Família Belli, o bisavô materno, Felici, veio de Nápoles.
Moisés Neto O nome BELLI tem origem na região do Tyrol. A Itália teve
dificuldade :seu território, depois do Império Romano, foi ocupado por muitos
povos sob fortes poderes políticos e religiosos. Criada como nação em 1860, com
a exclusão da Áustria de Nápoles ( por Garibaldi).
À esquerda, os bisavós de Moises neto com as três filhas: Terezinha, Diomar e Henriqueta de Belli
Avô e avó de Moisés Monteiro de Melo Neto; ele, Mário, é da família Peixoto Vasconcelos, de judeus paraibanos
O ramo da família Belli ao
qual pertence Moisés Neto chegou ao Brasil com Felice de Belli, que chegou a
Paraíba para trabalhar como vendedor e enriqueceu a custo de muito trabalho.
Tornou-se Cônsul da Itália na Paraíba casando-se com Henriqueta da Silva gerou
os filhos: Nicola, Felice júnior, Dante e Beatriz(gêmeos), Carmela, Elvira,
Júlia, Galileu e o caçula Deocleciano (avô de Moisés Neto). O marido de Carmela, João Petrucci,
possuiu uma das primeiras lojas de automóvel do Brasil. Tia Elvira casou com um
italiano da família Grizzi- ele morreu e ela casou com Braz, irmão dele. Há que
se destacar que dois tios de Moisés, os escritores Osíris e João de Belli,
paraibanos, eram poetas e que alguns membros desta família estavam envolvidos
com o teatro na capital da Paraíba.
Pelo lado paterno, a família de Moisés Monteiro de Melo Neto tem INTERESSANTE TRAJETÓRIA: A FAMÍLIA MONTEIRO é descendente de Rui Monteiro, aristocrata português, também do
tempo de Dom Afonso Henriques, que residia na região de Penaguião, onde
possuía inúmeros bens. Monteiro casou-se com Elvira Gonçalves, filha de D.
Gonçalo Moniz e Maria Anes. Tiveram muitos filhos, que continuaram com o
sobrenome e, com certeza, nos legaram além-mar. Em 1877, dois irmãos saíram
da região de Piancó, na Paraíba, com o intuito de fixar residência em outro lugar,
por conta de uma grande seca que assolara o Nordeste. Com o dinheiro adquirido
da venda dos bens, comprou uma fazenda, numa região de lagoa; o local
passou a se chamar
“Lagoa do Monteiro”,
tempos depois.
O segundo irmão, de nome
Honório Monteiro de Mello,
galgou outros horizontes.
Acostumado a fazer
parada nesta região, como
almocreve que fora,
resolveu fixar residência
por aqui. Casou com Luzia
Monteiro, uma prima.
Tiveram vários filhos,
dentre eles, José Honório
Monteiro de Mello (que,
por título comprado, que
era comum, passou a
Capitão José Honório
Monteiro de Mello),
Manoel Monteiro (meu bisavô), Ernesto Monteiro, Maria Rita – matriarca dos
Monteiro de Arcoverde – Amélia Monteiro, res-ponsável pelo matriarcado dos
Monteiro de Lagoa dos Gatos e Caruaru; ainda, Maria Monteiro (prima legítima do
avô, José Honório; um verdadeiro emaranhado familiar muito comum, naqueles
tempos). O casal teve nove filhos, criando-se apenas um: Quiterinha Monteiro.
Afeiçoado aos amores clandestinos, o bisavô de Moisés Neto efetuou muitas
proezas. Dos vários ímpetos a que se expôs, surgiram descendentes outros. A
alguns, nos achegamos e outros, disfarçaram tão secretamente a procedência que,
ainda nos nossos tempos, permanecem em segredo total. Exímio nadador, o
bisavô expunha-se às maiores enchentes do Ipojuca. Em 1914, numa dessas
façanhas, contraiu febre amarela, tendo morte instantânea. Deixou razoável
legado. Além da casa na cidade, todas as terras banhadas pelo rio que iam, do
início da rua da Lingueta até o terreno dos Vital – que fora seu – formando um “S”
invertido, cortando toda a cidade.
Sem o menor tino administrativo, a família não soube conduzir o patrimônio,
desfazendo-se da maioria dos bens.
Moisés Monteiro de Melo Neto e o avô paterno, em Sanharó (PE)
Assim o professor e escritor Salomão Fonseca descreve livro
com os Poemas publicados em jornal, de Moisés Monteiro de Melo Neto: Recife
acordou radiante, majestosa e imponente, como o sol que ilumina e aquece nossos
corações; ou talvez, um Deus que encontra satisfação em abençoar seus filhos. Isto porque nossa
menina, que já não é mais tão menina
assim, foi glorificada por um de seus filhos. Filho este que parece saborear do
néctar, degustar dos mais diversos
sabores da literatura. Moisés Monteiro de Melo Neto, dramaturgo, teatrólogo,
poeta, nos presenteia com mais uma de suas obras: “risos e sisos”, uma
releitura de seus poemas publicados em jornal, e porque não dizer, uma
releitura de sua vida, uma vez que os poemas retratam muito de suas
experiências e observações sobre o universo de cada leitor. É difícil ler seus
poemas e não pensar: mas como? Como ele consegue sintetizar meu pensamento em
tão poucas palavras? Talvez por ser ele um pesquisador, um artesão das palavras
que nos embriaga e nos entorpece em sua descrição dos nossos sentimentos. Um
poeta que tem o romântico como sua essência, mas que transita pela tradição
(simbolismo, modernismo, até pelo arcadismo...), sem perder o contato com o
contemporâneo, o que nos permite dizer que sua obra será sempre atual. Isto nos
revela o Moisés letrado, um autor esmerado, estudioso da literatura que não se
contenta apena com o dom da arte de escrever, mas que vai além. Um autor que a
princípio se mostra simples em sua forma de escrever, mas quando nos
aprofundamos em sua obra percebemos o quanto ele é sofisticado. Temos aqui uma
coletânea de poemas que nos mostra o universo lúdico do autor suas emoções...
ideias.
Alguns dos seus poemas ressaltam a beleza do Recife, dentro
desta linha podemos cita o poema “Outono”, um amor que transcende o tempo e tem
a cidade como pano de fundo, já em”
Epifania”, a linguagem simbolista faz-se
presente , o poeta faz uso de algumas figuras de linguagem na tentativa de
envolver o leitor em um universo mágico.
Em “Ode ao Teatro de Santa Isabel”, vamos encontrar uma homenagem a um templo/
ícone das artes no Recife. No poema “Ode ao teatro santa Isabel” enfatiza a
nobreza da arte de atuar e a história que é representa nas paredes do teatro,
os vestígios do tempo, as marcas de suas glorias que por si só atrai um
publico. Ele que já foi chamado de teatro de Pernambuco, mas passou a se chamar
Santa Isabel para homenagear a princesa.
Com o estilo neoclássico, elegante e imponente; o nosso Santa Isabel é
considerado por muitos o mais belo edifício teatral do império. Ele que já foi
testemunha de inúmeras revoluções, que já recebeu tantas figuras ilustres. Deus
o abençoe caro gigante. Vós que sois a “Fênix renascida”, pois ressurgiste das
cinzas como a ave mitológica e resistisses à tantas transformações ao longo dos
tempos. Que os deuses do teatro te concedam toda gloria e honra que só um grande rei merece. Nos o saudamos.
Aqui vale inserir o poema de Moisés para o Teatro de santa
Isabel, vertido para o espanhol:
Oda al Teatro de Santa Isabel
(poema de Moisés
Monteiro de Melo Neto)
Tus paredes abrigan sueños
Dentro de ti la vida estalla com la intensidad de estrellas
En tu escenario las
ideas se renuevan siempre
Al sonido de la música
En el compás de la danza
A cada acto de tantas representaciones de la risa, del
dolor, de la serenidad
Traes reflejada em cada cristal la imagen de la audacia
humana
Clavado que estás a las orillas del Río Capibaribe
Eres gloria de una ciudad que viene a través de los años
construyéndose y rehaciéndose
Eres rosa al viento en las tardes tibias
Eres refugio de tantos proyectos que resisten a las
intemperies
Eres faro de Recife
En tu nobleza los pobres se equivalen a los ricos
Eres de todos
Y estás abierto como una flor magnética
Atrae y enseña
Divierte y educa
Quisiera tener versos magníficos que expresasen toda mí
gratitud
Pero soy poeta menor delante de tu esplendor
Más que sesquicentenario señor
Ya se van ciento sesenta años
Y pareces tan joven, tan actual
Quería abrazarte
Pero envuelvote sólo con esa mirada de quién pide
A Dios por un mundo mejor
Delante del altar.
Moisés Monteiro de Melo neto, no Teatro de Santa Isabel
Em “Linha do tempo”, a vida é um grande palco onde encenamos
nosso próprio espetáculo, somos espectadores
e protagonistas da nossa história, escrevemos nosso próprio enredo e
muitas vezes nos perdemos em nossa própria trama; o teatro é mímese da vida,
não como reprodução real do que somos, mas sim,como uma representação lúdica do
sentimento humano. O poema apresenta uma cadência, um jogo rítmico através das
palavras: “lida, vida, cena, sonhos, bastidores...” um artifício do poeta para
comparar o teatro à trajetória de uma vida. Ele representa tanto o artista
(você) quanto o homem comum (eu). Penso que o teatro é uma boa comparação, pois
somos todos trabalhadores e batalhamos por uma causa.
O poema sobre o teatro de santa Isabel (Moisés neto) também
foi incluído no libreto sobre os 160 anos daquele teatro (Moisés roteirizou
para os quadrinhos uma pesquisa sobre este famoso edifício)
Em “Os Atores”, o poeta produz um poema sobre a arte de
atuar, o título do texto é a chave do poema (meta linguagem). Usando de palavra
opostas (antíteses) e ideia contrárias (paradoxos) “Sozinhos em grupos”, o
autor sistematiza sobre a arte de representar; o ator e suas mil faces, o
mestre das ilusões. O ator e sua capacidade de dar vida a um personagem
(“manipuladores do próprio eu ou fantoches?”), misturando o conotativo ao
denotativo ele brinca de ser Deus quando compõe uma personagem. Descrevendo a
maravilhosa fase da juventude, “Poeminha Um” mostra que todos acontecimentos
nos trazem algum aprendizado, os riscos, as dúvidas, os acertos e incertezas de
um futuro duvidoso. A juventude e sua eterna relação com a transitividade do
tempo onde tudo é passageiro e acontece agora, “somos tão jovens e temos todo
tempo do mundo e mesmo assim não temos tempo a perder”. A adolescência e suas
descobertas; amores, encantos e desencantos; a juventude seus riscos e prazeres
tudo é eterno enquanto durar.
Já em “O templo das horas”,
tempo é a matéria prima do poeta e o poeta tem como tarefa registrar os
fatos, ser operário a serviço do tempo. Uma
passagem de mês, uma passagem de ano... tudo é criado pelo homem, mas no
”templo das horas não há portas”, então só nos resta observar e aprender os
ensinamentos que ele nos dá . O templo das horas fala da vida, “Embora mais um
ano esteja para começar/ Aprenda antes que seja tarde” não devemos deixar
de viver nossas realizações, pois este tempo acaba... a vida acaba, falar dos
sentimentos, pois, amanhã pode não dar mais tempo, priorizar o hoje. Um jogo de
sensações “Epifania” nos faz enxergar a noite com nossa eterna companheira, ou
com pano de fundo para o universo dos românticos. o poema nos conduz a um ambiente misterioso,lúdico; o
poeta faz uso de elementos simbolistas na tentativa de envolver o leitor em um universo mágico, sinestésico, mesclando bem o romantismo com o simbolismo. “A noite/É
de branco luar na estrada deserta/Ímã vermelho, teu calor me atrai/O azul
escuro do céu serve de contraste para/Uma verde luz que emana dos teus olhos.”
O poema “Você persiste” traz um
sentimento de nostalgia, a idéia de um homem solitário “O mar repete um
aviso/agora és ilha, homem”, que se apega às lembranças do passado; um amor que
ultrapassa os limites do tempo. O mar,
as ondas renovando nosso desejo de não virar a página de uma história inacabada
em nossos pensamentos e a lembrança dos abraços “hoje braços distantes”. Talvez
um amor adolescente, um amor que nos lembra o tempo em que tudo parece ser para
sempre; sem respeitar a efemeridade e a cronologia dos fatos. Novamente, o autor brinca com as palavra
usando metáforas, comparações para criar um ambiente romântico.
“Chove”, apresenta características urbanas: “Recife, vestida
de céu/cinzento, chove tanto/Cinco horas da manhã...”, fatos corriqueiros em
nosso cotidiano. Da janela do apartamento Recife é descrita como uma metrópole
que não descansa. Ao mesmo tempo, percebemos que o autor utiliza o
cotidiano para mostrar o amanhecer das
pessoas, o despertar e o sentimento que pode levar o leitor a uma interpretação
do que teria acontecido na noite
anterior:” Silêncio entre nós dois, nada pode nos fazer um\ Entre a indiferença
e o intransitivo prazer de existir”. Mesclando simbolismo e romantismo o poema
“Teus olhos” conduz a um jogo sensações (sinestesia) “Como negras
azeitonas/Sobre branca porcelana” misturando
cores, sabores que aguçam nossos sentidos. O eu lírico nos revela sua face romântica que faz
comparações para exprimir a loucura de quem ama, remetendo-nos à morbidez do romantismo.
“Roletas russas da sorte/A loucura de quem ama”. Possivelmente uma releitura de
um poema de Gonçalves Dias chamado “Olhos Verdes”.
“A busca” sugere o aprendizado que vai além do material
(metafísica) “Que aprendizado novo nos aguarda?/o da doçura?/talvez o do ar
mais puro...” trazendo uma relação com o arcadismo, trabalhando a questão da
natureza e do sagrado do puro e o intocável; “sobre sermos jóias
preciosas/sobre deixar a bebida sagrada/tocar nossos lábios/para sermos puros”.
Já em “Seu beijo” um pescador avistou uma mulher de cabelos dourados boiando em
direção à praia. Uma mulher seminua, metade humana, metade peixe que o seduziu com o seu canto e beleza (Lenda
da sereia). O poeta faz uso da mitologia para expressar seus sentimentos, ele
assume o papel do pescado: “eu estava deitado na areia/ você chegou” talvez uma
referência à deusa Tétis (ilha dos amores). O beijo é caminho que leva às
portas da percepção,”sua boca na minha” , dois lábil que se encontram e se unem
formando um todo, o toque suave das mãos acariciando-me “ você minha joia mais
rara”, o êxtase de uma relação.
Preparando-se para a sedução, Balada recifense enfatiza o
desejo, a juventude e sua efemeridade, eu quero viver o hoje e o amanhã fica
para depois... “Entro na boate te procurando/ Peço uma bebida doce./ Sinto o
gosto, teu cheiro aguça meus sentidos../ Me viro e beijo/ Mas não é
você/ a noite acaba e tudo voltou ao que era antes...”. Apesar da linda noite,
vem a decepção por não ter estado com a pessoa amada.
“Sementes do amanhã” tem a cidade como pano de fundo de um
grande amor que passou... fica a lembrança, a saudade e o desejo de voltar no
tempo. “se ainda pudesse ter algo seu/ seria o tempo reconquistado”. A
nostalgia de uma história de amor inacabada. “nossa fantasia do último
baile.../ entre atos e fatos, a dúvida e a culpa” de quem é a culpa, não
sabemos; só o tempo cicatrizará as feridas, só o tempo nos dará um novo amanha.
Comparando os conflitos de um relacionamento com uma trama o poema Novela
ressalta os acontecimentos de um relacionamento, intrigas, conflitos
contradições é como se a vida fosse um romance em capítulos com
hora marcada para começar e terminar. Tudo está escrito, nada é por
acaso: “Ah, meu amor!/ Por que teve que/ ser assim?/ tudo sempre parece /começo
e fim”.
Retratando a vida dos pescadores, como diz o próprio nome do
poema, “Pescadores” mostra a alegria do seu trabalho e a incerteza do seu
retorno” Arrastar nelas o destino incerto” , com a vida sofrida mais sempre
cheia de esperança, o eterno aprendizado da lida com mar é seus mistérios, o
tempo...a solidão, o cansaço”; dias e
noites de mestres e aprendizes” e a esperança do retorno para suas
famílias. Este poema “Revolução na Rua
da Glória”, traz uma história de
amor de carnaval, “Ilusão latina/Amei-a no carnaval”, onde as lembranças da
mulher pernambucana misturam-se com as lembranças da cidade, “mapa perdido:
Pernambuco/Menina-revolução sem afeto/às margens secas do Capibaribe/no bairro
da Boa Vista” , dos blocos, das fantasias , quem não já se encantou com os
blocos líricos e a nostálgica do carnaval do Recife. A liberdade o amor sem compromisso
“Menina-revolução sem afeto” que dorme na memória e quando ressurgi vem a
saudade boa ... a alegria de ter vivido aquele momento./ Ela dorme agora na
memória”.
Na visão do poema Intraduzível, um amor sem tradução, lembrança que se eternizou... que tamanha importância
passa a ser intraduzível diante de tantos detalhes. “Sereia, você me atrai,
irresistível melodia./Navegador, conquistador, me deixo seduzir/e me tens nos
teus domínios”. A fascinação pela mulher
e o domínio que ela possui sobre ele, as diversas sensações despertadas no
tocar.
“É inútil resistir, você não acredita?/Dizer que o amor
pagou o preço do meu pranto/Parece inútil a pureza no meu peito/Viveremos de
nós mesmos!/E eu... como quem delira/De qualquer jeito/O resto é mentira”. O
resto é mentira! É um questionamento de amor... será que valeu a pena tudo?
Será que a pureza do amor tão maltratado valeu ou tudo não passou de uma
ilusão? Viveremos de que, já que a nossa história não passou de uma mentira.
Fala da decepção.
“Aí está você”... “Sapateando no leite derramado/Rindo
do meu choro abafado/Dançando com o CD arranhado/Não vou adiar esse adeus
danado” fala da insatisfação de um relacionamento que esta no fim, descreve um
lar em pedaços.O poema apresenta uma cadencia , jogo de silabas fortes que dar
um ritmo, usando o artifício da aliteração , o autor consegue passar a idéia da
repetição do discurso.
“Sexto sentido”, neste poema o autor cria uma relação entre
sentidos do corpo para expressar o seu
desejo por uma mulher. O título é a chave do poema “sexto sentido”. Trabalhando
com um jogo de palavras e idéias o eu lírico mostra que sua vontade e
incondicional pois, o seu querer independe do outro. “Nos meus olhos está a tua
imagem... Queria ser o teu preferido, mesmo que fosso num sexto sentido”.
A música no ar e os dois que valsam nas estrelas, nada mais
neste momento interessa só o amor que os entorpece, nosso ritmo, nossa harmonia
emanam alegria e ao seu lado não tenho mais dor.... “Amantes no Paraíso”: o
poema fala da plenitude do amor, dois corpos que unem formando um só.
“Pantomina”, numa narrativa descritiva, o eu lírico deste
poema mostra uma situação onde o homem passa a ser objeto de desejo. Em uma
festa regada a vinho e boa música de repente ele se sente observado: “alguém me
dirige o olhar, nos percebemos e isso aguça meu desejo”. O que fazer, como devo
agir?... No outro dia me ligou,como descobriu meu telefone?... Era o início de
uma ópera bombástica.” O universo masculino e seus atrativos.O poema apresenta
características narrativas:espaço,ambiente, cronologia de tempo e uma boa
descrição de local.
Vamos encontrar em “Milagre de carnaval”, Uma louvação ao
carnaval, encontros e reencontros no meio de tanta fantasia, promessas que não
são reais, mais serão lembradas como uma doce recordação “Te encontrei num
clube de máscaras... bem sabia:/ Nossas promessas, tu não confessas?”. Em meio a exaustão, festa, alegria... nos
encontramos... eu, andarilho errante, tu, que eras de outro, mas já me pertencias...
Pierrôs e colombinas nos festejam e o galo nos abençoa. “Seremos eternos ao
menos em nossas lembranças/ Ressurgiremos transfigurados em ascensão sobre
todos./Neste Éden recifense, tudo ferve.../Da madeira morta nascem flores./Tudo
é folia, agora/estamos perdoados.”
Um poema metafísico
“Nirvana” nos remete ao cosmos, um turbilhão de sensações tudo ao mesmo tempo
agora. “mudo, quieto em meio ao trovejar de pensamentos alheios./Ferido,
petrificado pelo sal, doçura do amor impessoal...”. Um olhar introspectivo do
homem em direção ao infinito em busca do ser superior. A busca pelo desapego
material.
Recife como cenário do nosso amor, em “Outono”, a bela
cidade que tem em suas pontes, ruas e praças a nostalgia da história de um
povo. “Agora o outono recifense.../ As folhas caem na memória/ Caminhamos por
ruas de sonho/Ecoam os nossos passos nesta história”. Neste cenário em pleno
outono o amor se perpetua entre as folhas que caem e o colorido da cidade, as
lembranças vividas aqui passando na memória serão sempre a prova viva do nosso
amor.
“Desaparece o sol na nossa janela/De um dia feliz sem
mazela”, simboliza o fim de tarde, um olhar através da janela com a tranquilidade
do dia, observa a cidade do Recife: pessoas vêm e vão despertando a vontade de viver.
Em “Desaparece o sol na minha janela” é valido ressaltar o jogo de corres... os
detalhes das várias situações de um cotidiano, ali passando sobre um olhar
atento descrevi-se a cidade.
Muitas vezes o autor nos traz um sentimento de nostalgia,
como no poema Você persiste: “agora és ilha, homem./ lembrança dos teus
abraços”. É ou não a idéia de um homem
solitário que se apega às lembranças do passado, um amor que ultrapassa os limites do tempo? O mar, as ondas renovando
nosso desejo de não virar a página de uma história inacabada em nossos
pensamentos: “lembrança dos teus abraços/ hoje braços distantes”; talvez um
amor adolescente, um amor que nos lembra o tempo em que tudo parece ser para
sempre; sem respeitar a efemeridade e a cronologia dos fatos. Novamente, o autor brinca com as palavras
usando metáforas, comparações para criar um ambiente romântico, buscando o
invisível, as profecias, sombras da vida... são dúvidas que percorrem o ser
humano. Os sentimentos estão aflorando e o desejo me fará presente. A mais doce
alucinação, lembranças e mistérios relatam um amor passado, feroz guardado para
a vida inteira em sensações, ecos. Imagina se fosse agora...será que sentiria
menos culpa? As fantasias continuam, passam como um filme acelerado, flashes da
vida. Temos aqui a tradução, um relato de um casamento antigo, que em momentos de reflexão a vida e suas aventuras,
levam a pensar ...será que poderia ter sido diferente, mais ao retornar de sua
viagem alucinante quer acender o casamento o amor da vida inteira e que esta
ali ao alcance das suas mãos.
Nelson Rodrigues faz cem anos e Moisés homenageia o escritor
recifense que descreve tão bem a sociedade carioca, tendo a família como tema
central, e as faces do ser humano, seus conflitos familiares e desejos... um
realista de essência que ousou mostrar a vida como ela é, permeando-a com humor
e a sátira. Suas mulheres podem ser a representação da pureza, castidade; ou a
personificação do desejo, do pecado. O homem é representado como o canalha, o
ser despido de pudores que faz o que for preciso para alcançar seus objetivos.
O poema tem os
ingredientes que torna a obra de Nelson Rodrigues diferenciada, mostra
uma realidade problemática e polemica das famílias e dos
relacionamentos.“castidade e perversão/ amor & tragédia/ gozo suburbano/
casamento problemático”, com uma visão sempre conturbada e uma opinião sempre
contraditória o escritor relata a sociedade carioca.
A mitologia é a chave do poema Sem resposta, cita Orfeu e
trata de um amor destrutivo , com isso levanta perguntas da importância da sua
própria vontade, “...em solo movediço/
sabendo que me segues/ e que não nos cabe/ nem o Hades nem o Eden./ Resta-nos/
Nosso amor em trânsito/ nosso amor ...passagem.../ sem resposta”; usando o amor
como resposta e justificativa para seus atos, amor e pecado andam juntos
tornando as perguntas sem respostas.
Em O pedido... o desejo de estar com quem se ama, um
cenário de justificativas de um amor perfeito , pronto para entrelaçar-se , a
certeza da mulher amada...desejos, abraços
“Sinta minha pele ardendo por você.../Meus ouvidos amorosos por lhe
ouvir\meus lábios sedentos e obedientes./Meu coração...eu já nem sei se é só
meu...” não existe mais eu e sim nós. Apesar das suas inseguranças,
“entregue-se, como eu fiz”. Porque as
promessas são de amor eterno , então: “ Case comigo.”
A preparação para uma
viagem, os pensamentos ficam voltados para os acontecimentos externos. Casa na
montanha uma viagem para o campo: “Viajo para o campo/ A natureza só pode amar
a ela mesma/ a gente tem que se ajudar./ A roseira que você plantou floriu”;
transmitindo uma ideia bucólica, a valorização da natureza e a concepção que
precisamos ajudar uns aos outros. Trabalhando elemento da natura Moisés
descreve o desgaste do tempo na vida e nas coisas matérias, a necessidade da
manutenção física e espiritual da vida. Assim também é em Tempo de separação,
que traz a exposição do oposto de um
relacionamento onde personalidades e prazeres com tempo se revelam
coisas distintas: “...lá estão as cinzas do nosso amor/ brasas adormecidas/
apaixonadas” adormecendo o amor tão
intenso no inicio, parece que quanto mais tenta amar, mais o eu-lírico na
poesia de Moisés exercita-se como se
fosse possível alimentar e continuar um amor puramente literário que busca
justificativas e motivos para continuar. É o que percebemos em Nossa música como metáfora de uma vida, as cordas de um violão que quando
dedilhadas produzem uma melodia comparadas à trajetória de uma vida ...a
história de duas pessoas que não conseguem se encontrar,duas metades que não se
encaixam e são como cordas de um violão que não se tocam . O desejo sem lei, a
não ser a mímesis interna, encontra e eterniza sua razão de ser e estar, pode
ser numa praia, velha casa na colina , A casa do holandês, dá-se sempre uma
espécie de resgate, um período da
história pessoal, inventada ou vivida, tudo vai se misturando em frenesi
poético, torvelinho, como na casa antiga, castigada pelo tempo, onde o vento
produz sons do abandono, onde o poeta escuta e transmite-nos o sofrimento da
efemeridade, tema tão recorrente em sua obra, toda ela uma espécie paisagem
selvagem de lembranças, ou, lembrando o mestre Edgar Allan Poe... relíquias,
que Moisés define como “prisão/liberdade/ lembranças” , o que se passou realmente
jamais saberemos com certeza. Às vezes isso resvala num encômio, como em
homenagem a uma voz que se cala e eterniza-se como a de Mercedes Sosa, no poema
La Negra acena dúbia despedida, tratando-a como uma mulher forte que conquistou
o mundo com sua voz e seus ideais, mulher revolucionária, mas que não perdeu a doçura e a sua voz carinhosa
deixa saudade: “Até a próxima canção, querida Mercedes”.
Já Malu Souza, professora, escritora e musicista, expressa
sua opinião sobre os poemas deste livro de Moisés assim: “É com maestria e sensibilidade que Moisés
Monteiro de Melo Neto compõe esta obra. Passando por uma epifania onde tudo ao
redor ganha equilíbrio, o autor nos remete ao seu mundo de verdades, mentiras,
revelações, alucinações... e por que não o das suas baladas? Uma poesia Cool
& Cult é o que temos nesta obra, com uma coerência e uma permanência que
nos encanta. Poética não necessariamente avassaladora, mas com uma
característica simples e elegante. O que se mostra em meio a esta simplicidade
é a grandeza tantas vezes particular, porém altamente universal deste
poeta. Acredito no amor como a essência de cada um
dos poemas de Moisés, a começar pelo recíproco, como vemos em Seu Beijo, ou
mesmo o rejeitado, retratado nos versos de Novela e, até, a dor do amor que se
foi em Você persiste. Moisés Monteiro de Melo Neto atua em seu teatro da vida
registrando em versos e estrofes que criam uma espécie de trama em nossa mente.
Nos versos do poema Novela, onde percebemos essa característica com mais ênfase.
Somos espectadores dessa teatralização que se assemelha a um musical de tão
embalado, e é nessa clima rítmico que sentimos, também, um quê de samba gostoso
de declamar no poema “Aí está você...”.
O tempo é
submetido e concentrado em encenações que se revertem em temporadas e, assim, o
ciclo não para. O templo das horas é como um espetáculo que se inicia, mas logo
tem seu fim, são experiências da passagem de uma cena para a outra, e depois à
outra temporada, outras peças, outros atos, outros atores e assim “sempre
haverá mais uma chance”.
Considerando
a paixão que o autor deste livro exprime, não nos surpreende as tamanhas
homenagens que o mesmo faz, durante a obra, à artistas como Mercedes Sosa,
Nelson Rodrigues e à monumentos como o Teatro Santo Isabel e a própria cidade
do Recife.
É através de sentimentos como saudade, paixão, harmonia e do
visível amor pelo teatro e pelo Recife que Moisés Monteiro de Melo Neto
compreende todos os poemas deste e livro. Não só estes, como todos os seus
demais textos.
Mais sobre Moisés Monteiro de Melo Neto
O escritor, professor e pesquisador recifense Moisés
Monteiro de Melo Neto tem formação em Letras, pós-graduado em Literatura
Brasileira, Mestre e Doutor em Teoria da Literatura pela UFPE. Ele estreou no
teatro como ator profissional dirigido por José Francisco Filho e Buarque de
Aquino e com o diretor /autor João Falcão.
Entre 81 e 83 participou do Grupo Trapézio de teatro, ao
lado de Geane Bezerra, Zélia Sales, Romildo Moreira, Manoel Constantino, Tereza
Meira Henrique brito e Buarque de Aquino, este coletivo montou A Vila dos mil
Encantos (texto de Geane e direção de Buarque).
Grupo Trapézio durante intervalo dos ensaios do musical A
VILA DOS MIL ENCANTOS, teatro Valdemar de Oliveira, Recife, 1983
Fundou em 1983, a Ilusionistas corporação artística com
Augusta Ferraz
Moisés Monteiro de melo Neto, Moisés Neto, e a grande atriz Augusta Ferraz. Fundadores da Ilusionistas Corporação Artística. Na foto: cena da peça O BOLO (O vazio do céu que esvaziou o mundo); foto do Ilusionista Adeilson Amorim
Atores da Ilusionistas Corporação Artística, na primeira sede (Rua da Hora, Espinheiro, Recife - PE)
Moisés estreou como dramaturgo (também como diretor) com as
peças O diário secreto de janis Joplin (Verdades e Mentiras), vejam os arquivos
abaixo:
E com Um Certo Delmiro Gouveia, vencedora do prêmio de
melhor texto literário num concurso promovido pelo Governo de Pernambuco.
A atriz Mísia Coutinho, na peça Cleópatra, de Moisés Neto, que também recebeu um prêmio do Governo do
Estado de Pernambuco.
CLEÓPATRA, peça escrita por Moisés Monteiro de Melo neto
Além do teatro, Moisés publicou seu 1º poema no Jornal do
Commercio nos anos 80 (Lobos) e foi colaborador regular do Suplemento literário
deste jornal nos anos 90, publicando seus artigos em outros jornais e revistas
como o Le Monde Diplomatique e na revista belga Parati. Lançou seu primeiro
romance intitulado A Incrível Noite (edições Ilusionistas) e Chico Science: A
Rapsódia Afrociberdélica (primeiro livro sobre o movimento mangue, lançado em outubro
de 2000 que analisa aspectos da cultura pernambucana).
Moisés é autor de alguns diálogos para filmes como Cassino
Americano (do diretor Marco Hanois) que recebeu menção honrosa no festival
internacional de vídeo da JVC em Tóquio.
Nelson Caldas no filme CASSINO AMERICANO
Houve muitos trabalhos de Moisés com marco Hanois, artista
plástico e cineasta, do círculo mais íntimo das amizades de Moisés. Um deles
foi Andy Warhol está morto, que virou motivo de polêmica no recife, na segunda
metade dos anos 80.
Parte do elenco de Andy Warhol está morto
É autor de Notícias Americanas, poema épico (livro) sobre o
11 de setembro e a devastação do Afeganistão, lançado em 2002, pela editora
Edificantes, de Teatro Ilusionista
Publicou também Chico
Science, Zeroquatro & Faces do Subúrbio
Além de colaborar com vários jornais e revistas o Brasil e
da Europa os ensaios de Moisés analisando diversos aspectos culturais estão
publicados em várias antologias.
Como ator ele participou, dentre outras peças, de: Muito
pelo Contrário (texto e direção João falcão), Suplício de Frei Caneca (de
Cláudio Aguiar, com direção de José Francisco Filho), Hamlet (no papel-título-
direção do argentino Alberto Gieco e de Paulo Falcão),
Romeu e Julieta, Viva o Cordão Encarnado (direção Luís
Mendonça), A Noite dos Assassinos (do cubano Jose Triana, com direção de
Augusta Ferraz). Na TV atuou em A Cartomante e no cinema em O Cangaceiro
(direção Aníbal Massaini).
Moisés Monteiro de Melo Neto (Moisés Neto), como jornalista, com Jece Valadão)chefe das volantes) e Renato Phaelante (representando a oligarquia pernambucana no sertão, em O CANGACEIRO, filme de 1998
capa do primeiro livro de Moisés Neto
Também assina a autoria do espetáculo Para um Amor no
Recife, que dirigido por Carlos Bartolomeu em 1999, recebeu 4 prêmios da
associação de produtores teatrais em Pernambuco.
Parte da equipe da peça PARA UM AMOR NO RECIFE
cartaz de peça de Moisés Monteiro de Melo Neto
cartaz de peça de Moisés Monteiro de Melo Neto
HAMLET, adaptada por Ricardo Valença Monteiro e Moisés Monteiro de Melo Neto, cena com Bruno Garcia , Moisés Neto e Carlos Mesquita. Teatro Valdemar de Oliveira, Recife, Pernambuco
Foto da peça O DIÁRIO SECRETO DE JANIS JOPLIN, VERDADES E MENTIRAS, autoria e direção de Moisés Monteiro de Melo Neto
foto do musical de Moisés Monteiro de Melo Neto, QUINCAS BORBA (inspirado no romance de Machado de Assis)
Moisés Monteiro de Melo Neto é co-autor dos musicais A Ilha do Tesouro (2002)
Moisés Monteiro de Melo Neto é autor do musical
DRACULIN E O CIRCO NO ESPAÇO
Peça de Moisés Neto, musical infantil DRACULIN E O CIRCO NO ESPAÇO
Sonho de Primavera
(que dirigiu ao lado de Ulisses Dornelas; que teve estreia em 2004 e ficou sete
anos em cartaz), Guilherme Arantes aplaudiu o musical de Moisés Neto: SONHO
DE PRIMAVERA
Várias dos seus espetáculos foram premiados pela APACEPE.
Adaptou para o projeto escola parte da obra de Machado de Assis. Em 2006 foi
assistente de direção do filme Incenso baseado em poemas de Ascenso Ferreira,
vencedor do concurso Ary Severo/ Firmo Neto (Prefeitura Cidade do Recife/
Governo do Estado de Pernambuco).
Vencedor do Prêmio Klaus Vianna, concedido pela FUNARTE, Moisés Monteiro de Melo Neto é autor, responsável pelo roteiro e direção do espetáculo Recife- Paralelo 8, montado pela Companhia
DANTE em 2007.
Moisés Monteiro de Melo Neto é autor do texto da peça Anjos de Fogo e Gelo, a vida
atormentada de Arthur Rimbaud, que dirigido por José Francisco Filho teve
grande repercussão em Recife no ano de 2008, recebendo prêmios da APACEPE.
Participou em 2009 da Curadoria da exposição permanente da
Faculdade de Direito
do Recife (UFPE) sobre Ruy Barbosa e Castro Alves.
2010 foi o ano do lançamento
de Anticânone, literatura em Pernambuco a partir do século XX, e em dezembro do
mesmo ano mais um texto de Moisés foi levado à cena, o musical O Circo do
Futuro, com direção de Carlos Bartolomeu, um sucesso que já dura uma ano num
grande teatro do Recife.
O professor Moisés Monteiro de Melo Neto é autor, em 2011, lançou o livro Pequena História da Literatura
Brasileira.
Atualmente
Moisés Monteiro de Melo Neto é professor da UNEAL.
O site
www.moisesneto.com.br parou de ser alimentado em 2009, mas ainda é bem visitado e contém artigos e peças
escritas por Moisés e exibe a trajetória do seu grupo,a Ilusionistas Corporação
Artística- que com vinte e cinco anos de atividades tem no seu currículo, além
de produções teatrais e publicação de livros, a promoção de oficinas, cursos,
exposições(como o Universo de Antunes Filho, trazendo duas vezes ao Recife este
diretor de teatro internacionalmente reconhecido.
Moisés Neto e Antunes Filho
Neste evento Moisés proferiu a palestra “O poética de Nelson
Rodrigues em A falecida na montagem 2009 de Antunes Filho” à convite do curador
paulista Sebastião Milaré). O mesmo Antunes Filho convidou-o em setembro de
2012 para fazer a apresentação da sua encenação de Toda Nudez será Castigada,
pelo CPT/ Sesc SP. Também em 2012, ele lançou seu livro POEMAS DE MOISÉS
MONTEIRO DE MELO NETO PUBLICADOS EM JORNAL, no salão nobre do Teatro de Santa
Isabel, com participação da atriz Sônia Bierbard interpretando alguns dos
poemas da edição, em 9 de dezembro de 2012.
SOBRE SEU TRABALHO COMO PROFESSOR, MOISÉS DECLARA:
A Escola é um sonho feito de amor, luta e fé. Um professor é
antes de tudo um guerreiro que acredita num futuro melhor. Seus louros são as
glórias dos alunos. Aqui estamos diante do mistério maior: a criação do
ser e estar no mundo. Estaríamos todos à procura de um bom professor? Um bom
discípulo? Nos Colégios ou nas faculdades em que ensino quero que toda esta
aprendizagem feita entre estas paredes se transforme em trabalho, festa e pão.
Assim, é com enorme satisfação que vejo mais uma turma lançar-se ao mundo.
Estes estudantes representam também o meu pensamento, quero sempre,
apaixonadamente aprimorar seus conhecimentos enquanto seres conscientes do seu
papel de pensadores e cidadãos, profissionais, que eles serão, que devem
combater por liberdade e justiça social com as armas do estudo: as únicas que
possuíamos e dispúnhamos. Minha moeda é um mínimo de coerência com as ideias e
ideais que cultivo, pois quero um mundo menos alienado. É um prazer tê-los
comigo; faço o melhor que posso para que suas vidas sejam profícuas e
vantajosas para este país que cresce e fortalece-se com o esforço
conjunto. O magistério é também a minha vida, minha razão de Ser. Desejo a
todos o sucesso que cabe a quem batalha e defende a Sabedoria Eterna. Uma prece
àqueles que fazem do estudo uma casa querida, porque os professores doam ao
mundo seu suor, lágrimas e risos de felicidade.
Sobre suas viagens pelo Brasil e ao redor do mundo: ele sempre procura conhecer o teatro e a
literatura viva de cada lugar que visita, foi assim na temporada de um mês e
meio no Egito
Moisés Monteiro de Melo Neto em Saqara, Egito
Moisés Monteiro de Melo Neto fala um pouco sobre sua TESE DE
DOUTORADO: “Alguns nomes são recorrentes na obra de Jomard Muniz de Britto: os
irmãos Campos e Pignatari, por exemplo, admiradores de Caetano e incentivadores
da Tropicália, que retomaram a linha evolutiva do baiano e deram organicidade e
fortaleceram seus julgamentos de criação, nisso está uma intersecção com Jomard
que, dentre vários vieses ataca nacionalismos passadistas, nacionaloides do
tipo macumba para turistas oswaldiana.
Quanto ao mencionado movimento liderado por Caetano e Gil, Luís Carlos Barreto
deu nome à canção Tropicália, por causa de uma instalação do carioca Hélio
Oiticica e logo a seguir Nelson Motta escreveu um texto no qual batizou o
movimento que surgia foi aí que Caetano resignou-se ao nome Tropicália, por
falta de opções, Tropicalismo lhe soava gasto por causa de Gilberto Freyre. A
Tropicália enquanto miscelânia de informações que vão de Louis Malle, pelo
filme Maria, com Brigitte Bardot, passando por Garota de Ipanema (em tupi: água
ruim), identificações com Terra em Transe, com toda a esperteza e fúria da
estética de Glauber; Jomard une-se ao grupo em 1968 e instala-se nos limites do
Tropicalismo (diferir da tropicologia freyriana). Longe da esquerda festiva,
tal vanguarda livra-se de possíveis angústias da influência em intensa
radicalidade, como no espírito tropicalista. A poesia de Jomarde é de cunho
jamesjoyciano, fundo verbivocovisual com versos em palavras-montagens, em
translíngua. De João Cabral, outra das referências na poética de Jomard, vem o
olhar lúcido, o nível de argumentação, defesa crítica, determinação inabalável.
Do noigandres do Concretismo às perguntas sobre a significação (em louca
tenacidade) nos poemas-manifestos jomardianos contra os mantenedores do
subdesenvolvimento na geleia geral (como na letra de Torquato Neto) brasileira
que a mídia anuncia. Surge o texto como a quebra dos resguardos, como reflexo
de ruidosas performances, escrita paródica-carnavalesca de aspecto
inventivo-construtivista (de combatividade) buscando a imparcialidade, a expor
as entranhas do Brasil em radicalidade antilírica, como num filme de Godard,
ver a abertura de Pierrot le fou, numa
poética cheia de lugares incomuns, poesia enquanto palavra-impacto, composição
(des)construtora de efeitos, linguagem organizada de maneira meticulosa em meio
ao caos criativo vertiginoso numa época em que os ouvidos têm paredes, num
mundo que se mostra mais intolerante do que nos libertários anos nos quais JMB
iniciou sua produção poética. Augusto de Campos já disse que a poesia é uma
família de náufragos nadando no espaço e no tempo. Busco nesta minha explanação
a trans-historicidade contra a banalização do passado no texto de JMB, onde
diluição e invenção, qualidade de percepção do mundo buscam, talvez, expressar
o indizível, apontar que a captação do fenômeno qualitativo e sensível, longe
do sentimentalismo, em protesto contra a vulgarização da vida na era da
disparada da tecnologia e mudança rápida de valores morais. Seu deboche de
cunho antropológico e pós-utópico cubo-futurista aborda também o erótico na
política em expressividade não linear sendo por isso rejeitado tanto pela
esquerda quanto pela direita, mas isto não o impede de continuar com seus
atentados (panfletos que ele distribui atentando inclusive contra o
panfletarismo, em pleno século XXI). No seu texto para o filme palhaço degolado
temos algo próximo ao construtivismo indigesto e antropófago. Seus textos
parecem fora de controle numa escrita mais intuitiva do que coerente, incitavam
à demolição, contra o acanhamento e inclui os erros como contribuições. Algo nos
textos jomardianos parece clandestino, andrógino, enfim: pluralidade de
estilos, desmantelamento de cercas entre as classes sociais, os gêneros; mas
Jomard Muniz de Britto não é um piadista nem um vanguardista datado. É poeta
que usa o tratamento de choque em ritual canibalista na movência do Brasil, em
selvagem psicanálise a riscar o nome do Pai, em audacioso gesto literário. Não
em poesia límpida, mas em mistura de referências, estilo novo, inaugural, a rir
das desesperanças, dos comandantes e dos alienados. Poesia que tenta desalienar
corações e mentes em meio às tentativas vãs de unicidade e cinismo. Suas
discussões sobre o gozo imediato, sua recusa às migalhas lançadas pelo poder,
sua atração pelos marginalizados, tudo isto, como uma performance exerceu sobre
mim simultaneamente atração e repulsa. Venceu a primeira”.
SALOMÃO FAZ Perguntas,
MOISÉS responde:
Moisés
Monteiro de Melo Neto, professor, escritor, teatrólogo, pesquisador, diretor,
ator... enfim. São títulos que ao longo da vida foram sendo conquistados, mas
todos eles devidos a somente uma característica indiscutível na personalidade
deste artista: paixão. Esta que moveu e dirigiu seus mais variados feitos
durante sua caminhada até hoje, e que será sempre o motor de suas obras. Quem lhe conhece de longas datas deve
saber quando seu primeiro poema foi publicado em jornal, no ano de
1980(LOBOS...), você atuou em uma peça infantil e numa adulta (Suplício de Frei
Caneca, na Igreja do Carmo, em Olinda, dirigido por José Francisco Filho,
professor da UFPE, no mesmo ano. Mas quem vai mais a fundo entende que sua
paixão não começou de uma epifania adolescente, mas sabe que desde de criança
demonstra seus dons e vontades através de simples atos. Hoje conversaremos
sobre sua mais nova Teoria Literária, poesia instrumental, e sobre seu caminho
ao longo dos anos, suas obras e suas realizações...
Existe uma forte presença do movimento mangue na sua obra,
seu livro "A rapsódia afrociberdélica" e seu conto
"MANGUEBEATINIK" mostram muito de seu trabalho nesta perspectiva. De
onde surgiu esse interesse nesse movimento e qual a importância de Chico
Science para o Recife na sua opinião?
R- Conhecer Chico mudou minha vida radicalmente. Nunca vi
nada igual desde os beatniks e o rock. Gosto muito das ideias de Renato Lins,
de Fred Zeroquatro.
Moisés Monteiro de Melo Neto e Renato Lins, um dos mentores do Movimento Mangue (Manguebeat)
Moisés Neto e Renato Lins Renato L
Moisés Neto, Bárbara Heliodora, Fernando Oliveira e Rodrigo Dourado
Moisés Monteiro de Melo Neto e Sábato Magaldi
Entrevistado por Salomão Fonseca, Moisés Monteiro de Melo Neto (Moisés Neto) declara:
Salomão Fonseca e Moisés Monteiro de Melo Neto (Moisés Neto)
Quando você começou a escrever seus próprios poemas e por
quê?
Escrevi porque queria transcender. Busco a expressão do
etéreo e uma visão da carne humana em movimento
E as publicações em jornais, como surgiram?
A primeira foi Manoel Constantino que levou para o Jornal do
Commercio. Fiquei feliz e fui adiante
Existe algum tema específico que você goste de trabalhar em
seus poemas?
Sim: a transgressão
O que o faz tão apaixonado pela cidade do Recife ao ponto de
dedicar tantas de suas obras à ela?
Recife é meu vício e meu laboratório: amoródio por minha
cidade, nasci na conde da boa vista, pode? Num palacete da belle epoque
Você considera sua obra universal? Por quê?
Sim: trato da essência do ser em qualquer lugar do mundo,
mas tenho características locais, também
Existe algum público específico que você queira atingir com
seus escritos? Por quê?
Sim: os que respeitam o próximo como a si mesmo ou melhor
ainda; porque acredito na revolução em gênero, número e grau
Algumas das suas peças teatrais são para o público
infanto-juvenil. É de sua preferência trabalhar algo voltado para o público
infantil? Você acredita que através de peças como essas podemos moldar e
transformar a mente de uma criança? Esse é um de seus objetivos?
Criança para mim é adulto em miniatura, está aprendendo amor
e malícia, opto pelo primeiro; criança gosta de “viajar”, eu curto isso e
incentivo-as neste sentido; quero um mundo onde todos lembre-se das primeiras
emoções e reações, para sermos menos lógico e mais intuitivos, respeitando as
diferenças e amando muito
Na sua peça "Anjos de fogo e gelo" você trabalha o
lado mais carnal e, digamos, perturbador de Arthur Rimbaud. É perturbador e
genial ao mesmo tempo. A obra deste poeta e do Paul Verlaine, são influências
em seus escritos? Em que aspectos?
Rimbaud é um dos meus mestres, quem me apresentou sua obra
foi um cantor de rock. È uma peça sobre amor, também homossexual, é amoródio,
do tipo que eu exploro, é impossível separar estes dois sentimentos em minha
obra, sou beatnik, mangue, admiro o armorial, mas não tem jeito: meu mar é
ímpar
Quais são suas maiores inspirações para o teatro e para
poesia?
Machado, Clarice, Poe, Joplin, Amy, Lucila Nogueira, JMB,
Shakespeare, Carrero e tantos que fico zonzo só de pensar, Lennon, Led
Zeppelin... Renato Russo...
Sabemos que a literatura abrange vários temas e aspectos,
inclusive o da música. Chico Science o inspirou para escrever um livro, conto e
outras obras variadas. No cenário musical, o que mais chama sua atenção ao
ponto de querer dedicar sua literatura a ela?
Transcendência e revolução
Além de seus livros de poesias, você escreveu dois livros
sobre literatura, sendo um dedicado a literatura pernambucana e o outro a
brasileira. O que você acha que poderia mudar no cenário de sala de aula,
especificando a matéria de literatura?
Quem foi meu aluno passou por uma experiência: ver-me criar
e recriar um universo ( o meu e dos queridos autores do cânone), é uma viagem
sacudida; aviso logo: apertem os cintos, faço a cabeça do pessoal abrir-se, há
que se catar fragmentos também, depois... pago e recebo por isso, é minha vida:
escola e escrita, sem isso? NADA
O que é poesia instrumental?
