REALISMO
Na segunda metade do século XIX, o
contexto sociopolítico europeu mudou bastante. Lutas sociais, tentativas de
revolução, nova ideologia, o impulso da ciência...
O mundo se materializava cada vez mais
e o artista passa a ver friamente a realidade, torna-se um analisa do seu
tempo.
A Revolução Industrial desencadeou
mudanças no modo de produção que se tornou responsável pela reordenação da
economia mundial no século XIX.
O avanço capitalista promoveu um
agravamento dos problemas sociais. Os artistas passaram a retratar a miséria. A
sociedade toma conta da arte.
O que se observava nesse momento era
um processo de industrialização com efeitos contrários ao esperado: acentua-se
o abismo entre a burguesia e a classe trabalhadora (proletariado). A fome, o
desemprego, a prostituição crescem.
Nasce o projeto literário realista e
os folhetins continuam a ser o principal veículo de divulgação das obras,
Na segunda metade do século XIX, a
visão fantasiosa, imaginativa dos românticos começa a saturar. Por volta de
1855, Gustave Courbet, pintor francês, usou pela primeira vez a expressão “O
Realismo” para dar nome à sua exposição cujo temas eram os costumes e
aspectos (“realistas”) de sua época. Nascia a “sinceridade na Arte”, o retrato
da sociedade em oposição ao exagero artístico do Romantismo.
O contexto
histórico-filosófico-científico contribuiu para essa virada na perspectiva. O
ambiente se mostrava mais hostil, mais voltado para o mundo material: é o
triunfo do capital industrial. As cidades crescem desordenadamente, vive-se o
apogeu da Revolução Industrial, observa-se o avanço científico e tecnológico
(eletricidade, telégrafo, locomotivas a vapor) de ciências como Física, Química
e Biologia. Surgem as massas trabalhadoras exploradas nas cidades industriais
(proletariado x burguesia).
Podemos ainda somar a essas
transformações a publicação do manifesto comunista de Karl Marx. A luta dos
operários contra a exploração, horas de serviço etc.
O estilo literário que surgiu nesse
contexto – o Realismo (Real-Naturalismo) – é, de algum modo, reflexo
dele. A percepção do artista é extremamente objetiva, racional e sua linguagem
torna-se impessoal, precisa, simples, sem os exageros do estilo anterior. A
preferência, agora, é com o presente e suas contradições: a euforia burguesa x
o capitalismo desumano. Os acontecimentos exigem a participação do artista como
observador desse mundo. E tudo ele analisa à luz de teorias sociológicas,
psicológicas ou biológicas.
O Realismo,
no dizer do escritor português Eça de Queirós, é “a anatomia do caráter. É a
crítica do homem. É a arte que nos pinta a nossos próprios olhos – para
condenar o que houve de mau na nossa sociedade.” O artista, nesse momento, será
o grande analista da alma, da consciência do personagem.
1. Origem
A tendência literária realista ganhou
força em 1857, na França, com a
publicação da obra Madame Bovary, de Gustave
Flaubert. Antiburguês, Flaubert desmascara (de forma caricatural) a falsa
moral burguesa. No romance, a romântica Emma Bovary, seduzida por
conquistadores, trai o marido (um médico medíocre). Enganada pelos sedutores,
acaba suicidando-se. Era o fim da moça educada nas ilusões de um falso
romantismo.
Dez anos depois (1867), Émile Zola
publica Thérese Raquim, dando início à estética naturalista na França.
Revestiu-se de um caráter mais científico. Podemos dizer que o Realismo tem um aspecto mais documental
e o Naturalismo é mais experimental.
Por volta de 1866, as antologias
parnasianas intituladas o Parnaso
Contemporâneo surgiram. Era o retorno da poesia ao mundo clássico. A arte
sem vínculo com o mundo social. Veja que o Parnasianismo merece um estudo à
parte, já que se desvinculou do momento presente, do compromisso com o social.
Retomando nossos estudos sobre o
Real-Naturalismo, podemos ainda dizer que quando os personagens são construídos
através de pormenores, de análise psicológica profunda, teremos uma posição
típica da estética realista. Quando
os personagens só tiverem sentido nas narrativas se expressarem o grupo a que
pertencem, teremos uma posição típica da estética naturalista.
