Pinheiro Chagas
O PRIMEIRO BEIJO
Primeiro beijo, perfumado, ardente
Primeira estrofe da gentil canção,
Que, em doidas horas de prazer fervente,
A flor dos lábios vem dizer «paixão!»
Ténue murmúrio, a suspirar carícias!
Aéreo sopro respirando ardor!
Meigo prefácio dessas mil delícias
Do gosto etéreo dum primeiro amor!
Beijar, a furto uma boquinha airosa,
Fugir, ceder à tentação fatal,
Bem como a abelha a voltear medrosa
Por entre as rosas do gentil rosal,
Que poisa, e suga a perfumada essência
Da flor tremente dum gozar sem sim;
Roubar assim, d'almo prazer de ardência
A puros lábios virginal carmim!
É sonho louco de ventura e enleio!
É ver nas trevas o esplendor do céu!
De casta virgem pudibundo seio
Palpita, rasga da inocência o véu!
Os lábios tremem da gentil donzela,
Refogem, voltam de delírio a arfar!
Oh! nessas horas amorosa estrela
Inunda a vida de fulgor sem par!
Depois extingue-se a visão brilhante;
Voltam as trevas, quando morre a luz,
Finda o romance da existência amante
Da fria campa em solitária cruz!
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Etérea emanação da Divindade!
Sonho encantado dum primeiro amor!
Tímida flor, que o sol da mocidade
Inunda com seu plácido fulgor!
Minha ingénua visão, dize quem há-de
Manchar-te as vestes de brilhante alvor?
Quem se não curva ao poderoso império
Dum meigo olhar, fulgente, enamorado?
O amor então é divinal mistério,
É puro incenso, ardendo resguardado
No coração, turíbulo sagrado,
Urna singela dum perfume etéreo!
Um beijo ardente, que traduz ternura,
É santo, é puro, porque é santo o ardor;
Em torno à virgem, num primeiro amor,
Respira – se um ambiente de candura,
Onde paira sorrindo a imagem pura
Do meigo arcanjo do infantil pudor!
A impureza é na orgia, é no devasso
Que escarnece do amor e da virtude,
Que nos prega moral no tom mais rude,
E entra no lupanar, trémulo o passo,
A prostituir, em repugnante abraço,
A casta flor da etérea juventude!
Vergonha sobre o ímpio, que despreza
Mimosas afeições do coração,
Gentil grinalda de infantil simpleza,
De puras flores virginal festão,
E vai, cingindo a croa da impureza,
Sentar – se no festim da corrupção.
Vergonha sobre o hipócrita, o decrescente,
Tartufo, que se envolve em castos véus
Ao nome de paixão, louca, fremente!
O Amor é santo, porque vem de Deus,
E um beijo louco, apaixonado, ardente,
Faz sorrir de prazer anjos nos céus!
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