É poesia com o essencial, para mudar, utilizar como
ferramenta para analisar tudo mais na vida, poesia-óculos, lentes (até
coloridas ou transparentes)
Explique melhor: poesia como instrumento de quê? Mudança “social?
Sim, por um mundo mais lírico e menos convencional
Como você enxerga o Moises do primeiro poema, para este
Moises de agora.
É o mesmo cara. Tem a ver com o mito forjado por autores
como Bram Stoker... (risos e sisos)
Como você mescla a técnica e o sentimento na sua obra?
Não gosto da técnica. Faço por obrigação na maior parte das
vezes... imagine que tenho uma cinco mil páginas com meus escritos, tantos
livros, peças, tudo.... só minha tese de doutorado tinha 900 páginas, minha
orientadora disse: quero só um terço disso... ficou em cerca de 400... também
só sentimento não é o caso... entende? Não? Oh!
O Recife lhe inspira de que forma?
É cidade anfíbia, libidinosa, safada, protetora e ... cruel
naturalmente, gosto da luz... trevas tem poucas... o inferno somos nós, sou
existencialista freudiano
Como você homenageou Nelson Rodrigues e Mercedez Sousa , tem
algum projeto para homenagear Luiz Gonzaga, por exemplo?
Não tenho a ver com o Luiz, curto muito, mas sou de outro
viés, vi o filme e a peça (João Falcão, já foi meu diretor, sei que ele gosta
de mangar, o Santa Isabel curtiu, o cinema chorou, eu também?), não tenho
saudade do luar do sertão, eu sou mais Jung e a sincronicidade, conhece? Recife
é como o mundo todo, no mundo um grande amor perdi...
A magia do carnaval te inspirou em alguns poemas como:
Milagre de carnaval e Carnaval , o lúdico da festa, o tudo pode, revela um
pouco do seu lado romântico? Fale um pouco sobre o romantismo na sua obra.
Sou romântico incurável, um apaixonado que vive em êxtase 24
h por dia, isso está em tudo que faço, nos meus estudos também. Carnaval é só a
ponta do meu iceberg
Quais os caminhos que um escritor iniciante deve percorrer
em Pernambuco? O que você pensa desse universo tecnológico ( Internet, por
exemplo)?
A cibernética vai acabar com muita coisa no homem, mas para
que preocupar-se com isso? Meu medo é que a vida vire videogame...
Essa nova linguagem literária como os blogs, as redes
sociais, os livros digitais trazem algum risco para a literatura tradicional
(livros impressos)? Como você vê este tipo de literatura?
Qualquer maneira de amor vale a pena. Mas sou fetichista
também, curta meter meus dedos entre as... páginas... dos meus livros... é uma
espécie de gozo em extinção? Ui!
Como a literatura pode contribuir para inclusão social. De
que modo você enxerga isso?Explique:
Todos são autores, até os analfabetos. Inclusão é vontade de
se revelar, expor-se, mostrar-se, lutar, arte tem que ser revolucionária, mas o
pessoal só quer o lado prostituo da arte, o lado de professora é tratado como
se olhava para as vitalinas no século XIX!
MONSTRO ILUSIONISTA OUQUEM TEM MEDO DE MOISÉS MONTEIRO DE
MELO NETO?
Por HENRIQUE AMARAL:
Capítulo 1
Moisés NA TV
Fotos do especial A CARTOMANTE, direção de Luiz Maranhão Filho
Moisés adora William Shakespeare. Sobre o bardo inglês ele nos declarou:
"
Tenho dez anos, acabei de cruzar a ponte de ferro (feita com trilhos de trem?) que liga a rua da Imperatriz à rua Nova, Recife. É uma tarde chuvosa e eu venho do dentista, como recompensa me levaram à minha sorveteria favorita: Confiança (que também era uma fábrica de biscoitos, na rua da Imperatriz); ao dobrar à esquerda em direção à Praça Joaquim Nabuco, onde tomaríamos o ônibus para Boa Viagem, onde eu morava, paramos numa banca de revista; enquanto a pessoa que estava comigo escolhia uma revista eu fixei meu olhar sobre um livro com capa verde limão, havia seis letras douradas que me chamaram a atenção. Abri-o.
Moisés Monteiro de Melo Neto, como Hamlet
"Li a palavra ESPECTRO, perguntei o que significava e me disseram: fantasma. Pedi o livro e a pessoa que estava comigo comprou para mim. Começou assim o meu envolvimento com Shakespeare. A peça era HAMLET, que eu interpretaria durante dois anos, algum tempo depois, dirigido por Paulo Falcão e pelo argentino Alberto Gieco. Tragédia maior, em vários sentidos. Sonho de uma noite de verão foi outra peça que acompanhei uma montagem luxuosa bem de perto; dirigida por Antônio Cadengue, tendo Susana Costa como Titânia, Buarque de Aquino como Oberon e Augusta Ferraz como Puck (na época fazíamos parte do grupo Ilusionistas). Também interpretei Mercúcio, personagem de Romeu e Julieta (numa adaptação de Rubem Rocha Filho, dirigida por José Francisco Filho). Aos quinze anos ganhei a obra completa de Shakespeare, presente de um primo mais velho, da nossa família, os Belli. Com prazer devorei peça por peça. Depois desta maratona eu nunca mais fui o mesmo. Faz 400 anos que William Shakespeare morreu, mas continua a perseguir com carinho todos os atores, diretores e muitos autores. Nascido na bucólica Strattford-upon-Avon, em 1564, antes de expressar-se através da criação literária, foi ator (um crítico o chamou de “corvo arrogante”, ao tratar de uma interpretação sua no palco; lembro aqui do conselho de Hamlet aos atores: “que a discrição te sirva de guia; acomoda o gesto à palavra e a palavra ao gesto, tendo sempre em mira não ultrapassar a modéstia da natureza, porque o exagero é contrário aos propósitos da representação, cuja finalidade sempre foi, e continuará sendo, como que apresentar o espelho à natureza, mostrar à virtude suas próprias feições, à ignomínia sua imagem e ao corpo e idade do tempo a impressão de sua forma”) e a seguir o mais influente dramaturgo do mundo, cujas 38 peças são exemplo quase ímpar da capacidade humana na escrita. Seu pai, John Shakespeare, afirma-se que era um comerciante chegou a prefeito da sua cidade natal. Sua mãe, Mary Arden, vem de uma família de proprietários de terras. Teve sete irmãos. Criou-se católico, mas só em um soneto ou dois ele ousa defender, ou pelo menos citar, os companheiro sufocados pela rigidez da Igreja Anglicana. Casou-se com Anne Hathaway e geraram: Susanna e dois filhos gêmeos, um chamava-se Hamnet (quase Hamlet, teve má sorte, morreu aos 11, longe do pai que estava em Londres). Parece, especulações novamente, que o jovem artista, fugiu com uma trupe de teatro (muitos deles visitavam a cidade de Shakespeare); Quando em 1592, fecharam os teatros, por causa da peste, ele se dedicou aos poemas líricos Vênus e Adônis e O Rapto de Lucrécia. Logo depois construiu o Globe Theatre (sucesso por 15 anos, mas em 1613, na peça Henrique VIII, pegou fogo e virou cinzas; foi reconstruído, mas depois foi demolido em 1644. Em 1997, o projeto do americano Sam Wanamaker (morreu em 1993), de reconstrução dessa famosa casa de espetáculos, perto do lugar onde ficava o primeiro Globe, trouxe de volta um pouco do antigo fascínio deste Teatro. Além de ator e escritor, ele foi sócio da Lord Chamberlain´s Men (ou King´s Men, o que já dá o tom da sua gratidão aos nobres que o apoiavam, não é?).
Moisés Monteiro de Melo Neto como Ricardo III, de Shakespeare
Sobre sua vida sabemos pouco, embora haja uma enxurrada de livros sobre sua produção e até a lenda sobre a autoria de parte dos seus textos. Estudou até os 7, retornou até os 11. Conheceu , ainda adolescente o teatro e se apaixonou, foi para Londres e cavou seu caminho quase até o topo. Christopher Marlowe (teria sido ele, que forjara a própria morte e escrevia tudo de Shakespeare?) estava no seu caminho; Thomas Kyd e outros protegidos da rainha. Mas ele chegou até Elizabeth; o resto se mistura com lenda, o que é ótimo, para quem curte a produção deste bardo. Suas comédias, dramas históricos, tragédias (Macbeth, Rei Lear, Otelo) são jóias de valor incalculável. Da sua forte herança latina brotaram as tragicomédias ou romances. Teve a glória em vida, mas acho que nem no sonho mais louco imaginou até aonde iriam as projeções da sua sombra e da sua luz. O Mercador de Veneza, A Comédia dos Erros, Os dois fidalgos de Verona, Muito barulho por nada, Noite de reis, Medida por medida, Conto do Inverno, Cimbelino, Megera Domada, A Tempestade, Tito Andrônico, Romeu e Julieta, Julio César, Antônio e Cleópatra, Coriolano, Timon de Atenas, Henrique IV, Ricardo III, Henrique V e outras peças como Henrique VIII, fascinam com sua genialidade enigmática sublime; 400 anos depois do desaparecimento físico do misterioso bardo inglês, que tratou tão apropriadamente temas tão fortes, com um colorido (forma e conteúdo) tão cheio de som, riso, siso e fúria da alma humana, ainda dá muito o que falar. Uma vez, em Londres, eu parei diante da estátua dele no Museu de cera de Madame Tussaud e me perguntei: qual seria a figura exata de Shakespeare? Há tantas representações diferentes dele. Voltei no tempo, ao dia em que ganhei aquele Hamlet, e o li numa noite cheia de chuva, relâmpagos, trovões, ventos uivantes, próximo ao mar de Boa Viagem.
Na tradução de Houaiss para o “Ulisses”, de Joyce, em certo
momento, se fala do bebê, que deve ser mesmo uma graça, rindo com aqueles
olhinhos alegres e aí a Cissy cutuca a barriga dele e o bebê devolve o contato
sobre um babadouro novinho.
Fico imaginando como deve ter sido o bebê Moisés, mas como
dizia Cortázar em “As Armas Secretas”, não sabemos nada verdadeiramente até que
amemos. E eu já havia amado.
Achei legal o jeitão de ser de Moisés Monteiro de Melo Neto
desde que parei um tempo na praça do Carmo, em Olinda, com Verônica Monteiro
Correia e João Álvaro Lopes Braga, para conversar com ele, antes que subisse
para a igreja onde se encenava “O Suplício de Frei Caneca”, em fins de 1979 e
início do ano seguinte.
Verônica ou Verinha, que está nas mãos de Deus, pertencia ao
elenco, eu a
adorava e em consequência disso passava a adorar todos os
seus amigos. A peça era dirigida por José Francisco Filho, no auge de sua
carreira.
Eu assisti à peça e gostei de tudo e de todos. Não havia
muita maldade naquela época, pelo menos na minha cabeça.
Em 2000 escrevi uma peça biografando e ficcionando a vida do
Senador José
Ermírio de Moraes, encenada por Rivaldo Casado e Marquinhos
Varella, com mais de 500 estudantes no elenco, no dia 18 de novembro de 2000,
às 19 horas, no Teatro Guararapes, para o Núcleo Educacional Senador José
Ermírio de Moraes, o NESJEM.
Mas o pai de Antônio Ermírio de Moraes me foi dado a
conhecer através de muito material de pesquisa cedido por várias fontes. Que eu
nunca o conheci e que faleceu muitos anos antes de 2000.
É tão diferente de biografar alguém que convive com você,
que atua com você.
Talvez porque Moisés Monteiro de Melo Neto já tenha, ou
seja: um referencial do tipo lutou, batalhou, deu certo, chegou lá. Abandonou
os estudos para fazer teatro e depois do sucesso voltou à universidade, se
formou, e ensina literatura há anos. O que pode ser melhor para um escritor
como Moisés Monteiro de Melo Neto do que ensinar literatura?
Com três livros publicados, os dois últimos de grande
impacto, sobre Science e o movimento mangue e o longo poema em cima do 11 de setembro,
Moisés encenou ou teve seus textos encenados entre 1985 e 2004 no teatro
pernambucano.
E eu tive a sorte de ser colega de trabalho, de grupo,
parceiro em um texto teatral, ator em peças dele, ou ele atuou em peças minhas.
Dessa convivência entre 1979/80 a 2004, sempre tive curiosidade em saber mais
sobre a evolução de Moisés, a sua vida, a criança que foi, como ele mesmo me
disse, uma espécie de Will Robinson, o personagem de Billy (hoje Bill) Mummy,
no seriado “Perdidos no Espaço” (Lost in Space, 1965/1968). E o que é isso?
Curioso, quieto, observador, um pré-adolescente meio gênio, curioso, xeretando
as coisas.
Claro que devíamos ter a cópia em DVD da Tia Linda da TV
Jornal apresentando o garotinho Moisés cantando e mostrando seus desenhos para
as câmeras. Fim dos anos 60 ou início dos 70? Por aí.
As imagens vão me chegando com a ajuda enfim do próprio
biografado, imagens de um filme que parece ter sido realizado em preto e
branco, mas como diz meu pai, todo o passado dele (dele, meu pai, nascido em
1928), foi a cores. Mas colorido mesmo eu não sei, imagino talvez num tom
próximo às fotos que Ana Farache torna coloridas através da aquarela.
Mesmo que eu tenha visto Oscarito em preto e branco nos
musicais da Cinédia ou nas comédias da Atlântida, foi a poderosa, e velha,
Hollywood que me tirou a dúvida. O passado era colorido. Então somente o
passado do Brasil era em preto e branco?
E o do Nordeste? E as imagens das telenovelas, teleteatros e
programas das
emissoras do Recife que infelizmente não possuímos mais?
Tudo preto e branco?
Um Nordeste apagado?
Nem tanto. O Sul adora o Nordeste e o nordestino também está
lá, a cores, como em “A Compadecida”, de George Jonas, baseado no clássico de
Ariano, de 1969. Os brasileiros mudam muito de região. É claro que o Nordeste
não possui uma rede nacional, mas estamos no elenco, nos temas, nos técnicos,
desde o início da TV no Brasil.
E o maravilhoso Ciclo do Recife? Apresentado no Teatro do
Parque, restaurado?
Acredito, que pelo incentivo maior de Fernando Spencer. Eu
corri da minha sala, no departamento de jornalismo da Rádio Jornal direto para
o microfone de Jaime Sabino anunciar ao ouvinte a inacreditável mostra.
Tudo preto e branco no Nordeste? Não, tudo é preto, branco,
pardo, mulato, vermelho sangue de batom, cordão encarnado, muito pelo
contrário, que é o título do primeiro sucesso de João Falcão no teatro, como
autor, e no qual Moisés atuou entre 1981/1982.
Lógico, todo o colorido dos maracatus, por exemplo, entre
tantas manifestações culturais que o Nordeste e Pernambuco, como representante
forte da região, tem.
Então o passado de Moisés Monteiro de Melo Neto foi a cores.
E tudo muito bem vivido. Ele foi
feliz. Ele é feliz. Discretamente feliz. Nunca o vi em
gargalhadas passando da conta ou sorrisos forçados para agradar a ninguém.
A Trupe do Barulho montou CLEÓPATRA, de Moisés Monteiro de Melo Neto
Adaptando Machado de Assis, William Shakespeare, filmes com
Bette Davis,
recriando o mito de Janis Joplin, levando aos palcos o
clássico de Robert Louis Stevenson, “A Ilha do Tesouro”, em forma de musical
(músicas de Ricardo Valença), atuando como ator, diretor, produtor, escritor,
professor, analisando obras literárias, peças, filmes, participando do cinema e
vídeo local e nacional (um repórter em “O Cangaceiro” em cena com o “Boca de
Ouro” de Nélson Rodrigues na visão de Nélson Pereira dos Santos, ou seja, Jece
Valadão), escrevendo crônicas para o Jornal do Commercio, avaliando a Broadway,
correndo o mundo, passeando por locais um dia frequentados por Elizabeth Taylor
e Bette Davis (o Egito, por exemplo), com um inglês fluente, decepcionando-se
com a Baker Street, mil vezes citada por
Sir Arthur Conan Doyle nas histórias de Sherlock Holmes, conhecendo Ionesco e
tantas outras personalidades que acredito nunca imaginou que conheceria...e aí,
leitor?
É pouco? Manter uma coerência, estar em cena sempre, ano
após ano, sempre com a arte como meio de vida, tendo a literatura como base?
Não é fácil, mas não é fácil mesmo.
Existem aqueles que criam uma obra e em seguida se
aposentam. Qualquer tipo de obra. Outros são bissextos. E outros fazem um
trabalho contínuo, do momento em que iniciam até o momento de sua morte.
Esse é o caso de Moisés. Ele não para nunca. Cria e recria.
Dono de um site na Internet, ele próprio, escancara a sua vida artística e
literária, chega a apresentar poemas dos seus 15 anos de idade. E são poemas
fortes, bonitos, simples.
Nada como a simplicidade, é impressionante, mas ela, a
linguagem simples, sem tantos rebuscamentos, é responsável pelas grandes obras,
talvez pelas maiores obras da literatura.
Um Charles Dickens, por exemplo, ou um Emile Zola? A
linguagem é direta, clara, não engana o leitor. Como as falas dos personagens
teatrais de Moisés, vão direto ao assunto e quando mentem, mostram ao
espectador que estão mentindo. Ou não.
E mergulhando nas primeiras cenas de sua vida, Moisés
Monteiro de Melo Neto me conta:
“Uma das primeiras imagens da minha infância é o mar. Eu
tinha problemas com respiração e os médicos aconselharam levar-me todos os dias
à praia. Legal, não? Quando eu tinha poucos meses de idade, minha mãe, que
tinha 16 anos quando eu nasci, não me deu água suficiente e eu tive
desidratação. Esse conjunto de coisas poderia associar-se à travessia de um mar
vermelho que apenas se iniciava enquanto eu engatinhava. Nasci no mês de março,
outono, chovia muito e minhas fraldas não secavam direito. Água, sempre água.
Aos sete anos eu ia me afogando. Aos oito, vi a casa onde eu passava férias
inundar-se com a enchente de um rio.”
Mas onde está Moisés aqui? Em que área do Recife? Nossa área
metropolitana é tão grande, um dia chegaremos a Nova Iorque. Por falar em New York, Moisés passou temporada por lá, nos anos 1990... (foto abaixo)
E ele me responde:
“Eu morei em Campo Grande e a praia à qual me levavam era
Olinda, que naquela época, disseram-me, era bem menos poluída. Aos cinco anos
fui morar em Boa Viagem, levado por uma tia que havia se casado e tinha medo de
morar num lugar deserto como eram as imediações da Escola Americana do Recife.
Logo mamãe mudou-se para lá também. Era um paraíso para mim. Campinas enormes.
Muitas árvores, flores, animais. Parecia cidade do interior. O ano era 1966. Eu
tinha um casarão só para mim. À tardinha passava ao longe o trem que ia para o
Cabo. O nascer e o pôr-do-sol eram magníficos.
Minha primeira professora casou-se com meu tio. Ela era
muito rica, mas, só quando se casasse colocaria a mão na grana. Casou-se e eu
também passei um tempo na casa dela.
Meu apelido era “bandoleiro”, pois desde pequeno eu tinha
pelo menos três endereços.
Vivia sempre com mochilas cheias de coisas para cima e para
baixo, como um pequeno cigano.”
Capítulo 2
DE REPENTE NO ÚLTIMO VERÃO
Frankenstein de Moisés Neto
Moisés Neto e Andrea Rezende em PRAZERES DA REVOLUÇÃO
PRAZERES DA REVOLUÇÃO, nos jornais da época
Moisés Neto sofreu preconceito por parte da elite por tratar temas-tabu na sociedade recifense dos anos 1980
Moisés e eu estivemos ontem no palco do Teatro do Parque,
representados por
Maninho Casado (antes, Rivaldo Casado) e Emmanuel David
d’Lúcard, em “Com a Víbora no Seio”, no show-tributo a Gilberto Aureliano (24
de julho de 2004) e como não compareci pude mergulhar mais um pouco sobre sua
obra e vida.
A descrição de sua infância em primeira pessoa me recorda
muito o monólogo de Catherine Holly, em “Suddenly Last Summer”, de Tennessee
Williams, tem um pouco de dor, de descoberta, de trauma. Não atinge o mesmo
ápice dramático da peça porque Moisés superou, acho isso evidente, os medos de
sua infância.
Leia, é ele mesmo contando:
“Havia minhas crises de respiração e as madrugadas infernais
à base de remédios fortíssimos. Próximos à minha casa havia acampamentos, tanto
de ciganos quando de hippies no final dos anos 60. Boa Viagem, a praia, era
encantadora. Havia na avenida beira-mar, próximo ao Hotel Boa Viagem, o
Castelinho, e depois estava uma casa que parecia um barco: a Casa Navio,
lugares que a gente frequentava. Eu fui frequentador durante muitos anos do
calçadão de Boa Viagem. Lá nossa turma se encontrava. E também na esquina das
ruas Almirante Tamandaré e Padre Cabral, em Setúbal. Várias tardes eu passava
na Escola Americana do Recife e nos fins de semana o vigia nos deixava usufruir
várias coisas naquela instituição. Era tão diferente das escolas do Recife, eu
ficava fascinado. Eu me lembro da época da Jovem Guarda. Mamãe usando aquelas
perucas e as mini-saias. Lá em casa todas as mulheres tinham uma caixa de jóias
verdadeiras. Lembro que um dia fomos buscar titia no aeroporto e no dia
anterior tínhamos assistido no cinema ao `Auto da Compadecida´, com Regina
Duarte (fazendo o papel da própria) e quem desce do avião com minha tia? Ela
mesma: a Regina.”
É interessante observar aqui como era realmente fascinante a
Casa Navio e como havia tranquilidade em Boa Viagem naquela época. Eu mesmo
fugi do Colégio Militar do Recife, em 1974, para passear com um colega de
classe que morava em frente à praia.
Boa Viagem ainda é uma maravilha para um belo passeio
noturno, enfiar os pés na água fria do mar, deixar que eles se sujem de areia e
só limpá-los em casa, depois que os pés, dentro do sapato sujo de areia,
estiverem bem relaxados pelo sal marinho. Ou talvez um banho de mar num dia
mais tranquilo que o fim de semana.
Se bem que o mesmo acontece com Gaibu, que se tornou
irreconhecível depois de alguns anos. Uma praia lotada de barraquinhas de
diversos tipos e gente, mas tanta gente, que você não relaxa como nas épocas
áureas da juventude surfista dos anos 60/70 e início dos 80.
Moisés em Porto de Galinhas (PE)
E é engraçado perceber que mesmo que o diretor George Jonas
tenha reduzido o título da peça de Ariano Suassuna, a criançada estava no
cinema vendo um auto que se tornou um clássico desde a sua estréia com Socorro
Raposo (a 1ª Compadecida) no teatro pernambucano.
E Suassuna rejuvenesceu no tratamento de alta sensibilidade
dado ao texto por Guel Arraes, quer na minissérie, quer no filme. E as mãos de
João e Adriana Falcão estavam presentes no roteiro.
E Moisés fala do cabelo da mãe. Nossa! Quem vê as fotos das
garotas na década de 60, arregala os olhos. Os penteados eram muito engraçados,
beirando o ridículo se vistos hoje em dia, altamente kitsch ou brega (veja Liz
Taylor em “Jogo de Paixões”, com Warren Beatty: os penteados desconcentram
você, ela que sempre foi tão linda, com aquele cabelo, não dá mesmo; o mesmo
não acontece com Leila Diniz em “Todas as Mulheres do Mundo”, talvez porque
Leila tenha preferido um penteado natural e não embarcou na onda fashion em
voga.
A mãe, a avó e a sobrinha de Moisés
Mas vamos avançar um pouco mais na trajetória de Moisés,
passando-lhe o microfone:
“Concluí o Fundamental 1 com a mesma professora que ensinara
a minha mãe. Dona Tereza Andrade. Ela era muito severa e no mês de Junho sempre
ensaiávamos várias danças como baião, cateretê, a quadrilha e outros ritmos que
ela mesma tocava ao piano.
Havia a dança do pau de fitas, a dos arcos e também o chula
e o vira (danças portuguesas), eram roupas caras e nós dançávamos no
internacional. Aí papai começou a abusar da bebida. Saiu da aeronáutica e as
coisas começaram a ficar meio estranhas. Nós nos desentendíamos e eu cada vez
mais me afastava deles. Eu gostava muito da minha irmã, Fátima Amaral,
começamos a estudar juntos e sofri muito com nossa separação.
Moisés e os irmãos (festa de São João, Clube Internacional,
Recife)
Aos onze anos, decidi morar com titia e com minha avó Diomar
de Belli. Fiquei em Boa Viagem e eles voltaram para Campo Grande. Meu irmão,
Mário Filho, formou-se em Medicina e foi o laureado da turma. Mas achou que tal
trabalho era mal remunerado no Brasil. Hoje tem um cargo melhor no governo e
não quer que diga a ninguém que ele é médico (os mestres ficaram chocados, ele
era o queridinho da UFPE), concluiu também na UFPE o curso de direito. Minha
irmã Fátima fez Letras e tem dois filhos: Leonardo (Direito) e Rafaela Amaral
(Publicidade).”
Os Bellis, bisavós, a avó e tia Therezinha (de MoisésNeto) ,
na ilha fluvial que tinham em João Pessoa
Mário, Fátima e Moisés Monteiro de Melo em festa de São João, no Clube internacional do recife, quando crianças
O Amaral da irmã de Moisés é de seu marido, a quem não
conheço, e não sei se é algum parente próximo. O meu Amaral vem de Minas, onde
meu pai nasceu.
Não é fácil para os professores observarem qual daqueles
alunos poderia um dia, quem sabe, fazer teatro, ou dança ou até mesmo canto,
desenho, literatura.
Uma das apresentações de Moisés, no Clube Internacional do
Recife, deu-se em 1970. Ele lembra bem por causa da Copa do Mundo. E em 1979,
estava com a trupe de “O Suplício de Frei Caneca”, de Cláudio Aguiar. São de
1976 os seus poemas dos 15 anos, publicados em sua página na Internet. E junto
à Tia Linda, além de cantar uma canção do repertório de Roberto Carlos, expôs
para a câmera uma série de desenhos seus.
Ou seja, uma coisa se liga à outra. A arte na infância,
adolescência, na juventude, na idade adulta, na maturidade.
É sempre bom, acredito, a folha de papel em branco, e lápis
de todas as cores para o desenho e um pretinho para as primeiras letras. Isso
na infância. E é o que as escolas fazem mesmo, lógico.
Como também o ensino da dança e do canto, sem que se force
demais a criança, ela pode estar mais interessada em esportes num primeiro
momento. E uma coisa não exclui a outra, é evidente. Que o diga Pelé, astro de
“Os Estranhos” (também com a Regina Duarte), novela de TV, que dizem ter sido
uma ficção científica, e em 72, de “A Marcha”, sobre a escravidão. Sem
mencionar seus trabalhos mais recentes.
E reparem que Moisés cita diversas danças e considera a
professora rígida. Sim, deve ter sido, mas com uma proposta interessantíssima
de arte-educação.
Moisés começa a abrir um pouco de sua intimidade ao falar de
sua família, seus pais, sua avó, seus irmãos e sobrinhos. São revelações
pessoais raras, não é comum vê-lo falar de sua família.
Aliás, em relação às pessoas que fazem teatro no Recife, parece
que existe essa retração. Ou existia.
Separar o mundo teatral pernambucano, que se misturou muito,
durante longo
tempo, com as mesas dos bares, com a bebedeira, as boates ou
qualquer outro tipo de casa noturna, da vida familiar, parece ter sido a saída
para se manter certa privacidade.
Principalmente pela mística da comemoração do fazer teatral,
geralmente um bom jantar e bebidinhas num bom restaurante – se a receita tiver
sido boa.
Mas isso é passado.
Os atores e técnicos da nova geração não estão nem aí para
fumar, beber, comemorar, fazem um espetáculo, pegam seu ônibus ou um táxi e vão
pras suas casas.
O que não ocorria nas décadas de 70/80, pelo menos. Todos
bebiam, fumavam, uns se drogavam, porque a bebida estimulava, liberava,
relaxava, e mil e uma idéias vinham desses encontros.
Mas a família de cada um, ah, essa ninguém comentava,
ninguém tava nem aí com isso. Claro que pelas costas se comentavam baboseiras,
fuchicos ingênuos ou perversos, mas a verdade é que a família dos artistas em
Pernambuco, durante muito tempo, não acompanhava a carreira de seus filhos
(as).
Dona Dinah de Oliveira (Primadona do TAP, Teatro de Amadores de Pernambuco) foi assistir algumas montagens de Moisés Monteiro de Melo Neto, Moisés Neto
Uma exceção, claro, é a do Teatro de Amadores de Pernambuco,
o TAP, cuja
formação familiar em sua própria estrutura, proporcionava
outro tipo de comportamento.
Posso estar enganado, mas talvez não. Comigo mesmo foi
assim. Teatro, em casa, só as longas horas de leitura dos textos (eu, sozinho),
um ou outro visitante eventual (uma vez na vida...).
Meu pai, que dizia que o teatro já era, por mais incrível
que pareça, mostrou-me um dia peças suas da época do bumba – uma de 1944! Antes
quando chegava alguém de teatro, ih, o povo sumia! Daí eu não convidava ninguém
pra ir lá em casa.
Mas é claro que eu posso estar exagerando, talvez seja
motivo para um outro
texto, uma outra análise, e que não vem ao caso aqui.
O que importa é desvendar um pouco do menino Moisés. Sem
querer me lembrei de João (Falcão): “Oh, meu Brasil menino/ menino Brasil/
menino...”
E lembrando dele, filmei “Muito pelo Contrário”, mas Moisés
tinha saído em setembro de 82, do elenco, sendo substituído pelo nosso
eternamente querido Marcus Vinicius. Foi em super-8, tentei de tudo pra colocar
banda sonora, colocar os letreiros, mas nada! Acabaram com o super-8 mesmo.
Consegui enfim o áudio do espetáculo (da temporada 1981) com
Augusta e tivemos uma bela exibição no Moreno Vídeo Bar. Depois desapareceram
com a fita cassete de La Ferraz e até hoje. O título do filme eu mudei, hoje em
dia se chama “Quer Tapioca com Manteiga, Freguesa?” e devo passá-lo para DVD,
não sei ainda. De qualquer forma, João Falcão tem uma cópia dele em VHS. E
conversei com Magdale Alves e Suzana Costa para darmos uma final nessa questão.
Talvez eu dê a elas o material filmado. Mas eu estou entrando em assuntos
correlatos.
Voltando a Moisés Monteiro de Melo Neto, eu o vi em “O
Bandido da Sétima Luz”, curta de Paulo
Caldas (na época, Paulo Maurício Caldas), lançado em 1987
(filmado no ano anterior), e também em “O Cangaceiro”, na versão de Aníbal
Massaini, de 1997, como um repórter, em cena com Jece Valadão.
Moisés em intervalo das gravações do filme O CANGACEIRO
Eu achei glorioso. Também tinha mais era que achar mesmo!
Logo eu que, quando tinha 11 anos, vi Rejane Medeiros sendo filmada na esquina
da minha casa.
Ou desde pequenininho via os filmes de Oscarito e Grande
Otelo, Ankito, Mazzaroppi e Ronald Golias, só pra citar alguns, exibidos na
antiga TV Tupi (saudades...).
Ele ali, cara a cara com o astro de “Os Cafajestes”, “O Boca
de Ouro”, “Mineirinho Vivo ou Morto”. E atuando de igual para igual. Pronto! Agora,
além de colega de trabalho e amigo de Moisés Monteiro de Melo Neto, virei seu
fã.
Dá um tempo!, diriam os cineastas/videastas que atuam mais
com o documentário.
Eles odeiam isso de “estrela”, “astro”, “fã”, “ator
principal”. O pessoal de teatro nem tanto.
Um dia, colocam o elenco em ordem alfabética, no outro por
entrada em cena, e ainda com o personagem principal/ator principal em destaque.
Portanto, pensei agora, porque não uma estrela na porta do
camarim dos atores e na sala dos técnicos? E outra não sei bem onde.
Capítulo 3
Tarântula: Fim da adolescência
E perguntaria Bob Dylan: “por que que você tem tanto medo de
se envergonhar? Você passa muito tempo no banheiro né? por que que você não
admite? por que que você tem tanta vergonha de ter medo? teu tio Matilda” (in
“Tarântula”)
E continua Moisés Monteiro de Melo Neto, narrando o fim de
sua adolescência:
“Paulo Barros: ele adorava vestir preto. Usava casacos,
óculos escuros e sempre uma bolsa como se estivesse pronto para ir embora para
um lugar bem distante. Foi com esse cara eu conheci Andy Warhol (Andy dava um
suspiro em 78, lá em New York e Paulo já sabia e nós comentávamos), David Bowie
(Paulo me explicou Ziggy Stardust e Major Tom e me deu uns toques sobre
androginia), Blondie, Rolling Stones (na época do lançamento de Black and Blue
nós ficamos chapados várias vezes escutando a bolacha de vinil), Bob Dylan
(nesta época eu li o romance dele chamado “Tarântula” e comecei a fazer
traduções das letras das suas músicas. Eu adorava Lay Lady Lay), Paulo também
curtia sons como Marlui Miranda e Mutantes (foi ele que me apresentou isso
também, eu já conhecia Rita Lee, que tinha barbarizado com o lançamento de
Fruto Proibido e depois Entradas e Bandeiras). Aliás, alguns dos amigos gostam
muito da Rita.
Rita Lee e Rosalia Calsavara, com quem Moisés escreveu
muitos musicais
Enfim: o amigo perfeito, não fosse pelo seu jeito suicida de
ser. Um dia Paulo Barros cortou-se em várias partes do corpo, só para obter
sangue e pintar um quadro. Como eu, ele era poeta, e, gostava dos tais estados
alterados da mente. Este rapaz também trouxe a psicodelia para dentro de mim.
Seu apelido era Paulo Astral, para diferenciá-lo do outro Paulo da nossa turma,
o Smith. Ele me trouxe também Carlos Castañeda e a Erva do Diabo, um dos seus
livros, que ao lado de Viagem a Ixtlan mudaram a minha vida. Eu já estava
acostumado com Drummond, Gregório, Shakespeare (Hamlet e Romeu e Julieta estão
entre as minhas primeiras leituras), Krishnamurti, Dostoievski, Dumas, Huxley,
Hesse, Gibran, Poe (fiquei muito impressionado quando li um livro sobre sua
vida e obra), Baudelaire, Dante (li o Inferno três vezes) e Clarice Lispector
(e aqui eu devo confessar: eu adorava romances policiais. Li praticamente tudo
de Agatha Christie que uma vizinha me emprestou, li Maurice Leblanc e Edgar
Wallace), mas o underground mesmo, só conheci em 1977”.
E o que Moisés conheceria a partir de 1977? Ele próprio
continua:
“Um dos nossos pontos de encontro era a lanchonete Fruto
Proibido atrás da
igrejinha de Boa Viagem. Rolava a maior azaração e todos
exibiam suas performances e atitudes. Ali sabíamos tudo sobre todos. Falávamos
mal dos surfistas de Olinda e das cocotas de lá também. Rolava um certo clima
de adversidade entre as duas facções. E mesmo entre a turma de Boa Viagem. Uns
da nossa turma, C... e D..., perderam os pais num brutal acidente de carro.
Ficaram revoltados. Herdaram imóveis e uma boa grana, mas caíram na
marginalidade. Tipo: formar uma gang, roubar carros e traficar drogas. Muitos
de nós pagaram preços altíssimos por certas experiência. Em 1988 quando eu
estava morando em Brasília, fiquei hospedado na casa de D… (uma mansão com
piscina e quadra de tênis), ele me tratou muito bem. Ele havia se regenerado.”
E Neto continua:
“As festas eram quentes e às vezes improvisadas. O som e as
luzes eram perfeitos para os nossos encontros de fim de semana. Havia, é claro,
os indefectíveis luaus em Gaibu e Maracaípe. Soube que ele continua morando em
São Paulo e de vez em quando dirige uns filmes. Ainda em 77 uns rapazes da
turma chegaram com o disco Never Mind the Bollocks, do Sex Pistols. Eu fiquei
ligado naquele som. Eu gostava também do Kiss. Lembro do dia em que fomos
assistir ao documentário “Woodstock”, foi como se estivéssemos indo ao
próprio festival. Era esse o clima. Também fomos ao
lançamento do filme “Janis”. Uau! Eu nunca vou me esquecer daquele dia. A turma
toda reunida. Foi uma caravana. Éramos mais ou menos uns vinte. Só haviam dois
carros. Fomos espremidos e alguns pegaram ônibus. Nos vestimos de acordo com a
ocasião. Nossos pais não tardaram a entender o que se passava conosco. Algumas
garotas como Miriam Pimentel, que mais tarde trabalharia como atriz
em duas das minhas peças, eram como “musas” para a gente e
levavam um estilo de vida bem San Francisco, se é que vocês me entendem.Alguns
dos caras começaram a usar drogas injetáveis. Eu nunca fiz isso. Outros tomaram
chá de cogumelo de zebu e comiam a tal coisa em viagens delirantes. Um deles se
deu tão mal que até hoje nem álcool bebe.
Stairway to Heaven era o nosso hino. Até hoje quando eu
escuto esta música lembro daqueles dias. Houve uma tarde, quando fomos assistir
The Songs Remains the Same, filme sobre o Led Zeppelin, muitos de nós resolveram ficar zanzando numa
lancha de aluguel pelos rios da cidade e curtindo o pôr-do-sol no dique do
porto, ali, sobre os arrecifes que deram nome à nossa cidade, tendo como perfil
a ilha do Recife antigo.”
É desta época um poema de Neto chamado “Tarântula” (dedicado
a Paulo Barros e Bob Dylan):
Em qualquer canto da casa existe uma tarântula
Com suas patas curvas, peludas e débeis,
Trêmulas de emoção e veneno
Em qualquer canto, o murmúrio dos ventos
Quando se encontram num portal,
nas brechas das janelas, corredores
atrás dos velhos quadros
sacudindo os vidros
A tarântula se move como um Pégaso
na neblina do sonho de alguém que depois da festa
parece despreocupado com os estilhaços
que são arrastados pela ventania.
E Moisés Monteiro de Melo Neto conta ainda:
“Nossas conversas eram sobre estados alterados da mente,
filosofia, literatura,
música e andanças pelo mundo. Eu pensava em fundar um grupo
de teatro. Paulo queria morar em Nova York ou Londres, Smith queria ser um
campeão de surf e um músico com talento reconhecido. Cantamos e dançamos. Uma
das garotas tirou a roupa alguém tirou uma foto. A gente tinha assistido a um
show de Robertinho do Recife numa cela da Casa da Cultura, antigo presídio,
saímos depois com o pessoal da banda e então comentávamos o assunto. Apoiávamos
os Panteras Negras e torcíamos pela libertação de Ângela Davis.
Todos riram muito quando eu contei que quando era criança eu
cantei e exibi os meus desenhos num programa de televisão do Recife, chamado
Cidade Encantada, sob o comando de uma tal Tia Linda, na TV Jornal do Commercio.
A música era “As folhas caem”, do repertório de Roberto Carlos. Paulo Barros
riu tanto que quase teve uma crise, pensando sobre o pequeno Moisés e sua
aparição na TV local.”
Capítulo 4
A IMPRENSA
Recife, 29 de julho de 2004.
“1986 foi o ano de LUIZ MARINHO...deixamos para agora a vez
de falarmos em alguns nomes que luziram também, embora não fossem protagonistas
dos espetáculos, nem tampouco os principais nomes dos cartazes. Recordamos logo
o nome de MOISÉS MONTEIRO DE MELO NETO, o sacristão de “Viva o Cordão
Encarnado”, engraçado e correto em todas as suas intervenções no
espetáculo...HENRIQUE CELIBI, em “Tal e qual, nada igual no. 2” proporcionou
momentos inesquecíveis no espetáculo. VLADIMIR COMBRE é outro ator que se
afirma nos palcos recifenses...” (em “Valores que impressionam (I)”, Valdi
Coutinho, Diário de Pernambuco, Recife sábado, 3 de janeiro de 1987).
“(...) Moisés Monteiro de Melo Neto também conseguiu sucesso
em seu desempenho, sabendo
vencer com altivez o desafio de um papel feminino.”(em
“Punhal”/Crítica, Enéas Alvarez, Jornal do Commercio, Recife, Terça-Feira, 7 de
maio de 1985).
Fazer teatro nos anos 80 era uma maravilha no Recife.
Tínhamos a maravilhosa cobertura quase diária de Valdi Coutinho e Enéas Alvarez
do movimento teatral pernambucano. Era saboroso, indescritível. Não se pode
falar do teatro pernambucano do período e esquecer esses dois nomes. Eles eram
sensíveis na compreensão e tinham um talento nato para a crítica, se bebiam na
fonte dos excelentes críticos teatrais dos jornais O Globo e Jornal do Brasil,
eu não sei, mas tinham um jeito de escrever que levantava a moral de toda a
classe artística. Publicavam notinhas, planos, projetos, idéias, a agenda
diária, críticas muito educadas, elaboradíssimas, num português de alto nível,
elegante mesmo. Taí, eu disse.
Fazer teatro nos anos 80 era o que havia de mais salutar
para alguém que pretendesse desenvolver uma nova auto-estima, descobrir seu
rumo na vida. Foi o que aconteceu comigo, e com Moisés Monteiro de Melo Neto
também acredito.
Eu o via com Augusta em “Dona Patinha Vai Ser Miss” e a peça
era ótima e todos estavam ótimos. Augusta já havia dado o show de atuação em
“Irmã Natividade” e passava a ser a atriz mais aplaudida pela platéia do
Recife. Era incrível sua beleza, talento, jeito independente, mordaz, às vezes
ferino. Todas queriam ser como ela. Ou mais tarde, como Magdale Alves, quando
deixou de atuar apenas em comédias e encarou o drama. Sim, porque Magdale fazia
você quase morrer de rir na platéia. Ela era absurda. Estávamos em 1980. Em
2004, que alegria poder ouvir a sua voz e a da superstar recifense dos anos 70
e 80, a toda poderosa Suzana Costa.
Mal compreendida por uns, invejada por outros, Suzana era a
produtora mais forte do Recife daquela época. E seu jeito simples de atuar fez
com que a considerassem mal, mas é evidente que os que se lembram de um
monólogo de João em “Muito pelo Contrário”, onde ela dizia, através de seu
personagem Alice: “Quer com Manteiga, Freguesa?” entre outros momentos bárbaros
desse clássico do teatro pernambucano que correu o país – temporada 1981/1982 –
sabem que ela tinha um humor sutil, refinado, e sabia ser dramática como em
“Toda Nudez Será Castigada” e em “Cordélia Brasil”.
As atrizes dominaram o Recife durante toda a década de 80.
Cada uma que quisesse ser mais abaladora que a outra.
Eu ia fazendo meu caminho bem devagarzinho...Fiz a
divulgação de uma peça chamada “A Menina que perdeu o gato enquanto dançava o
frevo numa terça-feira de carnaval em Olinda. Na ficha técnica, o nome: Mirna
Hélia (iluminação). Mais na frente, Moisés fala de Mirna Hélia e depois conta
que aos 13 anos já escrevia contos e poemas (ele os têm guardados em sua casa).
Eu não era uma estrela naquela época. Mas Moisés foi se
tornando. Em 80, esteve ainda como substituto em “O Suplício de Frei Caneca”
(em 79, ele era contra-regra dessa peça). E em 81 depois de “Muito pelo
Contrário”, na qual ficou até setembro de 82, ele já era uma estrela.
Porque todos da cidade vinham falar com você, lhe dar uma
força, dizer que você tinha futuro, que você devia ir pra Globo, depois fazer
cinema e ir direto pra Hollywood.
Tudo era tão simples.
Será mesmo?!
Mas tudo era na base da batalha. Tudo era muito trabalho.
Eu não consigo situar o passado e compreender/escrever uma
biografia de Moisés Monteiro de Melo Neto sem me lembrar do que eu fazia.
Porque em tudo existem as interligações.
Nos anos 80, Moisés fazia cursos de tudo, como o de ator de
TV, no Canal 11 -
TV Universitária, e de teatro com os maiores nomes do teatro
local.
Viajei para o Rio de Janeiro em outubro de 81 e fiquei lá
até julho do ano seguinte.
Quando retornei vim direto do aeroporto para ver
“Rendez-Vous”, o musical de
Ricardo Valença Monteiro ao lado de um grande elenco: Moisés
Monteiro de Melo Neto, Augusta, Paulo Barros, Patrícia Barreto, Sandra
Mascarenhas. Do palco, Augusta mostrou (só eu notei) á Patrícia a “minha
pessoa”. Acabado o espetáculo, que alegria pra mim: reencontrar Recife e seu
maravilhoso universo artístico do início dos 80. Aí fui continuar a fazer
teatro.
Moisés conversava muito com Alzeni Gomes (Jujuba), grande
atriz do período e musicista, sobre Nietzsche e principalmente sobre
Zarathustra.
À luz de poderosas lentes, o que vejo e que interessa
reproduzir aqui?
Moisés fala de sua família pela primeira vez na vida:
“A família de mamãe veio de Nápoles. Sou bisneto de
italianos. Vovô chamava-se Diocleciano de Belli. O pai dele foi cônsul da
Itália na Paraíba e um dos primeiros a ter uma agência de automóveis. Isso na
primeira metade do século XX era raridade. Contam-me histórias de mansões onde
havia tapetes enormes, pianos de cauda, quadros. Há também na família o caso de
uma ilha enorme que meu bisavô comprou no litoral paraibano. Lá havia viveiro
de peixes, dizem que boa parte do peixe da capital vinha de lá. Havia
plantações de frutas também. Foi a única coisa que sobrou da fortuna do velho.
Os filhos dele torraram tudo.”
Moisés, em temporada na Itália, terra do seu bisavô materno
“Meu avô ajudava Barreto Júnior quando ele levava comédias
para a Paraíba e
minha avó e minha madrinha entraram em cena algumas vezes.
Tio Osíris de
Belli era poeta e morreu tuberculoso. Iaiá de Belli, minha
bisavó que veio de Caicó, olhos profundamente azuis, tocava bandolim e fazia
letras de música. No terraço da casa de Cabedelo, vovô organizava rodas de
coco.”
o escritor e professor Moisés Monteiro de Melo Neto esclarece: “Por parte do meu pai, Mário Monteiro, eu tenho sangue de índio Xucuru. Meu avô, Moisés Monteiro de Melo, era filho de uma índia com o fazendeiro mais próspero de Sanharó (PERNAMBUCO)”.
Capítulo 5
Por Que Viver de Literatura?
Em julho de 2004, Moisés Monteiro de Melo Neto responde
porque quer viver de literatura:
“Desejo tanto uma nova mecânica de poder e tem ao mesmo
tempo ter reforçado certos valores antigos que se embutiram de alguma forma às
minhas estratégias de composição e divulgação dos meus textos. Queria que a
mídia não adestrasse os recifenses do modo que vem acontecendo de forma tão
insistente. Aqui a guerra não é o contrário da paz quando se trata, por assim
dizer, de literatura: a história de uns não é mais a história de todos.”
E continua:
“É uma anti-história o que se faz no Recife e a minha
literatura reflete, ou busca
refletir este não-ser.”
Mas, Moisés Monteiro de Melo Neto conta mais sobre sua
própria vida:
“Um dos nossos tinha também uma casa na praia de Maracaípe,
perto de Porto de Galinhas, nem energia elétrica tinha lá em 76. A geladeira
ali era na base do gás e a cozinheira fazia comidas deliciosas como fatias de
pão, assadas e embebidas em leite de coco e canela. Surfávamos
despreocupados,e, viver, era uma aventura fantástica. Ah os olhos da juventude!
Aos 16 conseguíamos passagens de avião de graça pelo avião do correio, o pai de
um cara do grupo era da aeronáutica e foi assim que eu, conseguindo uma autorização
especial dos meus pais, viajei para lugares como Fortaleza e Belém, aos 15:
mochila nas costas e cabelos encaracolados nos ombros. Foi quando eu ganhei um
concurso sobre os Beatles promovido pela revista POP. Acampávamos em Gaibu e
surfávamos.
O surf entrou na vida de MOISÉS NETO na adolescência
Paulo Smith, amigo irmão de Moisés Neto, companheiro de várias ondas e estradas, aparece aqui no Pier 60 em Clearwater Beach, Estados Unidos, onde morou.
Alguns dos meus melhores amigos desta época foram, Paulo
Smith, que comporia comigo algumas trilhas sonoras para teatro. Paulo Barros, a
quem eu dirigiria no teatro e que fez parte do revolucionário grupo de teatro o
TUBA (de O Guarani com Coca-Cola), Rogério, Glória Smith, o DJ Nelinho – grande
Nelinho! – a artista plástica Elúsia, a futura jornalista e dona de boates,
Rejane Leandro (dona das boates Status, em Piedade, e Leandro’s, em Boa
Viagem), com quem eu curti até a exaustão minha fase dancing days), o milico
José Souto, o multimídia Ricardo Valença, dentre outros. Um cara de um grupo
chamado Cães Mortos estudava comigo. Havia a feirinha Hippie e os problemas com
as drogas. Alguns dos meus amigos se deram mal.