2. Características da prosa real-naturalista
2.1 Existem alguns princípios comuns às duas
estéticas, tais como:
a) Objetividade e impessoalismo;
b) Racionalismo;
c) Universalismo (é o oposto de personalismo);
d) Verossimilhança (= a renúncia ao improvável
ou fantástico. A arte deve estar presa aos mecanismos da vida);
e) Contemporaneidade;
f) Pessimismo;
g) A contenção emocional (nega-se o sentimento e
a metafísica);
h) Narrativas lentas;
i) Perfeição formal (a correção e a clareza da
linguagem, entendida como fruto do trabalho e não da inspiração);
j) Materialismo.
2.2 Diferenças entre Realismo e Naturalismo
Como a estética naturalista é uma
ramificação cientificista do Realismo, apresenta características próprias.
O Naturalismo está fortemente marcado
pelas idéias científicas e sociológicas que varreram a Europa tais como os ideais positivistas e suas verdades
científicas; a corrente determinista
que viu o homem como produto do meio, do momento e da raça e a lei da seleção natural.
Agora, vejamos o que é peculiar à
estética naturalista:
a) o romance de tese;
b) a perspectiva biológica do mundo (o homem é
reduzido à condição de animal -> macho x fêmea -> o instinto se sobrepõe
à razão);
c) visão determinista (o meio e o contexto
histórico tem influência);
d) personagens patológicos (personagens
doentios: bêbados, incestuosos, prostitutas, devassos etc.) – Não se preocupa
com a psicologia dos personagens. Ela aparece de forma superficial;
e) crítica social explícita (anticlericais,
antimonárquicos, antiburgueses);
f) detém-se nas camadas mais baixas da
sociedade e nos aspectos mais torpes. Exibe a sexualidade.
g) o estilo é relegado a segundo plano. A
crítica vem primeiro. Exibe-se uma linguagem vulgar, coloquial ou cheia de
termos científicos.
O
contexto histórico, social, político, etc. levou a intelectualidade da época a
buscar novas formas de expressão. Novas perspectivas sociais e literárias
apareceram. Em Portugal, Antero de Quental e Teófilo Braga escreveram obras
contra a postura idealizada dos românticos: VISÃO DO TEMPO e TEMPESTADES
SONORAS (Teófilo Braga) e ODES MODERNAS (Antero de Quental).
Castilho, escritor romântico, criticou
pesadamente as obras de Braga e Antero, chamou de falta de “bom senso e bom
gosto” quanto à escolha dos temas por seus ideais revolucionários.
Em resposta, Antero de Quental
escreveu um textos “Bom senso e bom
gosto” e atacou o atraso dos poetas românticos, esta foi a chamada Questão
Coimbra. 1865 marcava, assim, a chegada do Realismo a Portugal, a
destruição das ilusões românticas.
Essa proposta de destruição da
idealização dos românticos foi defendida, também, em 1870, por Eça de Queirós,
escritor português autor de romances de olhares impiedosos sobre a sociedade
lisboeta do seu tempo. Fez o retrato cruel de uma sociedade hipócrita, de uma
igreja corrupta, de casamentos de fachada, de uma aristocracia irresponsável
como na obra Os Maias (1888), sua obra-prima.
·
EÇA DE QUEIRÓS (1845-1900): A crítica aberta
Mais importante ficcionista do
Realismo português.
Influenciou escritores portugueses (ao
longo da primeira metade do século XX) e também escritores das literaturas
brasileira e espanhola.
Exerceu advocacia em Lisboa e dirigiu
um jornal político na província. Foi diplomata, cônsul e viveu alguns anos na
França e na Inglaterra.
Seus primeiros trabalhos – artigos e
relatos breves – foram reunidos postumamente sob o título de PROSAS BÁRBARAS.
Foi um divisor entre tradição e
modernidade.
Sua obra é dividida em:
Ø
1ª fase: influência romântica determinada por
uma visão social, linguagem mais solta.
Obra:
O Mistério da Estrada de Sintra (1871).
Fez publicar mensalmente AS FARPAS, jornal de crítica à
política, aos costumes, às letras.
Ø
2ª fase: fase de combate e ataque às
instituições.
