por Moisés Neto
Sempre procurei algo que fosse interessante em alguém. É mais ou menos assim a
minha vontade de escrever e tornar público o que eu escrevo. Sempre amei o
Recife além de toda repressão contida neste lugar e sempre quis expressar a
minha opinião sobre o que é viver aqui, como escritor, como intelectual, etc.
Escrevo para me inventar. Como autor uso a minha literatura para unir as letras
e a civilização em seus detalhes. Ser escritor é ser pai e mãe. Começo às
vezes, paradoxalmente, com uma narrativa pré-verbal que busco dentro e fora de
mim: grunhidos, suspiros, gritos, sussurros, etc. É muito difícil chegar até a arqueologia deste meu experimento, atrás das
barricadas desse meu desejo, desta minha ambição, recusa, reclusão, liberdade
(?). Escrever é dar primazia ao pensamento sobre a ação, ao macro sobre o
micro: Diacronia (a evolução no tempo – fenômenos
culturais, sociais, linguísticos, etc.) e Sincronia (isolar o fenômeno num certo tempo uma
época que em retrato). Já viajei por muitos lugares do mundo em busca de
contrastes que refletissem a minha tese. Terminei por quase não acreditar que
houvesse uma mudança no mundo: há uma troca de pensadores no poder, mas existe
sempre a necessidade de limites, como esses tão necessários na educação das
nossas crianças. Vi logo que a liberdade só se justifica pelo jogo arriscado
cuja regra principal é o tudo ou nada. Percebi que na
minha escrita está refletida a urgência a ditar a matéria dos meus passos.
Nunca fui contra a fome do capital, apenas não suporto muito bem as suas,
digamos assim, torturas.
Houve em mim sempre a alegria de pensar, de criar e de oferecer meus textos
escolhendo a mídia a meu alcance. Cai sobre mim o peso da disciplina que barra
um agir livre, que sufocou tantas vezes minha aparente revolta, mas por dentro
eu sempre soube que realizo o possível.Duvido um pouco de conceitos
totalizantes sobre “certo” e “errado”. Como esta “certeza” está vinculada ao
poder (político, econômico, social, afetivo, sexual, etc.)? Devemos tentar
entender a vida não apenas pelo conhecimento dividido das épocas passadas, o
que foi, mas sim pelo que
já não somos ou pelo que poderemos ser. Eu quero interrogar o espaço (mítico e
real) que nos cerca. Meus textos são como embarcações:
espaços flutuantes lançados na imensidão das águas, são reflexos, como este
agora o é, dos outros textos que leio e, ouço e sinto no mundo. Abraço a
literatura porque a linguagem para mim funciona como o espaço do possível de
ruptura com a noção primitiva do tempo. A linguagem supera o tempo (embora
aconteça dentro dele): realizando, e desrealizando, busco nas palavras a presença dos
seres e vejo a literatura como sendo um “outro” lugar, um acesso a um mundo
onde se pode enxergar o que não
se deveria ver: uma
experiência extrema do pensamento. Ela nos faz reinventar as palavras, deslizar
entre os sentidos, penetrar espaços, habitar neles, sem se fixar num lugar, sem
estar em terra firme, rumo ao horizonte da compreensão, do ser enquanto ser
múltiplo, plural, mutante. Temo que ao ansiar por uma nova mecânica de poder eu rasure ou... reforce ao mesmo tempo
certos valores antigos que se embutem, de alguma forma, às minhas estratégias
de composição e divulgação de textos. A guerra não é o contrário da paz quando
se trata, por assim dizer, de literatura, nela a história de uns pode ou
não ser a história de todos? É uma anti-história o que a minha literatura
reflete, uma reflexão contraditória entre o ser e o não-ser. Prazer e trabalho. Mãos à obra!
Moisés Neto (professor , pesquisador,
escritor, doutor em letras pela Ufpe)
Recife,
junho de 2013
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