Fomos um dia ao teatro assistir ao Trate-me Leão com o
Asdrúbal Trouxe o Trombone. Foi quando eu decidi que faria teatro a qualquer
custo. Minha família (com razão?) ficou escandalizada. Teatro? No Recife? Eu
olhava algumas fotos de artistas de teatro no Recife. Lembro de Suzana Costa em
Cordélia Brasil. Via as propagandas na TV: a Práxis Dramática, de José Mário
Austregésilo (Galileu Galilei). Era uma época de filmes como Laranja Mecânica,
Woody Allen. Sessões de Arte com filmes que me impressionavam como um, que eu
comprei a trilha sonora, chamado Sunshine, ou ainda Ifigênia, com Irene Papas,
Barbarella, Macbeth de Polanski, Romeu e Julieta, Ladrão de bicicleta, Verdades
e Mentiras, de Welles, O encouraçado Potenkin, Terra em Transe, filmes velhos
que vinham à tona com o fim da censura militar. Os concertos gratuitos de
música clássica no Teatro de santa Isabel, que eu frequentava com meu amigo
Rogério. Eu estava fascinado com o mundinho dos intelectuais. Duas figuras
marcam o final da minha adolescência: minha namorada Mirna Hélia e atriz
Augusta Ferraz. Eu tive algumas namoradas, como a terrível Vilma que me seduziu
e abandonou aos treze anos (com um beijo de língua coberta com sorvete de nata
com morango), mas Mirna mudou a minha vida: queríamos ter um filho e comprar
camisinha em 1979 era um drama. Curtíamos Clarice Lispector e Fellini. O
relacionamento acabou de forma terrível. Nesta época eu tinha entrado para UFPE
e queria ser antropólogo”, conclui por enquanto Moisés.
Capítulo 6
O Fim da Adolescência de Moisés Monteiro de Melo Neto
“Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu
cadáver dedico como saudosa lembrança estas Memórias
Póstumas”, Machado de Assis, Memórias Póstumas de Brás
Cubas.
Moisés Monteiro de Melo Neto estava crescendo e adquirindo
gosto literário e musical.
É ele quem continua: “Eu acabara de ler O Capital de Karl
Marx e um dos rapazes de turma, o Júnior, o filho do general, dizia que aquilo
era uma obra datada. Adriana, a quem eu pedia há muito tempo que ilustrasse o
meu livro de poemas, finalmente, ali, no improviso desenhou algo que eu guardo
até hoje e realmente ilustrou uma edição vagabunda dos meus versos.
Rogério começou a recitar um poema aos berros próximo à
barra onde ficam dois pequenos faróis e a guarda do porto, num barco, pediu que
parássemos com aquilo. Era uma época difícil. A ditadura militar exigia de
todos nós jovens um posicionamento. Em 79 viria a “abertura” e nós
trabalharíamos para as esquerdas. Eu vendi camisas e broches para Arraes,
Francisco Julião e Gregório Bezerra. Participei de reunião com estes políticos,
ajudei na organização e divulgação de comícios e tudo mais. Fernando Gabeira
lançou o
livro O que é Isso Companheiro?, que eu li, ansiosamente.
Depois viria O Crepúsculo do Macho, outro best seller. Um dos nossos amigos
inventou de usar uma tanga de crochê igual a do Gabeira na praia de Boa Viagem,
afinal de contas vivíamos um período de abertura sexual também. A turma achou
meio engraçado. Só. Conheci Gabeira pessoalmente numa das palestras que ele
conferia e em 1985 escrevi uma peça sobre suas aventuras e desventuras, esse
texto permanece inédito.”
Moisés Monteiro de Melo Neto e Fernando Gabeira: debate acirrado
E o que dizer de Moisés Monteiro de Melo Neto enfim adulto?
Ele mesmo responde:
“Em fevereiro de 1980 eu tinha 18 anos e fui morar no centro
do Recife. Eu simplesmente enlouqueci ao me distanciar de Boa Viagem, que por
sinal anunciava a inauguração de um dos maiores shoppings do Brasil: o shopping
center Recife. Meu bairro já não era o mesmo e os anos 80 começavam
azedos.Comecei a beber demais e a me meter em confusões terríveis. Uma grande
amiga minha se envolveu com drogas e eu tive que acompanhá-la a uma clínica e
dar satisfações à lei. Entrei para um curso de teleator na TV Universitária e
participei do especial A Cartomante, que só seria lançado dois anos depois.
Fiz uns dez cursos de teatro e conheci mestres como Antônio
Cadengue, Carlos Bartolomeu, José Francisco Filho, Luiz Maurício Carvalheira e
muitos outros. Comecei a andar com esse pessoal de teatro e logo me vi
envolvido em três “grandes” produções locais: a primeira era “Suplício de Frei Caneca”, de Cláudio Aguiar.
Bastidores de “Suplício de Frei Caneca”
Nesta era contra-regra e fiz uma turnê pelo Nordeste. Nos apresentávamos nas
igrejas (centenárias) dos Carmelitas (era o 4º centenário dos Carmelitas no
Brasil). Houve brigas e um dos atores subiu um altar barroco.
Estreia de Moisés como ator: Suplício de frei Caneca, texto
Cláudio Aguiar, direção José Francisco Filho
Em Salvador e fez coisas absurdas durante uma reunião.
Tínhamos aqueles monumentos impressionantes e valiosos todos ao nosso dispor,
já que a cúpula do Carmo estava nos produzindo. Aprendi muito sob a direção de
José Francisco Filho e estreei como ator substituto na igreja do Carmo de
Olinda numa noite daquelas. Eu havia subido para a torre do sino para ver a lua
nascer à beira-mar. Antes tomara uns cálices de um Porto sensacional e andara
num brinquedo Tira-prosa, num parque de diversão na frente da igreja. Já tinha
feito o meu serviço e esperava a peça começar. Foi quando vieram procurar-me
com a boa nova: eu deveria substituir um ator que faltou. Meu primeiro texto em
cena foi: “Enforcai-o!”.
“Eu era um dos algozes de Frei Caneca. No mesmo ano eu
estrelaria uma peça infantil que foi um sucesso e foi interrompida porque o
Teatro onde estava se apresentando pegou fogo (“Dona Patinha vai ser miss”, sob
a direção de Buarque de Aquino).
A terceira produção em que Moisés atua, em 1980, foi “Muito
pelo Contrário”, que estrearia em 1981 e mudaria a vida dele para sempre. No
elenco estavam: Ana Célia, Augusta Ferraz, Buarque de Aquino, Cláudio Ferrário,
Diana Fontes e Eduardo Almeida
(Coreografia), Ivonete Melo, Jandira Airam, José Ramos, Magdale Alves, Marcus
Vinícius, Miguel Ângelo (Iluminação), Moisés Neto, Paulo Falcão, Rutílio de
Oliveira, Sandra Mascarenhas. Pela Skene Produções Artísticas- Susana Costa.
O musical Muito pelo Contrário é a primeira peça do
dramaturgo e encenador João Falcão. Elaborado por um grupo de jovens artistas
recifenses, o espetáculo mostra o olhar de uma geração sobre sua cultura e sua
realidade, e busca desconstruir, com humor e ironia, ideias e imagens
cristalizadas a respeito da Região Nordeste, frequentemente associada à seca, à
fome e ao folclore. Com realização da Skene Produções, da atriz e produtora
Suzana Costa, a peça reúne integrantes de vários grupos teatrais do Recife,
procurando se diferenciar da hegemônica estética regionalista. No palco, o
elenco apresenta o próprio universo afetivo-social – o cotidiano no Recife e em
Olinda - e reflete sobre os modos como a cultura pernambucana, sobretudo a arte
popular, é pensada e representada dentro e fora do Estado.
Matéria no jornal RIBALTA, do SATED PE, sobre os 30 anos de dramaturgia de Moisés Monteiro de Melo Neto
Moisés Neto, 1º à esquerda, e parte do elenco do musical de João Falcão: Muito pelo Contrário
Segundo seu autor, Muito pelo Contrário fala "das
raízes um tanto deterioradas e do folclore de uma região, que se prende a estas
coisas como meio de sobrevivência de suas artes. Porém, o espetáculo não é um
lamento, é uma viagem ao avesso do cartão-postal, ou
melhor, a uma realidade que transcende o colorido das festas
populares e a virtuosa e heróica imagem da miséria nordestina". Narrava a
história de uma socióloga carioca que vai a Pernambuco a fim de estudar os
hábitos do povo e suas manifestações folclóricas. E, ao chegar, o que encontra
é uma realidade bem distinta daquela aprendida na universidade por meio dos
livros. Quando vai ao rio Capibaribe, por exemplo, cuja beleza é eternizada
pelos poetas, vê apenas sujeira; em Olinda, em vez de uma cidade barroca e
tradicional, depara-se com um lugar de vida noturna intensa, cheio de bares -
voltados não somente para o público heterossexual, mas também para o público
gay; visita Caruaru, onde conhece uma família de classe média que finge ser
miserável e ignorante para ganhar um concurso que elege a típica família do
Nordeste; e, no Recife, em vez da decantada hospitalidade pernambucana,
defronta-se com o mau humor da população e a violência urbana. São situações
típicas de qualquer cidade grande, mostradas com leveza pelos números de música
e dança e diversas situações cômicas. Muito pelo Contrário é um espetáculo
simples, centrado no trabalho dos atores e no texto, que consegue estabelecer
uma eficiente relação de cumplicidade e comunicação com a plateia. O crítico
carioca Macksen Luiz explicita que isso se dá paulatinamente ao longo da
apresentação, firmando-se "a partir da visita da socióloga a Olinda, quando
é assediada pelos garotos-guias [...]. E, ao se iniciar o quadro da família de
classe média de Caruaru, que resolve assumir toda imagem estereotipada do
nordestino para ganhar um concurso da família típica, o público já está
definitivamente conquistado". A montagem
faz diversas temporadas na capital pernambucana - com sucesso de público e
satisfatória recepção crítica - e também apresenta-se em festivais e excursiona
por diversas cidades brasileiras, como Vitória, Rio de Janeiro e São Paulo.
Participa do 7º Festival de Inverno de Campina Grande, Paraíba; do 9º Festival
Nacional de Teatro de Ponta Grossa, Paraná, em que Suzana Costa é premiada como
melhor atriz e Augusta Ferraz, como melhor atriz coadjuvante; do 1º Festival de
Teatro do Recife, que, além dos prêmios de melhor atriz e atriz coadjuvante,
recebe os prêmios de melhor direção e música para João Falcão; e do Mambembão
1982.
Em segunda temporada no Rio de Janeiro, em 1982, o crítico
Yan Michalski louva em Muito pelo Contrário:”Muito pelo Contrário aquilo que o
diferencia do panorama teatral carioca e paulista, especialmente sua instigante
vitalidade: "O texto procede à demonstração proposta com inteligente e
contundente espírito crítico e com atraente senso de humor. O espetáculo
através do qual a ideia é cenicamente traduzida é singelo e sem maiores lances
de inventividade, mas charmoso e envolvente, e interpretado com simpática
mordacidade pelo elenco, cuja protagonista, Suzana Costa, destaca-se pela sua
presença elegante e maliciosa. A música, cantada com apreciável competência,
desempenha um papel de grande importância na realização: por um lado, ela
contribui para reforçar, com suas características, a carga crítica do texto;
por outro, constitui-se no principal trunfo estético de um trabalho cujas qualidades,
de uma maneira geral, situam-se no plano da ideia, mais do que da
estética".
Notas
1. FALCÃO, João. Muito pelo contrário - release. Recife,
dez. 1981. Manuscrito. [Acervo Cedoc/Funarte].
2. LUIZ, Macksen. Muito pelo contrário. Jornal do Brasil,
Rio de Janeiro, [s.p.], 7 fev. 1982. [Acervo Cedoc/Funarte].
3. MICHALSKI, Yan. Recife sem nordestinismo. Jornal do
Brasil, Rio de Janeiro, [s.p.], 21 jul. 1982. [Acervo Cedoc/Funarte].
Sem registro. Fontes de pesquisa
BACCARELLI, Milton. O teatro em Pernambuco: trocando a
máscara. Prefácio José Mário Austregésilo. Recife: Fundarpe, 1994. 186p.
CABRAL, Sanelvo. Muito pelo Contrário está no Santa Isabel.
Diario de Pernambuco,
Recife, [s.p.], 22 out. 1982. [Acervo Cedoc/Funarte].
FALCÃO, João. Muito pelo Contrário. Recife, fev. 1981. 29 f.
Digitado. [Acervo Suzana
Costa].
____________. Muito pelo contrário - release. Recife, dez.
1981. Manuscrito. [Acervo
Cedoc/Funarte].
FALCÃO, João et al. Muito pelo Contrário. Uma peça
pernambucana que mostra o outro
lado do cartão-postal. A Gazeta, Vitória, 27 jan. 1982.
Caderno Dois, [s.p.]. Entrevista
concedida a Tinoco dos Anjos. [Acervo Cedoc/Funarte].
LUIZ, Macksen. Muito pelo Contrário. Jornal do Brasil, Rio
de Janeiro, [s.p.], 7 fev. 1982.
[Acervo Cedoc/Funarte].
MARINHO, Flávio. Muito pelo Contrário está de volta no
Cacilda Becker. O Globo, Rio de
Janeiro, [s.p.], 11 jul. 1982. [Acervo Cedoc/Funarte].
______________. Pondo os pingos nos is. Visão, São Paulo, n.
31, [s.p.], 2 ago. 1982.
[Acervo Cedoc/Funarte].
MATOS, Dilma Gomes de. Muito pelo Contrário: o pranto por
nossas raízes. Diario de
Pernambuco, Recife, 7 maio 1981. Viver, p. B-1. [Acervo
Cedoc/Funarte].
MICHALSKI, Yan. Recife sem nordestinismo. Jornal do Brasil,
Rio de Janeiro, [s.p.], 21
jul. 1982. [Acervo Cedoc/Funarte].
OLIVEIRA, José Guilherme de. Muito pelo Contrário: nacional
e popular. Estado de
Minas, Belo Horizonte, [s.p.], 7 ago. 1982. [Acervo
Cedoc/Funarte].
SKENE PRODUÇÕES. Muito pelo Contrário. Direção João Falcão.
Teatro do Dérbi,
Recife, programa, abr. 1981. [Acervo Cedoc
Moisés largou o curso de Ciências sociais / antropologia) a UFPE. A peça foi um estrondoso sucesso.
Ficamos em cartaz durante um ano e meio em Recife e partimos para uma turnê
pelo Brasil. Teve então oportunidade de participar de temporadas no Rio de
Janeiro, São Paulo, Vitória do Espírito Santo, Paraná e várias outras capitais
e conviver com a nata da intelectualidade “pop” recifense. João Falcão e sua
turma eram absurdos e eu fiquei fascinado com aquilo tudo.”
Parte do elenco do musical MUITO PELO CONTRÁRIO, que
percorreu o Brasil nos anos 80
Cenas do musical MUITO PELO CONTRÁRIO, que percorreu o
Brasil nos anos 80
Por onde morava Moisés Monteiro de Melo Neto nesse período?
Ele nos conta:
O ARTISTA PLÁSTICO ISMAEL PORTELA MOISES E BUARQUE DE
AQUINO, CANDEIAS, ANOS 80
“Num dos intervalos da turnê eu decidi voltar a morar
próximo aos meus pais.
Minha avó Diomar de Belli tinha ainda uma casa em Campo
Grande e eu me transferi para lá. Não, não foi uma boa idéia. Papai não bebia
como antes, mas logo começamos a nos desentender e teve um dia que na hora do
almoço eu tirei toda minha roupa e disse poucas e boas. A família ficou chocada
e mamãe chorou convulsivamente. Na mesma semana tive oportunidade de encontrar
pessoalmente o dramaturgo Eugene Ionesco, que viera ao Recife à convite da
Fundação Joaquim Nabuco. Nosso encontro se deu num bairro muito agradável do
Recife chamado Casa Forte, bem perto da casa de Gilberto Freyre. Eu fiz algumas
perguntas e Ionesco me respondeu. Eu pedi conselhos, pois estava pensando em
publicar o meu primeiro romance. Em 1982 eu concluí o tal livro e resolvi
participar de um grupo teatral chamado Trapézio. Fomos todos morar numa região
deserta da praia de Candeias, um lugar ainda quase virgem com um visual que
incluía montes azulados e uma lagoa.”
Zélia Sales e Moisés Neto em A VILA DOS MIL ENCANTOS, Teatro Valdemar de oliveira, Recife grupo teatral chamado Trapézio.
Buarque de AQUINO, Moisés Neto, Geane Bezerra, Romildo moreira, Tereza Meira, Henrique, Albemar Araújo, Zélia Sales , Manoel Constantino: grupo teatral Trapézio. "Fomos todos morar numa região deserta da praia de Candeias, um lugar ainda quase virgem com um visual que incluía montes azulados e uma lagoa.” , afirma Moisés
Capítulo 7
O que teria acontecido com Moisés do final de 1984 até 1985?
Lula Cortes, Rosália Calsavara e Moisés, em candeias: muito
rock´n´roll!
Os jovens começaram a se vestir de modo diferente. New wave
da Blondie, do
Lobão, do Kid Abelha, ska do Paralamas, Lulu Santos, Legião
Urbana, Cazuza do Barão Vermelho, filmes e mais filmes que brotavam. Moisés
estava interpretando A Noite dos Assassinos (do cubano José Triana). Conseguiu
uma passagem para o Rio e um passaporte para todos os dias do festival Rock in
Rio (Rock’n’Rio). Como ele mesmo conta:
“Eu peguei um avião com destino ao Rio. Isso foi na
madrugada da última apresentação da peça (antes fui comemorar com toda a equipe
e tomamos bastante vinho). Um amigo meu foi me pegar no aeroporto carioca. Ele
me levou para a casa dele, na Ilha do Governador. Era uma favela!”
A narrativa segue em ritmo jovem:
“No outro dia me transferi para a casa de outro colega meu
que morava em Ipanema, o Pedro Paulo. Nós fomos à praia e aquela água gelada me
revigorou bastante. A galera estava falando com Mary Jane por toda a areia.
Como eu curti a minha juventude! Eu não precisava das drogas nem do álcool. A
minha imaginação sempre foi uma companheira bem agitada. É claro que houve
cervejas e tudo o mais, mas a minha interna vida cósmica (título de um poema
meu) era bem mais forte que qualquer substância a ser consumida, entendem?
Tinha um cara com quem meu amigo dividia o apartamento e aí teve uma garota e
uma cena de ciúmes. Pronto: no quarto dia tive que encontrar outro lugar para
ficar. Naquela tarde eu fui ao apartamento de Celeste Jerônimo, onde João
Falcão estava hospedado. Não foi o que se poderia chamar de uma tarde legal,
mas algo a tornou mais desagradável: alguém contou que durante um enterro
Celeste pisara num caixão podre e atolara o pé num cadáver. Fiquei hospedado
então no Parque Guinle, num conjunto residencial nas Laranjeiras, coisa de
primeira. Meu quarto tinha janela para um monte belíssimo e a família de Lúcio
Azevedo Wanderley me recebeu muito bem. Chegaram outros amigos nossos e
começamos a fazer uma farra que duraria cerca de dez dias e incluía caixas de
vinho e tudo mais que aparecesse em termos de emoção: eram shows de Ozzy
Osborne, Nina Hagen (por quem eu era fascinado), Queen (Fred barbarizou num
Grand Finale), Iron Maiden, Scorpions, Kid, Barão, Paralamas, Rita Lee e
outros. Eu sabia muitas letras desses músicos e cantava na maior brincadeira.”
“Foi uma grande confraternização. Lúcio é um cara bem legal
e chegamos a compor uma pequena ópera baseada em Frankenstein, ele morava no
bairro de Casa Forte (Recife). Encontrei o pessoal do teatro no Festival, que
acontecia num local enorme, nós jovens vítimas da ditadura militar não estávamos
acostumados com tamanha liberdade. Até 84 dois caras conversando na rua? A
polícia já podia prender por conspiração.”
E aquele festival, o que significou para Moisés Monteiro de
Melo Neto? Ele responde:
“Aquele festival marcou o início de uma nova etapa para
muita gente. E não ficávamos somente por lá, não. Uma noite depois do evento
nós fomos ao Canecão assistir ao show da Legião Urbana, que não participou do
festival. Assistimos a algumas peças de teatro e conversamos muito com atores e
diretores. Um grupo de lá começou a ensaiar uma peça que eu havia escrito (O
Diário secreto de Janis Joplin). O projeto não foi adiante.
Voltei para o Recife cheio de gás e montei meus primeiros
textos. Chamei Henrique Amaral para trabalhar na minha primeira peça. Ele
topou, compus o elenco e faltava uma atriz. Pierson Barreto me indicou Simone
Figueiredo, que já trabalhara com a Ilusionistas. Foi assim que eu conheci uma
das mulheres mais importantes de toda a minha vida. A minha companheira Simone
Figueiredo. Meu amor por esta garota mudou tudo. Minha vida começou a tomar
novos rumos”.
E 1985 como começava para Moisés? Ele explica:
“Eis o começo de 1985: Tancredo Neves morreu em
circunstâncias muito suspeitas. O povo dizia que ele fora assassinado, que a
repórter Glória Maria vira tudo dentro de uma igreja e tiveram que abafar o
caso. Conhecemos então Dona Risoleta Neves, a esposa do homem que poderia ter
salvado o Brasil, ela sempre parecia estar sofrendo muita pressão, estava
bastante assustada. Sobrou o vice para a gente: o maranhense José Sarney
assumiu o comando do país. Foi um período no qual o Brasil poderia ter
melhorado. Não aconteceria nada disso. Na rádio Lobão cantava Decadence avec
Elegance, Revanche e O rock errou. O país mergulharia num plano econômico catastrófico
chamado Plano cruzado. Foi algo similar a um soco na cara dos cidadãos que
continuariam a levar porrada até o final da década, sem intervalos. Faltaria
comida nos supermercados, a inflação chegaria às alturas antes inimagináveis e
a nação se emporcalharia no mais absoluto caos culminando com a gestão do
presidente Collor.”
Em 1986 Moisés trabalhou como ator em várias peças como VIVA
O CORDÃO ENCARNADO (de Luiz Marinho com direção do mitológico Luiz Mendonça.
Moisés Neto, Luiz Mendonça, Henrique Amaral e Mozart Guerra
Moisés contracenando com Ozita Araújo, Maria Paula, Márcia
rocha e Ana Montarroyos (Viva o cordão encarnado!)
Também atuou como Mercúcio em ROMEU E JULIETA (adaptação de
Rubem Rocha filho, direção de José Francisco Filho)
ROMEU E JULIETA: Moisés Monteiro de Melo Netoao lado de Carlos Varela, Conceição
Camarotti, Júlia Lemos e Ricardo Link
Mas foi em HAMLET (1988)que Moisés se destacou como ator,
interpretando o papel título ao lado de Heitor Dhália, Bruno Garcia e outros.
HAMLET
Nunca tive medo do palco e gostava de provocar reações na
plateia; mas sempre registrei mentalmente que não se tratava de interpretar
nada. Como se o ator fosse uma espécie
de soldado: era preciso se sacrificar em nome de um bem maior. Era preciso acreditar
na causa. Só que eu não tenho vontade me sacrificar o bastante para ser ator,
disse Moisés no dia da estreai da peça Hamlet, onde atuava como protagonista.
Abaixo: Ana Célia , como Gertrudes e Moisés, como Hamlet:
Moisés escreveu e dirigiu várias peças para bares e boates.
Nos anos 80 o grupo Ilusionistas causou escândalo ao apresentar-se em Boates com temáticas ousadasBastidores da peça Shakespeare acorrentado (Boate Misty,
Recife)
Atuou em peças como Mudanças no galinheiro (de Sylvia
Ortoff, direção Manoel Constantino)
Manoel Constantino e Moisés Neto em Mudanças no galinheiro
(de Sylvia Ortoff, direção Manoel Constantino)
Escreveu e atuou em A
MAIOR BAGUNÇA DE TODOS OS TEMPOS (direção Buarque de Aquino), Teatro José
Carlos Borges, Recife
A MAIOR BAGUNÇA DE TODOS OS TEMPOS
Adaptou para o teatro clássico da literatura brasileira:
Elenco de uma das montagens de DOM CASMURRO
LUZILÁ GONÇALVES FERREIRA, RAIMUNDO CARRERO E A COLUNISTA
ROBERTA JUNGMANN ESCREVEM SOBRE A ARTE DE MOISÉS MONTEIRO DE MELO NETO
Os Caminhos de Moisés Monteiro de Melo Neto segundo
Raimundo Carrero
|
Moisés Monteiro de Melo Neto conhece os segredos da invenção, como poucos.
Isto é, sabe inventar e sabe, sobretudo, harmonizar esta invenção, quando ela
exige perícia e sacrifício. Os textos que tenho lido dele comprovam a
habilidade. Não se contenta com o óbvio e com o lugar- comum, vai adiante,
investe nas especulações criativas. Reinventa.
O que se tem visto, quase sistematicamente, são
escritores, mesmo aqueles mais jovens, repetirem fórmulas antigas, superadas,
repetidas. No romance, por exemplo, quase não se avança mais na questão das
novas fórmulas. Em Moisés Monteiro de Melo Neto, todavia, o caminho é
diferente. Ele é capaz de revolucionar sem provocar dramas no leitor. Sem
torturas e mágicas mal elaboradas.
Além do mais sabe ser sutil. As palavras nascem, vêm com
leveza, montam a história, num clima quase de sonho, mesmo quando enfocam os
caminhos mais cruéis. Esta é a impressão que me ficou de um dos seus textos
mais recentes, o romance "Michelle", cheio de truques e
arrebatamentos. Uma fábula fabulosa.
No teatro, Moisés tem o domínio do que vem (ou vinha) a se
chamar de "carpintaria cênica": Personagens seguros e determinados
na criação, diálogos sóbrios e envolventes, cenas sequenciadas pela lógica da
invenção, palavras definitivas e verdadeiras, situações trabalhadas.
Inventando ou adaptando conquista pela convicção.
Tudo isso é resultado da extrema familiaridade com o texto
literário: Conhece os melhores escritores, estuda diversas técnicas
narrativas, elabora novas conquistas, enfim, desenvolve sua capacidade de
inventar. Estou seguro de que se trata de um desses autores difíceis de
esquecer. Para sempre.
Raimundo Carrero
|
Raimundo Carrero escreve sobre peça ANJOS DE FOGO E GELO (a vida de Arthur Rimbaud) de Moisés monteiro de Melo Neto
Moisés Monteiro de Melo Neto e Raimundo Carrero
Luzilá Gonçalves Ferreira escreve sobre o texto de Moisés
Monteiro de Melo Neto (apresentado no Teatro de Santa Isabel em setembro de
2010)
Diário de Pernambuco, 21 de setembro de 2010, Caderno Viver,
p. E2)
´
Luzilá Gonçalves Ferreira saúda Moisés Monteiro de Melo Neto: Literatura Pernambucana em destaque
Um belo final de tarde
Quem lá não esteve não sabe o que perdeu. No Salão Nobre do Teatro de Santa
Isabel, que há 160 anos abriga recitais, concertos, para pessoas de bom gosto,
em um cenário mínimo, sobre fundo negro, atores vestidos de preto fizeram a
leitura dramática do texto teatral que seu autor, Moisés Monteiro de Melo Neto,
intitulou simples e modestamente de Bento. Trata-se do julgamento de Bento
Teixeira, nosso primeiro poeta, o autor da Prosopopéia, por sua mulher, Filipa
Raposa, e pelo representante da Inquisição. Partindo de nosso romance Os rios
turvos, Moisés tornou presente o que era apenas palavras, ficção, romance, um
trabalho de recriação, de criação, um belo, inteligente e muito pessoal
documento dramático, pelo qual a autora do romance é agradecida.
Antes e após as leituras, fundo musical, antigas melodias judaicas. Os atores
sob a direção de José Francisco Filho, instalados, em pequenas mesas, para
Bento e Filipa, sobre um imponente púlpito, para o representante do Grande
Inquisidor, nos proporcionaram um raro momento de doação deles mesmos, no
profissionalismo, na emoção transmitida. Stella Maris, uma das ótimas atrizes
que o Recife possui, foi uma forte personificação de Filipa Raposa, na perfeita
dicção, na entonação, na economia e precisão dos gestos. O Grande Inquisidor,
vivido por George Meirelles tornou nossas as acusações a Bento, na força e na
convicção com que atacou, culpabilizou, humilhou, ironizou o autor da
Prosopopéia. De Germano Haiut, o que dizer? "Une bête de théâtre",
diriam os franceses, um bicho de teatro, um imenso, enorme talento que nos
comoveu (vi lágrimas em alguns olhos), vivendo Bento Teixeira diante de nós, um
pequeno judeu levado a abjurar de sua própria fé.
Esse esforço de criatividade de produtores, atores, autores, com que a
Prefeitura do Recife congregou oficinas, várias leituras dramáticas comemorando
os 160 anos do teatro sob a coordenação de Lucia Machado, não deve se encerrar
aqui. Sugerimos sua reedição em locais e datas outras. E com relação a Bento,
recado para Antônio Campos, Eduardo Cortes e Mário Helio: sua reapresentação na
Fliporto deste ano, dedicada à literatura de cunho judaico.
Luzilá Gonçalves Ferreira
Press release para Bento (espetáculo, texto de Moisés Monteiro de Melo Neto,
direção José Francisco Filho) O judeu Bento Teixeira escreveu o poema épico Prosopopeia (publicado
em 1601, um ano após a morte do autor) que trata dos primórdio da história de
Pernambuco e dá início à Literatura Barroca no Brasil. No final do século XVI,
após assassinar sua esposa em Pernambuco, Bento é aprisionado pela Santa
Inquisição por práticas judaicas.O texto de Moisés aborda os últimos dias de
Bento num cárcere em Lisboa. O autor inspirou-se no personagem de uma das
pioneiras da emancipação da mulher no Brasil: a cristã velha Felipa Raposa, nos
moldes em que a recriou a escritora Luzilá Gonçalves Ferreira. O foco da peça
dá-se no tormento psicológico do assassino que, remoendo tantos horrores,
delira e passa por severos interrogatórios. Um drama que envolve paixão e
preconceito numa época de extrema intolerância. As questões de gênero (a
opressão da mulher), da perseguição aos judeus e as raízes da história
brasileira formam um torvelinho inquietante.
Coluna dia a dia, JORNAL DO COMMERCIO (Recife, 16 de
setembro de 2010, Caderno C, p.3)
Teatro Nosso
Os veteranos atores Stella Maris Saldanha, Germano Haiut e
George Meireles dão via aos personagens do texto inédito Bento, do pernambucano
Moisés Monteiro de Melo Neto, que será apresentado no Salão nobre do teatro de
Santa Isabel. Atualmente, Moisés Monteiro de Melo Neto é o dramaturgo com
textos mais montados no Recife.
O jornalista Talles Colatino fala sobre evento que incluiu Moisés
Monteiro de Melo Neto como referência na dramaturgia contemporânea em
Pernambuco
Teatro nordestino pede parada em São Paulo
A programação é variada, e vai até o dia 3 de dezembro.
FOLHA DE PERNAMBUCO. CADERNO PROGRAMA. PÁGINA 5 EM 04/11/2008.
por Talles Colatino
Não soa estranho que São Paulo seja a maior cidade
nordestina do País. E para exercer uma proximidade ainda maior entre a região e
a metrópole, tem início hoje, lá na terra do céu cinza, a Mostra Paulista do
Teatro Nordestino. Até o dia 3 de dezembro, uma série de atividades gratuitas
relacionadas à produção teatral da região ocupa o Centro Cultural Banco do
Brasil (CCBB) e o Centro Cultural São Paulo (CCSP), incluindo peças, leituras
dramáticas e demonstrações de trabalho. A mostra também recebe a 6ª Semana do
Teatro Nordestino, reunindo dramaturgos de São Paulo e do Nordeste em mesas de
debates e lançamentos de livros.
O fato de abrir as portas de dois dos mais importantes
centros culturais do País (o CCBB e o CCSP) à Dramaturgia Nordestina é um ato
de reconhecimento do valor de autores e de criadores cênicos, abundantes nessa
região, que tornam o Brasil um dos lugares do planeta onde o teatro está mais vivo
do que nunca. Se o evento conseguir abrir um pouco mais o diálogo entre
Nordeste e Sudeste, em meio às luzes e às sombras da cena, terá cumprido
importante papel”, afirma Sebastião Milaré, curador da Mostra.
As quatro montagens selecionadas para se apresentar no
evento homenageiam o pesquisador e dramaturgo alagoano Altimar Pimentel,
falecido esse ano. Pimentel é autor de “A Construção”, uma das peças
emblemáticas do final dos anos 60, encenada em 1969, pelo Grupo A Comuna,
de Amir Haddad, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. De autoria do
dramaturgo, a mostra traz ao palco “Como Nasce um Cabra da Peste”, com a
companhia paraibana Agitada Gang.
Pernambuco vai representado pela companhia Arte-em-Cena, com
seu já clássico “Deus Danado”. “Lesados” (CE) e Sinhá Flor (PB) completam o
time de espetáculos.
SEMANA
Como parte da programação da Mostra, pela primeira vez São Paulo é palco da
Semana do Teatro Nordestino, evento que acontece anualmente em Natal (RN) desde
2003, por iniciativa da Associação dos Dramaturgos do Nordeste. A programação
da Semana inclui lançamento de livros e palestras com dramaturgos nordestinos e
paulistas. “A idéia principal foi dar acesso aos criadores cênicos paulistas,
aos estudiosos e ao público interessado de São Paulo a obras dramatúrgicas
produzidas no Nordeste. Essa idéia ia ao encontro da proposta básica da
Associação de Dramaturgos do Nordeste, que é difundir essa produção
dramatúrgica”, conta Sebastião Milaré, mediador das mesas.
Para as palestras, os dramaturgos convidados são: Cleise
Furtado Mendes (BA); Oswald Barroso, José Maria Mapurunga, Rafael Martins, Yuri
Yamamoto (CE); Tácito Borralho (MA); Eliézer Rolim, Elpídio Navarro, Paulo
Vieira, Celly Albuquerque (PB); João Denys(autor de “Deus Danado”), Moisés
Monteiro de Melo Neto (autor de “Anjos de Fogo e Gelo”), Romildo Moreira (PE);
Ací Campelo (PI); Racine Santos, Paulo Dumaresq (RN); Lindolfo Amaral (SE);
Luis Alberto de Abreu, Márcio Aurélio e Newton Moreno (SP). Lá, toda a
programação é gratuita. (Talles Colatino)
Moisés Monteiro de Melo Neto fala sobre o musical
infanto-juvenil “Sonho de Primavera”:Foi a primeira vez que eu dividi a direção de um espetáculo
com outro profissional e estou me sentindo bastante gratificado. Usamos de
muita técnica é claro. Supervisionamos música, dança, figurino e cenário para
que houvesse homogeneidade na cena. O resultado foi o que eu esperava: adultos
e crianças ficam perplexos diante da esfuziante mensagem que enviamos: é uma
performance cheia de frenesi. Entre um distanciamento brechtiano, a quarta
parede stanislavskiana, o teatro social dos anos 70 e os grandes musicais,
optamos por ficar com tudo e buscar algo mais: interação com a platéia. Meus
dois últimos espetáculos como autor, “Para um Amor no Recife” e “A Ilha do
Tesouro”, ganharam vários prêmios e me ensinaram que devemos procurar novos
caminhos para o teatro no Recife. “Sonho de Primavera” veio como um bálsamo. O
Teatro do Parque é palco de uma nova experiência em teatro infanto-juvenil. Não
se trata de uma grande produção e sim da vontade de declarar amor à vida de
forma divertida e dinâmica. É poesia, música, colorido e uma interpretação que
beira o exagero. Uma lição que aprendi com o mestre José Francisco Filho foi
não tratar a criança como boba nem tão pouco querer ver nela um adulto
obsequioso. Há também em “Sonho de Primavera” um mistério, que é claro eu não
posso revelar, e até agora dos muitos expectadores que já assistiram ninguém
adivinhou. Este eu não posso contar, só posso dizer que é muito, muito sério, e
me deu um trabalho danado camuflá-lo. Acho que esta peça é um trabalho em
progressão: Ulisses está burilando, eu continuo tecendo meus comentários.
Foi com prazer que escrevi este texto ao lado de Rosália
Calsavara e compus as músicas com Paulo Smith, que buscou inspiração tanto no
rock ´n ´roll quanto em filmes musicais
para compor a trilha sonora. Black Escobar é um profissional do jazz. Celibi
traz na bagagem tanto a concepção de figurinos e adereços para escolas de samba
do Rio de Janeiro quanto suas raízes fincadas no Vivencial Diversiones, casa de
espetáculo que revolucionou a Cena Recifense dos anos 70 no Recife, além do seu
trabalho com a Trupe do Barulho.
O que oferecemos é adrenalina. Prove e comprove.
Moisés Monteiro de Melo Neto
Mestre e Doutor em Teoria da Literatura, professor universitário, escritor
e diretor teatral pernambucano
Moisés Monteiro de Melo Neto FALA UM POUCO OBRE SUA TESE DE
DOUTORADO:
“Alguns nomes são recorrentes na obra de Jomard Muniz de Britto: os
irmãos Campos e Pignatari, por exemplo, admiradores de Caetano e incentivadores
da Tropicália, que retomaram a linha evolutiva do baiano e deram organicidade e
fortaleceram seus julgamentos de criação, nisso está uma intersecção com Jomard
que, dentre vários vieses ataca nacionalismos passadistas, nacionaloides do
tipo macumba para turistas oswaldiana.
Quanto ao mencionado movimento liderado por Caetano e Gil, Luís Carlos Barreto
deu nome à canção Tropicália, por causa de uma instalação do carioca Hélio
Oiticica e logo a seguir Nelson Motta escreveu um texto no qual batizou o
movimento que surgia foi aí que Caetano resignou-se ao nome Tropicália, por
falta de opções, Tropicalismo lhe soava gasto por causa de Gilberto Freyre. A
Tropicália enquanto miscelânia de informações que vão de Louis Malle, pelo
filme Maria, com Brigitte Bardot, passando por Garota de Ipanema (em tupi: água
ruim), identificações com Terra em Transe, com toda a esperteza e fúria da
estética de Glauber; Jomard une-se ao grupo em 1968 e instala-se nos limites do
Tropicalismo (diferir da tropicologia freyriana). Longe da esquerda festiva,
tal vanguarda livra-se de possíveis angústias da influência em intensa
radicalidade, como no espírito tropicalista. A poesia de Jomarde é de cunho
jamesjoyciano, fundo verbivocovisual com versos em palavras-montagens, em
translíngua. De João Cabral, outra das referências na poética de Jomard, vem o
olhar lúcido, o nível de argumentação, defesa crítica, determinação inabalável.
Do noigandres do Concretismo às perguntas sobre a significação (em louca
tenacidade) nos poemas-manifestos jomardianos contra os mantenedores do
subdesenvolvimento na geleia geral (como na letra de Torquato Neto) brasileira
que a mídia anuncia. Surge o texto como a quebra dos resguardos, como reflexo
de ruidosas performances, escrita paródica-carnavalesca de aspecto
inventivo-construtivista (de combatividade) buscando a imparcialidade, a expor
as entranhas do Brasil em radicalidade antilírica, como num filme de Godard,
ver a abertura de Pierrot le fou, numa
poética cheia de lugares incomuns, poesia enquanto palavra-impacto, composição
(des)construtora de efeitos, linguagem organizada de maneira meticulosa em meio
ao caos criativo vertiginoso numa época em que os ouvidos têm paredes, num
mundo que se mostra mais intolerante do que nos libertários anos nos quais JMB
iniciou sua produção poética. Augusto de Campos já disse que a poesia é uma
família de náufragos nadando no espaço e no tempo. Busco nesta minha explanação
a trans-historicidade contra a banalização do passado no texto de JMB, onde
diluição e invenção, qualidade de percepção do mundo buscam, talvez, expressar
o indizível, apontar que a captação do fenômeno qualitativo e sensível, longe
do sentimentalismo, em protesto contra a vulgarização da vida na era da disparada
da tecnologia e mudança rápida de valores morais. Seu deboche de cunho
antropológico e pós-utópico cubo-futurista aborda também o erótico na política
em expressividade não linear sendo por isso rejeitado tanto pela esquerda
quanto pela direita, mas isto não o impede de continuar com seus atentados
(panfletos que ele distribui atentando inclusive contra o panfletarismo, em
pleno século XXI). No seu texto para o filme palhaço degolado temos algo
próximo ao construtivismo indigesto e antropófago. Seus textos parecem fora de
controle numa escrita mais intuitiva do que coerente, incitavam à demolição,
contra o acanhamento e inclui os erros como contribuições. Algo nos textos
jomardianos parece clandestino, andrógino, enfim: pluralidade de estilos,
desmantelamento de cercas entre as classes sociais, os gêneros; mas Jomard
Muniz de Britto não é um piadista nem um vanguardista datado. É poeta que usa o
tratamento de choque em ritual canibalista na movência do Brasil, em selvagem
psicanálise a riscar o nome do Pai, em audacioso gesto literário. Não em poesia
límpida, mas em mistura de referências, estilo novo, inaugural, a rir das
desesperanças, dos comandantes e dos alienados. Poesia que tenta desalienar
corações e mentes em meio às tentativas vãs de unicidade e cinismo. Suas
discussões sobre o gozo imediato, sua recusa às migalhas lançadas pelo poder,
sua atração pelos marginalizados, tudo isto, como uma performance exerceu sobre
mim simultaneamente atração e repulsa. Venceu a primeira”.
Sobre o Teatro de Moisés Monteiro de Melo Neto
Moisés Monteiro de Melo Neto: Encontro com Fátima Amaral e Lucélia Santos, em peça teatral
A professora Fátima Amaral faz sinopses e comenta as peças
de Moisés Monteiro de Melo Neto (Sobre o
“ Teatro Ilusionista- Peças de Moisés
Monteiro de Melo Neto)
Estamos diante de textos teatrais em forma de livro:
as condições do texto teatral exigem carpintaria exclusiva. Não é um sistema
anárquico. Há leitores e principalmente espectadores que quer possuam atributos
específicos sobre literatura e espetáculos teatrais ou não, compartilham
códigos para sua assimilação/análise, em ambos os casos, são feitas leituras,
de certa forma “exigentes”. Descodificar (e avaliar uma peça teatral) é
fundamentalmente uma atitude lúdica, tanto para o leitor comum quanto para o
leitor “instrumentado”. Para este último surgem os “códigos estilísticos”
retóricos, temáticos, ideológicos, etc.. Quanto a este(s) posicionamento(s)
“crítico(s)”- como influencia(m) a arte teatral? Uma peça pode ser
incompreendida por muito tempo, e depois ser “recuperada”.É o caso de “O Rei da
Vela” de Oswald de Andrade, por exemplo.
Um texto teatral, como de qualquer outro gênero enfim, é
passível de múltiplas leituras.Umas mais ricas, outras mais pobres.
As condições de decifração de um texto “criam” um
subproduto, um “segundo produto, melhor dizendo, (a crítica) que terá o “ranço” de seu enunciador.
Uma crítica sociológica, ou psicanalista, estrutural,
histórico-literária, ou qualquer que seja o naipe, pode mutilar ou
potencializar uma obra, mas dificilmente servirá de panacéia para a criação de
outrem.
O significado global que atribuo aos textos de Moisés
Monteiro de Melo Neto presentes neste volume é mais ou menos o seguinte-
trata-se de uma escrita simplista.Só o “essencial” segura seus personagens
cênicos. Há por trás destes personagens, uma carga ideológica com um certo tipo
de “tensão” que tentarei definir.
O cenário é quase sempre Pernambuco, e mesmo em tramas como
“Draculin e o Circo no Espaço” e “A Maior Bagunça de todos os Tempos” (teatro
para criança), é a verve recifense quem dita as “regras” do jogo teatral. Há
que se reconhecer a época e as personas retratadas, contextualizando-as e
assim, buscar o que há de universal na sua proposta.
Nos textos de Moisés, cheios de “marcações” (indicações da
movimentação teatral), há uma espécie de fixação esquemática do fluir da ação
que, através da polifonia, esconde o rosto do autor.
Se cortarmos estes textos usando uma ferramenta teorética
qualquer, de maneira ontológica, por exemplo, ou mesmo beirarmos o biografismo,
ainda se procurarmos a gênese, veremos que nas falas e situações projetadas por
Moisés, há um espelho mais ou menos fiel de uma época, de uma certa
sociedade.Um espaço marcado pela inveja e pelo ressentimento. São duelos
verbais, que fluem da necessidade de verbalizar emoções, num jogo retórico,
numa sociologia literária, pululam desejos reprimidos, dogmas, medos, certezas
e incertezas dos anos 80.
O que cabe e o que não cabe nestes textos? O que extrapola e
do que carecem?
O grupo Ilusionistas, fundado por Moisés e pela atriz
Augusta Ferraz em 1983, para o qual estes textos foram escritos, tinha como
objetivo principal criar seus próprios textos. Augusta, Moisés e Henrique
Amaral produziam espetáculos diferentes dos encenados em Recife.
No trabalho do autor, as relações entre os personagens, o
desenvolvimento das intrigas, a organização do tempo e do espaço às vezes
cheira a vaudeville, às vezes a dramalhão de circo, drama psicológico e até à
opereta, no caso de sua adaptação para o clássico “A Ilha do Tesouro” de
Stevenson.
Uma dramaturgia urbana, entre o naturalismo e o
artificialismo, que não se utiliza do folclore.
Desfilam personagens como Delmiro Gouveia e sua ânsia de
sucesso. Prazeres de “Prazeres da
Revolução", mergulhada num vazio existencial. Draculin, sonhador, iludido. Branca (de “A
Maior Bagunça”) e Faustina que lutam contra o “mal”. Dá-se o mesmo com
Isabelita (em “Um Tostão para Isabelita”), Evita (de “Evita-me à Cubana”),
doutor Isaac (de “Horror em Pasárgada”), Dinho (de “Com a Víbora no Seio”) e
Valquíria (de “Folhetim”, encenada em 2004 no Teatro Apolo durante o Festival
de Teatro Estudantil por alunos de um famoso colégio recifense) que se vêm
prisioneiros do passado. Já a Cleópatra de Moisés é uma guerreira infantilizada
por uma paixão alucinante e pelo egocentrismo e sua Medéia surge como uma
contemporânea nossa e suas estratégias articulam-se com outros textos do autor.
Gil, personagem de “o Bolo”, é dominadora e tem instintos assassinos, usa seu
poder para esmagar o marido inseguro.Em “Shakespeare Acorrentado” (de 1989)
vemos os expoentes da pureza levados ao crime, e ao sexo ligado ao comércio. Em
“Com a Víbora no Seio”, o que vemos é um jogo homoerótico envolvendo liberdade
e prisão.
Matéria no Diário de Pernambuco. Teatro Pernambucano (Recife): Com a víbora no seio, de Moisés Monteiro de Melo Neto e Henrique Amaral
Rivaldo Casado e Heithor Dhália, dirigidos por Moisés (em
texto dele e de Henrique Amaral: Com a víbora no seio)
“Bandeira escreve a Mário de Andrade” é um texto onde Moisés
deu vida ao nosso mais terno poeta lírico- a dor da perda, o paraíso artificial
e irônico do mestre tudo exaltado em prosa e verso
Espaço e tempo injetam-se no comportamento dos personagens
em forma de juízo (de caráter valorativo e ideológico) que vai se insinuando
pelos textos através de símbolos e alusões. Se há pluralidade ou subjetividade
no vinco desta escrita, ou se nela encontramos algum hipotexto (matriz
referencial), hipertexto (referencial intertextualizado) ou paratexto
(interpenetração de textos) não importa muito, pois faz parte de um jogo
proposto pelo autor, num processo meio convulsivo, típico de sua geração que
não se deteve diante dos cadáveres dos seus heróis. São textos co-presentes de
uma história nacional caótica.Textos que buscam a oralidade acima de tudo
(aspecto fono-linguístico), gestualidade específica.
Os vetores temáticos oscilam como já acentuamos entre
vingança, busca do sucesso, resgate do passado e busca do absoluto. A linguagem
é despojada, concisa, provocante. Expõem-se enredos com desfechos inevitáveis,
neles a trama e discurso entrelaçam-se.
Um frenesi vai enriquecendo o fluir dos textos e é
indesmentível que se pressente neles uma fome insaciável que parece devorar o
autor.
O que Moisés tem de original é o seu formato de literatura
para a “caixa cênica”. Nesta espécie de claustro ele brinca com a idéia de
libertação, de reflexão. Quer seja de forma caricata, ou através de personagens
que parecem poeticamente envolvidos com seus sonhos, surge uma literatura que me sugere esgrima-duelos em
forma verbal.
O pragmatismo em Moisés busca clarear emoções, tornando-as
inteligíveis. Mesmo que isso beire a banalização de alguns tabus (como em
“Faustina” e “Com a Víbora no Seio”- religião e sexo).
