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domingo, 9 de junho de 2013


Lucila Nogueira: 35 anos de vida literária
                     por Moisés Neto

Lucila Nogueira nasceu no Rio de Janeiro em 30 de março de 1950. Ainda criança chegou em Recife, estudou no Colégio de São José, formou-se em Direito. Cursou mestrados dessa ciência, como também o de Antropologia. Doutora em Letras com tese sobre João Cabral. Foi promotora pública e exerceu outros cargos ligados à sua profissão. Desde jovem dedicou-se às artes: piano, violão, acordeom e principalmente literatura, sua fonte de testemunho no mundo. Em 1978, publicou o seu livro de estreia: Almenara pela Civilização Brasileira. Livro cheio de uma poesia em que o amor, a preocupação com o social e com os temas transcendentes do espírito, na metafísica, verso caudaloso, forte de envolvente originalidade: “Eis-me aqui/sorvedouro estelar lúcido e breve.// Corrosiva alegria(...) barro aceso e convulso sob a neve (...) revolvida,torcida, esbraseada//labareda incessante que se atreve/mas que a abismos se sabe condenada” (em “Presença”). Veio depois, pela mesma editora, o segundo livro: “Peito Aberto” (83). Odespojamento expressional e os acentuados aspectos formais marcam esses “primeiros”  poemas que,também,deflagram um clima uma atitude de amor e revolta.Como no poema “Na Morte do Colega Pedro Jorge”: “Sozinha agora as filhas acalenta/e ao pó tu já regressas sob o mármore./Tanta sabedoria inventa o mundo/-como escapar do mundo ninguém sabe.// Sozinha agora as filhas acalenta/e elas ainda te esperam a cada tarde.../Só uma pena intimida os assassinos:/explicar tua ausência a essas meninas”. Nesses poemas pressentimos a força poética que Lucila alimentaria: “Atravessar o fogo ternamente/o corpo azul cercado pelas brasas/em cada poro o ferro incandescente/tendo no olhar a exaltação das águias //melhor que ser fantasma de si mesmo/besta na sombra, ombro recurvado /num desespero de albatroz vencido/por ambições terrenas e fugazes”. “Desde o princípio o mundo era pequeno/e o caminho da escola muito grande/andava a pasta a farda e no recreio/sonhava raptada por ciganos//dançando na fogueira a saia em leque/a estrada o carro alegre a caravana// desde o princípio o mar era sem termo/nas mãos as linhas soltas do destino/e no sapato escuro os remoinhos/acesos para sempre no meu sangue” (em Infância). “Meu pai morreu na tarde de um domingo (...) partiu da enfermaria sem saída (...) queimei todas as velas nessa morte (...) abrindo em minha carne uma outra sorte”. Vieram seus outros livros: “A Dama de Alicante”. Neste livro Lucila dedicou-se à recriação mítica e simbólica de si mesma “associada à memória proustiana que emerge de poema e que entre passado e presente faz ressurgir a infância, o amor, o sonho, a vida diluídos em mescla de sombra e luz numa realidade (ou irrealidade) mágica. Fusão lírica de elementos díspares, tom personalíssimo, sem autobiografismo, expondo sentimentos e emoções universalizando-os,sem ter que,necessariamente,os assinar como exclusividades suas.”, disse José Rodrigues Paiva em ensaio sobre o livro. “Sei me vestir de tola, se preciso/como essa antiga dama de Alicante/ inda que ao fim só reste o que eu ensino/cama-de-gato que aprendi criança.// Sei me cobrir de frágil, de improviso/sob o furor de um cavaleiro andante/e as chaves da cidade conduzindo/pedir que permaneça por encanto.//Filtros de amor, doce paixão de abismo/navegaram meu olhar com esta dama/alegre que, misteriosamente/um dia suicidou-se em Alicante.”. Em “Quasar” (87) Lucila nos dá o a medida do nível já alcançado na construção de sua obra poética. É a vez de “Livro do Desencanto”e “Imilce”, poema para quatro vozes. Em “Ilaiana” – Enigma de Elche, vemos a confirmação existencial e material de uma imagem nominada em sonho.
 “Ainadamar” veio a seguir. Ela dedicou-se também à tradução de poesia, tendo alguns volumes inéditos de poemas de Emily Dickinson, Paul Éluard, entre outros. Em “AMAYA”, o emotivo-rítmico–conceptual, pulsando, entrega-se ao leitor. A artilharia luciliana tem como alvo, a lógica. E, sob fogo cerrado, ou conduzindo avassaladora onda em tempestade, ela, condutora de emoções, forja um hoje eterno, rompendo com as noções do ontem e do amanhã, princípio e fim: “coração de poeta/pobrezinha/ brincando de casinha/a soluçar (...) vem me ver/porque não me cabe a vida/preciso /de tua praia a me guardar” (in “Não me cabe a vida”).
Vieram tantos outros livros, aulas, palestras desta trnslúcida Dama da poesia em pernambuco. Vamos ficar com mais algumas palavras encantatórias para a Gazeta: “Digo que continua urgente a ilusão deste momento acometido de inenarráveis confissões. Utopia presa na cartilagem úmida,quando tua boca recobrir o seio seremos então,as duas outras  faces  de uma mesma única  possessão,como uma estória colada na outra enquanto se lambe o lacre da carta escrita na infância que uma água subitamente morna quase apagou.”.  Nossa sibila invoca outros espíritos, que nos tomam de assalto. E, de certa forma, enfeitiçam leitores, como cristais energéticos.
Viva os 35 anos de Literatura desta poetisa e professora, advogada da transcendência, do real, simbólico e imaginário.







Poema de Moisés Neto para Lucila Nogueira:

ORAÇÃO PARA INVOCAR LUCILA

Ela se atreve diz pronuncia
Profetiza Passado Presente
Ó translúcida Lucila
nossas contas dissolvem-se em ti
Ave poeta, pitonisa! Vem novamente! Ó chama de Eleusis!
Dá-nos tua vaporosa poesia
Teu ensinamento
como cristal antigo, guia, oráculo, vaticínio
Vem, já e multiplica com tua força
Entenderão os não iniciados os teus mistérios?
Inspirações,estudos
Cálculos, perspectivas
Amor...
Liga alquímica, Banquete Cosmotrônico
Ave Lucila! Oriente- Ocidente: cruzamento
verdade oculta, cítara, lira, címbalos, condão
Vem! Em cetim florido, veludo, perfumes, pedrarias,
Doce vigor
 música transcendental
Na Aurora interminável do quase ser tudo
Concertar ou consertar o mundo...


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