Obras:
O Crime do Padre Amaro (1875), O Primo Basílio (1878), Os Maias (1888).
Ø
3ª fase: abandona, um pouco, as críticas
mordazes. Tem uma visão mais otimista do mundo.
Obras:
A Ilustre Casa de Ramires (1897), A Cidade e As Serras (1901).
O
PRIMO BASÍLIO
(1878)
Obra revolucionária e de combate
social. Eça tece uma crítica violenta à vida social portuguesa. Analisa a
constituição moral de uma família da média burguesia da capital. Estuda-a por
meio de um caso de adultério feminino.
A origem social, educação e
influências externas ganham ênfases determinantes (determinismo de Taine).
Explora o discurso indireto-livre.
“Luísa
espreguiçou-se. Que seca ter de se ir vestir-se! Desejaria numa banheira de
mármore cor-de-rosa em água tépida, perfumada e adormecer! Ou numa rede de
seda...”
Estilo: uso de ironia, abandona a rigidez.
Prosa clara, concisa.
OBRAS
v O
mistério da estrada de Sintra (1870)
v O
Crime do Padre Amaro (1875)
v O
Primo Basílio (1878)
v O
Mandarim (1880)
v A
Relíquia (1887)
v Os
Maias (1888)
v Uma
Campanha Alegre (1890-91)
v Correspondência
de Fradique Mendes (1900)
v A
Ilustre Casa de Ramires (1900)
v A
Cidade e As Serras (1901, póstumo)
v Contos
(1902, póstumo)
v A
Aia (1894)
v Prosas
Bárbaras (1903, póstumo)
v Cartas
de Inglaterra (1905, póstumo)
v Ecos
de Paris (1905, póstumo)
v Cartas
familiares e bilhetes de Paris (1907, póstumo)
v Notas
contemporâneas (1909, póstumo)
3. Real-Naturalismo no Brasil
Em algumas produções da estética
romântica, observam-se preocupações com o momento presente. Obras como Senhora, Lucíola, O Cabeleira, Memórias de
Um Sargento de Milícias ou mesmo os poemas sociais de Castro Alves evidenciam manifestações contrárias ao predomínio do
eu, a idealizações. Era o início de um modo diferente de ver a vida, de sentir
o momento. Eram os primeiros passos para a perspectiva realista.
No Brasil, a visão positivista
encontra apoio em intelectuais da época domo estudantes da Faculdade de Direito
do Recife. O Positivismo, mistura de religião, filosofia e ciência ganha força
significativa nessa época e passa a ser divulgado por seus defensores.
4. Fatos importantes na segunda metade do século
XIX
As ideias positivas, republicanas e
abolicionistas ferviam em nosso país no último quartel do séc. XIX. O Partido
Republicano fundado em 1870 fazia campanhas com o fim de substituir trabalho
escravo pela mão-de-obra imigrante (italianos). A lavoura cafeeira prosperava
muito e possibilitava a expansão de novas áreas de povoamento. A República...
era decisão dos grandes fazendeiros, controladores das exportações de café (a
classe rural exportadora) e como não tínhamos indústrias, o que não provinha de
atividades agrárias era importado. Crescia, assim, nossa dívida externa (que se
iniciou no primeiro Reinado). Se pensarmos na cidade, a situação era pior,
faltava quase tudo.
Nesse contexto, chegam, ao Brasil,
através do ideólogo da “Escola do Recife”, Tobias Barreto, as ideias estéticas,
filosóficas e científicas vividas na Europa. As ideias positivistas,
deterministas, evolucionistas, socialistas tiveram repercussão no nosso meio,
apesar do pouco desenvolvimento do nosso país.
Nasce uma literatura voltada para
aquilo que se vivia no país: o registro do homem brasileiro do fim do Império,o
momento vivido e agora visto de dentro para fora.
A literatura começa a ter como ponto
de origem o contexto social que daria fundamento às suas teses (romances
naturalistas) ante às convicções científicas.
Aprofundando a psicologia do
personagem, investigando seu mundo interior (Realismo) ou colocando como produto do meio, do momento e da raça,
da animalização, da exploração do homem pelo homem (Naturalismo), o certo é que documentando ou denunciando o momento
vivido, a realidade, o comportamento humano foram os alvos da nova tendência
literária.
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