Cena de “Faustina”
“Faustina”
A tensão dos personagens
equilibrando-se entre associações e dissociações, a busca da palavra-signo, a
fantasia nas inter-relações de tipos que se digladiam entre o horror e a
salvação, o sentimento e a natureza, vida e morte, oprimir ou ser oprimido-
tudo isso é exposto com um grau necessário de honestidade cínica, que às vezes
os mais sensíveis precisam para sobreviver aos ataques cotidianos da realidade.
Notamos isso em Prazeres, e em outros personagens como o doutor Isaac (de
“Horror em Pasárgada”)- a dor de não saber dizer o que se quer por não dominar
a linguagem do jogo social.
São personagens que parecem vindos de famílias que se
desenvolveram com pouca intimidade ou calor emocional. Eles refletem isso,
esquivando-se da ternura e buscando se transformar em “alguém”. As escolhas que
fazem em seu desespero verborrágico, a implausibilidade dos seus ideais, a
necessidade de mostrarem suas diferenças, chafurdarem nas próprias fraquezas,
buscando no álcool e no sexo, um infrutífero consolo para a proximidade do
abismo emocional que os rodeia (como em “Para um amor no Recife”) leva-nos a
pensar mais sobre esta contracultura amalgamada por estes excluídos. Há neles
todos, um foco de subversão, um questionamento da tradição, uma procura pelo
que é genuíno-uma ânsia de dar um basta
à letargia e passividade,tão comum no final do século vinte. Eles trazem uma
espécie de alívio cômico no meio de uma grande tragédia, como os coveiros
brincalhões da peça Hamlet. Com sua peça mais recente, “Sonho de Primavera”
Moisés surpreendeu por mostrar seu lado didático em peças infanto-juvenis- ao
adaptar o conto da escritora Rosália Calsavara ele permeou o texto com
observações sobre ecologia. Neste espetáculo que estreou e manteve uma temporada de retumbante sucesso
com mais ou menos 800 espectadores por apresentação e que percorreu várias
cidades, Moisés teve seus poemas musicados pelo seu amigo de infância Paulo
Smith, o que resultou numa agradável união de estilos. Este espetáculo marcou
também a volta de Moisés na direção, que neste caso ele dividiu a tarefa com o
tarimbado produtor e performer Ulisses Dornelas, o Palhaço Chocolate.
Recife, agosto de 2004.
Fátima Amaral
MOISÉS MONTEIRO DE MELO NETO, O PRODUTOR CULTURAL
por ALBEMAR ARAÚJO
(diretor do Departamento de Artes Cênicas da Fundação de
Cultura Cidade do Recife)
Albemar Araújo e Moisés Neto
Albemar Araújo (autor) e Moisés Neto (como Pilatos, ao centro), na foto aparecem Buarque de Aquino e a atriz Inaílza (Madalena). Paixão dos Guararapes, 2018
Nestes
tempos ásperos, quando um simples tocar de dedos resulta em trabalho de várias
horas, quando a “pena” cede lugar a outras formas de linguagem, quando os
vídeos substituem os livros, pego-me (sem nenhuma tendência à apostasia)
sentado, frente à parede (nela encontram-se expostos retratos do Quênia e
África do Sul, quando lá estive em 1995, sem cabotinismo) a escrever
manualmente, quando lá do outro lado da sala, aguarda-me um computador.
Escrever.
Escrever
sobre uma facção de um período (dando um corte sistemático
conceitual/temporal/espacial), sobre uma determinada pessoa nesse período – MOISÉS
MONTEIRO DE MELO NETO -, que culturalmente passou e viveu intensamente, por uma
década (os anos 80), numa forte influência das mudanças sociais, das mudanças
políticas, das mudanças econômicas, das mudanças culturais, na qual vivia o
país; produzindo intensamente cultura. Uma cultura engajada nas vanguardas do
seu tempo. Uma cultura ora chamada de PÓS-MODERNA, ora chamada de MARGINAL, ora
chamada de VANGUARDISTA...
É sempre
fascinante versar, quer seja na poesia ou na prosa, sobre alguém. Especialmente
se este alguém vive e transita entre nós. Longe dos cânones. Sem cetro. Sem
coroa. Sem séquito de vassalos a impedir nossa passagem à sala do trono. E
talvez seja mais fascinante por essa pessoa nos proporcionar uma (re) leitura,
mesmo que seja em rápidas passadas, de uma época tão recente, cronologicamente
falando, e tão esquecida, agora falando culturalmente. Remete-nos este estudo,
sem pretensões literárias, científicas ou históricas – quando Ciência -, a
análise de um momento dentro da conturbação pela qual atravessava toda a nação,
de um momento que poderíamos chamá-lo, mesmo assim, de farto e rico na
diversidade cultural apresentada. Diversas tendências se manifestavam de uma
forma ou de outra. E a cultura, como um todo, crescia com isso ao romper com
uma série de signos e códigos. Toda uma série de acontecimentos rolava, qual
caudaloso rio precipitando-se de uma vertiginosa montanha, em cachoeira.
Há quantas andavam a nossa Economia, a nossa Política e a
nossa Cultura?
O movimento cultural dos anos 80 ainda estava enraizado nos
anos 60/70. nas duas décadas (60/70), a cultura foi marcada por profundas e
violentas transformações. Pelas variações econômicas e políticas (pós-68, AI5,
etc.). O que ira fornecer fortes bases para o surgimento de um tipo de poesia
chamada- POESIA MARGINAL. Um tipo de literatura quase que artesanal, ou seja,
onde os poetas e escritores em geral, mimeografavam seus produtos reuniam-se
para vendê-los, eles próprios, em bares, paradas de ônibus, teatros, cinemas,
boates,etc. (Mimeógrafo, era uma máquina em moda na época, hoje quase sem uso.
O Texto era datilografado em um papel especial -chamado estêncil-e duplicado -a
álcool ou a óleo. Era a copiadora daqueles tempos – uma coisa bem jurássica).
Aqui no Recife, diversos locais foram pontos e/ou sede desses produtores
culturais. Tais como- Cervejaria 7 (r. Sete de Setembro – No local funcionava
um complexo de Cervejaria, Discoteca, Livraria e Teatro. Ali ,reuniam-se muitas
pessoas dos meios culturais da cidade. Artistas Plásticos, Atores, Diretores
Teatrais, Bailarinos e notívagos em geral. Uma verdadeira vitrine, onde
diversos produtos estavam expostos – sendo a cultura o prato principal. Aqui um
registro do saudoso diretor teatral Marcos Siqueira (responsável pelo teatro
desse complexo), Bar Savoy (Av. Guararapes), A Nova Portuguesa (r. Siqueira
Campos), Bar Mustang (Av. Conde da Boa Vista), Gambrinus (Av. Marquês de
Olinda) e outros.
Ao
longo dos anos 70, um certo tipo de produção poética ficou conhecida como
poesia marginal. Esta produção surge exatamente na virada dos anos 60/70 e,
certamente, traz as marcas deste período.(1)
No seu artigo publicado na revista Folhetim, Carlos Alberto
Messeder Pereira faz um balanço da Poesia Marginal, bem especulativo. Nesse
contexto, Moisés Monteiro de Melo Neto aparecia timidamente entre outros jovens
intelectuais do Recife. Entre outros, estava com ele, nessa produção
lítero-marginal, Manoel Constantino e Rejane Leandro – uma de suas maiores amigas
e dona de duas famosas boates na zona sul da cidade. A Boate Status, por exemplo, era soberana na
década de 70.
No espaço entre os seus dentes
restos de almoço
vários lobos foram espalhados
quero te contar como foi-
eles foram soltos com a boca cheia de fome
todos os lobos, eles comeram meus olhos
Eu os vi
chegar
dancei e cantei junto do fogo
vi febre nos olhos deles
nos olhos calmos que tinham.
E sabia deles, pois os pressenti sem direção
todos os lobos, eles comeram os meus olhos
atravessaram apressados os campos que
rodeavam minha casa
comeram meus frutos verdes
minhas flores na varanda
sonhos da juventude...
todos os lobos, eles comeram meus olhos
O poema acima (“Todos os Lobos”) circulou pelo Recife, de
bar em bar, sendo vendido juntamente com as produções de outros escritores.
Este mesmo poema, de Moisés Monteiro de Melo Neto, seria publicado, em
28.03.80, no Jornal do Commercio, Caderno C, p. 2).
Nestas produções, marginais, tudo era permitido. E a literatura,
assim distribuída, aparecia nos mais inóspitos lugares. Como se diria no bom
português matuto da zona da Mata de Pernambuco- da fábrica ao consumidor. E
assim, estava a cultura, sempre entre todas as camadas sociais, pois havia uma
gama infindável de posicionamentos nos escritos e que com isso chegavam a
agradar, se não a gregos e troianos, a um certo número de pessoas. Desde o mais
simples poema de amor ao mais enraivecido poema revolucionário. Havia, como se
pode dizer, temas para todos os gostos. No entanto, esse tipo de produção
caracterizava-se pela marginalidade também nos temas escolhidos.
Para os jovens recifenses, literatos de então, era fácil
encontrar nos diversos assuntos contemporâneos, os temas para seus escritos.
Aí, reunindo tudo isso. Mexendo e (re) mexendo mais, esse
agitado caldeirão, em efervescência constante, ingressava-se nos anos 80. Novas
e fortes mudanças permeavam a década. Havia um grande desequilíbrio entre o
político e o econômico, o que iria implicar em mudanças na cultura também.
Criação de órgãos públicos de apoio à Cultura (anos 70), a queda do AI5,
abertura política, o retorno dos exilados, eleições diretas, etc.
E a nossa Cultura Regional, geograficamente falando, vinha
de fortes correntes anteriores- Movimento Tropicalista (Salvador/60) e
Movimento Armorial (Recife/70).
Moisés Monteiro de Melo Neto fazia parte de um grupo teatral
(Ilusionistas), formado por jovens que comungavam do mesmo pensamento. Além dos
componentes fixos do grupo (Henrique Amaral, Mísia Coutinho, Paulo Barros,
Augusta Ferraz, Simone Figueiredo, Rivaldo Casado, Buarque de Aquino, Beto
Vieira, Adeilson Amorim – este desenvolvendo um trabalho fotográfico com o
grupo -, entre outros), diversos artistas tiveram uma passagem marcante pela
trupe (Vladmir Combre de Senna, Fátima Barreto, Ivonete Melo – esta com suas
experiências “Vivencialescas”).
Não havia “gurus” no grupo. Todos tinham os mesmos direitos
e deveres. Baseavam-se no que liam. E liam muito. Antes de tudo tiveram por
base a literatura universal. Pesquisaram todas as formas teatrais do mundo.
Estudaram diversas obras e eram seus conhecedores soberanos.
Que jovens se entregavam à Cultura e suas formas e suas
origens, num engendrado de estudos e críticas? Pouquíssimos!
Esse jovem, Moisés Monteiro de Melo Neto, alvo da presente
análise, buscava juntamente como os demais componentes do grupo, desdobrar a
essência das obras (dos gregos, de Goethe, Cervantes, Shakespeare, O´Neil,
Shaw, Ionesco, Becket, Nélson Rodrigues, Plínio Marcos, Artaud, entre outros.)
e nela se aprofundar. Buscavam não somente a análise crítica, do ponto de vista
cultural, mas também o posicionamento sócio-político da obra, em sua cronologia
real.
Eram elitistas, culturalmente falando. Para um “papo” com os
integrantes do grupo, por exemplo, tinha-se que no mínimo entender do
Expressionismo Alemão.
Procuravam viajar
para se inteirar das novidades nos campos artísticos. Principalmente no eixo
Rio-São Paulo. No entanto, muitas vezes iam ao exterior em busca dessas
informações (eram, alguns, bem abastados de família). E nessas andanças viravam
o Brasil de ponta a ponta, de festival em festival, na procura das novas
tendências. Não se prendiam apenas às artes cênicas, mas a todo o universo
artístico (artes plásticas, arquitetura, música, etc.)
No fim da década de 70, mas precisamente em maio de 78,
surgia em São Paulo o grupo Viajou Sem Passaporte, cuja proposta era bem
irreverente. Quebrava com os signos e códigos sagrados do teatro ao rompes, em
primeira instância a barreira palco-platéia. Ao ler matéria publicada pelo
grupo, em entrevista/depoimento à revista Arte em Revista, evidencia-se a
turbulência artística da época. O Brasil era um imenso turbilhão, onde todas
tendências se manifestavam e o universo de variedades era bastante vasto.
O grupo Viajou Sem Passaporte tinha algo em comum com as
propostas dos Ilusionistas. Ambos tinham raízes no mesmo chão. Ou seja, as
influências evidentes naqueles grupos, podem também servir em Moisés Monteiro
de Melo Neto-
Nesse processo, a gente foi descobrindo, em relação ao
teatro, que praticamente quase tudo é
dispensável l, com exceção do próprio corpo. Fomos nos despojando de tudo.
Sentimos que texto de dramaturgo bom era uma aprendizagem constante. pesquisamos
muito sobre iluminação e trilha sonora. Teatro não tem a menor necessidade de
ter que transmitir idéias... (2)
Moisés Monteiro de
Melo Neto viajou bastante pelo Brasil, pela América do Sul, visitou o Grupo El
Galpon (convivendo por quatro dias em Montevidéu com os integrantes do grupo).
Um grupo com tendências pós-modernas e que viria a lhe mostrar muita
versatilidade na montagem de três textos de Tchekov.
Muito me impressionou o trabalho deste grupo.Suas
técnicas.Por exemplo- afogamento de uma pessoa em cena e as soluções
encontradas foram muito marcantes. Sempre fui fascinado por soluções cênicas,
vê-las me encantou. Exemplo- um cadáver boiando numa piscina na montagem do
musical Sunset Boulevard. Ou então as soluções de Gerald Thomas na sua montagem
da Ópera O Navio Fantasma, de Wagner, que também vi, e jamais esquecerei no
Teatro Municipal do Rio de Janeiro, os incessantes minutos de vaia, que mais
pareciam horas, e que o Thomas recebeu nos agradecimentos, entusiasmado e
rindo, pela polêmica lançada. Antes pela mídia e tendo seu ápice naquele
momento. Isso me remeteu de volta ao grupo (A Ilusionistas), era um jogo
parecido que tínhamos aqui. (3)
Aqui no Recife, o encenador Carlos Bartolomeu, com a
montagem da peça A Mais Forte, de August Strindberg, deu várias referências ao
grupo, que se identificava com os códigos daquela encenação. A rápida solução
encontrada pelo diretor, o atraía. Com o mínimo de elementos, encontravam-se as
soluções rapidamente. Esse era o tipo de encenação encaixado nos moldes dos
seus ditames. Com a encenação de o Arquiteto e o Imperador da Assíria, Arrabal,
também pelo diretor Carlos Bartolomeu, viu Moisés Monteiro de Melo Neto, quão
difícil era agradar o público notívago.
Vaias e pedras de gelo, poderiam facilmente substituir
risadas e aplausos, como foi essa produção escorraçada da Boate Misty, numa
total falta de respeito aos artistas envolvidos, dentre os quais a grande
Magdale Alves (4).
Disse-me isso, Moisés Monteiro de Melo Neto, em um comovente
depoimento, na sua residência no Janga.
Havia uma certa conotação de melancolia, saudosismo
(talvez), no seu falar- a gente está chegando ao caos...(5). O mesmo já se
notava no Tropicalismo de Jomard Muniz de Britto.(6) Não se trata aqui de um
saudosismo infectado na miséria da vida. Mas uma saudade do que não existe. Uma
saudade que põe a alma em dúvida e com isso a excita à criação, rompendo com
todos os tratados pré-estabelecidos e lança o homem, qual pássaro num mundo
desconhecido e povoado de abutres impregnados da outra saudade (saudade
doença), maldade.
Na sua densidade, a vida individual e coletiva é pensada a
partir da idéia de um amanhã que deverá existir e que justificará
retrospectivamente, o que tiver sido feito para se chegar até esse momento
(...) A pós-modernidade marca-se por uma atenção maior com o presente e um
desejo de viver intensamente o momento agora e aqui. (7)
Representava então, aquela trupe, algo de novo, de
inusitado, para a sociedade local. E lançar no mercado com algo novo, fora dos
padrões, era um pouco arriscado. Os anos 80 viam nascer uma forma alternativa
de representação teatral. Surgir a busca por novos espaços. A saída dos palcos
convencionais, sua intenção era tirar o teatro dos palcos, para bares, boates
(8). E o que seria isso então? Em que forma (ou fôrma?) estariam colocados?
Eles, da Ilusionistas, não gostariam se quer que isso fosse assim tratado.
... em teatro será o abandono do lugar fixo de representação
(reapresentação, repetidas) e sua substituição pelo lugar incerto da
apresentação de uma cena, instaurada e não repetidora. (9)
Com a entrada de Vladimir Combre Senna, no grupo, viu-se a
necessidade de trazer textos sobre improvisar (Escola Alemã), como o saber
viver e zombar de quem é idiota. Era necessário dizer coisas que enlouquecessem
as pessoas. Diz Moisés Monteiro de Melo Neto.
Em tudo isso havia um presenteísmo muito forte. Um desejo de
viver intensamente o momento. E isto é uma marca dentro da pós-modernidade.
Nas suas viagens pelos festivais (nacionais/internacionais),
buscavam debater o fazer teatral. Contratavam professores locais e de outros
estados para ministrar cursos para os integrantes do grupo, aberto ao público em geral. Uma vez que fazia parte de suas filosofias, literaturizar
o público, a população como um todo (Utopia?). E com isso, tinham sempre novas
informações sobre tudo que ocorria no mundo cultural.
A ilusionistas produziu em teatro- “A Noite dos Assassinos”
(do cubano José Triana – Teatro Joaquim Cardoso/84), “Punhal (de Henrique
Amaral no T.J.C/85) “Cleópatra”, para um Festival de Humor em 1986, no Apolo e
outra peça neste festival da Prefeitura do Recife- “O Desobumbrar da Ambunda”
encenação de Vládmir Combre. “Draculin e o Circo no Espaço” (de Moisés Monteiro
de Melo Neto no Teatro Apolo Espetáculo Infantil/85), “Um Certo Delmiro Gouveia”
(de Moisés no Teatro de Santa Isabel/85 um musical), em 1987 Henrique Amaral
encena “Percepção” no Teatro do SESC, “Hamlet” de Moisés e Ricardo Monteiro
(Teatro Valdemar de Oliveira com Moisés no papel Título em 1988). “Urânia” (de
Augusta Ferraz no mesmo T.V.O.), “O Horror em Pasárgada” (de Moisés baseado no
livro de Mary Shelley, “Frankenstein” – Teatro José Carlos Borges/89), “A Maior
Bagunça de Todos os Tempos” de Moisés Monteiro de Melo Neto direção de Buarque
de Aquino, este último também ilusionista, encenou esta produção, a penúltima
do grupo que fechou as cortinas com “La Cumparsita” uma adaptação do romance de
Manuel Puig “Sangue de Amor Correspondido”, numa montagem que tinha no elenco
Ivonete Melo, Simone Figueiredo, Black Escobar e Geovane Magalhães. Era o ano
de 1991 e havia um horizonte, onde novos ideais acenavam risonhos e
convidativos.
Seu humor cáustico, marcado por profunda ironia, talvez não
seja apreciado pelos críticos recifenses. A Liberdade com que satirizou
“Faustus” a obra do imortal Goethe, rebatizando-a de “Faustina” e exibindo-a na
Boate Misty, rendeu-lhe mais ressalvas do que elogios por partes dos que
analisam os espetáculos teatrais (...) Denominando-se um intelectual, Moisés
Monteiro de Melo Neto, diz que é muito criticado e mal compreendido na sua
intenção de tirar o teatro do palco e introduzi-lo, também, em bares e boates.
(10)
Assim versava na época, Valdi Coutinho um jornalista do
Diário de Pernambuco, sobre a obra de Moisés Monteiro de Melo Neto. Entre
outros textos, Moisés Monteiro de Melo Neto produziu e presenteou “os seus
públicos”, com peças de gêneros diversos nos bares do Recife. Entre outros-
Depois do Escuro – nome sugestivo, para a marginália -. Onde muitos se reuniam,
o mundo letrado dos anos 80. Era um ponto de encontro também dos Ilusionistas.
Onde debatiam, entre um chope e outro, com os intelectuais a cultura em voga. E
onde nasciam, das discussões, as inspirações para novos textos. Cujo público
certo ao comparecer a um espetáculo já aguardava o próximo. Daí a velocidade,
pós-modernista, da criação dos textos-
“O QUE TERIA ACONTECIDO COM BETTE DAVIS?” e “SHAKESPEARE
ACORRENTEADO” falam de traição, “EVITA-ME À CUBANA” – fala da decadência de
Cuba, na década de 80 – numa análise do autor. “PRAZERES DA REVOLUÇÃO” – uma
crítica ao governo militar no Brasil, em sua fase terminal (a queda do AI5, por
exemplo). “O BOLO” – uma estória intrigante, contando o casamento entre
intelectuais e o novo pensamento pós-governo militar. “COM A VÍBORA NO SEIO” –
a impossibilidade de amor entre dois homens, marcada pela diferença de idades e
o preconceito. “VERDADES E MENTIRAS” – relata os últimos dias de Tancredo Neves
(presidente “eleito” do Brasil. “Eleito” mas não empossado, por motivo de
morte. Assume Sarney) sob a perspectiva de um casal de artistas desiludidos e
fracassados.
Ora seus textos, ora de Henrique Amaral, falavam de um “aqui
e agora”, tão cantado no pós-modernismo. (...) tudo para no instante em que
nada perece – tudo é criança, não há morte, nem envelhecimento e nem dor.
Apenas paixão. (11)
As temáticas dos textos eram as mais diversas possíveis.
Sempre temas que atravessavam o cotidiano, a década, os anos 80. O público, ou
“os públicos”, era (m) notívago (s). E
era formado pela identificação direta entre platéia e palco. Já que não
existia separação. Quantas vezes o palco não foi a própria platéia?
Em seu apartamento no Janga/ Paulista, Moisés Monteiro de
Melo Neto findou-me seu depoimento dizendo-
Nos fins da década de 80, a fórmula estava exausta. Aí veio
o primeiro golpe precisamente em 88, quando a Ilusionistas perde suas
características e junta-se a outros produtores culturais (profissionais do
ramo) que eram alheios à ideologia do grupo. Como era bom ser jovem e fazer
teatro. Tínhamos, também, por vezes, inspirações locais como os já citados e “O
Extrato de Formosura (Eduardo Maia). Mas a lembrança forte da abertura dos anos
80 com “O Guarani com Coca-Cola”, uma criação coletiva, “Muito Pelo Contrário”
(João Falcão). A morte de Marcos Siqueira – e o seu teatro político. O próprio
Vivencial de Guilherme Coelho, de Suzana Costa, de Ivonete Melo e de Américo
Barreto. (12)
Durante cinco anos Moisés Monteiro de Melo Neto abandonou as
produções teatrais. Passou uma temporada na Europa e nos Estados Unidos. “LA
CUMPARSITA” (1991), marcou um hiato no trabalho da Ilusionistas. Aproveitou para concluir o
curso de Letras e a pós-graduação em Literatura Brasileira.
Ele finaliza dizendo- Os primeiros anos da Ilusionistas
foram muito experimentais.Uma época que passou e pronto.Aquilo tudo era muito
ingênuo. Tínhamos liberdade de dizer o que queríamos.E dissemos!
No ano de 1982, Moisés havia escrito o livro “A NOITE DOS
SENTIMENTAIS”, que A Ilusionistas produziu a editoração em abril de 1983. Uma
ficção urbana, desenvolvida dentro de um apartamento que para o autor simboliza
a cidade (Recife), seus habitantes e conflitos.
A fórmula, como disse o próprio Moisés Monteiro de Melo Neto,
estava esgotada mesmo, ou não tinha bastante profundidade, fundamentação, para
sustentar-se? Não houve semente daquelas árvores ou os frutos não vingaram?Foi
um geração que produziu José Manuel, João Falcão, Henrique Amaral, Adriano
Marcena, Luis Felipe Botelho e outros que hoje seguem caminhos tão diversos.
Moisés Monteiro de Melo Neto hoje é professor de literatura,
lecionando nas redes privada e dirigindo um Núcleo de Estudo de Línguas na rede
estadual. Escreve regularmente para jornais e revistas.
Outros do grupo estão no Japão (Fátima Barreto), na França
(Mozart Guerra), na Alemanha (Vladmir Combre de Senna), Henrique Amaral é
jornalista, Paulo Barros em São Paulo (cinema), Augusta Ferraz fundou outro
grupo teatral, Buarque de Aquino é professor, Rivaldo Casado trabalha com a
Unesco, Simone Figueiredo dirige órgãos público, Mísia Coutinho é produtora
cultural. Mas a Ilusionistas está mais viva do que nunca e cheia de projetos.
Para 1999 está marcado o retorno da Ilusionistas com uma grande produção
chamada “Para um Amor no Recife” que já teve o projeto aprovado pela Lei de
Incentivo à Cultura.
Eu vivo num tempo sem sol.
Uma linguagem sem malícia é sinal de estupidez,
Uma testa sem rugas é sinal de indiferença.
Aquele que ri ainda não recebeu a terrível notícia (13)
Recife, agosto de
1997.
Notas-
(1) – Carlos Alberto Messeder Pereira. In Folha de São
Paulo. Poesia Marginal Um balanço
Provisório. Folhetim. Domingo, 28.02.82. P. 6.
(2) – In Arte Em
Revista. Depoimento/entrevista c/Raghy do Grupo Viajou Sem Passaporte. “Ora
Pombas!” nº 8. São Paulo, 1982. Pp. 116 a 199.
(3) – Depoimento/entrevista
de Moisés Monteiro de Melo Neto a Albemar Araújo em out/97.
(4) – idem
(5) – idem
(6) – Jomard Muniz
de Britto. Palestra gravada na FUNDAJ. Pernambuco. 1997.
(7) – Teixeira
Coelho. Dicionário Crítico de Política Cultural. Cultura e Imaginário, São
Paulo, Iluminaras/FAFESP, 1997. P. 64.
(8) – In Diário de
Pernambuco. Cad. Viver. Exponha-se. Pernambuco. Sábado, 15.11.86, P. 64.
(9) – op. Cit. Nota
7.
(10) – op. Cit. Nota
8.
(11) – Valdi Coutinho
In Diário de Pernambuco. Caderno Viver. Capa. Quinta-feira, 21.08.80.
(12) – Depoimento de Moisés
Monteiro de Melo Neto a Albemar Araújo, em out/97.
(13) – Berthold Brecht
In Breacht Vida e Obra. Fernando Peixoto. Paz e Perra. Rio de Janeiro, 1974. P.
347.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS-
COELHO, Teixeira. Dicionário de Política Cultural. Cultura e
Imaginária, São Paulo, Iluminaras/FAPESP, 1997.
HUBERMAN, Leo. História da Riqueza do Homem. Waltensir
Dutra. 10º, Zahar, 1974.
PEIXOTO, Fernando. Brecht Vida e Obra., José Olympio/Paz e
Terra. Rio. GB, 1974.
REVISTAS-
BURGER, Peter. In Arte em Revista, nº 7. “Pós-Moderno”, São
Paulo, CEAC/FAPESP/FUNARTE, 1983. Pp. 91 a 92.
HABERMAS, Jurgen. In Arte em Revista, nº 7. “Pós-Moderno”,
São Paulo, CEAC/FAPESP/FUNARTE, 1983. Pp. 86 a 91.
HUYSSEN, Andréas. In Arte em Revista, nº 7. “Pós-Moderno”,
São Paulo, CEAC/FAPESP/FUNARTE, 1983. Pp. 92 a 94.
LYOTARD, Jean-François. In Arte em Revista, nº 7.
“Pós-Moderno”, São Paulo, CEAC/FAPESP/FUNARTE, 1983. Pp. 94 a 96.
PORTOGHESE, Paolo. In Arte em Revista, nº 7. “Pós-Moderno”,
São Paulo, CEAC/FAPESP/FUNARTE, 1983. P. 96.
A Presidente da Fundação de Cultura Cidade do Recife, Simone
Figueiredo, fala sobre as peças teatrais de Moisés Monteiro de Melo Neto
Escrever
sobre a produção literária de Moisés Monteiro de Melo Neto é um prazer
acompanhado de uma responsabilidade muito grande, por ter acompanhado e
participado muito diretamente do desenvolvimento e da pesquisa proposta pelo
autor nos últimos 17 anos.
Conheci
Moisés nos anos 80, especificamente em 85. O autor lançava-se então como
dramaturgo com o texto “Verdades e Mentiras” – que como ele bem define-
“arma-se o conflito comédia”, o escritor rompe a obediência com a fatalidade
que nada tem de Deus e tudo dos homens. Imitar- intriga engenhosa, temática
superficial e aparentemente inocente em torno do amor e dinheiro, teatro-
realidade além do real, em nenhum momento atinge dimensão mais profunda não
perde nunca a agilidade, um painel de minha época escrito com simplicidade, mas
justa eficácia no senso crítico, visão social, brincadeiras leves e bem
construídas, algo romântico, sátira política, um pouco dos anos 60/70, a
condição humana diante do mito, do artista internacional.”
Lembrando a
definição de antropofagia – linguagem literária ou estética de cunho
nacionalista. Essa linguagem assume a forma inicial de uma poética, com a
publicação do manifesto antropófago em 1928. A poética antropofágica de Oswald
de Andrade reivindica o estabelecimento de um código literário específico que
incorpore as categorias de uma consciência arcaica tipicamente brasileira,
surgida numa hipotética idade de ouro. Essas categorias, que inspirariam a nova
linguagem literária, incluem formas do surreal e do irracional. Os escritores
antropófagos romperiam, assim, com o discurso linear. A nova linguagem
“devoraria” os modelos literários estrangeiros, em vez de imitá-los. Além
disso, a linguagem antropofágica atacaria os sufocantes códigos sociais, morais
e literários, por meio da paródia e do sarcasmo.
“O Rei da Vela”, peça de Oswald de Andrade
publicada em 1937, estende a metáfora antropofágica à linguagem teatral e
fortalece o seu componente político.
A metáfora
antropofágica é revivida em 1967 com a montagem do rei da vela. O diretor José
Celso Martinez percebe que a linguagem da antropofagia é uma resposta
apropriada às circunstâncias culturais, políticas e econômicas dos anos 60. A
montagem de “O Rei da Vela” constitui uma versão atualizada da deglutição antropofágica
dos mais recentes modelos teatrais estrangeiros que então predominava no teatro
brasileiro. O Rei lança as bases de um modo brasileiro de fazer teatro com a
incorporação de formas culturais populares e folclóricas e a metáfora, em sua
transmutação última, passa a chamar-se Tropicália.
No Recife,
nos anos 70 assistimos ao surgimento do “Vivencial Diversiones”, nome de uma
casa de shows e variedades fundada por Guilherme Coelho e Beto Diniz. O grupo
utilizava-se do escracho e do deboche para romper, valores e falar sobre sexo,
valores éticos e estéticos e política.
Segundo
Paulo Vieira “O Vivencial Diversiones tangenciava qualquer discurso que fosse
engajado, construindo, com a sua prática e a seu modo, um diálogo com a
urbanidade, ponto de convergência para onde flui, afinal, aquilo que é chamado
de contemporaneidade.”
Traçando-se
um paralelo entre o que foi exposto e a obra do dramaturgo, concluímos que
Moisés é um autor sintonizado com a sua época, “antenado”.
Através dos
seus textos, Moisés critica a “política cultural” estabelecida de maneira
irônica e inteligente, muitas vezes utilizando-se de clássicos da dramaturgia
universal.
Faustina –
Adaptação do Fausto de Goethe é uma comédia escrita e produzida em 1986 que
tenta desarticular um pensamento ditatorial católico, ateu e protestante, onde
o Mefisto é o demônio, o Fausto, o Saci Pererê virado às avessas e o anjo; a
vítima do amor divino. “Se Deus existe, logo o Diabo existe” – satiriza o
autor. O espetáculo acontecia à partir da meia noite na boate Misty.
O público
identificava-se com a galhofa, com a sátira, talvez por necessidade de rir das
próprias desgraças – uma catarse coletiva.
Seguindo a
mesma tendência o autor escreve em 86, a peça “Cleópatra”; espetáculo dividido
em três partes – A primeira, uma sátira e a segunda e a terceira, tragédias –
só a primeira parte foi montada para o I Festival de Humor – promoção da PCR –
que recebeu indicações para melhor atriz, melhor autor e melhor espetáculo.
(Espetáculo, aliás, mais aplaudido pelo público).
Com
Cleópatra e Um Certo Delmiro Gouveia, também de 86 Moisés ganha respectivamente
o 1º e o 2º lugar em dramaturgia no concurso “Exponha-se” – promoção do Governo
do Estado de Pernambuco.
Criticado e
pouco compreendido na sua intenção de tirar o teatro do palco e introduzi-lo
também nos bares e boates. Os espetáculos de Moisés ocuparam espaços como- Água
de Beber, Três Por Quatro, Boate Araras, Boate Misty, entre outros. Acaba
determinando uma tendência nos anos 80 (influência do Vivencial?) –
permitindo-se através dos seus textos penetrar no absurdo – “A crítica sagaz,
mutante, definitiva, transforma sempre qualquer recente criação” – filosofa o
autor.
Uma das
suas adaptações mais ousadas foi a de Hamlet, de William Shakespeare – que Moisés
Monteiro de Melo Neto transformou em parceria com o músico Ricardo Monteiro, em
um musical Pop. Mantendo a trama básica e feita uma adaptação dos diálogos
criados pelo dramaturgo inglês, o nosso Hamlet, Pop e Tupiniquim, procurou se
distanciar o menos possível do seu original. A estória se desenrolava nos
bastidores de uma companhia teatral durante o ensaio geral do Hamlet. A partir
daí, o público passou a se integrar com toda a riqueza do texto e mensagem
shakespereanos, enriquecidos pelas canções que permeavam o desenvolvimento da
encenação, servindo não de pano de fundo, mas como elemento fundamental para a
sua compreensão. Apesar de suas poucas apresentações – o espetáculo instigou os
jovens na época (1988).
Outro texto
de Moisés baseado na obra do dramaturgo inglês foi “Shakespeare Acorrentado”
(1990) – trata-se de uma fusão de “Macbeth” e “Bem Está o que Bem Acaba”,
respectivamente uma tragédia e uma comédia.
O autor dá
colorido às páginas shakespeareanas de forma surreal e caricata. Ao invés da luta
pelo reino da escócia, luta-se pelo domínio do tráfico de drogas e dos famosos
clubes para ricaços no Recife. Moisés Monteiro de Melo Neto define seu texto
como sendo “resgate de certas idéias incutidas pelo Mestre inglês que desde seu
surgimento vem atraindo autores de todo o mundo como o canto das sereias”.
Porém nem
só de adaptações e releituras é composta a obra Produção de Moisés. Verificamos
os espetáculos “Draculin” e “A maior bagunça de todos os tempos”, ambos
direcionados para o público infanto-juvenil. O primeiro propunha um passeio
pelo espaço unindo elementos da cultura popular (o protagonista sonhava montar
um circo no espaço) com a tecnologia vigente na época. O segundo, propõe uma
discussão sobre o poder e suas relações, apesar de se tratar de um assunto
sério o tratamento que recebeu tornou o espetáculo divertido e engraçado.
Recentemente
(1999/2000) foi montado o espetáculo “Para um amor no Recife” que narra uma
história sobre amores, conflitos, sexualidade, ambiguidade e solidão de um jovem
casal recifense, dos anos 90.
Segundo o
diretor do espetáculo Carlos Bartolomeu, “o texto é um daqueles documentos que
revelarão ao futuro a narrativa de uma sociedade e suas feridas. Duro e
apaixonado- assim posso descrevê-lo”.
Ainda nos
anos 80, Moisés faz um passeio pela dança contemporânea escrevendo roteiros
para espetáculos experimentais, a convite da bailarina Beth Marinho
(Profissional Paulista de formação clássica que participou por muitos anos do
Balé Stagium da cidade de São Paulo); e do bailarino Black Escobar.
O resultado
foi a construção dos espetáculos “Comunhão” e “Orgasmo” (1987), este com trilha
sonora composta por Ricardo Monteiro que participaram do Festival de Dança
organizado pela PCR com apresentações no Teatro de Santa Isabel. A Associação
de Técnicas do Balé Clássico com a dança contemporânea foi o caminho utilizado
na criação/construção dos espetáculos.
Ousada para
a época, seguia uma tendência da dança que buscava uma linguagem universal,
utilizando-se da cultura brasileira. Foi construída uma trilha sonora
específica para as coreografias pelo músico Ricardo Monteiro que na época
trabalhava em parceria com Moisés na adaptação do clássico Hamlet – de William
Shakespeare.
Em 1989
roteiriza o espetáculo Bandido Corazon mantendo a parceria com Beth Marinho.
Escreve os
romances “A Incrível Noite” e “Michelle- corações pernambucanos”. O primeiro
foi publicado no ano de 1983 e o segundo recebeu elogios do escritor Raimundo
Carrero e será lançado em 2004. Seus poemas já foram publicados em várias
coletâneas. Em setembro lançará o livro “Notícias Americanas”, um poema épico
experimental sobre a tragédia afegã que teve início com os atentados de 11 de
setembro de 2001 nos EUA, neste poema ele desenvolve sua verve crítica sem se
preocupar com rigores acadêmicos, segundo ele é sua última fala
underground.Será?E em 2000 lança uma análise sobre o pós-modernismo e releitura
da cultura popular nas letras das músicas do fenômeno Chico Science e de outros
poetas da cena recifense dos anos 90. O livro vendeu 1000 exemplares em três
meses e teve parte da renda revertida para instituições de caridade
Concluímos
então, que Moisés é um autor inquieto, frenético, ávido pela criação. Não me
proponho a fazer uma análise crítica de sua obra, mas a dar um depoimento sobre
a necessidade de respirar, de alimentar-se de forma autofágica da arte, com
ousadia sem medo de descer aos subterrâneos da condição humana (o autor vai ao
inferno se preciso for) para construir uma obra forte, feroz, ácida, crítica purgando-se
assim e propondo uma reflexão sobre (o homem) com muito humor, ironia e acima
de tudo talento de quem domina a arte de escrever e sabe registrar a sociedade
que o cerca.
Recife, junho de 2002.
Simone Figueiredo
Atriz, arte-educadora e produtora cultural.
Moisés Monteiro de Melo Neto e seu teatro dissonante
Por Carlos Bartolomeu
Professor do Departamento de Artes Cênicas da UFPE
Recordo-me da primeira intervenção de Moisés Monteiro de
Melo Neto na cena pernambucana. A comunidade Carmelita comemorava quatrocentos
anos de sua chegada ao Brasil. O ponto alto das comemorações foi a produção do
texto de Cláudio Aguiar sobre o maior herói pernambucano e membro da ordem, o
nosso Frei Caneca. Era final dos anos setenta, início da distensão... Retornava
eu, à cidade do Recife, após minha rápida incursão ao mundo televisivo do Rio,
onde passara pela experiência de ter convivido com os instantes iniciais do fim
da rede Tupi de televisão. Encontrava-me desempregado e quis Deus dar-me a
felicidade de participar da experiência de montagem cênica sobre a vida do
frade pernambucano. Ao contrário de meus outros trabalhos como diretor, minha
volta proporcionou-me pela primeira vez na vida, trabalhar como ator
profissional. Foi lá, na épica e irônica realização de José Francisco Filho que
conheci Moisés...um adolescente ainda, figurando no meio de numeroso elenco.
Certa feita, na cena do julgamento de Frei Caneca onde eu
participava como acusador do mártir republicano e ele no papel de uma das
testemunhas, ocorreu ao ator iniciante, a idéia de mudar o registro de voz da
sua personagem, acirrando a um só tempo a tensão nos outros atores e a
comicidade latente na paródia de tribunal que realizávamos. O efeito foi
revelador da impostura histórica de nossas personagens. Risos nossos e do
público.
Cito este ocorrido, com o fito de traduzi-lo como uma
espécie de parábola sobre a época e de uma respeitosa, mas hilariante epígrafe
sobre a aparição do nosso autor!
Em um de seus exercícios teatrais, O Bolo, escrito em 1986,
uma frase é dita por uma das personagens- "Um monte de clichês, estamos
impregnados disso" , a frase revela a continuidade daquela interveniente
ação de outrora e mimetiza a cena de antes como recurso estilístico e dramático
que implícita ou explicitamente desemboca em sua literatura . Naquela época em
que fomos companheiros de palco sua intuição teatral teria feito par com a
mordacidade. Aquela sua personagem de voz estrídula, seu expediente algo
clichê, utilizando-se da cena teatral com intenção de ferir o ritmo pausado e
grandiloquente de uma encenação ou de nosso solene modo de atuar, estruturou-se
de maneira atrevida e plena de humor ao longo do tempo. Como um escopo a um só
tempo autodepreciativo e construtor
tornou-se recorrente em sua obra.
De exercícios como A Faustina, Prazeres da Revolução, O Bolo
ao precioso registro Com a Víbora no Seio, em parceria com Henrique Amaral,
passando pela revista de câmara, Cleópatra, a comédia; átimos notívagos tais
como Evita-me à Cubana e Um Tostão para Isabelita ou textos mais audaciosos
como Um Certo Delmiro Gouveia, Para um Amor no Recife ou a pop experiências no
teatro infantil, Moisés Monteiro de Melo Neto incorporou esse grito, essa
postura à cena e suas intenções.
Escrevo para ser
compreendido e revelar, só assim posso ter a crença de que faz sentido este
ato... Mas, pode ser um duplo e ilusório ponto de vista. Lembro a todos que não
sou um crítico teatral, vejo-me mais inventivo que eles- outra ilusão, talvez.
O vigente modelo de
perseguição a gênios estabelecidos, de se ir a cata do original popularizado,
da necessidade da última moda de clássicos (!) no nascedouro ou de bem
intencionados regionalistas... iluminados, frustra as possibilidades de se
deixar nascer verdadeiros criadores.
Antes de mais nada, o nascimento e o desabrochar de escritores teatrais,
deveria ser o primeiro passo. Ocasionalmente, aconteceria a colheita.
Nós, diretores, atores e críticos e mesmo o grande público,
talvez pudéssemos nos livrar da ilusão (fatal) de apenas sermos no outro, de
existirmos no estrangeiro. A verdade é que não nos visitamos com a assiduidade
necessária para o conhecimento de nós mesmos. Não nos deixamos envolver pelo
próximo, pelo nosso criativo irmão, primo, amigo...vizinho. O sujeito iniciante
que nos oferta Conversa e Poesia. Definitivamente é aí, que nossa paciência se
esvai. Corremos em retirada diante daqueles que batendo a nossa porta, nos
reconhece como capazes de sinalizarmos... Daqueles que nos oferecem a chance de
conhecermos os recortes de suas interioridades.
Porque
para maioria de nós é penosa essa aceitação?
Para maioria de nós, sujeitos normais eles podem ser tudo menos
artistas; podem até se tornar artistas. Mas, terem em si, a verdadeira chama da
criação, o desejo inesgotável do fazimento...isso nós duvidamos. No caso das
criativas mentes provincianas a proximidade não é um espaço de reconhecimento e
avaliação, antes é o lugar do desconforto diante da individualidade que se
lança corajosa.
Penso
alto e na defesa daqueles que hoje se lançam e lutam por espaço. Penso e
escrevo projetando muito daquilo que houve em mim, nos de agora. Penso em mim e
na poesia que necessita e deve ser aceita- a de Moisés Monteiro de Melo Neto.
Penso, especulo,
critico- talvez, o erro maior e que se projeta em oposição a toda tentativa de
veicularmos a diversidade no nosso teatro, é a maneira de instituirmos o
teatro, o teatro ideal que nós sonhamos. De longe... é a idéia!
É um teatro carregado de idéias vencedoras.
Para olhos normais, não adestrados, grande parte do mérito
destas idéias assume uma natural afirmação. Todavia, acredito eu, seu poder
emerge de circunstâncias geográficas, de um mérito localizado entre o Tâmisa e
o Sena, as margens do Tibre, ou evoca as ondas do Aquelôo.
O Capibaribe não conta ou, antes conta se contaminado pelo
Tietê...
Digo essas coisas todas, aceito-as como realidades de um
tempo, no intuito de colocar para outros que a escritura de Moisés Monteiro de
Melo Neto é daquelas que deveria ser visitada. Primeiro para descobri-la,
segundo para criticá-la, descartá-la ou nos deixarmos seduzir ante as suas
possibilidades de espetáculo e encenação. A obsidente memória e idiossincrasia
deste criador nos permite isso. Podemos sair de sua narrativa torcendo o
nariz. Todavia, nela há a
possibilidade de reavermos nossa imagística .Compreendemos mais o
universo da criação local, suas misérias e sonhos de constelações.
A dramaturgia de Moisés
Monteiro de Melo Neto explora e apresenta o mundo íntimo de seu autor e de sua
convivência com o mundo de nosso irrealismo teatral. Sua escritura vive disso e incorpora os
efeitos e as ações desses mundos deplorando em ambos o lado insustentável e
evanescente. A ação tateante de suas personagens retoma trejeitos e
ridicularias do entorno risível e da precariedade de nossas construções e
pretensões. Espelho quebrado, enquadra o ilusório de nossa materialidade,
delimitando o espaço tragicômico do conviver, do re/criar, gritando dissonante
por afeto, compreensão e palco.
Derby, 3 de abril de 2002
Carlos Bartolomeu é professor de teatro na UFPE
Moisés Neto estuda a obra de Chico
Science e mergulha na Cena Recifense
/ Pernambucana na virada do terceiro milênio destacando a relação entre o
popular e o erudito, o negro e o índio, a metrópole e o mangue.
Do
caranguejo globalizado ao Maracatu atômico, o Projeto Mangue buscou a
universalização das nossas raízes, fenômeno da década de noventa a mostrar que
ainda é viável defender-se um ideal em Pernambuco, levantar a auto-estima desse
povo através do artista morto em 1997 aos trinta e um anos em completa
resistência à pasmaceira e despersonalização em um Nordeste que desde
a Geografia da Fome de Josué de Castro exibe os seus
moradores de palafitas a comer sururu, da “lama ao caos”, alternativa contra o
marasmo cuja evolução e principais características aqui surgem expressas por
Moisés, de modo dinâmico e de agradável leitura, obra primeira a merecer
atenção do público especializado.
Lucila Nogueira, escritora, pesquisadora, que foi professora do PPG Letras UFPE, fal sobre o livro que Moisés lançiou sobre chico science: Moisés Neto estuda a obra de Chico
Science e mergulha na Cena Recifense
/ Pernambucana na virada do terceiro milênio destacando a relação entre o
popular e o erudito, o negro e o índio, a metrópole e o mangue.
Do
caranguejo globalizado ao Maracatu atômico, o Projeto Mangue buscou a
universalização das nossas raízes, fenômeno da década de noventa a mostrar que
ainda é viável defender-se um ideal em Pernambuco, levantar a auto-estima desse
povo através do artista morto em 1997 aos trinta e um anos em completa
resistência à pasmaceira e despersonalização em um Nordeste que desde
a Geografia da Fome de Josué de Castro exibe os seus
moradores de palafitas a comer sururu, da “lama ao caos”, alternativa contra o
marasmo cuja evolução e principais características aqui surgem expressas por
Moisés, de modo dinâmico e de agradável leitura, obra primeira a merecer
atenção do público especializado.
Lucila Nogueira, PPG Letras UFPE e Moisés Neto
POR QUE VIVER DE LITERATURA?
por Moisés
Monteiro de Melo Neto
Nunca
encontrei uma pessoa totalmente chata, sempre procurei algo que fosse
interessante em alguém. É mais ou menos assim a minha vontade de escrever e
tornar público o que eu escrevo.
Sempre amei
o Recife além de toda repressão contida neste lugar e sempre quis expressar a
minha opinião sobre o que é viver aqui, como escritor, como intelectual, etc..
Não há Moisés em mim- escrevo para me inventar.
Desde pequeno me ensinaram a rezar e eu rezo sempre. Pela
manhã e à noite. Procuro cumprir meus compromissos de modo quase obsessivo.
Como autor uso a minha literatura para unir as letras e a
civilização em seus detalhes, sua psicologia.
É algo similar a MENTEPSICOSE = transmigração de mentes,
viver em outros corpos (tentando unir as coisas numa espécie de café com leite)
ou como numa velha e doce canção de amor ou paródia, drama musical, monólogo.
Começo às vezes, paradoxalmente, com uma narrativa pré-verbal- grunhidos,
suspiros, gritos, sussurros, etc. ser escritor é ser pai e mãe. Em meio aos
meus trocadilhos dantescos, fecho os olhos e amo a arte de escrever que
transforma a vida em metáforas (políticas?).
Em Recife é difícil escrever porque numa conversa de bar
você pode jogar um livro fora. Aqui se fala demais e muito rápido.
Busco soluções para os enigmas da vida, também vou criando
mais alguns usando para isso as variações possíveis em nossa linguagem (erudita
versus popular).
Na ilha do Recife Antigo penso- se nossa se acabasse eu
gostaria que no futuro alguém a reinventasse a partir do modo como nós, os
escritores, seus narradores, a retratamos. Somos o oposto da vida real, eis a
literatura transcodificando os impulsos humanos (tão difíceis de se transformar
em palavras exatas). Eu gostaria de buscar nas onomatopéias, prosopopéia e
outras figuras de linguagem tudo que não conseguimos amar ou odiar na vida
desta cidade, desta humanidade incorrigível.
