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sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Entrevista exclusiva com Dinara Guimarães




Evento do Projeto Palavras Cruzadas (Espaço Multiver - cidades), em 03/12/2016, no Auditório da Livraria Jaqueira, Recife, às 16 h.

A autora estará autografando seu livro Escuta do desejo.


QUAL O SIGNIFICADO DO CINEMA ESCATOLÓGICO ?

Tomo o escatológico como pretexto para cinematizar o cotidiano que é expresso em um cinema particular; o cinema escatológico. Neste sentido, no  livro  “Escuta do desejo: ensaios sobre psicanálise , cinema e literatura” ,  explicito  os mecanismos  não só cinematográficos,  mas também do inconsciente para mostrar que determinado  cinema e a literatura  põe em tela o “Resto”  que é expelido de nossa sociedade fundada na tradição romano /germânica. . Ele  é assim composto de duas partes que se completam. A primeira parte,  desvela o cinema escatológico como olhar,  voz e fezes, e a segunda parte explora de forma nuançada a natureza da relação da voz e do olhar com a causa do desejo que mobiliza a sociedade humana.

QUAL O FUNDAMENTO DESTA LEITURA DOS "RESTOS" DA SOCIEDADE HUMANA CINEMATIZADA ?

Neste exercício me apoio em uma estrutura extraída da lógica lacaniana do significante latente no  conceito de “sutura”, por meio do qual ato o campo ao extra-campo, técnica estruturante do cinema  e,  evidencio o espaço ausente eludido, onde o sentido aparece como sintoma que se expressa de múltiplas formas, mas sempre como uma expressão do objeto escópico (causa do desejo), que, como frisei acima,mobiliza os sujeitos.

QUAL A CONSEQUENCIA DESTE DESVELAMENTO DAS ENTRANHAS DO CINEMA ESCATOLÓGICO, QUE SE PRESSENTE EVIDENCIAR A PARTE CINZA DOS SUJEITOS POR MEIO DOS FILMES ANALISADOS?

A consequência é a desconstrução da fantasia do   espectador a partir da exibição de uma posição des-fantasiada, nua e crua, ou mesmo delirante do artista. Uma estética pornográfica, no sentido da evidenciação, da mostração.  São obras que, da mesma forma que a obra pictórica clássica e moderna, indicam o real, mas não mais pela fantasia, e sim  por sua destituição violenta, por seu abalo traumático. Neste sentido, a abjeção e a repetição são dois elementos presentes no cinema contemporâneo  que parecem querer produzir uma dessublimação. Conduzem a Coisa a seu rebaixamento, abjeto, aviltam-na e degradam-na, em suma, rebaixam a Coisa à banalidade do objeto. Elas fazem ver o que não pode ser visto: carnes apodrecidas, corpos suspensos por ganchos de açougue, até mesmo ânus defecando. Uma arte que ao expor o horror, força o olhar a se desviar dela.  Uma arte assim pode ser qualificada de psicótica, no sentido de que implica a perda dos limites simbólicos que na arte em geral, bordeja o real da Coisa. Se para Salvador Dalí o sublime só pode ser inspirado pelo corpo, na arte contemporânea, ao presentificar o corpo despedaçado, o cinema traz à tona o antisublime, o horror do corpo quando reduzido à matéria que o constitui e destituído do simbólico  que constitui, no fundo, a alma humana e o amor de que ela é capaz.


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