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terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Barbara Heliodora e Sábato Magaldi

Há alguns anos, em 2005, tive a grata surpresa de reencontrar a crítica teatral carioca Bárbara Heliodora e conhecer pessoalmente o mineiro (Belo Horizonte) Sábato Magaldi aqui no Recife. Ele criticou FHC e LULA no tocante ao financiamento imperfeito à cultura: “O teatro não sobreviveu sem subsídio. Por culpa do governo vivemos o atraso. O governo teme os efeitos, de um conhecimento mais sólido”. Professor emérito da USP e ex-crítico do jornal O Estado de São Paulo (por 30 anos), aos 78 anos ainda mostra poder de fogo: “Os artistas maduros se cansaram da profissão e os novos têm poucas perspectivas. Concordo com Bárbara: peça com 2 atores já é superprodução. Há mais monólogos. A situação do palco está precária. Só resta a televisão, o teatro nasceu subvencionado na Grécia. Este é o espelho. Na França e Itália há subsídios públicos. Nos EUA grandes fundações se encarregam de ajudá-lo. Temos que construir mais teatro”, disse-nos Sábato emocionado. "Estimular escolas como a Escola de Arte Dramática – EAD – de São Paulo, fundada por Alfredo Mesquita, posteriormente incorporada à USP. Oferecer mais livros especializados, elevar o nível das montagens e das espectadores. O crítico não é autônomo. Depende da empresa em que trabalha, mas tive liberdade no Diário Carioca, no Estadão e no JORNAL DA TARDE (SP)”. Nosso encontro se deu em um Seminário de Crítica Teatral, no Teatro Capiba, SESC Casa Amarela, de 15 a 19 de agosto de 2005.


Moisés (de Melo) Neto, Bárbara Heliodora, Rodrigo Dourado e Fernando Oliveira (TAP)



                  Bárbara foi implacável: “Não uso estruturalismo, nem semiótica, nem metalinguagem: apenas crítica de teatro. Aos 81 anos, há 15 escrevendo para o Globo, adoro a cena. Assisto a cerca de cem espetáculos por ano, a maior parte de má qualidade, por amor assisto, mas é assustador", fulmina.

E entrega: "
Todos são críticos. Os profissionais têm que oferecer respaldo em poucas linhas e no calor da hora. O crítico tem que ser bem informado, não é questão de um curso de poucos meses. Há que freqüentar muito os teatros (o bom e o mau). Curtir os grandes espetáculos. O espectador só concorda com o crítico quando este concorda com ele. Não é só o gosto ou não gosto, nem perseguir ninguém.Ela acha que "tanto faz ver uma peça na estréia ou no último dia, ela tem que estar pronta, se a bilheteria estiver funcionando, de outro modo é desrespeito ao público. O crítico identifica qualidades, é um expectador melhor preparado, exigente. Platéias melhores também ajudam. As regras do jogo para apreciar melhor um trabalho, como no futebol. Um grupo estreante não deveria montar HAMLET ou ÉDIPO, como músicos improvisando a MISSA SOLENE, de BEETHOVEN ou a Paixão de São Mateus, de Bach."E sintetizou: "Ter jeito para teatro não é tudo: tem que dominar a arte e o instrumento. Quem tem que sentir é a platéia, ao citar compete ter imaginação e domínio de si o suficiente para transmitir. O teatro sempre esteve em crise, mas sempre se inovou, inventou e renovou”.

Sábato reclamou: “Os dramaturgos discutem pouco a questão do Brasil de hoje. Não vejo novela, ela não substitui o teatro. O besteirol se acabou, mas a comédia se refaz, mesmo com esta situação de política cultural que parece um túmulo. Devemos usar os recursos da boa dramaturgia. Críticos como MACKSEN LUIZ (RJ), são bem recebidos, assim como Mariângela Alves de Lima. Mas o espaço deles é reduzido na mídia”.

Bárbara reforçou:
“Comédia de costumes refletem o Brasil de hoje longe dos acontecimentos mais graves. Há quantidade e não qualidade. Nunca tantos brasileiros foram encenados. Os temas das novelas são superficiais. O teatro tem que ser mais penetrante. A linha mestra da dramaturgia brasileira é a comédia".Ambos concordaram num ponto: “Ninguém substituiu Nélson Rodrigues.”

“Se a crítica não tem um vínculo com os criadores, ela fica no ar, não tem real concreção. Conheci Oswald de Andrade em Belo Horizonte, gosto dos textos dele, mas o Nelson Rodrigues é a unanimidade nacional. Jorge de Andrade e Plínio Marcos foram influenciados por ele. Augusto Boal termina fazendo propaganda reacionária quando diz que todo teatro é político. Acho que a verdadeira política, engajada, seja descobrir o que é o ser humano”,
arrematou Magaldi.

Quanto aos anos de chumbo e a apatia que se seguiu, Bárbara depôs: “Não creio que só se escreva bem em crises. Arte é reflexo do mundo. Falta de dinheiro não é desculpa para um mau espetáculo. Confesso minha ignorância a respeito do teatro no Nordeste, mas Ariano Suassuna, é um dos maiores autores do Brasil. Gosto de Silveira Sampaio e Mauro Rasi e do ator Marco Nanini especialmente neste projeto chamado Circo de Rins e fígados”.Touché!

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