Eu sempre quis criar enigmas e charadas sobre o Recife- este
lugar no limite da ebulição, cheio de pontes, cachaça, tapiocas, pamonhas,
milho cozido, acarajé, arrumadinhos, caldo de carne, amores, interesses,
cultura, veneno peculiar, amores e tudo mais. Colocar tudo em versos de sangue
e risos. Em prosa excitante. É muito difícil chegar até a arqueologia deste meu
experimento, dessas barricadas do meu desejo, desta minha ambição, recusa,
reclusão, liberdade (?).
Escrever é dar primazia ao pensamento sobre a ação, ao macro
sobre o micro- Diacronia (a evolução no tempo – fenômenos culturais, sociais,
linguísticos, etc, no tempo) e Sincronia (isolar o fenômeno num certo tempo uma
época que em retrato). A vida do recifense que eu sou? Ora, eu busco retratá-la não de modo evolutivo nos
meus textos, não de forma muito lógica. Meus textos são sincrônicos (existem em
si mesmos) e não uso da diacronia (evolui com o tempo).
Durante minha juventude eu ainda tentei romper com o
moralismo e a ética de forma ingênua. Não é que eu tenha evoluído, agora,
simplesmente vejo que é tentando agradar que devemos solapar nossos próprios
valores. O aspecto principal da minha escrita foi defender a ingenuidade frente
à malícia intelectual e primitiva dos meus conterrâneos refletida na minha
cidade. Já viajei por muitos lugares do mundo em busca de contrastes que
refletissem a minha tese. Terminei por quase não acreditar que houvesse uma
mudança no mundo- haveria uma troca de pensadores no poder, mas haveria sempre
a necessidade de limites, como esses tão necessários na educação das nossas
crianças.
Vi logo que a liberdade só se justifica pelo jogo arriscado
cuja regra principal é o tudo ou nada. Percebi na minha obra que nela apenas
está refletida a urgência a ditar a matéria dos meus passos. Nunca fui contra o
capital, apenas não suposto muito bem os seus, digamos assim, sintomas.
Houve em mim sempre a alegria de pensar, de criar e de
oferecer meus textos escolhendo a mídia a meu alcance. Caiu sobre mim o peso da
disciplina barrando um agir livre, sufocava minha irreverente revolta, mas
dentro de mim eu sempre soube que tinha razão. Eu sempre duvidei um pouco do
que alguns rotulam como “certo” ou “razão”. Eis o eixo-comum que atravessa
minha diversidade temática (discursiva e extradiscursiva)- a diferença, e não a
evolução, marca a sociedade.
O que é o saber verdadeiro? Como esta “verdade” está
vinculada ao poder (político, econômico, social, afetivo, sexual, etc.)?
Devemos tentar entender nossa cidade não apenas pelo conhecimento dividido das
épocas passadas, o que o Recife foi, mas sim pelo que já não somos ou pelo que
poderemos ser.
Eu quis interrogar o espaço (mítico e real) que nos cerca.
Meus textos são, todos eles, como barcos- espaços flutuantes, fechados em si
mesmos e lançados na imensidão do mar. Reflexos, como este agora o é, dos
outros textos que leio e, ouço e sinto no mundo.
Abracei a literatura. A linguagem para mim funciona como o
espaço do possível de ruptura com a noção primitiva do tempo. A linguagem
supera o tempo (embora aconteça dentro dele)- realizando, e desrealizando,
busquei nas palavras a presença dos seres. A literatura como sendo um “outro”
lugar. O acesso a um mundo onde se podia enxergar o que não deveria ser, às
vezes, dito- uma experiência extrema de pensamento.
Reinventando as palavras, flutuando sobre o sentido,
penetrar espaços seus habitar neles, sem se fixar num lugar, sem estar em terra
firme. Num navio fantasma, eu, operário de carne e osso no comando rumo ao
horizonte da compreensão, do ser enquanto ser múltiplo, plural, mutante.
O Recife nunca foi, tanto quanto eu, essencialmente
positivista. A rede de significações tecida nesta cidade, feita de luta e
resistência, feita num período depois daoIluminismo francês mas poderia muito
bem ser pré-cabralino em seu processo de transformação dos seus habitantes em
sujeitos.
Temo que ao ansiar por uma nova mecânica de poder eu tenha
reforçado ao mesmo tempo certos valores antigos que se embutiram, de alguma
forma, às minhas estratégias de composição e divulgação de textos. Queria que a
mídia não adestrasse os recifenses do modo que vem acontecendo de forma tão
insistente. Aqui a guerra não é o contrário da paz quando se trata, por assim
dizer, de literatura- a história de uns não é mais a história de todos.
É uma anti-história o que se faz no Recife e a minha
literatura reflete, ou busca refletir um shakespeariano ser e não-ser.
Moisés
Monteiro de Melo Neto
Recife, julho de 2004, em entrevista a Leidson Ferraz
Fazer teatro em Recife sempre foi tarefa quase impossível,
principalmente pela resistência - histórica - do empresariado em apostar na
produção local. Por essa razão, a atriz Augusta Ferraz e Moisés Monteiro de
Melo Neto fundaram em 1983 a Ilusionistas Corporação Artística, a partir
do espetáculo infantil "Mas... A Verdadeira História de Chapeuzinho
Vermelho Não Foi Bem Assim", escrito e dirigido por Augusta Ferraz. Outros
profissionais aderiram pouco tempo depois: os atores Fátima Barreto, Paulo
Barros, Vladmir Combre de Sena, Rivaldo Casado, Buarque de Aquino, Mísia
Coutinho, Simone Figueiredo e o também autor Henrique Amaral; Zuleima Ferraz,
mãe de Augusta e responsável pela criação dos figurinos de parte das produções
do grupo; o cenógrafo Mozart Guerra e o fotógrafo Adeilson Amorim.
Em 1986-87, entraram Beto Vieira (que ficou pouco tempo), Mísia Coutinho e
Miriam Pimentel. No ano seguinte, Augusta e Zuleima Ferraz desligaram-se da
corporativa. Ao longo da década de 90, parte dos membros da Ilusionistas deixou
a cidade e até mesmo o país, como Fátima Barreto, Paulo Barros, Mozart Guerra e
Vladmir Combre de Sena. Hoje, a Ilusionistas é composta apenas por Moisés
Monteiro de Melo Neto e Simone Figueiredo
Manifesto Ilusionista
Tem gente que diz que o teatro que a gente tenta é um sonho,
uma utopia de transformação disso tudo que está aí e a gente já sabe que não
vai levar a lugar nenhum.
O sonho não pode parar de rolar: Drama, poesia, música
,dança , mímica, qualquer que seja a ferramenta do momento, nossa arte estará
ali. Palco italiano, caixa de papelão na praça. Crítica sagaz, mutante. O poder
da criação.
Sabem quem é Erwin Piscator ? Elia
Kazan ?
Se sonhamos ao som do trombone do Asdrúbal (Asdrúbal Trouxe
o Trombone-"Trate-me Leão" ) ou se incorporamos experiências do Globe
Theatre ao revisar o texto de Hamlet, ao adaptá-lo à nossa linguagem dos anos
80 . Em que rio atirar Ofélia? Com que cortina esconder o rato Polônio? .
"Alegres coveiros ", sentencia o agonizante Kremlin (URSS).
Há 25 anos aconteceu o "Movimento Popular de
Cultura" aqui em Pernambuco. As propostas agora são outras. Estamos
descobrindo uma nova forma de fazer teatro.
Se não conhece nosso teatro , vide a bula.
Muitas vezes ambientamos nossos espetáculos de maneira pouco
convencional, como foi o caso de "A Noite dos Assassinos" (do cubano
José Triana), para teatro de arena e "Chapeuzinho Vermelho", onde
utilizávamos a natureza como parte do cenário.
Satirizar o homem ou martirizá-lo ?
Produção alternativa significa que as quatro paredes da
cena são móveis. Queremos derrubá-las.
Viva o gozo da liberdade sem fronteiras.
Abaixo a burocracia cênica .
O prazer de criar nos uniu.
Depois de usar velhas teorias temos que buscar novas. Buscar
novos caminhos praticando teatro.
Pouco se importar com a crítica engajada ou alienada.
A literatura da seca não nos atinge. Somos urbanos. O que
não impede que nossos atores participem de musicais populares, como "Viva
o Cordão Encarnado " de Luiz Marinho, direção de Luís Mendonça - o
primeiro Cristo de Nova Jerusalém e que lançou Elba Ramalho e Tânia Alves,
participou do Movimento Popular ao lado de Hermilo e Ariano.
Colocar a favela em cena no espetáculo "Prazeres da
Revolução" ou jogar uma burguesa perua chique em Cuba ("Evita- me à
Cubana"), jogar o "Fausto" numa boate.
Incendiar a lira ! Incendiar a lira em cena!
Dar asas aos dramas psicológicos e sátiras ferozes escritos
por nosso ilusionista Henrique Amaral , como por exemplo "Punhal",
dirigido pelo diretor Carlos Carvalho, ou "Percepção", montado no
teatro do SESC de Santo Amaro com direção do próprio Henrique.
Encarar o absurdo.
Dissecar o que une os casais, o que é o amor e o riso em
espetáculos como "O Bolo".
Instalar-se além da política.
Espetáculos como "Cleópatra " devem misturar
história, cultura erudita, com linguagem de rua, linguagem de favela e
linguagem de aeroporto internacional.
Fazer experiências com a palavra e a expressão corporal. O
gesto icônico buscado por Vladmir Combre de Sena em "O Desobumbrar da
Ambunda" (Teatro Apolo- com Simone Figueiredo e o próprio Vládmir no
elenco).
Fazer pesquisas musicais como nos espetáculos " Um
Certo DelmiroGouveia", "Draculin", "Urânia no
rastro do Halley" e os projetos de montar "Hamlet" ( transformá-
lo numa ópera pop /rock misturando ritmos nordestinos, como fizemos em
"Draculin e o Circo no Espaço", com música de Gilberto Maymone e em
"Delmiro" com música de Emanuel Bandeira de Souza que misturou
maxixe, chorinho e música de banda com música moderna) .
Que circo, bar, boate, zoológico, clube, pátio, cidade do
interior e o mundo inteiro seja um palco para os Ilusionistas! E que qualquer
um possa ser Ilusionista!
Difundir a Filosofia Ilusionista de fazer teatro.
Acreditar que existe algo de mágico entre a vida e a cena.
Nutrir- se de erros e acertos no fazer laboratorial.
Misturar-se, incorporar várias experiências
Não ter medo de tempestade nem de calmaria.
Evoé!
Recife 1987.
Ilusionistas Corporação Artística:
Zuleima Ferraz
Moisés Monteiro de Melo Neto
Augusta Ferraz (presidente)
Simone Figueiredo
Vládmir Combre de Sena
Henrique Amaral
Rivaldo Casado
Fátima Barreto
Paulo Barros
Mozart Guerra
Adeilson Amorim
Buarque de Aquino
Beto Vieira, Mísia Coutinho e Miriam Pimentel
Ilusionistas estrelam a noite do Teatro Arraial
O Ilusionistas Corporação Artística realiza hoje a exposição Ilusionistas Rumo
ao 3° Milênio, no Teatro Arraial, a partir das 19h. O evento foi escolhido pela
Federação de Teatro Amador do estado, para integrar o projeto Memória da Cena
Pernambucana.
A corporação promete uma noite cheia de atrações. Haverá a estréia de um vídeo
que leva o mesmo nome da exposição, com cerca de um hora. Após a exibição,
debates e performances com personalidades do teatro local.
O grupo Ilusionistas foi formado há 16 anos por um grupo de jovens artistas,
tendo como seus fundadores, Moisés Monteiro de Melo Neto, Zuleima e Augusta
Ferraz. Daquele período para cá, promoveu cursos, palestras, publicação de
livros e produções para teatros convencionais. Também se fez pioneiro nas
apresentações em bares, boates e festas de aniversários. Esta versatilidade
proporcionou ao grupo, em 1992, atingir a um repertório de quase uma dezena de
espetáculos por ano.
Outros nomes importantes também compõem o grupo, como Henrique Amaral, Mísia
Coutinho, Adeilson Amorim, Mozart Guerra, Vladimir Combre de Sena, Rivaldo
Casado e Gê Domingues. Buscando sempre novos horizontes, até para possibilitar
a perpetuação do grupo, a Ilusionistas promove ainda eventos de outras
expressões artísticas, como música, dança, artes plásticas, mostras de filmes e
de fotografia e realização de vídeos como Frankestein em Pasárgada e
Revivencial. Em 1993, os artistas ficaram de fora da cena oficial do estado,
para realizar espetáculos apenas em escolas.
Para este ano, a corporação está planejando a estréia do espetáculo Feliz
Natal, de Moisés Monteiro de Melo Neto. O projeto Memória da Cena Pernambucana,
promovido pela Feteape, deve incluir o evento da noite de hoje no livro que
está sendo preparado pela instituição.
(Jornal do Commercio - Recife, 28 de junho de 1998)
Entrevista com membros da
ILUSIONISTAS CORPORAÇÃO ARTÍSTICA
Data: 28/07/1998.
Mediadora: Elaney Acioly.
Expositores: Moisés Monteiro de Melo Neto, Simone
Figueiredo, Augusta Ferraz, Gê Domingues, Henrique Amaral, Mísia Coutinho, Vavá
Paulino e Vládmir Combre de Sena.
Local: Teatro Arraial, Recife, Rua da Aurora.
Elaney Acioly: Numa noite diferente,
[1]
temos o prazer de receber uma trupe de artistas também diferentes: a
Ilusionistas Corporação Artística. Jovens que não tiveram medo de ousar,
enveredando, inclusive, por um mercado teatral bem alternativo. Com a palavra, Moisés
Monteiro de Melo Neto.
Moisés Monteiro de Melo Neto: A Ilusionistas Corporação
Artística começou sua trajetória em 1982 com a peça Mas... a verdadeira estória
de Chapeuzinho Vermelho não foi bem assim, texto e direção de Augusta Ferraz,
já num espaço alternativo: entre as árvores do pátio externo do Teatro Joaquim
Cardozo. Mesmo apostando numa produção feita sem grandes pretensões, a verdade
é que sempre investimos em um tipo de teatro que, aqui, ninguém fez ou ainda
faz.
[2] Um teatro
eminentemente alternativo, uma espécie de vanguarda, que hoje nem é mais. E
levamos muito “cacete” por isso, também porque nos achávamos os mais jovens e
os mais inteligentes. Sofremos muita discriminação por parte de algumas pessoas
desinformadas que nos consideravam ousados demais. Mas era a nossa proposta. Não
adianta bancar o certinho porque nunca dá certo e é daí que vem a loucura. Se
você é gauche, tem que ficar torto mesmo. Estreamos com uma peça voltada para
crianças e eu confesso, jamais gostaria de fazer um teatro careta como o que é
realizado aqui. Nunca nos interessou produzir uma pecinha com bichinhos de
pelúcia ou excessos de poeticidade, todas essas babaquices. Lembro que Marco
Camarotti, pesquisador do teatro para a infância e juventude, nos criticou
muito porque uma de nossas peças infantis, A maior bagunça de todos os tempos,
estreada em 1990, com direção de Buarque de Aquino, começava com uma tentativa
de assassinato. Era uma adaptação minha de A Branca de Neve e os sete anões e a
1ª cena era o empregado da Rainha tentando esfaquear a inocente mocinha na
floresta. Pôxa, mas isso é do conto de fadas, apenas começamos a trama por esta
parte! E foi assim que a gente sempre fez, sem, no entanto, afastar o público.
As nossas outras produções infantis, Draculin e o circo no espaço, texto meu,
igualmente dirigido por Buarque de Aquino, em 1985, e Urânia no rastro do
Halley, de 1986, que Augusta Ferraz escreveu e dirigiu, foram peças que ficaram
meses em cartaz. Em 1984, tivemos a 1ª experiência de ocupar um palco
totalmente alternativo, o bar 3x4, frequentado por um pessoal mais descolado.
Johnny Glicerina for president foi o nosso happening de estréia, numa concepção
minha e de Marco Hanois. Dom Hélder até mandou chamar a polícia porque
colocávamos um caixão em frente a Igreja das Fronteiras e, de lá, seguíamos em
cortejo para o bar. A partir de 1986 que optamos, de fato, por alternar nosso
repertório entre os palcos mais convencionais – teatros como o Santa Isabel,
Apolo, Barreto Júnior e Valdemar de Oliveira – e espaços alternativos, que
compunham o chamado “circuito das Graças/Boa Vista”, onde a gente vivia. Várias
vezes nos apresentamos, por exemplo, na Misty, uma boate que mantinha um certo
clima de liberalismo e era frequentada até por gente careta, afinal, era o
melhor lugar para se dançar no Recife nos anos 80 e 90. No Espaço Água de
Beber, um restaurante-bar chiquérrimo, o cachê era muito superior ao pago pelos
produtores no teatro e, depois de cada apresentação, todos nós da equipe
ficávamos na farra até de manhã cedo. Éramos muito notívagos. Quantos
amanheceres acompanhamos juntos!
Elaney Acioly: Chegou um momento dessa trajetória que você
decidiu parar, não?
Moisés Monteiro de Melo Neto: Em 1991, quando estreei La
cumparsita, no Teatro José Carlos Cavalcanti Borges, adaptação minha a partir
do livro Sangue de amor correspondido, de Manuel Puig, li uma crítica muito mal
escrita, que nem sequer trazia a ficha técnica corretamente e ainda dizia que
Ivonete Melo, uma das atrizes do elenco, estava irreconhecível.
[3] Bom, como sou muito
passional, vi que era melhor “bater em retirada” e passei seis anos afastado do
palco. Como não concordávamos com o que começou a ser escrito nos jornais,
decidi não mais compactuar com aquele tipo de cena que estavam tentando forjar
para o Recife, uma cena falsa, porque queriam que nos nivelássemos pela nata de
produção do eixo Rio-São Paulo. O maior problema é que era exigida uma
estrutura profissional de se fazer teatro inexistente aqui. Até hoje não tem
nenhum ator que sobreviva financeiramente de sua atividade, que tenha, por
exemplo, uma carteira de trabalho registrada com qualquer uma dessas
produtoras. Ninguém tem. Se hoje o artista recebe cachê, amanhã não. São
pessoas que ganham pouco e não têm a mínima estrutura. Fazem trapézio sem rede;
se caírem, se esborracham no chão. E mesmo assim nós sobrevivemos. Estávamos
chegando a uma fase de quase estabilidade. Isso porque fazíamos teatro em bares
e boates, na tentativa de conseguir dinheiro para a produção, já que a ajuda
oficial com a qual contávamos para alguns trabalhos, em especial da Fundarpe e
Prefeitura do Recife, não era suficiente. Ainda assim, conseguimos compor um
repertório que, se não agradou aos pseudo-críticos, presenteou o pessoal da
noite recifense com peças de gêneros diversos em lugares como o Espaço Água de
Beber, o 3x4, a Boate Araras e a Boate Misty, entre muitos outros points, além
de cumprirmos temporada em quase todos os teatros oficiais da cidade. Bem,
voltei a escrever no ano passado e estamos com uma nova produção para breve,
cujo título provisório é Feliz Natal.
[4]
Augusta Ferraz: Acho interessante explicar que a proposta do
grupo nasceu comigo, Moisés e Zuleima Ferraz, que, por acaso, é minha mãe e foi
também responsável pela criação dos figurinos de boa parte das nossas
produções. Mamãe foi professora de História, Geografia e vem de uma família
que, se não era constituída de artistas, manteve sempre uma relação com a
cultura, lendo bons livros, ouvindo uma boa música. “Os Ilusionistas”, como
inicialmente se chamava o grupo, teve sua fundação em 1982, como Moisés falou,
mais especificamente no dia 12 de julho, data do meu aniversário. O nome,
sugerido por mim, foi inspirado na idéia da ilusão, nesse sentido do teatro
também ser mágico. Moisés é que, pouco depois, mudou para Ilusionistas Corporação
Artística. Fui presidente do grupo e fico super feliz em ver que durante esses
anos todos, essa turma ainda está trabalhando. Dá para perceber que as pessoas
que permanecem há muito tempo ou estão entrando agora, ainda topam se
comprometer com a exposição, não têm medo de exibir a sua personalidade, suas
idéias dentro de um mundo tão marqueteiro, tão cheio de mídia e de posturas
corretas, diplomáticas, esses absurdos todos do “ter que bancar o certinho”.
Eu, particularmente, me sinto vaidosa de ter participado dessa equipe, um grupo
de artistas extremamente urbanos, sempre revivendo as grandes figuras da
história e trazendo à tona o cinismo dessas épocas, desses personagens. Como
foi o caso de Cleópatra e Evita, em Cleópatra, a piada, que cheguei a dirigir,
e Evita-me à cubana, que não tive nenhuma participação, duas propostas bem
subversivas. Nesse grupo de artistas urbanos encontrava-se de tudo, até
travestis em alguns trabalhos, mas, principalmente, estudantes universitários
que tinham o direito de ser rebeldes, acreditando que aquilo que faziam, sem
querer bancar o diferente, era o que estava certo. Quando me desliguei do
grupo, saí radicalmente.
Elaney Acioly: E por que começar com um espetáculo para
crianças em apresentações ao ar livre?
Augusta Ferraz: Nossa montagem de estréia foi Mas... a
verdadeira estória de chapeuzinho não foi bem assim, minha 1ª experiência como
autora e diretora teatral. Essa peça ganhou duas versões, com dois elencos
diferentes, uma em 1982, outra no ano seguinte. Acho que comecei com uma
proposta para crianças porque me considero bem infantil. A vida foi sempre
muito lúdica na minha cabeça. E olha que sou do tempo de brincar nos quintais!
Em seguida, fiz um adulto, A noite dos assassinos, meu 2º trabalho como
diretora, montado no Teatro Joaquim Cardozo em parte transformado. O cenário
era meu e de Pierson Barreto e a proposta era mexer com o convencional.
Eliminamos a platéia, completamos o palco cobrindo todas as cadeiras e ainda
pusemos uma arquibancada de ferro para o público, que participava como uma
espécie de júri, interferindo no espetáculo. O texto do cubano José Triana,
magnífico, põe em cena três irmãos que divagam o tempo todo num jogo
imaginário, após assassinarem os próprios pais. Existia também a imagem de uma
loba enorme em cena, arquétipo da mãe, de onde os atores saíam para a cena. A
montagem, com Moisés Monteiro de Melo Neto, Manoel Constantino e Miriam Juvino,
causou um certo burburinho. Em 1985, fui participar de outras produções na
cidade, até que, em 1986, surgiu essa possibilidade de fazer teatro em espaços
ainda mais alternativos que o Joaquim Cardozo: bares noturnos. Na época,
tínhamos também uma necessidade de preparar peças rápidas – geralmente, de
meia-hora, no máximo – e ganhar algum dinheiro com aquilo. Lotávamos os bares,
levando pessoas que não era frequentadoras do lugar, que iam para assistir o
nosso trabalho. Gente que tinha uma certa rebeldia também, vamos dizer assim. A
1ª experiência que fiz, em temporada, foi O bolo ou o vazio do céu que esvaziou
o mundo, texto de Moisés Monteiro de Melo Neto, dirigido e interpretado por nós
dois no Espaço Água de Beber, localizado na Praça de Casa Forte. Em seguida,
veio Anjo vitimado, com texto, adaptação e direção minhas, escrito a partir de
idéias do livro Merlim ou a terra deserta, de Tankred Dorst e de Assim falou
Zarathustra, de Nietzsche. Eu interpretava uma mulher que, durante a Idade
Média, no meio da noite, descia de uma escada com um candelabro enorme – foi
Walter Holmes quem o criou para nós – e começava a contar seus pesadelos. Paulo
Barros contracenava comigo como o Anjo Exterminador, ou seja, era como se a
minha personagem estivesse no passado ouvindo o futuro. Uma proposta um tanto
complicada, apostando numa linguagem surrealista e simbolista ao mesmo tempo.
Tudo muito intuitivo, vamos dizer assim, porque, de fato, eu ainda não sabia o
que havia por trás de cada idéia. Na prática, o grupo fazia muita pesquisa, eu
é que era bastante preguiçosa. Ainda em 1986, escrevi e dirigi Urânia no rastro
do Halley, em cartaz no Teatro Valdemar de Oliveira, mostrando às crianças um
pouco da mitologia grega e da simbologia mística, tendo como ponto de partida a
obra do astrônomo francês, Camille Flammarion. Confesso que, nessa época, eu já
lia um pouco mais. A peça conta a história de um menino que sonha e se
confronta com mitos gregos, no período da passagem do cometa Halley. No elenco
estavam, entre outros, Magdale Alves, no papel de Urânia, Henrique Amaral, como
o menino Camille e Vládmir Combre de Sena, vivendo Fobos, o Medo. Moisés
Monteiro de Melo Neto era um personagem invisível, Deimos, o Pavor. Somente sua
voz aparecia numa gravação. Essa peça foi uma co-produção da Ilusionistas com a
Papagaios Produções Artísticas. A experiência mais divertida que vivi no grupo,
como já citei, foi Cleópatra, a piada, texto de Moisés, com direção minha,
apresentada no 1º Festival de Humor promovido pela Fundação de Cultura Cidade
do Recife, no Teatro Barreto Júnior, e, depois, em curta temporada no Circo
Voador. Era uma versão escrachada da história da rainha do Egito, vista como
uma espécie de Dercy Gonçalves com empáfia. Dercy, por sinal, é um dos meus
ídolos. A abertura já causava um choque, com Cleópatra – Simone Figueiredo no
papel – fazendo sexo com Marco Antônio, interpretado por Vládmir Combre de
Sena. Lembro que fiz também esse happening que Moisés contou, bem no início da
Ilusionistas, Johnny Glicerina for president. Ele começava com um cortejo pela
rua, em direção ao bar 3x4, que fica em frente a Igreja das Fronteiras. Eu que
vinha carregada no caixão de defunto, e quando saía de dentro dele, minha
maquiagem era mefistofélica. Um barato! Até que chegou um momento que eu não aguentava
mais as discussões e as brigas dentro do grupo. Muito porque eu achava que
tínhamos que ter uma vertente definida e não uma produção em série. E entreguei
tudo. Um tempo depois me convidaram para fazer a Gertrudes, mãe de Hamlet, no
musical Hamlet – um musical pop. Topei, mas não passei três semanas ensaiando.
Era tudo muito místico, com direito a incenso e se falava muito. Não aguentei e
disse: “Chega!”. Nunca mais voltei à Ilusionistas e vi poucos trabalhos depois.
Gê Domingues: Bem, apareci meio que por acaso nessa turma.
Minha experiência começou com o lado plástico das peças, a cenografia e a
maquiagem, enveredando por um tipo de estética over que até então não havia
sido explorada pelo grupo. Tinha um certo exagero no que era feito e, através
dessa experiência, pude estar num vídeo de Moisés Monteiro de Melo Neto, Com o
crime nos olhos, minha estréia como ator. Em clima de humor negro, fiz também a
maquiagem e os adereços de O horror ou Frankestein em Pasárgada, com Black
Escobar, Henrique Amaral e Maria Paula Costa Rêgo no elenco e assinei ainda a
maquiagem e os adereços do infantil A maior bagunça de todos os tempos. Como
canto desde 1986, Moisés escreveu para mim Ketchup ópera, musical contemporâneo
apresentado num bar underground da Boa Vista chamado O Beco. Nesse trabalho, eu
interpretava canções do final dos anos 80, algumas minhas e, também, versões da
Janis Joplin. A Ilusionistas ainda produziu um outro show meu, Tara blue.
Também atuei numa sátira que Moisés escreveu, Shakespeare acorrentado, na Boate
Misty, unindo a linguagem clássica à vulgar.
[5] A Ilusionistas foi uma
espécie de berço para eu descobrir o que era o teatro e a cena pernambucana
daqueles tempos. A música veio a reboque disso tudo.
Simone Figueiredo: Entrei no grupo em 1983, graças a Augusta
Ferraz. Eu era estudante de Arquitetura da UFPE e, também, por um acaso, fui
parar no teatro quando Pierson Barreto, que estudava comigo, me introduziu
nesse mundo. Fizemos, juntos, um trabalho para a universidade e Augusta, que
atuava com ele no Teatro dos Estudantes do Centro de Artes – Teca, nos assistiu
e acabou me convidando para Mas... a verdadeira estória de Chapeuzinho Vermelho
não foi bem assim. Estreei já como protagonista, e quando fomos participar do
3º Festival de Teatro do Recife, fui rebelde, resolvi ir para o Congresso
Latino-americano de Arquitetura, em São Paulo, e Augusta acabou me substituindo
na personagem, apesar do meu esforço de chegar no dia do festival. Comecei
assim, revolucionando, anarquista e brincando com o fazer teatral. Depois, dei
um tempo porque Arquitetura pesava muito na minha vida. Mas o teatro era o meu
caminho natural, e voltei aos palcos através de Moisés Monteiro de Melo Neto,
em 1985, com a estréia dele como autor e diretor teatral em Verdades e mentiras
ou o diário secreto de Janis Joplin. Novamente, Pierson Barreto foi o meu
padrinho, me indicando para o espetáculo. Aí, não parei mais e o teatro foi me
envolvendo totalmente. Acho que foi paixão à 1ª vista. Moisés foi meu professor
no palco, minha formação, quem me estimulou à leitura teatral. Éramos todos
muito irreverentes, menos ligados aos padrões e diferentes até na forma da
gente se comportar. Acho que, até hoje, a irreverência dos Ilusionistas se faz
presente em tudo que desenvolvo, porque nunca me ative à convenção. E não deixo
de inovar. Um exemplo disso foi o trabalho que apresentamos no dia 27 de março,
Dia Mundial do Teatro e do Circo, em 1992, período em que eu era programadora
cultural da Casa da Cultura e consegui fechar uma parceria com Célia Muniz,
supervisora daquele espaço, e Rubinho Valença, presidente da Fundarpe. Numa
produção da Ilusionistas, reunimos quase 200 artistas numa festiva
apresentação-coletânea
[6] de vários textos do
teatro em diversas épocas, sob direção de Carlos Carvalho e roteiro de Moisés.
Esse caráter do libertário, da busca do novo, mostra que a Ilusionistas
Corporação Artística está a toda hora me acompanhando nos projetos que
desenvolvo, mesmo à frente de órgão público.
Moisés Monteiro de Melo Neto: Hamlet – um musical pop foi um
marco na história da Ilusionistas porque a peça enfrentou uma série de
problemas que fugiram do nosso controle. Depois dela, tive que passar quatro
meses em Brasília porque criei um verdadeiro pânico do Recife. Foi a nossa
produção mais cara, apresentada apenas umas seis vezes no Teatro Valdemar de
Oliveira, em 1988, já que a temporada que seria no Teatro de Santa Isabel foi
cancelada. A montagem misturava elementos tradicionais com música pop
contemporânea, utilizando elementos do rock, hip hop, MPB, música clássica,
dance music e, pela 1ª vez no teatro, introduzindo o sample. A idéia original
seria a de uma trupe de atores no ensaio geral de Hamlet mas a peça acabou
sendo uma versão mais ou menos livre e musical do próprio clássico
shakespeariano. As músicas de Ricardo Valença eram um show à parte. Numa delas,
há um trecho que gostaria de lembrar: “Se eu tivesse alguma chance de refazer
tudo o que eu fiz de errado, eu talvez errasse mais ou talvez até passasse pro
seu lado”.
Simone Figueiredo: Hamlet – um musical pop foi mesmo um
divisor de águas na história do grupo. Era um projeto antigo, de uns dois anos
ou mais, com cenário baseado no expressionismo alemão. Uma peça realmente
caríssima, numa co-produção com a Festim Produções, de Miriam Juvino e João
Júnior. Miriam foi quem sugeriu convidarmos Alberto Giecco para dirigir o
trabalho, um diretor argentino muito ligado ao cinema que estava morando em São
Paulo. Ele acabou trabalhando em parceria com Paulo Falcão. Algumas pessoas da
Ilusionistas ficaram de fora porque Alberto quis fazer uma seleção de elenco e,
daí, tivemos a participação de atores convidados como Bruno Garcia, Alexandre
Alencar e o próprio Paulo Falcão. Durante o processo de ensaios, o diretor
propôs vários laboratórios e até exercícios de ioga, algo que tinha muito a ver
comigo porque sempre acreditei muito na busca por um equilíbrio através da
filosofia oriental. Com o apoio do British Council, FUNDAJ e Secretaria de
Educação e Cultura do estado de Pernambuco. Fizemos ainda o projeto Shakespeare
para todos, com uma exposição sobre vida e obra do bardo inglês. Além disso,
houve exibição de filmes inspirados em suas peças. O material veio
especialmente de Londres, com apoio, também, da Empetur, ou seja, tinha um
certo glamour... . Geralmente dois ou três componentes do grupo assumiam a
produção executiva do espetáculo. Geralmente eu e Moisés, Adeilson
Amorim(fotógrafo) sempre esteve conosco e Rivaldo Casado em algumas montagens.
Minha visão sempre foi apostar no profissionalismo. Na época do Hamlet, com a
saída da Festim Produções, envolvida em outro projeto, segui na produção
sozinha, mesmo sabendo do enorme peso, segui meu coração e atendi ao pedido dos
envolvidos para continuar o projeto e convidei Janice Marques, da Center, pra
unir-se a mim. E foi assim. Minha visão foi sempre apostar no profissionalismo.
Na época do Hamlet talvez eu não tivesse a maturidade necessária, mas tentei
dar condições de trabalho a quem estava conosco. Hoje, numa nova produção, acho
que a gente tem que acompanhar o mercado, buscando apoio dos órgãos públicos e
da iniciativa privada para que esse meu objetivo realmente se torne possível.
Vládmir Combre de Sena: Acho que sou da 2ª geração dos
Ilusionistas, ou seja, a turma que entrou a partir de 1985. Eu,
particularmente, não vejo tanto unidade no grupo e acho que uma de nossas
características foi exatamente essa falta de unidade. Não existia um pensamento
único, um discurso a seguir: “Nós somos marginais ou rebeldes ou aquilo outro”.
Nós éramos e fazíamos. Até, às vezes, sem saber. Houve muito diletantismo
também. Foi poético, um momento bonito nas nossas vidas. O que acho uma pena é
que o panorama político-cultural da cidade, nos dias de hoje, não seja
diferente, não tenha mudado, porque nós mudamos. Esse panorama não permite,
como outrora não permitia, que grupos como o nosso se desenvolva e sobreviva do
próprio trabalho, pela total falta de apoio. Fazer teatro em Recife sempre foi
uma tarefa de Hércules, principalmente pela resistência do empresariado em
apostar na produção local. Acho que também por essa razão foi fundada a
Ilusionistas, para provar que era possível fazer isso. E fizemos. Agradando ou
não.
[7]
Vavá Paulino: O 1º contato que tive com a Ilusionistas foi
como platéia, e uma das imagens que guardo com muito carinho é da Ana Célia
fazendo o espetáculo musical Um certo Delmiro Gouveia, no Teatro de Santa
Isabel, em 1985. Tinha uma fala que ela dava no espetáculo – “Não vá, Delmiro!”
– que me persegue até hoje e acho que vai me acompanhar pelo resto da vida.
Para mim, significava o que eu chamei de “new expressionismo pernambucano”,
algo que os atores daqui faziam, com uma melodia engraçada no falar e uma
impostação de voz bem típica. Eu tinha acabado de chegar em Recife, estava
começando meu envolvimento com as artes. Na verdade, já me dedicava ao teatro
mas numa cidade muito longe da capital, Floresta, a 450 quilômetros de
distância. A galerinha da Ilusionistas conheci em 1983. Acompanhei bastante o
trabalho deles, que eu considerava “um pé à frente”, algo artaudiano, como uma
loucura saudável. Isso sempre me chamou a atenção. Não gostei de uma ou outra
experiência, mas o todo me agradava bastante. Principalmente por perceber uma
preocupação com a pesquisa. Essa dedicação ao estudo me fazia gostar ainda mais
deles, além dessa ligação com o pop, de estar antenado com o que acontecia no
1º Mundo. O 1º contato de trabalho mesmo, foi quando a Ilusionistas fez a
produção executiva de A revolta dos brinquedos, da Circus Produções Artísticas,
em 1989, com José Francisco Filho na direção, uma experiência maravilhosa. Até
hoje não tive a oportunidade de experimentar e nem vi acontecer com nenhuma
outra produção infantil o que vivemos naquela época, tendo Moisés Monteiro de
Melo Neto e Mísia Coutinho à frente da produção. Eles conseguiam lotar o Teatro
Apolo, um espaço que sempre sofreu pela rejeição do público. Era casa cheia
durante o meio da semana, quando eram vendidos espetáculos para escolas, e
também nos sábados e domingos. Ganhei um bom dinheiro. Depois, fiz o meu debut
como ator da Ilusionistas na comédia Um tostão para Isabelita, durante essa
grande comemoração do Dia Mundial do Teatro, que Simone já falou. Foi realmente
um mega-espetáculo, com vários artistas convidados a trazer seus trabalhos.
Minha apresentação aconteceu no centro da Casa da Cultura, uma única vez. Eu
vivia a Isabelita, uma atriz decadente que se diz argentina, força um sotaque e
é explorada pelo seu empresário, um cafetão interpretado por Buarque de Aquino.
O texto, de Moisés Monteiro de Melo Neto, com direção também dele, é bem
curtinho, conciso e aborda essa exploração, tanto afetiva quanto financeira. Eu
já tinha visto uma versão da peça com Valdi Coutinho e Moisés no elenco,
período em que a Ilusionistas vivia realizando pocket shows em bares. A cidade
prestava por conta disso. Agora, depois de estreitar bem os laços com a maioria
do pessoal, estamos com esse trabalho novo, Feliz Natal. A minha identificação
com essa turma se deu fundamentalmente por perceber isso que Vládi falou.
Apesar dele, que estava muito mais dentro da equipe, constatar que não havia
uma unidade, para mim, ela poderia não existir a título de verbalização
ideológica, um discurso afinado, mas a prática do grupo deixava tudo muito
claro: na hora do fazer, de se posicionar, todos eram iguais, cheios de
atitude. Como eu gosto muito de pessoas de atitudes e tenho várias por segundo,
a identificação veio por aí.
Henrique Amaral: Meu trabalho com a Ilusionistas iniciou-se
em 1983, na 2ª versão de Mas... a verdadeira estória de Chapeuzinho Vermelho
não foi bem assim. Fiz a divulgação da peça mas, logo após a estréia, fui
demitido porque não gostaram das matérias que saíram. Comecei a experimentar o
teatro na Universidade Católica de Pernambuco, quando estudava Jornalismo e me
meti a fazer administração de produção no Teatro Universitário Boca Aberta, o
Tuba. Na realidade, o palco sempre me chamou mais do que a universidade, tanto
que nem terminei o curso. Voltei à Ilusionistas para divulgar A noite dos
assassinos e, quase no final da temporada, acabei substituindo Carlos Anthony
na iluminação. Desde 1979 eu já escrevia para teatro, aprendendo na prática
mesmo. No início, vivi uma fase expressionista que, depois, me assustou
bastante. Em 1988 é que mudei de estilo e passei a valorizar mais a comédia, já
numa fase fora do grupo, quando fundei a Coopera – Cooperativa de Pesquisa da
Linguagem Cênica, cujo filosofia era aproveitar os espaços alternativos e com a
qual montei espetáculos como A máscara da assepsia e Pai, filho e um espírito
tão santinho. Bom, meu 1º texto a ser encenado na Ilusionistas seria Sangria,
que começamos a ensaiar no Teatro Joaquim Cardozo, mas a Polícia Federal acabou
proibindo-o. Tínhamos ganho um concurso de auxílio-montagem da Fundarpe mas
como a peça tratava de lesbianismo e cocaína, a Censura não deixou fazer. Com a
proibição, decidimos montar Punhal, que eu havia escrito um ano antes. Acho que
foi a 1ª vez que Carlos Carvalho saiu da linguagem do teatro convencional para
dirigir uma peça totalmente expressionista, numa discussão sobre a eutanásia. O
personagem principal, Aurélio, vivido na peça pela atriz Ana Célia, depois
substituída por Magda Alencar, era um canceroso que precisava cortar as pernas.
Com a ajuda do pai e do melhor amigo, ele participa de um ritual para morrer,
sendo, ao final, assassinado pela ex-amante, uma ex-presidiária, papel que era
de Moisés Monteiro de Melo Neto, ou seja, um pouco de inversão nas personagens
masculinas e femininas. O trabalho foi muito bem recebido pela crítica,
[8] pena que pouca gente
viu. Além de escrever e atuar no grupo, fui também secretário, responsável
pelas atas e pela divulgação, já que alguém tinha que fazer essa parte. Ainda
em 1985, participei como ator de Verdades e mentiras ou o diário secreto de
Janis Joplin, 1ª peça de Moisés Monteiro de Melo Neto. Em seguida, escrevi,
dirigi e produzi Percepção, uma montagem extremamente triste, que a crítica não
gostou. A estréia aconteceu em 1986, no Teatro do Sesc de Santo Amaro, às
segundas e terças-feiras. Quando passamos a ocupar lugares ainda mais
alternativos, seguindo uma idéia de Mozart Guerra, gerente de promoções do
Espaço Água de Beber, estreei vários textos meus, entre eles, duas comédias
dramáticas, Rival de prata, sob direção de Mozart Guerra, e Cinza solidão,
dirigida por Carlos Carvalho, peça que eu divulgava como “uma antiinterpretação
da vida, escrita em tons de comédia e farsa de abuso”. Nesse mesmo período, já
na Boate Misty, atuei em Faustina, com texto e direção de Moisés Monteiro de
Melo Neto, uma adaptação satírica da obra de Goethe. E vieram várias outras
experiências, algumas em co-produção com a Coopera. A comédia de costumes
Brega-chique & camarão, que escrevi e dirigi, tinha muito senso de humor.
Era uma proposta um tanto diferenciada na carreira da Ilusionistas, com uma
linguagem bem popular, sobre uma mulher sem cultura que chega do interior de
Pernambuco, com o marido publicitário, e vai a um restaurante fino cometendo as
maiores mancadas. A estréia aconteceu em março de 1986, no Espaço Água de Beber
e toda a trupe da noite foi nos assistir. Três anos depois, atuei em O horror
ou Frankenstein em Pasárgada, adaptação de Moisés a partir do romance de Mary
Shelley, em cartaz no Teatro José Carlos Cavalcanti Borges. Estivemos juntos
também, como autores e intérpretes, em Com a víbora no seio, no Espaço Araras,
em Boa Viagem, peça que já tinha ganho uma versão anterior com os atores Heitor
Dhalia e Rivaldo Casado no Espaço Canto e Arte. O texto conta a história de um
professor de arte dramática e crítico teatral apaixonado por um ator que não
quer nada com ele. Todas essas montagens feitas para bares e boates eram,
assim, um tanto diferentes. A platéia estranhava um pouco, uns aplaudiam,
outros odiavam.
[9] Uma vez, até jogaram
pedras de gelo! Em 1989, lembro que escrevi e encenei duas peças cômicas e
curtas: A queda da bastilha, sobre a Revolução Francesa, apresentada no bar
Sanatório Geral, nas Graças, e Vendo a lua nascer quadrada, quando Mísia
Coutinho experimentou-se, pela 1ª vez, como diretora teatral, vivendo ainda o
papel de uma atriz que vai fazer teste para um comercial de TV. Essa montagem
foi feita especialmente para o Festival de Humor, no Teatro Apolo. Não
conquistamos nenhum prêmio, mas ganhamos a simpatia do público. Em 1990, na
Misty, montamos Shakespeare acorrentado, que como Augusta citou, contava com um
travesti no elenco, Patrícia Hearst e, também, transformistas, como Marquesa,
“a 1ª e única”. Já n’O Beco, outra boate da Boa Vista, apresentamos Ketchup
Ópera, show especialmente escrito por Moisés para Gê Domingues, onde eu também
atuava. A jornalista Rosário Barreto além de compositora de algumas das músicas
atuou como backing vocal ao lado de Simone.
Elaney Acioly: E o que essas experiências traziam em comum?
Henrique Amaral: Quase todas contavam com uma linguagem
diferente do que se estava fazendo no teatro naquele momento, apostando numa
relação com o público bem mais direta e contundente. Tudo era dito como se
fosse um bofetão, mas sem a intenção de chocar ou de ser agressivo, e,
acredito, muito mais verdadeiro. O legal de termos ocupado tantos espaços
noturnos com os nossos happenings, é que, até então, o palco desses lugares era
somente para atores transformistas. E conseguíamos chamar mais público ainda.
Gente que passava a frequentar a casa porque tínhamos nossos admiradores
também. Em 1992 Moisés resolveu dar essa parada que ele já contou, mas estamos
pensando em voltar, promovendo logo logo um ciclo de leituras dramáticas.
[10]
Mísia Coutinho: Bom, quando entrei nesse grupo, descobri que
antes mesmo de ser convidada por Moisés Monteiro de Melo Neto, eu já era uma
ilusionista. Isso porque sempre fui bastante observadora, como todos da equipe,
e claro que o teatro-pesquisa que eles faziam me chamava a atenção. Na verdade,
minha 1ª participação foi na captação de recursos para Percepção, peça de
Henrique Amaral, que ficou em cartaz no Teatro do Sesc de Santo Amaro. Na Boate
Misty, produzi e atuei em Cleópatra, comédia de Moisés Monteiro de Melo Neto,
numa festa intitulada Uma noite com Cleópatra, e produzi ainda Um tostão para
Isabelita, atuando no papel-título, ao lado de Moisés, numa outra festa
programada. Fui também atriz do vídeo
Com o crime nos olhos, com roteiro e direção de Moisés Monteiro de Melo Neto.
Esse trabalho foi inspirado em O bolo, peça que já tinha sido levada para o
palco com Augusta Ferraz em cena. Com Henrique, fiz uma série de peças curtas
em bares e boates da cidade. Eram textos encomendados; ele escrevia e dirigia,
eu produzia e atuava. Éramos convidados, e pagos, pelos donos desses espaços
noturnos, onde funcionávamos também como uma espécie de promoters. No Sanatório
Geral, por exemplo, bar que funcionava nas Graças, fizemos A queda da bastilha,
que Henrique já citou, onde eu interpretava a louca da Maria Antonieta. Fui até
para o Baile dos Artistas daquele ano vestida como a personagem, devidamente
acompanhada por Vládmir Combre de Sena. Sempre fui a mais bandoleira do grupo,
trabalhando paralelamente com outras produções, mas sentia que mergulhava mesmo
na arte com a Ilusionistas. Um dos maiores desafios que enfrentei – e sempre gostei
deles – foi minha 1ª experiência como diretora teatral, com a peça Vendo a lua
nascer quadrada, de Henrique Amaral. Foi ele quem me induziu: “Topa fazer?”.
“Topo”, respondi de cara. Dirigir foi uma experiência boa, faria tudo de novo.
A verdade é que sempre fomos ousados: o mundo estava aos nossos pés. Basta
querer, não? Estou na Ilusionistas até hoje e pretendo continuar a produzir
muito mais.
Moisés Monteiro de Melo Neto: Mísia co-produziu comigo O
horror ou Frankestein em Pasárgada, no Teatro José Carlos Cavalcanti Borges e
atuou também em Dom Casmurro, adaptação minha a partir da obra de Machado de
Assis. Agora, estamos na produção desse meu mais recente texto, Feliz Natal.
Bom, lembrando de todos esses trabalhos da Ilusionistas, eu acho que o filme
Fome de viver, dirigido por Tony Scott, no início dos anos 80, tem muita coisa
a ver comigo, Augusta e Zuleima Ferraz – já que fomos o início de tudo,
especialmente numa cena em que a Catherine Deneuve e a Susan Sarandon estão
numa cama e uma morde a outra, há muito sangue passando para lá e para cá. Foi
algo muito bom o que ela e a mãe dela passaram para mim. Brigamos muito, é
verdade, e temos que fazer isso mesmo porque no teatro não há ninguém que não
tenha brigado com o outro. É realmente difícil conviver no meio da arte,
enfrentando a falta de grana, sem contar que trabalhamos com as emoções. Mas
Augusta Ferraz e Zuleima são pessoas que mudaram minha vida para sempre. A
verdade é que eu gostaria muito de escrever novamente para Augusta, seria uma honra.
Augusta Ferraz: A Ilusionistas surgiu de uma vontade nossa
de entrar nesse mundo da arte, de falarmos e de nos expressarmos. Mas,
fundamentalmente, ela sempre teve duas vertentes: a minha e a de Moisés. Eu
tinha o meu tipo específico de linguagem, Moisés tinha o dele. Até que houve um
momento, em 1988, que percebi que não era mais a minha e me retirei do grupo.
Mas é importante registrar que os dois tipos de linguagem, de vivência,
funcionavam. Lembra da época do Circo Voador quando a gente montou, em um mês,
quatro espetáculos para participar do Festival de Humor do Recife? Foi bem
interessante essa experiência, com muita gente envolvida. Tínhamos essa
dinâmica de que, quando queríamos concretizar uma idéia, fazíamos mesmo. Em uma
semana já existia um espetáculo pronto, sem ter um compromisso muito grande,
aliás, quase nenhum, com a mídia ou com os gastos, porque a gente sempre
encarou o teatro como exercício da alma e do bolso também. Nunca forjamos ter
um dinheiro que não tínhamos, o que é uma característica atual muito grande do
Recife. Os produtores culturais recifenses expõem o orçamento de seus projetos
no jornal e esses projetos se qualificam pelo preço que valem e não pela
representação cultural e artística que têm. Nós sempre fizemos o contrário. Não
como uma preocupação, mas como um desejo meio maluco de pôr em prática o que
queríamos, sem nos preocuparmos com essas questões tão arraigadas. E todas as
pessoas que foram entrando depois de nós três, eu, mamãe e Moisés,
inconscientemente também tinham esse desejo na alma, essa vontade de realizar e
de fazer. E, fundamentalmente – me perdoem os outros – acho que a Ilusionistas
terminou virando a linguagem e a característica do Moisés e, por que não, da
Simone, que sempre foi uma pessoa que esteve fomentando junto a ele essa
existência do grupo. Esse desejo sempre esteve mais presente neles. Eu caí fora
da turma. Os outros que vieram depois, eram cíclicos, chegavam e se despediam
com a mesma rapidez. Buarque de Aquino, talvez, tenha sido a presença mais
constante depois de mim. O que sei é que esse desejo de se expressar, que
originou a Ilusionistas, continua por aí. Tudo porque as pessoas querem
vivenciar a questão da arte, da poética, da expressão, da comunicação. Os
Ilusionistas tinham e ainda têm essa missão que eu, particularmente, acho muito
bonita, que é procurar viver e sobreviver do teatro, mesmo que se utilize os
órgãos públicos, porque na maioria das vezes a gente pensa que os órgãos estão
nos utilizando, mas nós é que, bem particularmente, estamos utilizando eles
para seguir a nossa vontade de levar a arte adiante. Afinal, os órgãos
culturais existem para isso, não? O problema é que falta as pessoas delirarem
mais, elas estão muito sérias, muito comprometidas, têm que correr bastante,
aprender muito e não se dão o direito de saborear o prazer que é fazer arte,
para se divertir também. Hoje em dia as pessoas fazem o teatro e a arte com um
sofrimento, com uma lamentação. Não há prazer, estão sempre querendo atingir
uma coisa onírica, fora do comum, inexistente. E naquilo que é feito
cotidianamente falta o prazer, o amor, a loucura, o jogar-se, o atrever-se. A
arte é isso. Acho que todos os Ilusionistas, aqueles que participaram de toda a
trajetória ou tiveram uma passagem rápida pelo grupo, levaram sempre, com muito
prazer, essa opção do “ser artista” adiante, dividindo isso com as outras
pessoas e mostrando que é possível viver a arte dessa maneira. E, também, dando
o direito a cada um de embarcar nessa história e, quando chegar no seu limite,
ter o direito de partir. Cada um com a sua compreensão daquilo, sua doidice,
seu nível terapêutico, sua maneira de ser, seu diferencial.
Vládmir Combre de Sena: Queria retomar essa questão da nossa
não unidade. Augusta falou que existiam duas vertentes, a dela e a de Moisés,
mas é bom ressaltar que também houve a vertente Henrique Amaral e eu comecei um
esboço. Encenei dois únicos espetáculos para os Ilusionistas: Perfume,
adaptação da obra de Ascenso Ferreira e O desobumbrar da ambunda, texto meu,
escrito especialmente para o 1º Festival de Humor do Recife. Depois, resolvi
sair do grupo e montei peças com outras pessoas que não eram mais Ilusionistas.
Assim como Henrique Amaral, que também fez muitas experiências sozinho. Ele
tinha o dom da escritura, eu nunca tive, por isso enveredei pela dramaturgia
somente uma única vez.
Augusta Ferraz: Quando coloco essa questão das duas
vertentes é porque considero Moisés mais urbano que eu. Eu sou muito mais
bucólica, agreste, parca sertaneja. Tanto que o nome do meu grupo atual é esse:
Parcas Sertanejas. Quando não citei Vládi e Henrique é porque acho que eles são
mais urbanos também. Na verdade, Moisés foi a cabeça de um grande polvo com
muitos tentáculos urbânicos. É nesse sentido que eu falo.
Vládmir Combre de Sena: Uma das características da
Ilusionistas é que nós experimentávamos, e nesses experimentos foram testadas
várias correntes, de várias vertentes. Até Henrique tentou vários estilos. O
próprio Moisés testa vários caminhos dentro da obra dele,
[11]
como você também, Augusta, dentro da sua.
Simone Figueiredo: O comum a tudo isso é a provocação,
típica dos Ilusionistas. Ainda bem que experimentei todas essas vertentes
dentro do grupo. Comecei com Augusta e, depois, mesmo atuando e produzindo
quase todos os textos de Moisés, participei desse único texto produzido,
escrito e dirigido por Vládi, O desombumbrar da ambunda, contracenando com
Paulo Barros, e fui ainda atriz de Henrique Amaral, explorando minha veia
cômica em Brega-chique & camarão. Ou seja, não dispensei a oportunidade de
atuar em experiências com os outros integrantes da Ilusionistas, como também em
outras produtoras da cidade, como a Papagaios e a Remo Produções. Mas o que me
fez deixar de ser arquiteta e virar atriz foi, realmente, os trabalhos que desenvolvi
na Ilusionistas, e tenho o maior orgulho de todos eles. Conhecemos a literatura
universal, os autores brasileiros, discutíamos muito teatro. Nada era
aleatório. Pesquisávamos, íamos às exposições de arte, cinema, líamos poesia,
assistíamos a festivais nacionais, trocávamos figurinha com outros grupos.
Temos registro disso tudo em ata. Éramos questionadores porque líamos, e,
talvez, o que mais incomodava, era que a gente não concordava com essa crítica
jornalística imposta de goela abaixo a todos nós que fazíamos arte. Sim, porque
alguém se arvorar a dizer que é crítico teatral sem ter formação crítica, não
engolíamos mesmo.
Augusta Ferraz: Confesso que durante a minha permanência na
Ilusionistas, a crítica sempre respeitou bastante o trabalho que a gente
desenvolvia. E, aqui, quero citar os nomes de Éneas Alvarez e Valdi Coutinho.
Eles sempre iam nos assistir, conversavam conosco, valorizavam o que, de fato,
a gente queria dizer, sem ser preciso corresponder às suas ansiedades de
crítico. Demonstravam um respeito ao indivíduo. Mesmo quando escreviam uma
crítica dura sobre determinado espetáculo, não eram cruéis, sádicos e, sim,
precisos sobre o que estavam abordando. Não diziam o que nós deveríamos fazer
mas sugeriam. Bem diferente do que acontece hoje em dia.
Simone Figueiredo: Com a saída de Enéas e Valdi dos jornais,
perdemos em espaço e qualidade.
Augusta Ferraz: Nessa questão da imprensa, o que acho um
horror é a idéia que gere o jornal: essa ação de ter que criar notícias
diariamente, massacrantes, e chupar o sangue de quem quer que seja. Atualmente,
as pessoas que se submetem a isso, deveriam ter um pouco mais de decência e
falar do próprio rabo. Porque rabo todos têm, principalmente crítico, que
geralmente está envolvido com a categoria da qual ele destrói e fala mal.
Moisés Monteiro de Melo Neto: Sempre foi muito difícil
seguir mas, apesar do break, vamos continuar produzindo.
Henrique Amaral: A Ilusionistas foi a soma de talentos
jovens tentando renovar a linguagem do que se fazia nos palcos do Recife. Em
homenagem a isso, quero ler um trecho muito rápido de um texto que escrevi esse
ano, Duendes de um apocalipse de mentira.
[12]
“A idéia é acordar, porém antes tive o cuidado de procurar a minha face no
espelho manchado de sangue. Como eu parecia comigo mesmo, como eu era quase o
mesmo, quase. A dor tinha me transformado, a loucura havia me seduzido e era
nela em que me espelhava, um grande doido no meio da maior doideira desse mundo
antropofágico, transformando todos em duendes de um apocalipse de mentira.
Cravo em mim um punhal emprestado de um outro texto. Afinal de contas de que me
vale um texto, de que me valem as palavras? São deuses brigando entre si e
tornando esse mundinho cada dia pior. O mar vai cobrir toda a terra do planeta
e a água que está em nossos corpos vai nos inundar. De que me serve estar vivo,
desfrutar de três refeições diárias, tomar três duchas, me sentar no aparelho,
jogar-me fora com o mundo inteiro que está dentro de mim? De que me servem
esses computadores, televisores, refrigeradores, todas essas dores, esse
mal-estar contínuo, esse olhar para milhões e milhões de seres
impressionantemente iguais a mim? Ouvir som, música, admirar-me em uma porção
de imagens em vídeos, em filmes, em fotos, em telas que nunca vão poder me captar
verdadeiramente? O homem é uma besta e aceita todas as regras do jogo que lhe
são impostas por outros homens, por um passado e por uma história com H
maiúsculo que não é sua. A vida de outros homens, a vida do outro, o que pode
me interessar? Sou eu quem está comigo, sou eu que carrego essa carcaça de
ossos e de carnes putrefatas. Sou eu que rastejo diante de mim mesmo. Não me
entendo, não me aceito e não me quero. Se não me perguntassem antes, eu não
teria dado a permissão para vir a este mundo. Então, não venham reclamar das
minhas faltas, das minhas ausências, das minhas loucuras. Eu não disse que
queria estar aqui. E eu não sei se queria estar aqui”.
Ilusionistas Corporação Artística – Montagens
1982
Mas... a verdadeira estória de Chapeuzinho Vermelho não foi
bem assim
Texto e direção: Augusta Ferraz. Figurinos e administração:
Zuleima Ferraz. Cenografia: Augusta Ferraz, Rinaldo, Frederico da Luz Guerreiro
e Carlos Anthony. Coreografias: Christiane Moraes Rêgo. Músicas: Reginaldo
Santos. Letras: Augusta Ferraz e Reginaldo Santos. Músicos (gravação): Edgar
Queiroz, Pierre Novelino, Lúcia Matos e Reginaldo Santos. Maquiagem: o grupo.
Programação visual: Rinaldo e Augusta Ferraz. Portaria: Carlos Anthony.
Produção executiva: Augusta Ferraz, Pedro Júnior, Frederico da Luz Guerreiro e
Rinaldo. Elenco: Edna Rodrigues, Paulo Barros, Pedro Júnior, Jandiram Airam
(eventualmente substituída por Augusta Ferraz), Fátima Santa Rosa, Frederico da
Luz Guerreiro, Alba Lúcia, Valéria Alencar, Rinaldo, Giselda Garret e Carlos
Anthony.
1983
Mas... a verdadeira estória de Chapeuzinho Vermelho não foi
bem assim
Texto e direção: Augusta Ferraz. Direção musical: Dinara
Pessoa e Augusta Ferraz. Músicas: Reginaldo Santos. Letras: Augusta Ferraz e
Reginaldo Santos. Sonoplastia: Dinara Pessoa. Execução de sonoplastia: Carlos
Anthony. Coreografia: Fátima Barreto. Cenografia: Augusta Ferraz e Rinaldo.
Execução de cenografia: Augusta Ferraz, Carlos Anthony, Rinaldo e Augusto Neto.
Figurinos: Lúcio Flávio Rios e Zuleima Ferraz. Execução de figurino: Irene
Maria, Lúcio Flávio Rios e Zuleima Ferraz. Maquiagem: o grupo. Contra-regras:
Augusta Ferraz, Carlos Anthony, Henrique Rodrigues e Magda Alencar. Programação
visual: Augusta Ferraz, Magda Alencar e Sulamita Ferreira. Administração:
Zuleima Ferraz. Produção executiva: Augusta Ferraz e Henrique Rodrigues.
Elenco: Ivete Lourenço, Cristina Brayner, Aidil Araújo, Magda Alencar, Simone
Figueiredo, Fátima Barreto, Leonardo Alencar, Marco Mendes, Luciene Leitão e
Henrique Rodrigues.
1984
A noite dos assassinos
Texto: José Triana. Tradução: Tânia Pacheco. Direção e
sonoplastia: Augusta Ferraz. Movimentos e expressão corporal: Bernot Sanches.
Plano de luz: Camilo. Execução de iluminação: Carlos Anthony (substituído por
Henrique Amaral). Execução de sonoplastia: Augusta Ferraz e Carlos Anthony
(substituídos por Sabrina Serpa). Figurinos e administração: Zuleima Ferraz.
Cenário: Pierson Barreto e Augusta Ferraz. Execução de cenário: Pierson Barreto
e José Luiz Simon. Adereços: Pierson Barreto, Zé Luiz e Zuleima Ferraz.
Programação visual: Miriam Juvino e Marco Hanois. Contra-regra: Carlos Anthony.
Produção executiva: Augusta Ferraz, Chocolate, Miriam Juvino e Moisés Monteiro
de Melo Neto. Elenco: Miriam Juvino, Manoel Constantino e Moisés Monteiro de
Melo Neto.
Jonny Glicerina for president
Concepção: Marco Hanois e Moisés Monteiro de Melo Neto.
Texto, direção, figurinos, maquiagem e adereços: o grupo. Elenco: Marco Hanois,
Augusta Ferraz, Moisés Monteiro de Melo Neto, Henrique Amaral, Ana Cláudia
Vasconcelos e Manoel Constantino.
1985
Punhal
Texto: Henrique Amaral. Direção: Carlos Carvalho. Cenário:
Mozart Guerra. Figurinos: Geny Bandeira de Souza. Iluminação: Adalberto Wagner.
Adereços: Márcia Trajano e Mozart Guerra. Programação visual: Rodolfo Mesquita.
Elenco: Ana Célia (substituída por Magda Alencar), Henrique Amaral, Moisés
Monteiro de Melo Neto e Pedro Ivo Veloso.
Verdades e mentiras ou o diário secreto de Janis Joplin
Texto e direção: Moisés Monteiro de Melo Neto. Figurinos:
Magda Alencar, Moisés Monteiro de Melo Neto e Mozart Guerra. Coreografia:
Antônio José (Black Escobar). Sonoplastia: Bruno Ferraz. Iluminação: Mozart
Guerra. Administração: Edilson Dutra e Ana Cristina. Produção executiva: Moisés
Monteiro de Melo Neto e Adeilson Amorim (Chocolate). Músicos: João Eugênio,
Bruno Ferreira, Gabriel Furtado e Lúcio Wanderley. Elenco: Magda Alencar,
Henrique Amaral, Pedro Ivo Veloso, Miriam Pimentel, Simone Figueiredo, Black
Escobar, Moisés Monteiro de Melo Neto e Paulo Barros.
Draculin e o circo no espaço
Texto: Moisés Monteiro de Melo Neto. Direção, cenário e
figurinos: Buarque de Aquino. Direção Musical: Gilberto Maymone. Maquiagem:
Henrique Melo. Coreografia: Raimundo Branco. Músicos: Bernardino José, George
Aubert, Robson Leite, Bartolomeu Mendonça e Henrique Brito. Participação
especial: Palhaço Risadinha (Miriam Pimentel). Elenco: Moisés Monteiro de Melo
Neto, Ana Célia, Fernando Tavares, Simone Figueiredo, Raimundo Branco, Adriana
Dória Matos, Bonifácio, Jarbas Janu, Ivone Maia, Charles Henri e Fernando
Chiapetta Júnior.
Um certo Delmiro Gouveia
Texto, direção e figurinos: Moisés Monteiro de Melo Neto.
Desenhos: Gláucio Botelho. Sonoplastia: Ricardo Barros. Trilha Sonora: Emanuel
Bandeira de Souza. Iluminação: Gustavo Túlio e Sulamita Ferreira. Coreografia:
Black Escobar. Elenco: Buarque de Aquino, Ana Célia, Simone Figueiredo, Paulo
Barros, Pierson Barreto, Jarbas Janu, Miriam Pimentel, Adriana Dória Matos,
Fernando Tavares, Mário Gomes, Otávio Cariello Jr., Edilson Simões e Andréa Rezende.
As três falsas do outro mundo
Texto: Moisés Monteiro de Melo Neto e Jarbas Janu. Direção: Moisés
Monteiro de Melo Neto. Sonoplastia e iluminação: Everton Tom e Moisés Monteiro
de Melo Neto. Elenco: Adriana Dória Matos (eventualmente substituída por Simone
Figueiredo), Fernando Tavares, Ana Célia, Jarbas Janu, Edilson Adnil e Mário
Aniram. Realização em parceria com Artistas Unidos.
1986
Faustina
Texto: Moisés Monteiro de Melo Neto, inspirado em Fausto, de
Goethe. Direção, sonoplastia e plano de luz: Moisés Monteiro de Melo Neto.
Assistente de direção: Rivaldo Casado. Execução de iluminação e som: Everton
Tom e Moisés Monteiro de Melo Neto. Cenário e figurinos: o grupo. Execução de
figurinos: Dayse Burgos. Coreografia: José Farias Júnior. Maquiagem: Edilson
Adnil e Vládmir Combre de Sena. Produção executiva: Edilson Adnil, Rivaldo
Casado, Henrique Amaral, Mário Aniram e Moisés Monteiro de Melo Neto. Elenco:
Simone Figueiredo, Vládmir Combre de Sena (substituído por Rivaldo Casado),
José Farias Júnior, Henrique Amaral, Mário Aniram e Edilson Adnil. Realização
em parceria com Artistas Unidos.
Perfume
Texto: Ascenso Ferreira. Adaptação, direção, interpretação,
maquiagem, figurino e sonoplastia: Vládmir Combre de Sena. Operação de som:
Mozart Guerra. Operação de luz: Daniela Araújo. Programação visual: Deborah
Echeverria.
Brega-chique & camarão
Texto, direção, seleção musical e iluminação: Henrique
Amaral. Maquiagem, operação de som e produção: Mozart Guerra. Programação
visual: Deborah Echeverria. Elenco: Paulo Barros, Simone Figueiredo, Henrique
Amaral e Mozart Guerra (voz em off).
Rival de prata
Texto: Henrique Amaral. Direção, sonoplastia e cenário:
Mozart Guerra. Figurinos: Valéria Loreto, Luciana Neves e Mozart Guerra.
Iluminação: Valério Baracho e Gleison Baracho (substituídos por André Rosa).
Programação visual: Deborah Echeverria. Músicos: Elly Ameling e Dalton Baldwin.
Elenco: Luciana Neves e Valéria Loreto. Realização em parceria com o Espaço
Água de Beber.
Urânia no rastro do Halley
Texto, direção, letras das músicas e direção de efeitos em
estúdio: Augusta Ferraz. Direção musical, músicas e direção de estúdio:
Henrique Macêdo. Cenário, bonecos e contra-regra: João Neto. Figurinos: João
Neto e Zuleima Ferraz. Maquiagem: Vládmir Combre de Sena e Augusta Ferraz.
Coreografia: Paulo Ricardo Paiva e Márcia Virgínia. Plano de luz e execução:
Horácio Falcão. Canhão de luz: Augusta Ferraz e Gustavo Túlio. Operação de som:
Roberto Carlos. Olho de Urânia: Mozart Guerra. Execução de figurinos e adereços
e administração financeira: Zuleima Ferraz. Cenotécnico e marceneiro: Marcos
Almeida. Maquinista: João Neto e Wilson. Músicos (gravação): Henrique Macêdo,
João Lera, Eliano Macedo, Hubert e Tovinho. Técnicos de gravação: Hubert
Frederico Resembauer e Neném. Programação visual e assistência de produção:
Vládmir Combre de Sena. Produção executiva: Augusta Ferraz e Henrique
Rodrigues. Elenco: Paulo Barros, Henrique Amaral, Vládmir Combre de Sena,
Henrique Rodrigues, Fátima Barreto, Gilberto Brito, Magdale Alves, Moisés
Monteiro de Melo Neto e Augusta Ferraz (os dois últimos com voz em off).
Realização em parceria com a Papagaios Produções Artísticas.
Prazeres da revolução
Texto e direção: Moisés Monteiro de Melo Neto. Assistente de
direção e produção: Rivaldo Casado. Sonoplastia: Ricardo Barros. Figurinos:
Mohan. Adereços: Zuleima Ferraz. Bonecos: Buarque de Aquino e Mozart Guerra.
Plano de luz: Gustavo Túlio. Execução de iluminação: Luiz Antônio Moraes e
Manoel Souza Lima (substituídos por Valério Baracho e André Cavalcanti).
Programação Visual: Otávio Cariello. Administração: Mário Castro. Elenco:
Simone Figueiredo, Moisés Monteiro de Melo Neto, Andréa Rezende, Fernando
Tavares (substituído por Paulo Barros) e Edilson Simões. Realização em parceria
com Artistas Unidos.
Evita-me à cubana
Texto: Moisés Monteiro de Melo Neto. Direção e figurinos: Moisés
Monteiro de Melo Neto. Elenco: Simone Figueiredo, Fernando Tavares e Renata
Echeverria (substituída por Andréa Rezende).
Cinza solidão
Texto: Henrique Amaral. Direção, cenário, figurinos, som,
plano de luz e maquiagem: Carlos Carvalho. Execução de iluminação: Mozart
Guerra. Elenco: Magda Alencar, Valéria Loreto e Henrique Amaral. Realização em
parceria com Artistas Unidos.
Percepção
Texto, direção, seleção musical e operação de som: Henrique
Amaral. Efeitos musicais: Paulo Santos. Cenário, grafismo em spray e maquiagem:
Mozart Guerra. Marcenaria: Mozart Guerra e Caetano Santos. Figurinos: Lia
Menezes, Terezinha e Ibéria Vila Nova. Contra-regra: Kátia Virgínia. Coreografia:
Rivaldo Casado. Plano e operação de luz: Horácio Falcão. Programação visual:
Rosa Campello. Assistentes de produção: Lia Menezes, Mozart Guerra e Rivaldo
Casado. Produção geral: Henrique Amaral e Mísia Coutinho. Elenco: Henrique
Amaral, Helena Vila Nova, Rivaldo Casado, Luciana Neves, Roberto Vieira,
Arlindo de Aquino e Myriam Pimentel.
Anjo vitimado
Texto baseado em obras de Nietzche e Tankred Dorst.
Adaptação e direção: Augusta Ferraz. Adereços: Walter Holmes. Elenco: Augusta
Ferraz e Baulo Barros.
O perfume da navalha
Texto a partir de obras de Manoel Constantino, C. W. Ceram e
Robert Brustein. Adaptação e direção: Henrique Amaral. Figurinos: Edilza de
Aquino. Seleção musical: Henrique Amaral e Mozart Guerra. Operação de som:
Erlanger e Mozart Guerra. Assistência de som e luz: Rogério Robalinho e
Lourival Nouzinho. Contra-regra: Lia Menezes. Programação visual: Adeilson
Amorim (Chocolate), Roberto Vieira e Henrique Amaral. Maquiagem: Mozart Guerra.
Produção executiva, cenário e elenco: Henrique Amaral e Roberto Vieira.
Pós-lavas do Vesúvio
Texto e direção: Henrique Amaral. Som, programação visual e
maquiagem: Mozart Guerra. Figurinos: Lia Menezes. Luz: Gleison Baracho, Valério
Baracho e André Cavalcanti. Produção executiva: Gilson Carneiro Leão, Antônio e
João Monteiro. Elenco: Manoel Constantino, Fábio Caio e Henrique Amaral.
Realização em parceria com o Grupo de Teatro Cara Pintada.
Cleópatra
Texto: Moisés Monteiro de Melo Neto. Direção, cenário e
sonoplastia: Augusta Ferraz. Figurinos: Zuleima Ferraz. Iluminação: Helânio
Farias. Assistente de produção: Rivaldo Casado. Elenco: Simone Figueiredo,
Vládmir Combre de Sena, Fátima Barreto, Roberto Vieira, Paulo Barros e Laelson
Vitorino.
O desombumbrar da ambunda
Texto e direção: Vládmir Combre de Sena. Elenco: Rivaldo
Casado, Simone Figueiredo e Paulo Barros.
O bolo ou o vazio do céu que esvaziou o mundo
Texto: Moisés Monteiro de Melo Neto. Direção, interpretação,
plano de luz, sonoplastia, figurinos e adereços: Augusta Ferraz e Moisés
Monteiro de Melo Neto. Maquiagem, operação de som e programação visual: Mozart
Guerra. Execução de iluminação: Valério Baracho, Glesion Baracho e André
Cavalcanti.
1987
Um tostão para Isabelita
Texto, direção e figurinos: Moisés Monteiro de Melo Neto.
Músicas: Moisés Monteiro de Melo Neto e Ricardo Monteiro (Ricardo Valença).
Elenco: Simone Figueiredo, Moisés Monteiro de Melo Neto e Black Escobar.
1988
Com a víbora no seio
Texto: Moisés Monteiro de Melo Neto e Henrique Amaral.
Direção: Moisés Monteiro de Melo Neto. Figurinos e adereços: Mozart Guerra. Som
e luz: Marinho Moura (substituído por Gilson Magalhães). Elenco: Rivaldo Casado
e Heitor Dhalia (posteriormente substituído por Henrique Amaral). Realização em
parceria com Como Assim? e Nova Postura Empreendimentos Culturais.
Hamlet – um musical pop
Texto: Moisés Monteiro de Melo Neto e Ricardo Monteiro
(Ricardo Valença). Direção: Paulo Falcão e Alberto Giecco. Músicas e direção
musical: Ricardo Monteiro (Ricardo Valença). Cenário: Mozart Guerra. Figurinos:
Walter Holmes. Elenco: Moisés Monteiro de Melo Neto, Simone Figueiredo, Ana
Célia, Paulo Falcão, Paulo Barros, Bruno Garcia, Carlos Mesquita, Cláudia
Guerra, Alexandre Alencar e Heitor Dhalia. Realização em parceria com a Festim
Produções.
1989
A revolta dos brinquedos
Texto: Pernambuco de Oliveira e Pedro Veiga. Direção: José
Francisco Filho. Cenários e figurinos: Buarque de Aquino. Maquiagem: Gê
Domingues. Produção executiva: Moisés Monteiro de Melo Neto e Mísia Coutinho.
Elenco: Penha Camarotti (substituída por Kalina de Paula), Buarque de Aquino,
Marcus Vinícius, Chico Ribeiro, Vavá Paulino, Clarice Andrade e Madalena
Aguiar. Realização em parceria com a Circus Produções Artísticas.
A queda da bastilha
Texto, direção e figurinos: Henrique Amaral. Perucas e maquiagem:
Gê Domingues. Execução de sonoplastia e iluminação: Helânio Farias. Elenco: Moisés
Monteiro de Melo Neto, Mísia Coutinho, Henrique Amaral, Gê Domingues, Jany
Stamford, Vládmir Combre de Sena e Rivaldo Casado.
O horror ou Frankenstein em Pasárgada
Texto: Moisés Monteiro de Melo Neto. Direção e cenário:
Buarque de Aquino. Adereços e maquiagem: Gê Domingues. Sonoplastia: Gustavo
Túlio. Iluminação: Augusto Tiburtius. Produção executiva: Moisés Monteiro de
Melo Neto e Mísia Coutinho. Elenco: Henrique Amaral, Black Escobar e Maria
Paula Costa Rego.
Cleópatra
Texto e direção: Moisés Monteiro de Melo Neto. Figurinos,
adereços e maquiagem: Buarque de Aquino. Execução de maquiagem: Gê Domingues.
Elenco: Mísia Coutinho, Luciano Rodrigues, Ludi Kadija, Dayse e Valdeck Lemos.
Um tostão para Isabelita
Texto e direção: Moisés Monteiro de Melo Neto. Músicas: Moisés
Monteiro de Melo Neto e Ricardo Monteiro (Ricardo Valença). Figurinos: Buarque
de Aquino. Maquiagem: Gê Domingues. Elenco: Valdi Coutinho (substituído por
Mísia Coutinho) e Moisés Monteiro de Melo Neto.
Vendo a lua nascer quadrada
Texto: Henrique Amaral. Direção: Mísia Coutinho. Elenco e
figurinos: Henrique Amaral e Mísia Coutinho.
Fausto (os deuses da tormenta e os gigantes da terra)
Texto: Fernando Pessoa. Direção: Rivaldo Casado. Execução de
sonoplastia e iluminação: Renato Specht. Contra-regra: Beth Specht. Elenco:
Edgard Franco de Sá, Henrique Amaral, Íris Pinto e Nilza Lisboa (voz em off).
Olinda, frevo e poesia
Texto e direção: Henrique Amaral. Elenco, figurinos e
maquiagem: Henrique Amaral e Rivaldo Casado.
Revivencial
Texto: Moisés Monteiro de Melo Neto, Fernando Tavares e
Mário Castro. Direção: Moisés Monteiro de Melo Neto. Elenco: Fernando Tavares,
Edilson Adnil, Lee Majors, Luciana Luciene, Ludi Kadija e Mário Gomes.
O que teria acontecido com Bette Davis?
Texto e direção: Moisés Monteiro de Melo Neto. Elenco: Mísia
Coutinho, Ludi Kadija, George Alencar, Jailson Martinho e Marco Antônio
(Marquesa).
1990
Shakespeare acorrentado
Texto: Moisés Monteiro de Melo Neto. Direção: Moisés
Monteiro de Melo Neto e Henrique Amaral. Maquiagem e cabelos: Gê Domingues e
Ricardo Santaclara. Sonoplastia: Gustavo Túlio e Ricardo Barros. Execução de
som e iluminação: Everton Azevedo (Tom). Elenco: Marco Antônio (Marquesa), Ludi
Kadija, George Alencar, Patrícia Hearst, Lúcio Mário, Gê Domingues, Jailson
Martinho e Henrique Amaral.
A maior bagunça de todos os tempos
Texto: Moisés Monteiro de Melo Neto. Direção e figurinos:
Buarque de Aquino. Assistência de direção: Beth Marinho. Cenário: Simone
Figueiredo. Maquiagem e adereços: Gê Domingues. Elenco: Lucinda Frota, Luciano
Rodrigues, Simone Figueiredo, Moisés Monteiro de Melo Neto, Carlos Mesquita e
Valdeck Lemos.
Um tostão para Isabelita
Texto e direção: Moisés Monteiro de Melo Neto. Músicas: Moisés
Monteiro de Melo Neto e Ricardo Monteiro (Ricardo Valença). Cenário: Gê
Domingues. Elenco: Simone Figueiredo e Moisés Monteiro de Melo Neto.
1991
Com a víbora no seio
Texto, direção, figurinos e elenco: Moisés Monteiro de Melo
Neto e Henrique Amaral.
Mara Méri, a trágica história de uma atriz desempregada
Texto e direção: Henrique Amaral. Figurinos e maquiagem: o
grupo. Elenco: Marco Antônio (Marquesa), Henrique Amaral e Paulo Ricardo
Ferreira.
La cumparsita
Texto, direção e figurinos: Moisés Monteiro de Melo Neto.
Coreografia: Black Escobar. Maquiagem: Gê Domingues. Elenco: Simone Figueiredo,
Ivonete Melo, Jeovane Magalhães e Black Escobar.
1992
Um tostão para Isabelita
Texto e direção: Moisés Monteiro de Melo Neto. Músicas: Moisés
Monteiro de Melo Neto e Ricardo Monteiro (Ricardo Valença). Elenco: Vavá
Paulino e Buarque de Aquino.
Dom Casmurro
Texto: Machado de Assis. Adaptação, direção e figurinos: Moisés
Monteiro de Melo Neto. Elenco: Mísia Coutinho, Valdeck Lemos e o Grupo de
Teatro da Fafire.
1998
Dom Casmurro
Texto: Machado de Assis. Adaptação: Moisés Monteiro de Melo
Neto. Direção e sonoplastia: Henrique Amaral. Figurinos: o grupo. Maquiagem: Gê
Domingues. Elenco: Mísia Coutinho, André Numeriano, Moisés Monteiro de Melo
Neto e Henrique Amaral.
1999
Varietê teatral
Textos: Orson Welles (Cidadão Kane), Tennessee Williams (De
repente no último verão) e Henrique Amaral (A taba da ogira, Jaburu do Pólo
Pina agradece consolo, Fleuma, Luxo e Bronca safada). Adaptação e direção:
Henrique Amaral. Elenco: Henrique Amaral, Ivonete Melo e Moisés Monteiro de
Melo Neto. Realização em parceria com a Coopera.
Cinema mundial
Textos: Patrick Hamilton (À meia luz), Tennessee Williams
(De repente no último verão), Orson Welles (Cidadão Kane) e Nelson Rodrigues
(Boca de Ouro). Adaptação e direção: Henrique Amaral. Elenco: Henrique Amaral,
André Numeriano e Joselma de Freitas. Realização em parceria com a Coopera.
Para um amor no Recife
Texto: Moisés Monteiro de Melo Neto. Direção: Carlos
Bartolomeu. Assistência de direção: Vavá Paulino. Figurinos: Andréa Monteiro e
Marcelo Taulbert. Cenário: Cláudio Cruz. Cenotécnica: Cristovam Sovagem.
Cabelo: Fernando Costa. Design e trilha sonora: Hélder Aragão (DJ Dolores).
Iluminação: Alexandre Veloso e Beto Trindade. Administração de produção: Rec
Produtores Associados. Produção executiva: Simone Figueiredo e Ivonete Melo.
Assistência de produção: Luciene Vilhena. Elenco: Gustavo Falcão, Elaine
Kaufmann e Márcio Carneiro.
Antes do bate-papo, foram apresentados o documentário em vídeo Ilusionistas rumo ao 3º Milênio, com
roteiro e direção de Moisés Monteiro de Melo Neto, a performance Ensaio de Hamlet, com interpretação e direção de Vavá Paulino, a canção Manias ocidentais, com Gê Domingues, e
um número de dança do ventre com a Cia. de Dança Tatiana Queiroga.
“Graças ao idealismo, à capacidade de sonhar e de buscar novas formas de
expressão estética e à insistente inquietação dos jovens pernambucanos se
recicla, se renova, se sacode e se fortalece. Pouco importa se o resultado,
quase sempre, não corresponde à fome do tradicional mercado consumista. É bom
até que muitas vezes isto nem aconteça. Um sinal de que o trabalho não se
enquadra dentro do convencional sabor do modismo. Não fora a audácia dos jovens
e a cena não se renovaria. Assim, mesmo quando os jovens produzem espetáculos
de qualidade técnica deficitária e de linguagem formal confusa e duvidosa quase
sempre estão contribuindo de maneira vigorosa para a renovação dos padrões, dos
valores, das intenções e das ações. É dessa participação de gente nova e por
esta ótica que desejo anunciar o reaparecimento da Ilusionistas, dentro em
breve, com novas produções, sempre tentando se firmar dentro dos meios
produtivos locais com atividades lucrativas mas através de espetáculos de
qualidade, que buscam o novo, o anticonvencional, o experimental. (COUTINHO,
Valdi. “Planos de Ilusionistas”. Diário
de Pernambuco. Recife, 16 de março de 1989. Caderno Viver/Coluna Artes
Cênicas. p. B-4.).
“A trama de ‘Punhal’ é densa, a ação se desenvolve num clima beirando o
mórbido, com a morte sendo preparada e rondando o palco da primeira à ultima
cena do espetáculo. ‘Punhal’, decididamente, não diverte, não relaxa, não
descontrai. È como se fosse um estilete penetrando profundamente de começo ao
fim da peça. Com ‘Punhal’, Henrique Amaral se revela um autor essencialmente
urbano, com uma dramaturgia em nada preocupada com a natural digestão do
espectador, muito pelo contrário, capaz de provocar alterações mentais
inquietantes. Talvez nesta ousadia e nesta coragem de estilo, sobretudo em
enveredar por um jogo teatral tão obsessivamente tenso, onde a ação está quase
totalmente concentrada no próprio interior do ser humano, resida o conteúdo
estético e a linguagem formal de maior expressão no texto de Henrique Amaral.
(...) ‘Punhal’ revela um autor cheio de talento e de capacidade para enveredar
num campo onde poucos se aventuram; o do âmago do ser humano, com um estilo
urbano, ousado e cruel, pois não procura tergiversar sobre temas que já não
encontram lugar na fútil sociedade contemporânea, como a morte, a dor, a
hipocrisia, a fatalidade – agressões que são tão comumente impostas ao homem”.
(COUTINHO, Valdi. “Henrique Amaral com um ‘Punhal’ na mão”. Diário de Pernambuco. Recife, 29 de
junho de 1985. Caderno Viver/Coluna Teatro. s. p.).
2010
O CIRCO DO FUTURO (BRUNO E O CIRCO)
Trecho do texto
Para um amor no Recife
de Moisés Monteiro de Melo Neto
PERSONAGENS:
BEL- Garota da classe média alta.
MÁRCIO- Estudante da
pós-graduação, funcionário público.
Jornal do Commercio fala sobre peça de Moisés Monteiro de Melo Neto: Para um Amor no Recife
Num banco na Av. Beira Mar, um rapaz de 20 e poucos anos,
dorme. Parece estranhamente adormecido. Diz algo que não se entende. Sua
mochila lembra as asas de um anjo. Usa uma bermuda até o joelho. Botas e meias
até o tornozelo.
Há um outdoor iluminado com os dizeres: “FELIZ 1998!”
Época : dia 24 de Dezembro, final do segundo milênio e o sol
já se pôs. Sons da avenida e do mar. Isabela está com um vestido curto, olhar
algo cansado. Tenta fazer uma surpresa.
Márcio não acorda, está dopado
provavelmente.
Bel – Márcio ô! Ei! Acorda.
Márcio – Ah...
Bel – Meu Deus, eu
não posso aguentar isso por muito tempo (fala isso para a platéia).
Márcio – Beeel! (acordando. Ri antes de falar)
Bel – Márcio, qualquer um podia roubar você, você não pode
dormir aqui. Vá para casa.
Márcio - Que casa?
(Pausa: Olham-se em silêncio. É uma oração).
Bel– Quer um pouco de colírio?
Márcio - Eu tenho –
a . (Pausa enorme).
Bel – Coloque então.
Márcio – Bel, eu
quero morrer. Eu não aguento mais.
Bel – Você está bebendo há 24 horas. Como você aguenta?
Isto não atrapalha os remédios, não? Este coquetel misturado com álcool não
deve fazer bem. E ficar sem dormir 48 horas. Você quer morrer?
Márcio – Quero (chora desesperado). Por que eu conheci
aquele homem? Por que o tempo não pára? Por que essa doença é tão feia?
Bel – Existe doença "bonita"?
Márcio – Fica comigo. Deixa ficar no teu colo, me leva
daqui pra algum lugar. Me salva você é meu anjo, me salva.
Bel – Vá para casa. Tome um banho, coma, durma.
Você não comeu nada.
Márcio – Porra (bêbado) sua merda! Você é merda.
Bel: – Eu não sou
obrigada a escutar isso. Não sou, está ouvindo?
Márcio – Como é que eu vou fazer? (abre a bolsa,
procura algo). Fui roubado (pausa). Roubaram o meu celular. Estes desgraçados!
Bel – Você foi caçar ontem, não foi?
Márcio – Você não quer transar comigo, diz que não tem
medo da morte, mas não é suicida. (pausa). Bel...Fica comigo hoje.
Bel – Você já ligou pra sua mãe?
Márcio – Pra
quê? (pausa) Aquela casa pequena é uma prisão enorme. Eu não aguento mais, não
aguento mais.
Bel – Tome o telefone (tira da bolsa) ligue para
ela. Dona Ana deve estar preocupada.
Márcio – Ela não se preocuparia. Preocupação causa
envelhecimento e ela não quer envelhecer, tem 53 anos e diz que "dá para o
gasto". (pausa. Ri – sarcástico).
Eu quero morrer. ..essa porcaria incurável, esses remédios... (agarra – se com
a bolsa). Eu fui tão feliz antes, eu nunca mais vou ser feliz não vou encontrar
mais ninguém para me amar. Quando eu digo que tenho isso as pessoas fogem
dizendo que eu sou muito "pesado" dão o fora. Nem posso beijar você
direito. Você acha que pega com a saliva.
Bel – Eu estou com um corte na boca.
Márcio – Está vendo? Se eu não tivesse dito que tinha
isso você continuaria me beijando loucamente como fazia antes de eu lhe
contar... tudo. (pausa). Vamos fugir, Bel.
Bel – Vamos, eu estou de férias. (ri)
Márcio – Fica comigo hoje à noite Bel. É natal. Eu não
tenho ninguém, me bota pra dormir. Me dá um banho. Me tira dessa.
Bel – Não posso. Vou jantar com mamãe. (pausa) E
você bêbado assim faria escândalo.
Márcio – Janta comigo! Deixa eu ser teu namorado. Por
favor. Eu paro de sair à noite. Fico em casa. Fico lendo. Fica comigo. Deixa
somente eu ficar ao seu lado. Me abraça. Toca em mim (chora, apaga o cigarro)
passa a mão no meu cabelo, eu estou tão triste. Tão triste.
Bel – Deixa de drama Márcio ! Por que você não vai para casa e pronto?
Márcio – Me dá o telefone (liga) vou ligar para a
"boca da noite", "boca da escuridão"! A mama do meu câncer.
Bel – Sua mãe... Dona Ana. Santa ingratidão, não é,
Márcio ? Você não reconhece nunca o que
as pessoas fazem por você.
Márcio – Chama, chama e ninguém atende. A bruxa está
fora do ar (desliga, devolve o telefone a Bel).
Bel – (farta de tudo, mesmo assim esperançosa)
Quando esta noite... findará?
Márcio – Até quando a gente vai empurrar este sonho
pra frente?
Bel – Por que você não come alguma coisa? Vamos
naquele restaurante ali. Tem uma peixada ótima. Eu conheço...
Márcio – "Uma peixada ótima" (zombando).
Você é tão ridícula!
Bel – Não me chame desse jeito que eu não gosto.
Márcio – Você gosta de quê? Do César, não é?
Bel – Eu não quero falar sobre o César.
Márcio – Você vai ficar com ele hoje. Não vai?
(furioso)
Bel – Pare. Se você continuar assim, eu vou – me
embora. Que coisa!
Márcio – Hum. Tá zangadinha, é? (pega o colírio na
mochila e tenta colocar nos olhos. Não acerta).
Bel – Deixa que eu te ajudo. (põe gotas de colírio
nos olhos dele que se deitou no colo dela).
Márcio – Você ficou velando meu sono aqui. Você veio.
Você veio. Você é meu anjo.
Bel – Bobagem...
Márcio – Fica comigo. Vamos para um hotel.
Bel – Meu cavalo marinho. Meu unicórnio voador. Eu
não posso. O máximo que posso é deixar você lá. Ficar um pouco e sair. Vou pra
casa da minha mãe.
Márcio – Eu estou sozinho. Queria tanto ficar com
você. Só nós dois. Vamos para sua casa.
Bel – Não. Márcio
eu já disse quais são os meus planos.
Márcio – E o meu futuro? Será que eu vou ficar
deformado?
Bel – Você é assintomático. Ninguém diria que você
tem isso.
Márcio – "I – s – s – o". Muito bem explicado:
"i – s – s – o". Eu odeio i – s – s – o!
Bel – Vamos comer. Levanta!
Márcio – Você vai jantar comigo!
Bel – Não. (pausa). Vou somente lhe acompanhar.
Márcio – Então eu não quero jantar.
Bel – Você precisa comer.
Márcio – Não quero.
Bel – Vá. Deite aqui, meu filho. Conte pra sua
terapeuta de plantão...
MATÉRIA SOBRE PARA UM AMOR NO RECIFE no Jornal do Commercio:
Trilha mangue conduz Para um Amor no Recife
O movimento mangue ganha hoje o seu primeiro representante
nas artes cênicas pernambucanas. A estética que levou a música feita em
Pernambuco de volta à mídia nacional, conduz a trama de Para um Amor no
Recife, espetáculo que estréia hoje, às 21h, no Teatro Apolo. A peça tem
texto de Moisés Monteiro de Melo Neto e direção de Carlos Bartolomeu.
"Decidi dedicar minha tese de pós-graduação em
Literatura Brasileira ao compositor Chico Science e isso despertou a vontade
de escrever um texto para o teatro. Sou super fã do movimento mangue, adoro o
som e os conceitos trabalhados nas músicas. A peça veio dessa paixão",
confessa Moisés Monteiro de Melo Neto, que traz no currículo textos
premiados, como Um Certo Delmiro Gouveia e Auto de Casa Amarela.
"A peça narra os conflitos e aventuras do casal Bel
(Elaine Kauffman) e Márcio (Gustavo Falcão), jovens de classe média, bem
sucedidos e que não conseguem entregar-se plenamente ao amor. "São dois
intelectuais, descolados, viajados, mas que são impossibilitadas de ficarem
juntas. No fundo a trama resume-se ao discurso de dois indivíduos que se
encontram à noite, num acesso de euforia", explica Moisés.
No elenco da produção, além dos atores Gustavo Falcão e
Elaine Kauffman, está o ator goiano Márcio Carneiro, que atua como a
consciência de Márcio. Os figurinos do espetáculo são uma criação de Andréa
Monteiro e Marcelo Taubert (da grife Sakapraia) e a trilha sonora é do DJ
Dolores, Hélder Aragão.
-----------------------------------------------------------------------
|
Jornal
do Commercio
Recife - 29.08.99
|
2002
A ilha do tesouro
Texto: Moisés Monteiro de Melo Neto, adaptado da obra de
Robert Louis Stevenson. Direção: Carlos Bartolomeu. Trilha sonora e produção
musical: Ricardo Valença. Preparação vocal: Múcio Callou. Coreografia: Maria
Paula Costa Rêgo. Figurinos, adereços e maquiagem: Marcondes Lima e Henrique
Celibi. Coordenação dos ateliês: Henrique Celibi. Cenário: Cláudio Cruz e
Henrique Celibi. Programação visual: Cecília Leite e Valdemir Cruz. Iluminação:
Triana Cavalcanti e Beto Trindade. Produção executiva: Simone Figueiredo.
Elenco: Gérson Lobo, Ivo Barreto, Bobby Mergulhão, André Ricardo, Eduardo Japiassu,
Pascoal Filizola, Anna Polistchuk, Ana Medeiros (substituída por Geisa
Barlavento), Ilka Porto, Sandra Rino, Raimundo Branco, Antônio Rodrigues,
Valter D'Souza e Bernardo Medeiros. Realização em parceria com a Trupe do
Barulho.
Ainda sobre o grupo que Moisés Monteiro de Melo neto fundou
com Augusta Ferraz, a ILSUIONISTAS CORPORAÇÃO ARTÍSTICA, em 1983:
A Ilusionistas
produziu ainda o lançamento do romance A incrível noite dos sentimentais
(1983), de Moisés Monteiro de Melo Neto; o curso Teatro Contemporâneo em Debate
(1984), com Antônio Cadengue; os shows Tara blue (1989) e Ketchup ópera (1990),
com Gê Domingues; e os vídeos de ficção Frankesntein de Moisés Monteiro de Melo
Neto (1989), com direção do próprio, e Com o crime nos olhos (1992), de Moisés
Monteiro de Melo Neto, com direção dele e de Carlos Cordeiro, e O beijo da
serpente ou God part one (1993), de Henrique Amaral, com direção de Mozart
Guerra e Henrique Amaral e também o 1º Seminário de Teatro para a Infância e
Juventude, em parceria com a Apatedepe.
O humor cáustico de Moisés Monteiro de Melo Neto, marcado
por profunda ironia, talvez não seja apreciado pelos críticos recifenses. A
Liberdade com que satirizou “Faustus” a obra do imortal Goethe, rebatizando-a
de “Faustina” e exibindo-a na Boate Misty, rendeu-lhe mais ressalvas do que
elogios por partes dos que analisam os espetáculos teatrais. Denominando-se um
intelectual, Moisés Monteiro de Melo Neto, declarou ao jornalista Valdi
Coutinho: sou muito criticado e mal
compreendido na minha intenção de tirar o teatro do palco e introduzi-lo,
também, em bares e boates.
Em 2010 é montado mais um texto de Moisés : BRUNO E O CIRCO
DO FUTURO:
Matéria Jornal do Commercio sobre Bruno e o Circo, de Moisés Monteiro de Melo Neto
moises monteiro de melo neto sendo entrevistado por polyana diniz do Diário de Pernambuco. Bruno e o circo
O circo do futuro, um musical em cartaz no Recife
Por Moisés Monteiro de Melo Neto, o autor
O Circo do Futuro é o quinto musical que escrevo. Costumo
compor as letras e dar sugestões quanto a ritmo e melodia. Já tive vários
parceiros que são músicos tarimbados, como é o caso de Henrique Macedo, Ricardo
Valença e, no caso do Circo, Paulo Smith. Procuramos sempre entreter e
trabalhar com o espírito da ética do respeito ao próximo.
Os musicais para a juventude trazem sempre o renovado
frescor de voltar no tempo, ou trabalhar a questão do ser humano com uma ótica
atemporal, isto é: música atinge níveis da sensibilidade que estão além das
limitações de faixas etárias.
O circo do futuro é composto em sua maior parte por números
musicais. As referências são as mais diversas. Tenho viajado muito pelo Brasil
e pelo mundo, além de ser um ávido espectador de cinema, o que é óbvio, inclui
centenas de musicais que já assisti, no palco e na tela. Passei, por exemplo:
algum tempo na Inglaterra, Estados Unidos e até em alguns países árabes, como o
Egito (o Cairo é uma espécie de Broadway do mundo árabe), sempre indo a teatro
e a shows.
Trabalhei com excelentes coreógrafos como Black Escobar,
Heloísa Duque, Diana Fontes e venho trabalhando com o teatro para a juventude
há duas décadas como ator, diretor, autor e produtor. Atualmente tenho tido o
prazer de assistir ao sucesso de O Circo do Futuro. É uma honra trabalhar com
dois produtores tão dedicados como Ulisses Dornelas e Simone Figueiredo, toda a
equipe muito comprometida, cenógrafa, figurinista, sonoplasta, iluminadores,
todos. O diretor Carlos Bartolomeu já dirigiu outro musical que escrevi, A Ilha
do Tesouro, com talento de um mestre, e obteve em 2002/ 2003 um sucesso junto
ao público.
Fico observando as crianças e os adultos que as acompanham
ao espetáculo O Circo do Futuro. Muitos saem emocionados com o que viram e voltam
outras vezes. Um pai me disse que estava assistindo pela terceira vez e que se
encantava tanto quanto seus filhos e sua esposa que nunca tinha visto uma
produção nestes moldes no Recife. Tem que se levar em conta que no teatro nunca
há duas apresentações iguais. A dinâmica entre atores e público sempre gera
novas expectativas e mudanças dentro de um planejamento detalhado como é o da
produção de O Circo do Futuro.
O fato de haver uma espécie de show dentro do espetáculo não
interfere nas outras partes da peça que contém a narrativa. Alguns dos números
musicais funcionam como contraponto ao texto. Os quinze artistas em cena
trabalham com dança, música, circo e teatro.
Ao realizar a montagem do espetáculo infanto-juvenil O Circo
do Futuro, o tive como finalidade levar o público jovem à reflexão sobre
o relacionamento Pai/Filho e Arte/Educação e colocar em questão a importância
do lúdico na formação da criança. (o pai pensa somente numa educação formal, o
filho numa onde o lúdico, através da arte circense, seja incluído. Ele fala
sobre seu novo texto e de como ele visualizou a sua montagem:
O Teatro agrupa as pessoas, ajuda na leitura, na fantasia e
na imaginação.Com ele , aprende-se a respeitar o outro e as diferenças. Uma
relação dialética que vem se desenvolvendo através dos milênios, dos gregos aos
índios, e por que não dizer: ele está presente em quase todas as culturas
conhecidas.
Quando penso na montagem de O Circo do Futuro, penso em
levar o público jovem à reflexão sobre o relacionamento Pais e Filhos
em interface com a Arte/Educação e colocar em questão a importância do
lúdico na formação da criança. (o pai pensa somente numa educação formal, o
filho numa onde o lúdico, através da arte circense, seja incluído. Proponho o
divertimento a partir de uma história simples : um garoto, como tantos outros,
aventureiro, faz parte de uma família que mora num complexo espacial. O pai é
um empresário, num futuro não determinado.Ele tem dois filhos: Bruno, um garoto
de oito anos com uma imaginação atiçada pelo mundo do circo (que ele descobriu
num antigo notebook) , e Bela , uma jovem adolescente que não quer saber de
“coisas de crianças “, pois está prestes a entrar no mundo dos adultos.Resta ao
pequeno Bruno mergulhar em uma nova aventura , mas seu pai o quer envolvido num
mundo mais prático e tecnicista.
A peça tem como pontos-chaves números (apresentações no
contexto da peça) musicais e circenses em diálogo com a tecnologia. Ao resgate
de antigos números e a mãe foi banida por suas idéias ousadas. Medusa é o
nome dela, mantém um circo beneficente com os artistas da Terra, planeta onde
está exilada. Há uma homenagem minha aos circenses e às encenações nos circos
populares e aos grandes circos internacionais que fizeram a alegria da minha
infância. Mesclam-se aqui, também, as inovações do circo contemporâneo (vide
Cirque du Soleil) que tanto me fascinam.
Como nas fábulas coloquei os animais com personalidades
humanas (como acontece em boa parte dos desenhos animados que as crianças
adoram): é neste sentido que aparecem os animais no circo do futuro: como
integrantes de um universo fabuloso. Na verdade são seres mutantes,
nativos do planeta Terra, que ainda não tiveram autorização do Império para
atingir níveis superiores. Medusa liderou uma revolução por direitos iguais
para todos no universo, por isso foi expulsa da Ordem.
Coloquei também a inquietante discussão em torno dos
direitos dos androides, estes seres que poderão ou não ser aperfeiçoados
pelos homens no futuro, a ponto de se assemelharem a eles em quase tudo
(inclusive a paixão: a peça também trata deste tema: a discussão dos homens com
suas maquinas pensantes). Bruno possui um andróide, chamado Curumim, que lhe
serve de companhia. Curumim se apaixona por Bela e se inquieta quando acusado
de ser apenas uma máquina.
Quando pensei na música imaginei uma comunicação entre o
passado e a projeção de um futuro, num tempo presente dinâmico e criativo. Quis
algo que melodicamente sinalizasse várias épocas, sendo os violões a
representação lúdica do mundo no passado e os instrumentos eletrônicos o mundo
digital o futuro.
A mecânica básica do espetáculo é o movimento com uma mescla
de linguagens que vai das gírias urbanas a reinvenção da fala pelas
crianças, além de elementos cênicos de circo, teatro, cinema, dança, desenho
animado e música. Afinal, como diria Roland Barthes: o que é literatura senão
linguagem? Tratamos desta com respeito à expressão do jovem, da criança. Houve
uma pesquisa muito intensa do nosso grupo neste sentido.
Qual o futuro da arte circense? Como o lúdico e a arte podem
ajudar na construção de um futuro mais justo, melhor? Que espécie de família
estamos projetando para o futuro?
Como todo texto de teatro deve ser: este é para ser
representado e não simplesmente lido. Há nas entrelinhas uma orientação cênica
que o une à direção de forma inextrincável. Ele quer transformar um público.
Tentei trabalhar com o caráter histórico e com as falhas humanas (a alienação
em relação a certos problemas essenciais do ser). Tentei expressar o mundo
a partir do universo da criança, entrelaçando o ético e o pedagógico, na
expressão do querer-ser dos homens e do ser das coisas. É texto ao mesmo tempo
contestador e reconciliador, quer menos exprimir o real do que significá-lo.
Pergunta ao espectador: o que se deve fazer numa situação como esta em que se
encontra a família de Bruno?
A minha paixão pela música eu compartilho-a com Paulo Smith
mais uma vez. Da Figueiredo vem um lado estético que me acalanta. Do mestre
Bartô eu ganho a representação do inconsciente num espetáculo
comprometido com o teatro-dança, neste caso incorporando várias
possibilidades, e fixando no concerto com o diverso, um posicionamento onde a
soma dos contrários é inaugural, e definindo tal realização como exercício e
processo. Legal, não?
O Circo do Futuro é um musical que tem em cada número uma
divertida aventura para todas as idades, discutindo a problemática dos
relacionamentos familiares neste novo milênio que se anuncia cibernético mesmo
que ainda estejamos envolvidos por tantas raízes dos séculos passados e
envoltos ainda num universo não totalmente explicado. longo poema para crianças
de todas as idades.”
Das Idéias que Circulam numa Montagem do espetáculo O CIRCO
DO FUTURO (BRUNO E O CIRCO)
por Carlos Bartolomeu
Nossa montagem teatral é um testemunho. Incorpora idéias
preestabelecidas, diálogos exploratórios, muito de sonho, impossibilidades, e
um reconhecimento das ‘tecnicalidades’ inerentes à proposta e suas metas. Som e
fúrias...
Tal montagem exercita a partir do discurso da dramaturgia,
uma nova leitura sobre as relações parentais, articulando-a com o futuro;
evocando dele como núcleo imagético, um testemunho do apanhado infantil perante
o universo televisivo. Discernindo entre credibilidade e realidade, pede o
reconhecimento de que a ideia central em sua representação encaminha-se pela
aproximação com a diversidade dos textos, pela polissemia... Teatro e encenação
mestiços, assumindo o compromisso, em matizar, conjugar diversidades,
pluralidades.
O Circo do Futuro na sua arquitetura de encenação enuncia o
(i)limitado da visão adulta sobre as fantasias da infância, e o dialogo dessa
mesma infância com os meios de comunicação, e os brinquedos futuríveis.
Consoante tal particularidade, é também, a fala sobre a distante proximidade
entre pais e filhos, cifrada e decifrada no ato de arremedar mangais e animês.
Adultos de olhar pueril, crianças de visão absortas.
O Circo do Futuro desponta em uma geografia envolta pela
música, compromete-se com o teatro-dança, no nosso caso incorporando todas as
possibilidades, e fixando no concerto com o diverso, um posicionamento
onde a soma dos contrários é inaugural,
e define tal realização como exercício e processo.
As palavras dos produtores:
Sonhar, brincar, sentir o cheiro da pipoca no ar; viajar na
velocidade luz; despertar sob uma tenda multicolorida e repleta
demoções,aventuras,suspense e fantasia.Tudo isso tem nome: O Circo do Futuro,
musical que encanta crianças de várias idades e gerações. Produzir em parceria
com a competente pesquisadora cultural, Simone Figueiredo, dividir o palco com
talentosos artistas , é fantástico e encantador, uma felicidade ímpar. Porém,
não podemos errar. Queremos premiar o público com um espetáculo envolvente,
poético e revolucionário para a cena teatral pernambucana e brasileira.
(Ulisses Dornelas)
Conceito das Músicas (Por Paulo Smith):
Um híbrido da música folclórica com o minimalismo eletrônico
leve e divertido pop.
O texto, como eu o entendo, acontece no momento em que o
Futuro faz contato com o Passado através de uma das mais (senão, a mais)
antigas das Artes: a Circense.
A comunicação entre esses dois momentos diferentes num mesmo
mundo será musicalmente interpretada através de instrumentos que possam
sinalizar suas respectivas épocas.
Processo de criação da coreografia
Por Heloísa Duque
Os atores que dançam e cantam!!! Foi uma experiência
maravilhosa, sempre tive vontade de coreografar um musical com adultos, e dessa
vez pude realizar esse desejo, apesar de a maioria não ter formação em dança acredito
que não deixamos a desejar em nada, procurei fazer um trabalho de acordo com
que o elenco ia me dando suas possibilidades, e num processo de troca fomos
montando as coreografias, que resultou num trabalho prazeroso, harmônico e empolgante, e sem dúvida nenhuma, mais uma
vez pude constatar que o artista é realmente apaixonado pelo que faz, apesar do
tempo que praticamente foi muito curto, não teve um ensaio onde o bom humor não
prevalecesse, sempre num ótimo astral foi o clima que aconteceu todo o processo
de montagem de O circo do futuro,acredito eu, que esse espetáculo vai levantar
crianças e pais das cadeiras... Estou feliz, realmente...
Ficha técnica
Texto: Moisés Monteiro de Melo Neto
Músicas: Moisés Monteiro de Melo Neto e Paulo Smith
Direção: Carlos Bartolomeu
Assistência de direção: Sandra Rino
Direção Musical: Sueudo Fernandes
Produção Musical: Tovinho e Ulisses Dornelas
Arranjos: Tovinho, Ulisses Dornelas, Sueudo Fernandes e Paulo Smith
Efeitos Sonoros: Carlos Bartolomeu, Sandra Rino, Tovinho e Ulisses Dornelas
Coreografia: Heloisa Duque
Figurino, Adereços e Maquiagem: Célio Pontes
Cenário: Séphora Silva
Design de Projeção: Séphora Silva e Robert Christian (REC Produtores
Associados)
Design de Luz: Játhyles Miranda
Oficina de Tecido: Célio - Escola Pernambucana de Circo
Programação Visual: Valdemir Cruz
Consultoria em Sonorização: Gera Vieira
Assessoria de Imprensa:Margarida Rodrigues
Fotos: Marcelo Lyra ( Olhonu)
Elenco
Catarina
Rosa Coro/
Macaca / Gatinha /Péssimusclovis
Herminia Mendes Coro / Tigresa / Psique / Alegrorinoclowns
Hilda Torres e Karla Martins Medusa/ Mãe / Coro
Lano de Lins
Curumim/Péssimusclovis
Mateus
Sobral
Bruno / Coro / Alegrorinoclowns
Pascoal Filizola Apresentador / Coro / Alegrorinoclowns
Reinaldo Patricio Cachorro /
Coro / Cupido /Péssimusclovis
Reyson
Santos Elefante
/ Coro / Péssimusclóvis
Romero Brito
Bruno
/ Coro / Alegrorinoclowns
Sandra Rino
Bela
/ Coro / Alegrorinoclowns
Soraya Silva
Foca
/ Coro / Pantera/Péssimusclovis
Zé Barbosa e André Ricari Senhor
X / Águia / Coro / Alegrorinoclowns
Participação Especial dos Circenses da Trupe do Palhaço
Chocolate
Execução Técnica
Execução Figurino: Henrique Celibi e Helena Limoeiro
Execução Adereço: Henrique Celibi e Altino Francisco
Execução Praticável: Cristovam Sovagen
Execução Cortina: Henrique Celibi
Execução Telão: Image Press
Execução de iluminação cênica: Játhyles Miranda e Cleisson Ramos
Execução de Sonoplastia: Carlos Antônio Dos Prazeres
Contra-Regra: Kátia Virgínia
Camareira: Beta Galdino e Nazaré
Coordenação de Produção: Simone Figueiredo
Produção: Simone Figueiredo, Ulisses Dornelas e Karla Martins
Realização: Ilusionistas Corporação Artística e Chocolate Produções Artísticas.
JORNAL DO COMMERCIO, Recife, 27 de setembro de 2011. Caderno
C, p. 8
JC leva assinantes ao teatro
O último domingo foi dia de teatro para os assinantes do
Jornal do Commercio. Pais e filhos lotaram o Teatro Boa Vista para assistir ao
espetáculo infantil O Circo do Futuro. A sessão, que teve direito a
refrigerante, biscoito Treloso e muita diversão com o Palhaço Chocolate, foi
exclusiva para assinantes do JC que se inscreveram no JC clube e participaram
do sorteio de ingressos.
A peça teve início às 10h30, mas uma hora antes a galeria do
teatro já estava lotada de crianças e adultos na expectativa para assistir à
história de Bruno e seus amigos. Escrita pelo teatrólogo Moisés Monteiro de
Melo Neto, o musical conta as aventuras de um menino que mora em uma galáxia no
futuro e cuja mãe foi expulsa por querer montar um circo. Cinco anos depois,
Bruno, a irmã Bela e o androide Curumim resolvem dar um presente diferente para
o pai e contratam então uma trupe circense da Terra, formada por Medusa e seus
animais falantes, sem saber que ela era sua mãe. Daí em diante é só alegria.
Durante toda a exibição era possível ver o entusiasmo da plateia, que sorria
com o jeito desengonçado do androide que queria ser gente.
Para Moisés, a iniciativa do jornal incentiva ao público a
frequentar o teatro, além de prestigiar a cena local. “Fiquei muito feliz com
essa parceria. Mostra que o JC é um veículo que tem uma atenção com nossa
cultura e com o que é produzido aqui. A peça é linda, lúdica e é um grande
presente para os assinantes. Tenho certeza que eles gostaram muito da ideia”,
disse.
Pais e filhos, tios com os sobrinhos, avós e netos, amigas
que aproveitaram para fazer um programa diferente com as filhas. O público era
bem variado. O casal Karla e Ricardo Marques levou os filhos Rodrigo, 5 anos, e
Maria Clara, 3. Segundo eles, foi uma grande oportunidade para reunir a
família. “A peça é uma ótima chance para fazermos algo juntos, nos divertir e incentivá-los
a frequentar o teatro desde pequenos. Nem sempre podemos desembolsar RS 60, já
que cada entrada custa RS 15. É uma iniciativa muito bacana do Jornal do
Commercio, nós, como assinante, nos sentimos prestigiados e bastante felizes”,
salientou Ricardo. O estudante Emmanuel Lacerda, 8 anos, levou a mãe, a
pedagoga Marta Lucena. “Quando soube da promoção fiquei bem animado e aperreei
ela para participar e me trazer”.
Essa é a primeira vez que o JC realiza uma ação de
fidelização no teatro e os assinantes mostraram que aprovaram a ideia. Mais de
600 pessoas compareceram ao teatro. A diretora de Mercado Leitor do JC,
Verônica Barros destaca que a participação superou as expectativas. “Esta foi
uma de muitas ações que o JC fará em homenagem ao Dia das Crianças. O público
receber tão bem é uma felicidade para nós”, completou.
“O Jornal do Commercio está de parabéns. Sabe como nos
agradar e abrir espaço para a cultura pernambucana ao mesmo tempo. A iniciativa
só vem somar à seriedade e ao respeito que o JC tem com quem o assina”, elogiou
a administradora de empresas Sandra Correa, que foi com o filho Bruno, 4 anos.
O CIRCO DO FUTURO
Texto: Moisés Monteiro de Melo Neto
(parte cortada pelo autor)
(Depois do número inicial, Curumim fica em cena e tenta o
contato com os bichos; depois de algumas tentativas ele consegue interagir com
a turma do circo sempre conectada à espera de uma nova turnê ou apresentação)
CURUMIM – Oi , gente.
Que lugar legal é este?
MACACA – Pelos olhos da minha vó! O que é isto? Que boneco
mais feio!
ELEFANTE – Não está
vendo que se trata de um androide? Você não estuda não é, macaca? Só pensa em
trapézio e esquece da totalidade do mundo. No espaço tem seres assim como este
aí.
MACACA – Falou o
professor. O que você está fazendo, hein senhor mágico?
ELEFANTE- Passando a varinha mágica para saber se esta
máquina diz a verdade e é do bem...
CACHORRO- E qual é o resultado?
ELEFANTE- Ele diz a verdade e é do bem. A proposta dele vai
ser muito legal. Mas qual é a proposta? Não posso adivinhar.
ÁGUIA – Sim, senhor
androide. Diga-nos: o que o traz aqui?
CURUMIM – Meu nome é
Curumim...
TODOS – Curumim? Como
assim?
CACHORRO – Você não
disse que ele era do espaço, não foi elefante?
ELEFANTE – Sim. Mas
como todos vocês deveriam saber bem, no espaço eles colocam nomes das coisas
também.
MACACA – Ah! Já
pensou? Eu vou chamar meu tapete favorito de João. Já pensou? Oi, João! Posso
pisar em você agora?
(todos riem, menos Curumim)
CURUMIM – Sou
máquina, mas parece que tenho mais sentimento do que vocês. Não, é?
CACHORRO – Ih! Olha
só! O cara se magoou.
FOCA – Eu nem queria
me meter.
CACHORRO – Fala,
palhaça.
FOCA – Sou palhaça, mas sou feliz. Mais palhaço sem graça...
é quem me diz!
CACHORRO –
Auuuuuuuuuuuuuuuuuu! (ri)
FOCA – É isso mesmo.
Seus insensíveis. É por isso que o nosso circo está do jeito que está.
ÁGUIA – Como assim “o
circo está do jeito que está?” Nosso Circo está muito bem, obrigado. Nosso
espetáculo é o melhor da Terra!
CURUMIM – Mas poderia
ser o melhor circo do universo.
ELEFANTE – Hum!
Parece que nosso amigo o coisa tem algo a nos revelar.
CACHORRO – Desembucha
aí, ô seu coisa!
FOCA – Parem de tratá – lo como uma coisa.
MACACA – Ah! Só
porque ele é uma coisa fofa?
(vai até Curumim e
lhe faz cócegas; todos riem, menos a foca e Curumim)
FOCA – Viram? Ele
sente cócegas. Ele tem sentimento. Aposto. Não ligue para eles. Diga-nos então,
senhor Curumim.
CURUMIM – Somente
Curumim.
FOCA – Curumim. O que o traz aqui para um contato
virtual com o planeta terra.
CACHORRO – Vocês do Espaço nos acham bem atrasados. Não é
verdade?
FOCA – Se depender do
seu talento, Cachorro, nossa fama vai se diluir pelo espaço.
CACHORRO – Eu sou
faxineiro, eletricista, encanador, me pegam para tudo...
MACACA – Menos pra artista, pois aqui é cada macaco no seu
galho!
CACHORRO – Mas eu não
sou macaco! Macaca é você! Eu sou cachorro! Auuuu!
MACACA – Ai que meda!
ELEFANTE – a palavra
correta é medo e não “meda”.
MACACA – eu sei. Mas
eu gosto de dizer meda!
ÁGUIA – O que o traz
aqui? Já perguntamos mil vezes. Diga logo, senhor Androide!
CURUMIM – Nós temos
um plano.
ELEFANTE – Nós, quem?
Quem é sua turma? Eles são todos máquinas, como você? Hein?
MACACA? O espaço é muito bonito? Eu nunca fui pro espaço.
CACHORRO – Eu
gostaria de mandar essa macaca pro espaço.
MACACA – Uma turnê
intergaláctica! Já pensou que barato?
CACHORRO – É não,
minha querida. É muito caro. Seriam necessários milhõõões de biscoitos para
pagar isto.
CURUMIM – Mas é
exatamente isto que eu vim oferecer para vocês!
TODOS – O quê?
CURUMIM –
Milhões de biscoitos cósmicos!
ELEFANTE – Milhões?
Imaginem isso! (ele delira e pensa no futuro glorioso) As minhas mágicas mais incríveis, que truques
de mágicas eu faria... se tivesse milhões de biscoitos cósmicos!
FOCA E eu? Minhas palhaçadas ficariam mais incríveis ainda!
ÁGUIA – Mas como
conseguiríamos todos esses milhões?
CURUMIM – Fazendo uma
apresentação virtual. Isto é através do computador. Pelo menos logo no início.
Depois quem sabe, vocês poderiam ir até pessoalmente...
ELEFANTE – Nós não
podemos ir pessoalmente, porque nós não somos pessoas! (todos riem) Somos
bichos!
CURUMIM – Bichos que
agem como humanos?
ELEFANTE – Na verdade
somos todos mu-tan-tes. Entendeu? Mutantes!
TODOS – Somos todos
mutantes.
CACHORRO – Ô, Zé Mané. Nem consegue perceber? Você é Curumim
ou é burro?
MACACA – Com todo o
respeito aos burros. Eu tenho um primo que é um mutante burro.
FOCA – E ele é burro, mesmo?
MACACA – É.
(todos riem, menos Curumim e a Águia)
ÁGUIA – Como seria esta
exibição pra gente ganhar milhões de biscoitos, precisamos falar com nossa
agente, Dona Medusa.
ELEFANTE – Sabe,
senhor Curumim? Dona Medusa é beem cri – te – rio – sa! Exigente mesmo! Com ela
é tudo bem feito ou nada feito!
FOCA – Somos artistas
muito especiais!
MACACA – Bota
especial nisso. Quero um camarim só pra mim.
FOCA – Eu preciso de
uma linha compleeeeta de maquiagem nova!
CACHORRO – O
pagamento é adiantado? (pigarreia)
Precisamos trocar toooodo o equipamento do ciiirrrrrrrrco, a lona está
furada e...
CURUMIM – Chamem a
empresária de vocês... como é mesmo o nome da dona do circo? Dona... dona...
dona... Medeia... não , Madonna... não... como é o nome da dona do circo?
TODOS – Dona Medusa!
CURUMIM – Que nome
maneiro. Tá! Gostei! Ela está conectada?
FOCA – Ela está
sempre conectada! Ligou o computador e
lá está a luzinha dela piscando verdinha.
ELEFANTE – Ela sabe
de tudo.
ELEFANTE – Ela é nota
dez em tudo.
CACHORRO – Ela é o
máximo em tudo!
ÁGUIA – Ela é nossa
empresária e nos faz felizes em tudo.
MACACA – De fato: ela
éééééé tuuuuuuuuuuuuuudo! Uma mulher
incrível!
CACHORRO – Então,
vamos todos chamá – la? Clica aí na tua tromba, ô elefante!
ELEFANTE – Só se for
agora mesmo! Chamem comigo, todos!
TODOS – Dona Medusa! (brincando)
(clica, Medusa passa pelo telão e se materializa; faz um
carinho em cada um dos seus artistas favoritos, dizendo coisa como “meus
queridinhos, eu amo tanto cada um de vocês, muito, muito muitão, fofinhos de
mamãe Medusa, cadê aquele risinho que me faz tão bem? Parece com um filhinho
que eu tive, por todos os céus...” para diante de Curumim)
MEDUSA- Eu estava escutando tudo que vocês diziam!
FOCA– ela sempre faz
isso. Ela não é in-crí-vel? A gente pensa em querer e ela já trazzzzzz. Uau!
MACACA- E aí, dona Medusa. A gente vai ou não aceitar o
convite da turma do Curumim?
MEDUSA- Curumim tem um segredo. Posso sentir isso! Qual é o
seu segredo, Curumim?
CURUMIM – Vim a pedido do seu esposo, madame. O senhor X...
MEDUSA – Meu esposo.
Meus filhos! Bruno e Bela! Você os conhece! (suspira) Espere um pouco! Você...
(circula Curumim) Você parece muito com um... um desenho... é (vai lembrando e
se emociona muito) um velho desenho que
o meu marido fez de um brinquedo para o nosso pequeno bruno... quando ele
nasceu... é isso! Uma homenagem aos índios crianças do planeta terra! Curumim,
um índio androide. Programado como se fosse... gente também.
TODOS –
Ooooooooooooohhhhhhh!
CURUMIM – Eu
também sei da sua história, dona Medusa.
Por ajudar estes artistas maravilhosos do planeta Terra, a senhora foi expulsa
do espaço.
ELEFANTE – Que
história triste. Eu assisti ao filme, aliás todos nós assistimos... lembram?
TODOS – Siiiiiiiiim!
(O IMPÉRIO: o telão exibe o filme da cena da transformação
de Medusa de mãe de família a mostro e a seguir a sua expulsão pelos sacerdotes
do Império, a família fica separada, o pequeno Bruno tinha um ano e meio, Bela
onze o Senhor x não pode evitar a expulsão promovida pelos patrões do espaço)
CURUMIM – Eu preciso
lhe contar o resto...
MEDUSA – Um momento,
Curumim. (dirige-se aos bichos de forma muito cartinhosa) Meus queridinhos. Por
favor. Mamãe vai tratar de negócios. Vocês poderiam ensaiar aquele número final
que eu combinei com vocês, agora?
TODOS – Sim.
MEDUSA – Então, por
favor. Daqui a pouco a gente conversa. Tudo bem? Tchau.
(bichos saem, Medusa sorri e dirige-se a Curumim)
CURUMIM – O plano é o seguinte: Logo será o aniversário do
Senhor X e o Império pode permitir que a senhora volte a viver com os seus
filhos, Bruno e Bela e com o seu esposo, sua família, aliás... a noossaaaa família ficará reunida. Mas Bruno é
muito pequeno e não entende de política, por isso tudo deve ficar em segredo.
Eu, Bela e o Senhor X fingiremos não saber de nada.
MEDUSA – O que tenho que fazer para falar com minha família
novamente?
CURUMIM– Apenas seguir o plano, Madame, o plano do Senhor X,
isto é o plano do seu esposo. Seu período de punição está acabando, Madame.
Logo a senhora retornará ao Espaço e poderá voltar à Terra sempre e poderemos
todos ser patrocinadores do Circo. O Espaço e a Terra selarão um acordo de paz.
MEDUSA – Meu marido é
tãããããoo inteligente.! (suspira de paixão e saudade) Tão bom! Sinto taantaa
saudade dos meus filhos, Bela e Bruno! (chora um pouco) Como está
Bruninho? (enxuga umas lágrimas) Faz
tanto.. tanto tempo! Eu chorei tanto de saudade! Mas sabia que um dia ia
reencontrar a minha família. Mas agora tudo vai ficar bem, não é?
CURUMIM – Eu tenho
certeza, madame. O plano do Senhor X é simplesmente per-fei-to! Nada poderá
falhar. Mas como é aniversário dele e seria uma data comemorativa, o senhor X,
precisa reencontrá-la primeiro pelo computador.
MEDUSA – Uma apresentação virtual? Sem Bruninho saber que
sou a mãe dele? Será que vai dar certo? Estou tão emocionada. Posso chamar o
meu amigo o Palhaço Chocolate para ir conosco nesta viagem virtual?
CURUMIM- O Senhor X gosta muito dele. Do Palhaço Chocolate.
MEDUSA – Que maravilha. Vou organizar tudo. E o contrato com
o Império? Hein? Aqueles monstros todos que me expulsaram de lá!
CURUMIM- Serão expulsos
logo... logo! E, Madame... tudo
voltará a ser como deveria ter sido de melhor
e todos serão felizes, bichos, máquinas, seres humanos... todos!
MEDUSA- Venha, querido Curumim (vai saindo com Curumim),
entre aqui neste lugar no computador e
conte-me tudo que devemos fazer. Tudinho. Ah! Este é o dia mais feliz de
toda a minha vida!
CURUMIM– Eu estou muito feliz também, Madame. Curumim está
muito feliz.
(saem)
(entram Bela e o Senhor X e falam sobre o plano, ajeitam o
velho notebook para que Bruno pense que foi ideia dele próprio não um plano do
pai para juntar, toda a família no seu aniversário)
Em 2008: foi produzido com pompa e circunstância o texto de
Moisés; ANJOS DE FOGO E GELO:
Jornal do Commercio
ARTES CÊNICAS
Ato, do Magiluth, é a zebra do Janeiro
Publicado em 05.02.2009
Peça feita com apenas R$ 3 mil desbancou Rasif e Anjos de
fogo e gelo e levou troféu Melhor Espetáculo em cerimônia da Apacepe
Com o ator Bobby Mergulhão como mestre-de-cerimônias e interpretando uma de
suas mais famosas personagens, Dona Verinha, a cerimônia de premiação dos
melhores do Janeiro de Grandes Espetáculos, na noite da terça, foi um
verdadeiro festival de prêmios. Trinta e nove estatuetas foram entregues aos
indicados, sendo a mais disputada entregue ao grupo Magiluth, que levou o
troféu de melhor espetáculo (eleito pela comissão julgadora) com Ato,
desbancando o favoritismo de Rasif e a arrasa-quarteirão Anjos de fogo e gelo.
O resultado surpreendeu os integrantes do grupo, uma das revelações do cenário
artístico local dos últimos anos. Ato foi realizada com um orçamento baixíssimo
(principalmente em relação a Rasif e Anjos..): R$ 3 mil. A peça levou ainda
levou o prêmio Melhor Figurino, conquistado por Júlia Fontes.
Jornal do Commercio
Destaques do Janeiro são premiados
Publicado em 03.02.2009
O 15º Janeiro de Grandes Espetáculos entrega hoje o troféu
Apacepe de Teatro e Dança para os destaques do festival. A cerimônia, que
acontece às 19h, no Teatro de Santa Isabel, é aberta ao público.
As peças indicadas ao prêmio de melhor espetáculo adulto
são: Anjos de fogo e gelo, Ato e Rasif. A árvore de Julia, Historinhas de
dentro e Outra vez, era uma vez concorrem ao prêmio de melhor espetáculo de
teatro infantil. Enquanto que, na categoria dança, Tempo fragmentado e Imagens
não explodidas disputam a preferência do júri.
Jornal do Commercio. 1 fev 2009»
ENTREVISTA A ATRIZ
DE ANJOS DE FOGO E GELO
PERSONA/STELLA MARIS
Entre o palco, o jornalismo
Publicado em 01.02.2009
Dentro de uma rotina corrida e estressante, Stella Maris,
que há cerca de 20 anos estava afastada dos palcos, encontrou na arte o
equilíbrio necessário para enfrentar o dia a dia. Integrando o elenco de Anjos
de fogo e gelo, ela planeja para 2009 uma turnê pelas capitais nordestinas.
Apaixonada pelo teatro e pelos livros, Stella conta à repórter Manuella Antunes
sua trajetória no jornalismo, na vida e no tablado.
JC – Há quanto tempo não fazia teatro?
STELLA MARIS – Voltei para os palcos depois de 20 anos.
Nesse meio tempo, fiz duas Paixões de Cristo, mas nenhum espetáculo de
temporada no teatro convencional.
JC – Qual o motivo de ter parado?
STELLA MARIS – Na época, houve uma mudança no cenário local,
pois fazer teatro é caro e difícil. Aliado a isso, minha vida como jornalista
engolia meu tempo. Todo ano eu dizia que voltaria a atuar, mas não conseguia.
JC – E qual o motivo da retomada?
STELLA MARIS – Faltou equilíbrio na minha vida. O jornalismo
é comunicação acima de tudo. E o teatro é a criação e estava em falta com o
exercício criativo, ficou difícil até respirar. Tinha que voltar, surgiu o
convite para Anjos de fogo e gelo e aceitei na hora.
JC – Como você descreve sua relação com o teatro?
STELLA MARIS – Depois de nove espetáculos e duas Paixões de
Cristo, posso dizer que, antes de tudo, sou uma apaixonada pelo teatro.
JC – Qual desses espetáculos é a menina dos seus olhos?
STELLA MARIS – Os fuzis da Senhora Carrar. Foi uma montagem
belíssima onde, com 18 anos, interpretei uma mulher de 40. Era época de ditadura
no Brasil e a peça pôde, com metafóras, discutir o regime.
JC – Professora, jornalista e atriz. Como administra tudo?
STELLA MARIS – Trouxe a rotina da televisão para minha vida.
Priorizo o que é mais importante e faço cada minuto render o máximo.
JC – Quando consegue parar, o que gosta de fazer?
STELLA MARIS – Sou apaixonada por literatura. Perto da cama,
tenho um pilha de livros e, sempre que tenho tempo, pego um deles. Ler é a
primeira coisa que faço quando acordo, antes do dia começar.
JC – E o teatro em 2009?
STELLA MARIS – Começaremos uma turnê que, inicialmente,
passará pelas principais capitais do Nordeste.J
Renato Filho/Divulgação
|
Folha de Pernambuco.
30/01/2009
Janeiro de Grandes Espetáculos se despede
“Anjos de Fogo e Gelo” está na programação de encerramento
|
“Anjos de Fogo e Gelo”, hoje, no Santa Isabel
|
|
|
|
Foram três semanas intensas para organizadores, técnicos, júri,
diretores e atores. E público, claro, parte fundamental para a manutenção e
desenvolvimento do Janeiro de Grandes Espetáculos, cuja 15ª edição encerra
nesse fim de semana. Hoje, no Santa Isabel, a ousada história de amor dos
poetas Arthur Rimbaud e Paul Verlaine ganha o palco com “Anjos de Fogo e
Gelo”.
O espetáculo coloca em cena momentos decisivos da vida dos
dois poetas; a crise do casamento de Verlaine, a incompreensão da mãe de
Rimbaud com relacionamento. A apresentação é às 21h. Já no Teatro Apolo, às
19h, Ivaldo Mendonça em Grupo apresenta “Tempo Fragmento”, espetáculo de
dança contemporânea.
Amanhã, último dia da maratona, é dia de rever “Rasif -
Mar Que Arrebenta”, do Coletivo Angu de Teatro. Baseada no livro homônimo de
Marcelino Freire, a peça traduz em linguagem cênica doze contos que revelam
as fissuras do tecido social brasileiro contemporâneo. Personagens obscuros
se cruzam com figuras cômicas para traduzir emoções e dissabores.“Rasif” está
no Teatro Hermilo Borba Filho, às 19h.
Também no sábado o publico vai poder assistir de novo “As
Andanças do Divino”(às 21h, no Santa Isabel), do Balé Popular do Recife. O
espetáculo celebra os 30 anos da companhia, completados ano passado, unindo
teatro e dança em cima da história de um mamulengueiro que sai do Sertão rumo
ao litoral. E fechando a programação infantil, “Historinhas de Dentro” (às
16h30, no Barreto Junior), do Grupo de Teatro Quadro de Cena, narra a
trajetória de uma menina que descobre, numa viagem ao interior do seu corpo,
um grande circo. Os ingressos para os espetáculos no Santa Isabel custam R$
15 e R$ 7,50. Demais teatros, R$ 10 e R$ 5.
|
|
FOLHA DE
PERNAMBUCO. CADERNO PROGRAMA. PÁGINA 5
EM 04/11/2008.
Teatro nordestino pede parada em
São Paulo
A programação é variada, e vai até o dia 3 de dezembro.
Talles Colatino
Não soa estranho que São Paulo seja a maior cidade
nordestina do País. E para exercer uma proximidade ainda maior entre a região e
a metrópole, tem início hoje, lá na terra do céu cinza, a Mostra Paulista do
Teatro Nordestino. Até o dia 3 de dezembro, uma série de atividades gratuitas
relacionadas à produção teatral da região ocupa o Centro Cultural Banco do
Brasil (CCBB) e o Centro Cultural São Paulo (CCSP), incluindo peças, leituras
dramáticas e demonstrações de trabalho. A mostra também recebe a 6ª Semana do
Teatro Nordestino, reunindo dramaturgos de São Paulo e do Nordeste em mesas de
debates e lançamentos de livros.
O fato de abrir as portas de dois dos mais importantes
centros culturais do País (o CCBB e o CCSP) à Dramaturgia Nordestina é um ato
de reconhecimento do valor de autores e de criadores cênicos, abundantes nessa
região, que tornam o Brasil um dos lugares do planeta onde o teatro está mais
vivo do que nunca. Se o evento conseguir abrir um pouco mais o diálogo entre
Nordeste e Sudeste, em meio às luzes e às sombras da cena, terá cumprido
importante papel”, afirma Sebastião Milaré, curador da Mostra.
As quatro montagens selecionadas para se apresentar no
evento homenageiam o pesquisador e dramaturgo alagoano Altimar Pimentel,
falecido esse ano. Pimentel é autor de “A Construção”, uma das peças
emblemáticas do final dos anos 60, encenada em 1969, pelo Grupo A Comuna,
de Amir Haddad, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. De autoria do
dramaturgo, a mostra traz ao palco “Como Nasce um Cabra da Peste”, com a
companhia paraibana Agitada Gang.
Pernambuco vai representado pela companhia Arte-em-Cena, com
seu já clássico “Deus Danado”. “Lesados” (CE) e Sinhá Flor (PB) completam o
time de espetáculos.
SEMANA
Como parte da programação da Mostra, pela primeira vez São Paulo é palco da
Semana do Teatro Nordestino, evento que acontece anualmente em Natal (RN) desde
2003, por iniciativa da Associação dos Dramaturgos do Nordeste. A programação
da Semana inclui lançamento de livros e palestras com dramaturgos nordestinos e
paulistas. “A idéia principal foi dar acesso aos criadores cênicos paulistas,
aos estudiosos e ao público interessado de São Paulo a obras dramatúrgicas
produzidas no Nordeste. Essa idéia ia ao encontro da proposta básica da
Associação de Dramaturgos do Nordeste, que é difundir essa produção
dramatúrgica”, conta Sebastião Milaré, mediador das mesas.
Para as palestras, os dramaturgos convidados são: Cleise
Furtado Mendes (BA); Oswald Barroso, José Maria Mapurunga, Rafael Martins, Yuri
Yamamoto (CE); Tácito Borralho (MA); Eliézer Rolim, Elpídio Navarro, Paulo
Vieira, Celly Albuquerque (PB); João Denys(autor de “Deus Danado”), Moisés Monteiro de Melo Neto (autor de “Anjos
de Fogo e Gelo”), Romildo Moreira (PE); Ací Campelo (PI); Racine Santos, Paulo
Dumaresq (RN); Lindolfo Amaral (SE); Luis Alberto de Abreu, Márcio Aurélio e
Newton Moreno (SP). Lá, toda a programação é gratuita.
» BARRETO JÚNIOR
Anjos de fogo e gelo em
DVD
Publicado em 31.10.2008
A apresentação de Anjos de fogo e gelo de amanhã tem sabor
especial. A peça, que traz o polêmico relacionamento entre os poetas Rimbaud e
Verlaine, foi gravada em um DVD
que é lançado amanhã. Com cinquenta e cinco minutos de duração e legendas em
francês e inglês, o material traz depoimentos do elenco e do diretor da peça,
José Francisco. O plano de direção e os desafios enfrentados pela produção para
montagem do espetáculo são comentados ali. A peça está em cartaz no Teatro
Barreto Júnior, sábados e domingos às 20h.
ANJOS DE FOGO E DE GELO
Saturday, October 11, 2008
O ator Rogério Bravo, mui generosamente, me franqueou entradas para o
espetáculo ANJOS DE FOGO E GELO. Confesso que temi – não pelo Rogério, que é um
ator sensível e competente, mas pela onda (eterna, meu Deus!) de “travestismo”
que ocupa os palcos recifenses; ando tão cansado do exagero, de atores berrando
abobrinhas...
Mas encontrei um elenco afinado, uma luz que funciona, marcações perfeitas, um
figurino impecável – destaque para Rogério Bravo, que dá conta de um personagem
difícil, e a atuação poderosa de Stella Maris Saldanha – que sequer aparece no
cartaz - a todo momento roubando a cena – sua mão, delicadamente dobrando o
vestido ao descer do palco, é a mão de uma mulher do século XIX. “Deus está no
detalhe”, reza o ditado alemão. A atuação dos grandes atores, também.
Vão ver o quanto antes, porque o teatro, meus queridos, é fugaz como a vida e
não está para os indecisos.
Posted by Walther Moreira Santos at
5:51 AM
Sábado, 13 de Setembro de 2008
"[...] L'arrivée de Rimbaud en enfer".
"Rimbaud : La lune blanche luit dans le bois. De chaque branche part une
voix sous la ramée… Ô bien-aimée ! L’étang reflète, profond miroir, la
silhouette du saule noir où le vent pleure… Rêvons, c’est l’heure. Un vaste et
tendre apaisement semble descendre du firmament que l’astre irise…"
Verlaine: Pâle étoile du matin, tourne devers le poète [...]".*
Sempre foi dito que tanto ao dramaturgo quanto ao poeta se deve consentir
liberdade de espírito e de texto e Moisés Monteiro de Melo Neto, ou simplesmente Moisés neto, recifense autor da peça
Anjos de Fogo e Gelo, usou e abusou dessa liberdade.
A fala inicial, transcrita acima, é um trecho do magistral “La Lune Blanche”, do
poema “La Bonne Chanson”,
de Paul Verlaine, colocado na boca de Arthur Rimbaud, no que o autor imaginou
ser o momento da chegada do poeta ao inferno e com o qual inicia a descrição de
parte da vida e da obra de Rimbaud, ambas patrimônios da humanidade. No dia 30
de agosto passado fui ao Recife, entre outras coisas para assistir, como
convidado, à estréia da peça referida acima e, confesso, não me arrependi. Revi
amigos que não encontrava há muito tempo, refleti, debaixo de uma árvore do
fruta-pão toda florida, a respeito dos Rimbauds, Verlaines, Mathildes e
Vitalies existentes em cada um de nós e fiquei feliz com o que o diretor de
“Anjos de Fogo e Gelo”, o consagrado José Francisco Filho, conseguiu fazer com
o bizarro texto colocado em suas mãos. Trabalho muito difícil, tenho a certeza.
O texto, como podem deduzir da abertura, é um coletânea não só de poemas de
Rimbaud, mas também de alguns de Verlaine, juntamente com uma descrição livre,
feita pelo autor, de fatos da vida dos dois, inseridos para facilitar a
compreensão dos assistentes. Os poemas também foram livremente adaptados à
prosa, tentando tornar o texto mais perceptível.
Se o resultado está sendo conseguido, deixo a resposta ao
público e à crítica.
O diretor, esse sim, deve ter feito das “tripas coração” para prender a platéia
- como de fato prende - durante a quase uma hora de duração da peça, já que
Rimbaud, o poeta, é denso e Arthur, o homem, complexo demais, para serem -
poeta e homem - facilmente compreendidos pelo público do meu querido Recife,
nem sempre aberto à poesia, ao teatro ou a comportamentos humanos. De minha
parte, ainda que não sendo crítico teatral, captei uma certa insegurança dos
protagonistas masculinos, bastante natural em estréias impactantes, talvez
fruto do natural receio da reação que o texto e as marcas poderiam gerar nos
assistentes. Receio desnecessário, ao menos naquela estréia. Considero um dos
destaques da peça - não sei se fruto do texto criado pelo autor, se do trabalho
do diretor - a força das duas mulheres presentes no palco: Vitalie, mãe de
Arthur Rimbaud e Mathilde, mulher de Paul Verlaine, que conseguem ser
protagonistas de uma narrativa na qual seriam coadjuvantes. Mathilde, numa
excelente interpretação de Stela Maris Saldanha, conduz linearmente todo o
texto, tornando-se no elo de ligação entre as narrativas. Graças à atriz, o
texto ficou bem mais fácil para os leigos. Vitalie, também muito bem
interpretada, transforma em momentos de comicidade a dispensável maldade que
lhe tentaram atribuir. Discordo, data venia, de quem pensou mostrar Vitalie
Rimbaud como um mulher amarga, ambiciosa e cruel na relação com o filho.
Vitalie era uma mulher da burguesia rural do interior da
França na época de Napoleão III, no rígido século XIX, e o filho era um gênio,
que poderia ter nascido em qualquer lugar ou em qualquer época. Impossível,
portanto, para uma mulher comum como Vitalie, entender as idiossincrasias de
Arthur sem as criticar, aceitar e conviver com os seus atos sem se magoar, sem
os recriminar. Daí, porém, a ser uma mãe sem amor, só interessada, anos mais
tarde, nos lucros nascentes de Le bateau Ivre e dos demais poemas, eu não
concordo. Ainda bem que Ivonete Melo conseguiu minimizar (mostrando
ingenuidade) a suposta ambição de Vitalie Rimbaud. A música (muitíssimo bem
escolhida) e a iluminação completam o texto e a direção. Parabéns ao autor, ao
diretor, aos quatro atores e a toda a equipe, que estão levando ao Recife um
momento mágico da vida de pessoas mágicas, em um espetáculo que poderá alçar
vôos ainda mais altos.
Aos que estejam no Recife e leiam esta postagem, sugiro que vão ao teatro
Barreto Júnior e apreciem o espetáculo, pois vale a pena sim senhor.
Por puro diletantismo, para matar o tempo, resolvi colocar
na língua mãe dos quatro personagens o texto de Moisés Monteiro de Melo Neto,
tarefa difícil devido ao "melting pot textual" que ele é, mas tenho
me distraído bastante e o “trabalho” contribuído para que possa melhor conhecer
a obra dos dois poetas. O título em francês - Anges de Flamme et de Glace - não
é meu, mas emprestado de Arthur Rimbaud, mesmo assim, por se tratar da versão
em outro idioma de uma obra teatral, é bom estar registrado (na versão em
francês, é claro), para evitar constrangimentos ulteriores.
____________
Captado em 5-out-2008
http://lugardosouto1.blogspot.com/2008/09/anges-de-flamme-et-de-glace-rimbaud.html
Professora de Jornalismo estreia peça no
Teatro Barreto Júnior
Por Lucélia Brito
Poetas e amantes, Paul Verlaine e Arthur Rimbaud estão tendo
suas vidas encenadas em Anjos de fogo e gelo. A peça estreou sábado (30), às
20h, no Teatro Barreto Júnior, e conta com a participação da professora do
curso de Jornalismo da Católica Stella Maris Saldanha, no papel de Mathilde,
esposa de Verlaine. A direção do espetáculo é de José Francisco Filho,
ex-integrante do Teatro da Universidade Católica de Pernambuco (Tucap).
Na fase liderada por José Francisco Filho e Carlos Borba,
entre 1973 e 1975, o Tucap se tornou um dos melhores grupos de teatro amador de
Pernambuco, conquistando mais de 30 prêmios. Durante a sua trajetória no grupo,
que durou até 1984, José Francisco Filho dirigiu as montagens Torturas de um
coração (1972), A revolta dos brinquedos (1972), Prometeu acorrentado (1973),
Os escolhidos (1974), A barca d’ajuda (1975) e A farsa do Mestre Pathelin
(1984).
O retorno aos palcos da professora Stella Maris também era
aguardado com expectativa.“Volto para o teatro depois de muitos anos de
ausência. Nesse intervalo, que começou no final dos anos 80, interpretei Maria
por duas vezes na Paixão de Cristo de Nova Jerusalém, mas não atuei por nenhuma
temporada maior”, contou Stella Maris.
O espetáculo Anjos de fogo e gelo retrata o período no qual
Verlaine, poeta já renomado, convida Rimbaud para morar com ele e sua mulher,
Mathilde. A peça mostra momentos decisivos da vida dos dois poetas, a partir da
cumplicidade e da paixão entre eles. A crise no casamento de Verlaine, a
incompreensão da mãe de Rimbaud e reprovação da sociedade francesa diante do
amor entre os poetas são alguns dos temas abordados.
Dono de uma poesia lírica e singular, Paul Verlaine se casou
com Mathilde Mauté de Fleurville numa tentativa de acomodar-se a uma vida
familiar. Mas tudo mudou quando o poeta conheceu Jean-Nicolas-Arthur Rimbaud,
jovem que o fascinava e se tornou seu amante. Rimbaud começou a escrever poemas
quando tinha apenas 12 anos e aos 19 deu por encerrada sua obra literária.
Precoce e cheio de inquietações, o poeta desenvolveu uma obra incomum, densa e
delicada. Admirador de Verlaine, em 1871 Rimbaud escreveu sua primeira carta
para aquele que seria seu maior companheiro.
A união dos poetas causou uma mágoa profunda em Mathilde, a
esposa traída, levando Verlaine a se afastar de Rimbaud. Hostilizados pelo meio
intelectual francês, Verlaine e Rimbaud se aventuraram pela Europa, numa viagem
na qual escreveram poemas que modificaram para sempre a poesia ocidental. De
volta ao continente europeu, Verlaine
trabalhou em "Romances sem Palavras", enquanto
Rimbaud publicou "Uma temporada no inferno". Depois de várias
rupturas e reconciliações, em 1873, Verlaine deu um tiro de pistola em Rimbaud,
em Bruxelas.
A montagem Anjos de fogo e gelo tem texto de Moisés Monteiro
de Melo Neto e atuações de George Meireles, Roger Bravo, Stella Maris Saldanha
e Ivonete Melo. O espetáculo fica em cartaz no Teatro Barreto Júnior até o dia
16 de novembro, aos sábados e domingos, sempre às 20h.
Em busca do tom
Escrito por Alexandre
Figueirôa
O espetáculo Anjos de fogo e gelo não chega a ser a redenção
de uma cena na qual as comédias de gosto duvidoso dão o tom, mas nos faz ver
que nem tudo está perdido
Um espetáculo para marcar múltiplos retornos. Assim é Anjos de fogo e gelo,
peça em cartaz até novembro no Teatro Barreto Júnior. Ela assinala a
reabertura, devidamente reformada, de uma das poucas salas municipais
exclusivas para as artes cênicas no Recife. Traz de volta, também, um encenador
– José Francisco –, que andava afastado dos palcos; uma atriz – Stella Maris
Saldanha –, cuja carreira ficou adormecida pela necessidade de enfrentar a
ribalta do jornalismo; um autor – Moisés Monteiro de Melo Neto –, que
afirma ter voltado à adolescência de leitor voraz de poemas de Rimbaud; e,
ainda, um tema, cuja mística enfeitiça o Ocidente e já inspirou outras tantas
peças, filmes e livros: a turbulenta relação entre os poetas Arthur Rimbaud e
Paul Verlaine, no final do século 19, na França.
Numa cidade onde as comédias de gosto duvidoso dão o tom,
não deixa de ser animador ver mais um grupo de pessoas se debruçar sobre um
projeto teatral que tenta escapar das fórmulas previsíveis do humor fácil e
afirmar: o teatro pernambucano permanece vivo. Por isso acho ser obrigação da
crítica não baixar a voz e, mais uma vez, buscar estabelecer um diálogo sereno
e propositivo com esta cena que resiste. Na troca de impressões, talvez
consigamos recuperar um espaço que, infelizmente, vem sendo ocupado, cada vez
mais, pelas manifestações artísticas massivas onde qualidade e apuro estético
pouco importam.
Isto não significa que Anjos de fogo e gelo consiga ser a redenção de tantos
conflitos, mas nos faz ver que nem tudo está perdido. Em primeiro lugar,
é preciso ressaltar o cuidado da produção, equilibrando os recursos materiais
disponíveis a partir de uma coerente articulação entre a proposta de encenação
e os elementos cenográficos. No figurino, predominam as cores marrom e bege e,
junto com a iluminação, em tom amarelo cobre, temos a impressão de que
folheamos as páginas envelhecidas de um livro esquecido na estante. As
plataformas por onde circulam os atores, com degraus decorados com sinais de
escrita, também conseguem dar unidade ao drama que se desenrola diante do
espectador e funcionam de forma precisa como elementos para definição do jogo
dramático proposto.
Alex Alencar, na sua coluna do JC, Caderno C
Publicado em 26.09.2008:
Não diria que o relacionamento homo tornou-se algo
absolutamente natural. Pela evolução no mundo, pelas propostas das novas
religiões, bem poderosas, ou de novas maneiras de acreditar e ter fé num Deus.
As várias igrejas que partem de um país e vão atravessando pacificamente outras
fronteiras mudaram as idéias e posicionamentos. A liberdade e os novos direitos
que surgiram permitiram que atrizes famosas, ou pessoas com elevado nível
social e financeiro, até militares tomaram a decisão de posar para fotos de
jornais confessando que são do mesmo sexo mas que se amam. Atitude forte. Claro
que muitos não aceitam, mas que fiquem apenas com seu direito. Não persigam,
não matem nem maltratem aqueles que fizeram a opção. Tenho um DVD que narra o
relacionamento amoroso de dois dos maiores poetas franceses em toda história da
literatura francesa, são Arthur Rimbaud e Paul Verlaine. No filme quem
interpretou Rimbaud foi Leonardo De Caprio, que vem se revelando bom ator, o
Verlaine teve como intérprete um ator francês. Não vou comentar o filme. Mas a
história amorosa e dramática dos dois poetas está sendo representada no teatro
Barreto Júnior aos sábados e domingos com o título de Anjos de fogo e gelo,
dirigido por José Francisco. Tenho ouvido muitos depoimentos sobre a peça. Vera
Brandão achou colossal, e tem bom gosto. O tema é insólito, mas deve ser visto.
O escritor e jornalista Raimundo Carrero escreve sobre ANJOS
DE FOGO E GELO no SUPLEMENTO CULTURAL DO DIÁRIO OFICIAL do Governo do Estado de
Pernambuco (Editado pela CEPE em Setembro de 2008):
SOBRE O AMOR MAGOADO
O que mais
importa na arte: o artista ou a obra?
A pergunta nem sempre tem resposta segura. Em
princípio pode-se dizer,
simplesmente, a arte. O que seria
o ideal, claro. Mas nem sempre é
assim. Há vidas que superam o objeto artístico e se impõem
pela forma, pela qualidade. Pela loucura,
talvez. E há casos em que arte e
artista se confundem tanto, que uma
coisa jamais será separada da outra. É o caso das vidas de Rimbaud e Verlaine?
Ou seria mais apropriado dizer das duas em uma só?
Os dois se
transformaram em símbolos do amor gay,
embora cheios de violência, sofrimento e dor. E não somente para
eles; também para as esposas e, lógico,
para os parentes e amigos. E é justamente para refletir sobre essa turbulência que está
em cartaz, no Teatro Barreto Júnior, a peça “Anjos de
fogo e gelo”, de Moisés Monteiro de Melo
Neto, som e direção de José
Francisco. Um espetáculo difícil,
que exige o máximo do elenco,
sobretudo de George Meireles e
Roger Bravo.
Além da natural e óbvia responsabilidade de encarnarem
personagens-símbolos de toda uma geração e de toda uma época, enfrentam um texto exigente naquilo que
a peça de teatro tem de mais significativo: o condicionante humano no tratamento do mundo gay.
Algo que provoca sempre divergências profundas e gestos desmesurados. É
claro que não é atributo apenas de
pessoas do mesmo sexo. As atribuições estão em todos. Mas, no caso
especial dos dois, que também geraram
obras de artes extraordinárias, a paixão e a convivência causariam,
como causaram, muitas inquietações.
Basta lembrar o tiro que Verlaine deu em Rimbaud, na Bélgica,
e que por isso TVE de pagar pena de prisão. É claro que o tratamento
agressivo pode ocorrer entre casais os mais diversos, do mesmo sexo ou
não. Violência não tem particularidade. O efeito da luta, porém, recebe hábil
tratamento no texto do experimentado Moisés Monteiro de Melo Neto, através de
referências e alusões. Até porque um
tema que começa a entrar na infalível lista do lugar-comum é a violência.
A direção da peça não conseguiu evitar outro lugar-comum da
arte contemporânea: as cenas de sexo. A
arte contemporânea terá que superar esse
impasse – seria mesmo um impasse? – de tratar o sexo e a violência em todas as
manifestações artísticas. Sobretudo no caso do amor entre pessoas do mesmo
sexo. É algo que está beirando o óbvio e, por isso mesmo, precisa ser
repensado. O sexo ainda causaria, mesmo, estranhamento artístico? É um elemento artístico de qualidade? Ou ainda provoca escândalo e,por ser
escandaloso, geraria o fator
artístico? É o caminho? Uma das questões da contemporaneidade, em que a violência e o sexo estão
terrivelmente presentes, precisa receber outro tratamento, que não seja apenas
pela beleza ou pelo escândalo.
No entanto, o que mais se ressalta no texto de Moisés
Monteiro de Melo Neto é o equilíbrio cênico, o que também é um atributo do
diretor. Dentro de um cenário leve, também com ótimo equilíbrio de luz, pode-se
acreditar, sinceramente, naqueles dois seres dilacerados, na pele de George
Meireles e Roger Bravo, sem esquecer as
duas atrizes Stella Maris e Ivonete
Melo. As duas, aliás, fazia tempo que não pisavam no palco. E estão ótimas. Seguras, firmes. Trabalhando este lado mais
inquietante do drama teatral que, no entanto, não tem nada de teatral – na
origem são duas mulheres que se
debatem entre a dor e o amor. E nada mais intranquilo do que o amor magoado. O amor que se debate
entre o choro e o soluço.
JORNAL DO COMMERCIO:
Anjos e fogo e gelo grava DVD no Barreto
Publicado no CADERNO C em 19.09.2008
Iniciando a quarta semana de exibição, Anjos de fogo e gelo,
peça que mostra o conturbado relacionamento entre os poetas franceses Rimbaud e
Verlaine, será gravada em DVD amanhã, às 20h, no Teatro Barreto Júnior. Quatro
câmeras captarão as imagens e microfones direcionais serão instalados nas
coxias do teatro garantindo a qualidade do som. O DVD será legendado em inglês
e francês. O material será usado também para divulgar o espetáculo nos
principais festivais cênicos do País. Com texto de Moisés Monteiro de Melo Neto
e direção de José Francisco Filho, a peça traz George Meireles (Verlaine),
Roger Bravo (Rimbaud) Stella Maris Saldanha (Mathilde) e Ivonete Melo
(Vitalie). O ingresso custa R$ 20, inteira, e R$ 10 (estudante).
JORNAL DO COMMERCIO
Coluna social
DIA-A-DIA. Segunda-feira, 01/09/08:
Estréia de sucesso: Arrebentou a estréia da peça Anjos de
fogo e gelo, no Barreto Júnior, sábado. O teatro teve lotação esgotada, com
direito a muitos conhecidos na platéia. Por lá: Turíbio e Zezinho Santos,
Carlos Trevi, Paula Ribeiro... que gravaram depoimentos sobre a peça. Detalhe:
para o espetáculo de ontem, mais de 100 ingressos já haviam sido vendidos até a
noite de sábado.
Publicado no DIÁRIO DE PERNAMBUCO
Em 01.09.08
Rimbaud e Verlaine:
Anjos de fogo e gelo estréia com teatro lotado
Romance conturbado dos poetas é revivido pelos atores Roger Bravo e George
Meireles. Foto: Renato Filho/Divulgação
|
Para o diretor José Francisco Filho, fazer teatro é como
andar de bicicleta. Você pode passar anos sem ter contato com o palco, mas
quando decide retornar, esta volta transcorre naturalmente. A julgar pela
interpretação do elenco de Anjos de fogo e gelo, que fez sua estréia neste
final de semana, no Teatro Barreto Júnior, o diretor tem razão. Quatro atores estão
em cena - Roger Bravo, George Meireles, Stella Maris Saldanha e Ivonete Melo.Os
três últimos não encaravam os espectadores numa peça adulta há anos e
defenderam com dignidade seus papéis.
Apesar da atuação correta e da produção impecável, a história do amor
conturbado entre os poetas Paul Verlaine (George Meireles) e Arthur Rimbaud
(Roger Bravo),
em plena
Europa do século 19, carece de mais emoção. Não sei se esta
impressão persiste por estarmos acostumados a textos mais lineares. A peça
inova e coloca os personagens mergulhados em seu próprio fluxo de consciência.
Da acolhida de Rimbaud pelafamília de Verlaine, ao fim do casamento entre este
e a aristocrata Mathilde, ou a passagem de Rimbaud pela África, somos
apresentados a situações-limite, e há instantes, como na primeira cena, em que
a poesia se confunde com os diálogos.
O texto, de autoria de Moisés Monteiro de Melo Neto, também evita o caminho
mais fácil ao apenas pincelar os fatos mais conhecidos do relacionamento
tempestuoso dos poetas. Os dois tiros que Verlaine deu em Rimbaud, e que o
levaram a ficar um ano e meio numa prisão da Bélgica, são apenas citados,
ficando tudo nas entrelinhas.
A questão da homossexualidade também poderia ser tratada com menos pudores. Na
segunda cena da peça, quando Verlaine e Rimbaud ficam nus e fazem sexo, o palco
fica quase na penumbra. Eles atingem o clímax e, instantes depois, já estão
discutindo novamente, como se nada de importante tivesse acontecido. Verlaine
corre para vestir a roupa de baixo, como se ficasse envergonhado do próprio
corpo. Nota dez para os figurinos e adereços de época criados por Aníbal
Santiago e para o cenário de Marcondes Lima, com várias escadarias e
plataformas de madeira por onde o quarteto se movimenta.
Extremamente pontuais em relação ao teatro local, que costuma atrasar em até
meia hora o início de uma peça, Anjos de fogo e gelo começou às 20h05 do último
sábado. A platéia do Barreto Júnior estava abarrotada de gente e quem chegou
por último precisou se acomodar nos corredores laterais, ficando em pé,
enconstado nas paredes. Ao contrário de outras ocasiões, porém, o elenco não
agradeceu formalmente à presença do público, nem aproveitou a oportunidade para
explicar até quando ficariam
em cartaz. Apenas Roger Bravo e Ivonete Melo se
abraçaram ao final do espetáculo, talvez pela tensão da estréia.
Em seguida, as luzes do palco se apagaram e o público começou a deixar a sala.
A platéia, aliás, continua mal-educada: os celulares tocaram repetidas vezes
durante a encenação. Quem comparecer à temporada, que continua até meados de
novembro, aos sábados e domingos, às 20h, pode adquirir o programa da peça
junto com um brinde - um CD com poesias de Rimbaud e Verlaine- por R$ 5.
ESTRÉIA: Poesia e
erotismo em lavagem de roupa suja
Publicado no JORNAL DO COMMERCIO em 01.09.2008
Marcos Toledo
mtoledo@jc.com.br
O público recifense lotou o recém-reaberto Teatro Barreto
Júnior, no Pina, anteontem, para conferir a estréia de Anjos de fogo e gelo,
espetáculo dirigido por José Francisco a partir de texto de Moisés Monteiro de
Melo Neto. Apesar do zunzunzum gerado pela polêmica em torno do tema, a relação
amorosa entre os poetas franceses Rimbaud e Verlaine, a peça, com menos de uma
hora de duração, contém apenas uma sequência de erotismo (a programação visual
do material de divulgação pode gerar expectativa) e foca mais na tensão do
triângulo amoroso formado pelo par central e a esposa de Verlaine, Mathilde.
Mesmo quando não há figurino em cena, Anjos de fogo e gelo é
uma grande lavagem de roupa suja entre os personagens supracitados e a mãe de
Rimbaud, Vitalie. Bem-escolhidos, os atores encarnam bem os papéis aos quais
foram destinados: Roger Bravo, na pele do jovem, arrogante e desmedido Rimbaud,
George Meireles, como o inseguro Verlaine, Stela Maris encarnando a preterida e
rancorosa Mathilde, e Ivonete Melo como a mãe amargurada Vitalie, responsável
por algumas das falas mais engraçadas da peça.
Apesar da tensão da estréia, e até pela larga experiência
dos profissionais envolvidos, o espetáculo se saiu bem em sua primeira
apresentação. O texto, porém, tem uma particularidade: mescla momentos
históricos de uma maneira paradidática, mas necessária, com citações poéticas e
diálogos de conflito dos personagens. Há contudo, um certo desequilíbrio entre
os momentos de mágoa – mais fortes –, os românticos e os líricos.
Em um cenário bem bolado, que segue uma tendência prática e
funcional, o elenco destila os dilemas dos personagens se movimentando de forma
bem coreografada que deixa o trabalho mais dinâmico. A boa trilha sonora e o
belo figurino de época completam os pontos fortes da peça que, tecnicamente,
coloca-se acima da média da produção local.
DIÁRIO DE PERNAMBUCO
Quinta-feira- 28.08.08
O amor conturbado de Rimbaud e Verlaine
por Tatiana Meira
Estréia // Anjos de fogo e gelo inicia temporada sábado no
Teatro Barreto Júnior e quebra o jejum dos atores George Meireles, Stella Maris
Saldanha e Ivonete Melo, que estavam distantes dos palcos
Tatiana Meira // Diário:
tmeira@diariodepernambuco.com.br
Quando assistiu à montagem carioca Pólvora e poesia, sobre o
relacionamento tempestuoso entre os poetas Paul Verlaine e Arthur Rimbaud,
George Meireles gostou do resultado, mas sentiu falta de um enfoque maior na
obra dos artistas cujo romance conturbado movimentou os cafés parisienses no
final do século 19. A
vontade de interpretar este drama amoroso que gerou polêmica acabou tornando
irrecusável o convite feito ao ator - há uma década longe da ribalta - pelo
diretor José Francisco Filho e pelo escritor Moisés Monteiro de Melo Neto,
autor do texto original de Anjos de fogo e gelo. A estréia do espetáculo será
neste sábado, no Teatro Barreto Júnior, no Pina, com temporada até 16 de
novembro, sempre aos sábados e domingos, às 20h. "A poesia é a forma do
texto, que assume um formato diferente, o que me instigou muito", destaca
George.
Foto: Renato Filho/Divulgação
|
Com uma trama enxuta, de 55 minutos, Anjos de fogo e gelo
relata a história dos dois poetas, vividos por George Meireles (que faz
Verlaine em dois momentos, aos 27 e aos 60 anos) e Roger Bravo (Rimbaud),
etambém marca a volta à cena das atrizes Stella Maris Saldanha (a aristocrata
Mathilde Mauté de Fleurville, que viu seu casamento de dois anos com Verlaine
ser esfacelado quando ele se interessou por Rimbaud) e Ivonete Melo (na pele de
Vitalie, a mãe de Rimbaud). "O quinto ator é a luz, que faz com que o
público se reporte aos atores e aos planos e escadarias onde se realiza a
ação", diz o diretor José Francisco Filho.
Ele explica que os cenários de tom expressionista criados por Marcondes Lima
contrastam com os figurinos rebuscados de época pensados por Aníbal Santiago,
numa reconstituição rigorosa da indumentária do final do século 19. A trilha sonora erudita
proposta por Fernando Lobo, a maquiagem de Henrique Melo e a direção de arte de
Renato Filho também ajudam a dar o tom naturalista da montagem, onde os atores
foram orientados a economizar nos gestos e na voz e a focar a interpretação nas
expressões faciais. "Todo o trabalho é fruto de muita pesquisa, do cuidado
com os fatos históricos, para conseguir passar ao público a vida e a obra de
Verlaine e Rimbaud", pontua o diretor.
Stella Maris Saldanha está muito emocionada com este retorno aos palcos.
"Tenho uma relação muito visceral com o teatro, mas estava sem atuar desde
o final da década de 1980, embora tenha participado duas vezes da Paixão de
Cristo de Nova Jerusalém", recorda Stella. Para ela, Mathilde tem um papel
estratégico no triângulo amoroso que acaba formando com Verlaine e Rimbaud,
experimentando um processo de muito sofrimento. "Ela fica amargurada,
magoada, pois é surpreendida por esta relação tempestuosa, até que a dor fica
insuportável", explica. A atriz afirma que também está feliz por perceber
um "burburinho", uma chama que se acende novamente na cena teatral
pernambucana. "Já fomos a terceira capital em produção teatral no país,
atrás apenas do Rio e de São Paulo. Temos um movimento muito generoso na música
e no cinema, mas no teatro esta palidez ainda está se desfazendo".
Na opinião de Roger Bravo, os oito meses transcorridos entre a leitura do texto
e os ensaios vêm sendo bastante intensos. "É um mergulho no desconhecido,
uma experiência libertadora, sem fórmulas a seguir", diz Roger, que fica
praticamente o tempo todo em cena como Rimbaud, o que exige um alto nível de
concentração.
George Meireles acredita que participar de Anjos de fogo e gelo é ainda mais
provocador porque o ambiente é simples e não restam "muletas" para
apoiar a interpretação do elenco. "É mais difícil, porque somos levados a
passar a alma do personagem", revela George, que havia feito a promessa de
só voltar ao teatro com uma peça de conteúdo denso, que possa desafiar o
público.
Serviço
Anjos de fogo e gelo
Direção de
José Francisco Filho
Onde: Teatro Barreto Júnior (Rua Jeremias Bastos, Pina)
Quando: Estréia sábado, às 20h. Em cartaz aos sábados e domingos, às 20h, até
16 de novembro
Quanto: R$ 20 e R$ 10 (meia-entrada)
Diario de Pernambuco - PE
29/08/2008 - 07:32
Paixão visceral embalada pela poesia
Amor de Arthur Rimbaud e Paul Verlaine é tema da peça Anjos de fogo e gelo, que
estréia no Barreto Júnior
Tatiana Meira
|
Renato
Filho/Divulgação
Espetáculo
remete à ebulição cultural da França no século 19
|
|
|
|
|
|
|
Um paralelo entre a vida e a obra poética de Paul Verlaine e
Arthur Rimbaud, mostrando as influências mútuas entre os dois poetas, ajuda a
compor o enredo de Anjos de fogo e gelo, peça que estréia sábado, às 20h, no
Barreto Júnior, no Pina. Além de trazer para o teatro a trajetória pessoal e
artística de Anjos de fogo e gelo dois ícones da literatura francesa do século
19, o espetáculo conseguiu reunir no mesmo elenco atores que estavam afastados
dos palcos há vários anos, como George Meireles (que vive Verlaine), Stella
Maris Saldanha (que estava longe das artes cênicas desde o final da década de
1980) e Ivonete Melo. Também faz parte deste time Roger Bravo, que interpreta
Rimbaud.
Dirigido por José Francisco Filho e baseado no texto escrito por Moisés Monteiro
de Melo Neto, Anjos de fogo e gelo opta por abordar a paixão avassaladora entre
Verlaine e Rimbaud, para discutir uma relação amorosa que poderia acontecer
independentemente do sexo. No lugar de uma narrativa convencional, são as
poesias que costuram os diálogos, onde os atores foram orientados a seguir um
gestual minimalista, para ressaltar a força da interpretação individual.
"Sabíamos da responsabilidade do projeto e nos dedicamos a ele com uma
entrega visceral", garante George Meireles.
Os cenários foram criados por Marcondes Lima, os figurinos são assinados por
Aníbal Santiago - que também estava há anos sem trabalhar na composição de
figurinos teatrais -, a trilha sonora é de Fernando Lobo e a maquiagem, de
Henrique Melo. A peça ficará em cartaz aos sábados e domingos, às 20h, até o
dia 16 de novembro. Ingressos: R$ 20 e R$ 10 (meia-entrada).
A árvore de Júlia - Também em cartaz no Barreto Júnior, a peça A árvore de
Júlia é protagonizada pela estreante Olga Ferrário, 16 anos, que é dirigida
pela mãe, Lívia Falcão. A peça conta a história de uma jovem que passa a morar
em cima de uma árvore, para que ela não fosse derrubada. Em cartaz na sexta, às
20h, e sábado e domingo, às 17h. Informações: 3232-3054. Ingressos: R$ 20 e R$
10(meia-entrada).
FOLHA DE
PERNAMBUCO SÁBADO - 30/08/2008
Encontros e desencontros clandestinos
“Anjos de Fogo e Gelo” retrata vida dos poetas Verlaine e Rimbaud
por Talles Colatino
Divulgação
Peça coloca em
cena momentos decisivos dos poetas
Foram dois anos de reformas, e depois da abertura oficial na
última quarta-feira, Recife agora conta com um Teatro Barreto Júnior apto e
seguro a receber peças em seu palco. E para marcar a nova fase do espaço,
acontece hoje a estréia da peça “Anjos de Fogo e Gelo”, que retrata os
encontros e desencontros de dois dos maiores poetas de todos os tempos,
Verlaine e Rimbaud.
A vida e a obra dos dois poetas e amantes ganham vida cênica
com a direção de José Francisco e conta com George Meireles e Roger Bravo como
protagonistas. “Anjos de Fogo e Gelo” retrata um período da vida dos poetas, no
qual Verlaine, entusiasmado com os versos do jovem poeta, Rimbaud, o convida
para morar com ele e sua mulher, Mathilde (vivida por Stella Maris Saldanha). A
partir daí cresce então uma grande cumplicidade entre os dois artistas e uma
intensa paixão.
O espetáculo coloca em cena momentos decisivos da vida dos
dois poetas. Mesclando a história com poemas de ambos, a peça traça um paralelo
entre a vida e a obra poética deles, mostrando como um influenciou o outro.
Fica certo que poesia de Verlaine não é mais a mesma desde seu encontro com
Rimbaud. Assim como esse mergulha no universo poético de Paul Verlaine, onde
sua erudição contribui para que Rimbaud passe a criar uma obra refinada e
profunda.
O texto da peça é de Moisés Monteiro de Melo Neto e
completam o time Renato Filho (direção de arte), Fernando Lobo (direção
musical), Marcondes Lima (cenários), Aníbal Santiago (figurinos) e Henrique
Melo (maquiagem). “Anjos de Fogo e Gelo” fica em cartaz até o 16
novembro, sempre aos sábados e domingos, às 20h.
Serviço
“Anjos de Fogo e Gelo”
Sábados e domingos, às 20h
Teatro Barreto Júnior
Ingressos: R$ 20 e R$ 10.
» ESTRÉIA
Dois homens e um livro aberto
Publicado no JORNAL DO COMMERCIO em
29.08.2008
Anjos de fogo e gelo leva o romance entre Rimbaud e
Verlaine, poetas franceses para o novo Barreto Júnior
Fabiana Moraes
A história de um dos romances mais comentados de todos os
tempos começa a ser encenada amanhã em um Barreto Júnior
novinho em folha: Anjos de fogo e gelo, direção de José Francisco e texto de Moisés
Monteiro de Melo Neto, conta o atribulado amor entre Rimbaud e Verlaine,
poetas-chave da França do século 19. O par será vivido pelos atores George
Meireles (Verlaine) e Roger Bravo (Rimbaud), que sobem ao palco ao lado de
Stela Maris e Ivonete Melo (elas vivem Mathilde, a mulher de Verlaine, e
Vitalie, mãe de Rimbaud, respectivamente). O espetáculo marca o retorno de
Meireles, Ivonete e Stella ao palco, além da volta de José Francisco ao
universo das montagens adultas – sua última incursão nesse sentido aconteceu há
oito anos.
“É engraçado, muita gente tem me perguntado como está sendo
volta aos palcos, mas você não volta de onde nunca saiu, não é?”, brinca o
diretor, que durante todo este tempo esteve à frente de peças infantis (como A
revolta dos brinquedos, que volta em breve aos palcos) e envolvido nas aulas do
curso de artes cênicas da Universidade Federal de Pernambuco. “Também estou
montando Apareceu a Margarida com a Trupe do Barulho”, adianta ele. É de José o
projeto que se concretizou em peça, uma mescla moderna de homoerotismo e
poesia. “Não sou um fã de carteirinha da poesia de Verlaine e Rimbaud, e sim
fascinado com o rompimento da linguagem poética”, conta o diretor. “Rimbaud
desafia a alta burguesia francesa quando diz simplesmente ‘eu não sou assim’,
ele quebra as estruturas pelo deboche”, fala.
A forte presença das mulheres foi determinante para a
encenação poética do relacionamento entre Rimbaud e Verlaine (aliás, o romance
entre os dois poetas foi encenado com sucesso em 2000, quando Pólvora e poesia
recebeu o prêmio Shell de melhor texto). “Rimbaud não era ninguém sem a mãe”,
opina José Francisco. O cenário de Marcondes Lima faz do palco um verdadeiro
livro aberto – é totalmente expressionista, pontua o diretor –, enquanto os
figurinos de Aníbal Santiago, verdadeiro pesquisador de indumentárias, seguem a
linha realista. É século 19 do sapato ao lencinho.
O ator George Meireles – que havia atuado pela última vez há
dez anos em O avarento – pesquisa há quase um ano o papel do exuberante
Verlaine, que larga a mulher e o filho recém-nascido para viver o tórrido
relacionamento com Rimbaud. “Aos 19 anos, ele já era considerado um grande
poeta, tanto que recebeu o título de ‘príncipe’ por parte dos franceses. Victor
Hugo ficou impressionado com seu primeiro poema”, conta Meireles, lembrando que
Verlaine supera Rimbaud em termos de popularidade naquele país – aqui, é
justamente o oposto. A separação de Mathilde, os passeios pelo boulevard
Saint-Michel (lugar de “pegação” onde até hoje michês fazem ponto,
escandalizando os moradores bem-nascidos do 5º e do 6º arrondissement) e os
dois tiros desferidos contra Rimbaud são algumas das passagens vividas pelo
jovem poeta e encenadas em Anjos de fogo e gelo. Vivendo o par trágico e
amoroso de Verlaine está o ator Roger Bravo, que já foi dirigido por nomes como
Carlos Bartolomeu e Marco Camarotti. Um grande trunfo da peça, é claro, é a
participação de Stella Maris (Um deus dormiu lá em casa, 1988) e Ivonete Melo
(seu último trabalho foi Abelardo e Heloísa, criado em 2000).
Quem for conferir o espetáculo leva um presentinho de
Rimbaud e Verlaine: além do programa, será distribuído um CD com poemas e a
trilha sonora do espetáculo. Anjos de fogo e gelo ficará em cartaz aos sábados
e domingos, às 20h, no Teatro Barreto Júnior. O ingresso custa R$ 20 (inteira)
e R$ 10 (estudante).
Quanto à política, Moisés Neto apoiava Miguel Arraes. Na foto, Moisés aparece ao lado de Miguel Arraes e sua esposa Madalena Arraes.
Sobre a morte de um dos melhoes amigos e parceiro de Moisés
o JC publica Cinema perde Marco Hanois
Publicado pelo Jornal do Commercio, em 19.11.2007
O artista plástico e realizador de cinema e vídeo Marco
Hanois, 42 anos, morreu, ontem pela manhã, na casa onde morava com os pais, em
Candeias, Jaboatão dos Guararapes, Grande Recife, vítima de esclerose lateral
amiórtica (ELA), doença degenerativa que atinge os músculos. O enterro
aconteceu ontem à tarde, no Cemitério Morada da Paz, em Paulista, Região
Metropolitana do Recife (RMR).
Dentre as obras de Hanois, estão Cassino Americano, de 1992,
filme curta-metragem (diálogos de Moisés Monteiro de Melo Neto) com o qual foi
premiado no Festival de Vídeo de Tóquio, no Japão, e Objeto Abjeto, de 2005,
que venceu o prêmio de roteiro do Festival de Cinema do Recife. Atualmente,
Hanois estava finalizando o filme Insenso, filmado em outubro de 2006, com
assistência de direção de Moisés e a participação dos pernambucanos Bruno
Garcia, Tuca Andrada, Aramis Trindade, Mônica Feijó, Simone Figueiredo, Lia de
Itamaracá, Diva Pacheco, entre outros. A obra é baseada na obra de Ascenso
Ferreira.
“Marco Hanois tinha uma importância cultural grande em
Pernambuco. Era um diretor e roteirista reconhecido e premiado devido a sua
enorme competência e dedicação com o trabalho”, afirmou o jornalista Pedro
Celso, amigo de Hanois e que participa de Insenso como diretor de produção.
Com o estágio progressivo da doença, estava tetraplégico e
dirigia os filmes sentado em uma cadeira de rodas. “Foi uma grande perda”,
disse Pedro Celso.
AINDA SOBRE O FILME INCENSO (direção MARCO HANOIS,
ASSISTÊNCIA DE DIREÇÃO DE MOISÉS MONTEIRO DE MELO NETO: A oralidade da poesia
de Ascenso Ferreira em curta-metragem
Cineasta Marco Hanois começou a gravar Incenso, filme que
presta homenagem ao poeta Ascenso Ferreira
O Engenho Massangana, no Cabo de Santo Agostinho, foi moradia do escritor e
abolicionista Joaquim Nabuco até os oito anos e é uma das construções mais
representativas do Pernambuco do século 19. O espaço, atualmente funcionando
como centro cultural, emprestou suas particularidades históricas ao início das
gravações do novo curta de Marco Hanois, Incenso, no último sábado.
O filme presta homenagem à obra de Ascenso Ferreira e busca,
segundo o diretor e roteirista, “resgatar as peculiaridades orais do texto do
poeta e reviver um período da história pernambucana, que ficou esquecido”: as
primeiras décadas do século 20, com suas beatas, coronéis, crendices e o
espanto diante da modernidade tardia que o Brasil começava a vivenciar. Uma das
cenas de Incenso mostra a perplexidade dos personagens diante de um Zeppelin
rasgando os céus de um Pernambuco ainda rural.
Apesar de Ascenso Ferreira ter nascido em Palmares, o curta
de Hanois não se fecha numa cidade específica. Sua proposta é ter como cenário
um interior arquetípico, que traga pormenores de todas as cidades pernambucanas
do início do século passado sendo apresentadas ao espectador durante os 20 minutos
da trama. Dessa forma, as filmagens, que se prolongam até o próximo mês, terão
como cenário ainda os casarões antigos e ruas do Poço da Panela.
O primeiro dia de filmagens de Incenso registrou os diálogos
entre os atores Alexandre Zachia e Tuca Andrada. Zachia interpreta um
personagem chamado apenas de Coronel, que funciona como uma espécie de “alter
ego” do próprio Ascenso. O poeta costumava dizer que um dos seus sonhos era ter
sido coronel de engenho, figura das mais representativas do imaginário nordestino.
Tuca vive Zé Estribeiro, que serve como elo das várias tramas do curta.
Amigo de longa data de Hanois, Tuca explicou que, por pouco,
ficou de fora do elenco de Incenso devido à sua apertada agenda, que divide
espaço entre a novela Cidadão brasileiro e a turnê da peça Orlando Silva, o
cantor das multidões. “Eu queria muito fazer esse curta, tanto por minha
amizade com Hanois quanto pela homenagem que ele faz à obra de Ascenso, um
poeta importantíssimo. Foi um verdadeiro milagre que neste fim de semana eu
tenha conseguido participar das gravações”, explicou o ator, durante uma das
pausas da filmagem.
Incenso tem um elenco numeroso com mais de 30 atores, que
conta ainda com nomes como Bruno Garcia, Aramis Trindade e com as cantoras Lia
de Itamaracá e Mônica Feijó. No caso de Mônica, que atualmente participa do
elenco de Páginas da vida, ela volta a Pernambuco nas próximas semanas
especialmente para gravar sua participação em Incenso. A assistência de direção
fica a cargo de Moisés Monteiro de Melo Neto. A atriz Patrícia França foi um
nome cotado para atuar no curta, mas acabou ficando de fora por problemas na
sua agenda. Patricia, nos anos 80, trabalhou em projetos teatrais de Hanois.
Todos os diálogos de Incenso são permeados por fragmentos de
textos de Ascenso. O título do curta faz referência ao poema Mês de maio: “O
incenso queima diante do altar,/ o mês de maio vai terminar.../ Com seus
deliciosos braços nus,/ as rosas fazem o sinal-da-cruz.../ Amém...” - presente
no livro Catimbó, de 1927. Ao fragmentar diversos textos de Ascenso, segundo o
diretor, o curta resgata para toda uma nova geração a oralidade típica da obra
do poeta.
O roteiro do curta foi vencedor do prêmio Ary Severo-Firmo
Neto, concedido pela Prefeitura do Recife no ano passado, e foi orçado em R$ 80
mil. Durante a fase de gravação, o filme está contando ainda com apoio de,
entre outras instituições, Chesf e Fundação Joaquim Nabuco, que cedeu
gratuitamente a utilização do Engenho Massangana. No entanto, a equipe ainda
procura recursos para a etapa de pós-produção.
Moisés Neto, Tuca Andrada, Assis e Pedro Celso Marconi(produtor do PREMIADO Filme INCENSO)
Moisés Neto em Buenos Aires
Moisés no aqueduto de Cesarea, Israel
Moisés Monteiro de Melo Neto no Teatro que Pilatos , mandou construir em Cesareia, Israel. Moisés também interpretou Pilatos (personagem histórico que ele interpretou no Teatro em pernambuco, na Paixão dos Guararapes) com texto de Albemar Araújo e direção de Geraldo Dias
Moisés Monteiro de melo neto Punta Del Leste, Uruguai
New
York
Havana
Moisés Monteiro de Melo Neto (Moisés Neto) no Partenon, Atenas, Grécia
Moisés Monteiro de Melo Neto (Moisés Neto) em Delfos, Grécia
Tel Aviv (Israel)
Abu Simbel (Egito)
Zurich
Lisboa revisitada
Barcelona
Moisés Monteiro de Melo Neto (Moisés Neto) em Ollantaytambo, Vale Sagrado, no Peru;
Moisés Neto Machu Picchu
Moisés e a irmã Fátima Amaral, Rio de Janeiro
e com Paulo Barros (SP)
No Paraná, turnê Muito Pelo Contrário
Pedra do Reino (S. José do Belmonte,
PE)
Festinha com amigos no apartamento de José Francisco Filho,
em Boa Viagem, 2015 (Atores, jornalistas, produtores, escritores, a então
presidente do SATED PE, Ivonete Melo)
Trechos dos diários de Moisés:
Foi uma maratona de peças teatrais e debates e coisas e mais
coisas, a semana passada,o 18º FESTIVAL RECIFE DO TEATRO NACIONAL 2016, que
homenageou o MAMULENGO SÓ-RISO. Do sábado, dia
19, com 'Memórias de um cão', do Coletivo Alfenim (PB),
no Teatro de Santa Isabel (já adaptei Quincas Borba para um musical no
circo e Ivaldo Cunha o encenou muitas vezes, assim como Brás Cubas , mas ali era
o cão Quincas que era o narrador, enfim...); na segunda foi o Seminário de
crítica, onde João Denys explicou parte da sua dramaturgia e dos processo de
criação (master); na terá MEDEIA, por Albemar Araújo, no Teatro Joaquim
Cardozo, na quarta ensaio com José Francisco.
Moisés Monteiro de Melo Neto é professor da Universidade Estadual de Alagoas, UNEAL, onde desenvolve trabalho de extensão e Pesquisa sobre Teatro
Moisés Monteiro de melo Neto também atua como professor de Dramaturgia, no Curso profissional do SESC:
POEMA DE MOISÉS MONTEIRO DE MELO NETO
(O Monstro)
Dorme dentro de mim
Ainda
Um monstro,
Um pequeno índio chamado Instinto.
E, como se fosse um pequeno computador
Um pequeno piano
Uma pequena harpa
Emitindo notas maravilhosas
Às vezes me faz chorar
E eu me guardo dentro deste coração
Eu me protejo na emoção
Eu teço peças e projetos
Invoco rios e mares
Seres cósmicos, novas espécies
E vou me entretendo
Com velhas canções .
Este monstro chamado Instinto
Neste lugar chamado infinito
Domina-me de modo selvagem
Sinto-me primitivo
Ó selva de sangue,ossos,cabelos,músculos
Que penetro
Que espero desde os 17.
Vida que me prometi
Ó, sonho que acalentei!
Ó, seio materno!
Ó, verão de setenta,vinho-lua-licor do céu
Paro.
Frenética corrida- Frenético torpor
Versos soltos – Espumas Flutuantes- Castro Alves-
Ninguém responde ali:
Eco do meu corpo ao redor deste pequeno coração- celeiro.
Emito raios, descubro soluções
Descubro outro monstro, que me dá sua mão.
Filmes,viagens, fotografias de Marte.
Primeira estrela da noite.Primeira Paris.
Ó, Balada Infame, ,esta do caçador ferido
II
Ainda lateja nos meus sonhos a primeira rua
Ali vivo e percorro por entre os flamboyants
O caminho que conduz ao Éden
Sublime desejo das tardes de chuva e sol dourado
Tecidos do pequeno príncipe,paixões de Buda e silêncio
Vivo para distribuir entre os mais estranhos
As experiências vulgares que me custaram tanto
Escorro dólares afanados, as publicidades warholianas.
Poucos me entendem, menos Ainda incensam-me.
Beiro as décadas qual Dante apavorado pelo tédio.
Busco nas modernas tavernas rimas estranhas e convictas:
Surge,surjo.Vêm como
em Romaria.
Encontro-me Jerusalém, Pompéia, Cairo, Assuan.Penetro Abu
Simbel ,
sou Agatha,Poe,Paglia,tantos.
Banho-me em Sartre: a Idade da Razão é uma fraude
Haja o que houver, foi ontem e não dá mais.
Fazenda Nova? Quantos modelos rejeitados!
Sexo que lateja,sexo que entorpece.Gozo gasoso.
Espelhos alucinógenos- colagens estapafúrdias
Amigos que vão do nada para mim.
Vôos de bruxos mulheres que se abrem.
Vaginas lúbricas,pênis que fazem doer.
Na última hora, a última chance.Lá está a esperança:esmagada
O escaravelho de Londres.
Noronha escrachada em Sanharó.Em Nápoles
Numa pequena ilha da Paraíba.
Quem jamais saberá de mim?
- multitude.
Só no Marco zero haverá minha paz.
Quero o Marco Zero onde o mundo começa
no Recife.
Os versos continuam em narrativa teatral.
As estrelas hoje gotejam chuva louca,
Amanhã novos voluntários “cerebram”
Haja português que agüente minhas praias
ermas de seres imaginários
Meus rios de tinta,papel e máquinas.
Vejam:céu,inferno e purgatório
Florença rediviva.
Pernambuco útero.
Recife crepúsculo auróreo.
Vida caleidoscópio.
Escorpião melhor amigo
Leão do meu conforto
agonia pacífica.
Erguem-se, já vejo,do fundo do Atlântico, do leito do
Capibaribe:
Estranhas criaturas, estranhos monumentos
Pedras e vegetais.
Seres metamórficos,espaciais,guturais
Lá de Triunfo,lá do Vale do Catimbau, Buíque sem fim
Vêm de Fort Lauderdale,das montanhas da Áustria,da
Suíça,Washington,
já nem sei.
Espalham-se velhos e novos espíritos.Conjuram-se em Hamlets
Cordões Encarnados.Palcos do Valdemar,Santa Isabel, Apolo e
mais tantos!
Vêm de Robertos Lúcios, Cadengues, Bartolomeus
Caio, sangro, levanto, Rio-São Paulo-Gaúcho Belém
E dentro do meu coração
O pequeno índio inocentemente,transformou em nuvens brancas
num céu azul
Aquelas pedras que chacoalhavam no inconsciente.
Nos sonhos calaram-se os gritos do Norte- Sul
O que apareceu,
O que não podia ser sempre semente
O que deixou as trevas e brotou de repente
Foi um leite tão doce,puro,virginal,reluzente
Gotas,pétalas,amor transparente.
Rompeu-se o dique,pressionado pelo Monstro /mente
Ergueu-se uma nova vida.Perdoou-se a causa da ferida
As portas de par em par abriram-se
Um tráfico entorpecente sol e luas novamente
Cosmo da arte tão presente
Mamãe,papai- o resto tão serpente
As maçãs,o vento,o livro.
O testamento,a dor, as lentes
Escorre o orgasmo em anos,silenciosamente
Em contrastes com o terror:os olhos do doente.
Não se adia a satisfação- para frente
As línguas badalam o que os domingos calaram
E agora já o sabe toda a gente :
É chegada a hora do monstro
Já não há tranca que o sustente.
É o fim,é o fim...de toda a corrente.
Porque não existe pintura
psicanálise
cadeia
nem porrada,câncer,igreja
que tenha justificado o Monstro
porque ser – sem ser captado,caçador,gato manco depois de
atropelado
arrastando-se estrada
adentro em busca de um bar
de um sexo que nem
ele quer
O Monstro fica de costas
às
avessas travessuras.
O Monstro é uma flor graciosa,perfumada,maquiada,travestida.
Cercam-no rosas multicores:espanholas,alemães,inglesas...
Ele vaga por sessões espíritas
Toma café da manhã com Roma Católica
Em todos os filmes ele está no choro dos bebês e dos velhos
à beira das mortes.
O Monstro é como Petróleo
Ele ri do ridículo Apocalipse prometido há dois mil anos...
Falso cálculo de eclipse!
Julgamento dentro de mim- gordo coração crescendo.Garganta
fumaça,comida,beber
Língua de palavras,sabores,artifícios
Guerra oblíqua,putas paspalhonas...
O Monstro no celular- na fita celulóide
Desfalco.Falso andróide,humana ponte de safena
Despejo,trançando planos ao redor do meu sangue
Possuidor possesso.Eu sangro, no interior...de Pernambuco
Espasmo, perco minha ferocidade no Recife
Espalho, espero, atiço
Espantalho.Aponto o revólver para a sua caverna
Esparramo .É inútil,só quero algo mais
Espeto.Tendo e tido tudo
Espaço
A gula me transcende .Explico
Maldita lei ...satélites caindo
Mofo-
Madonna arreganhada sangrando
Dedos na vagina quente
Reluzente
Desuso.Encantada pela oração que a redime, pecadora infame
Disco, digito.Petrodólares tilintam ,arregalando os olhos do
Monstro
Mastigo !Chicletes
tutti- frutti acalmam,amalgamam a
ânsia.
fazendo,
participando.
Ó, Grande- Mãe Canguru,desperta!
Chama teu filho
Monstro.Arranca-o de mim de novo:vai!
E os dias passam,modorrentos,sedentos,cheios de suores,
chuvas,calores,calafrios.Castelos,casebres,
lojas empilhando-se pelas cidades,nos pensamentos
Trilhas adiamantadas, quilates exagerados
Dispersões,conjurações,passeatas.
Eu seguindo o cortejo.Eu me carregando,em apavorante andor
Ardor ,fervilhando sangue
Paredes psicodélicasRituais angelicais.
Sinos repicando velhos dobres pelo Monstro em cada um
Nas ruas.Calçadões.
Indo e voltando.Dando risadas que ecoam
no fundo medroso de cada ouvido
pedindo ao amor que lhes dê coragem para desafiar
este Monstro ,chamado
destino
Estranha aranha,que trabalha as teias da agonia
fazendo com que a realidade,sempre derrotada pela imaginação
não esteja mais à
altura do sonho
e que uma vida inteira pareça sempre
tão pouco tempo para
a glória,paixão,sacrifício,
tudo que dá sentido à
existência.
No meio da procissão,tomado por vã inspiração,
imagino que a pior
idiotice é pensar que o homem nasce
livre.
Dirijo meus olhos ao infinito,capto-o pelo canal dos meus
olhos
Nunca cores tão intensas tocaram minha alma.
Minha mente anda tão depressa
Quem quisesse me acompanhar teria que dar saltos
inacreditáveis
Omitindo os elementos de ligação
Inconseqüente como criança
que não tem a menor idéia do que a vida pode fazer com ela.
A única maneira (à qual me agarro enquanto
rezo,oro,entôo ladainhas)
de ser feliz,
é não saber que sou
feliz.
Recuso-me a acreditar que o passado é um bom lugar para se
viver.
Imagino-me um tipo que faz alguém ter vontade de fugir da
cadeia
Esfrego minha bola de cristal e vejo que para ser atacado
pelo monstro
basta alguém
provocá-lo((ele devora seres humanos rapidamente)
nem a música acalma sua selvageria
e com o mundo do jeito que está, ninguém tem muitas chances
e o monstro quando se apossa de um corpo(ele não perdoa
nada)
velhos e jovens são mergulhados no absurdo e lá se afogam
na ilusão de algo que os torne humanos novamente
o Monstro faz-nos pensar que não há relação espontânea
que o trabalho e o estudo só nos desgastam
ele nos quer no inferno,ele enerva até um santo
transforma todos em seres vulgares.
Chego em casa depois do culto
O Monstro está fora de
mim.Unhas,pêlos pretos,olhos verdes,
varanda para o mar.
Uma estranha melodia se faz ouvir ,envolve o ébano da
criatura.
Ele se arrasta em busca de alimento pela fria cerâmica do
meu apartamento
Na varanda um pássaro pousa.Um pássaro canta na varanda
Estridente.Com aquela cara boba de passarinho
O Monstro aproxima-se.O pássaro foge
O monstro olha-me diabolicamente.Olhos mortiços, sem vida,
cheios de frieza .
Ao longe várias flores
exalam perfume.
O mar encrespa-se
A noite vai descendo
até o chão.
II
O Monstro sabe que ao deixar meu corpo,o contaminará com o
fim do poema
Ele sabe que qualquer que seja o escopo,será ruir a
escultura,o sistema
Por isso ao olhar para outro espaço
Ele sente palpitar nas paredes do seu lar-meu coração
Um novo castelo,novo paço(chamado vácuo)antiga solidão
Ele não se importa,ele segue buscando seu prazer
Experimentando nova sensação
Na verdade só o que lhe interessa é se satisfazer
É ejacular,curtir,tocar novos corpos,explosão.
Meu corpo não tem como fugir dos antigos poetas
Não há escapatória ,nem improviso.
Novas cidades,novos estetas
Só o que é detalhado,é assim conciso.
A ignorância não entenderá os anseios deste corpo
Os intelectos dirão “foi fraco”
O que digo é: o monstro chegou morto
Ao reavivá-lo
conheci o vácuo.
Com tanto para fazer e tão pouco tempo
Escrevo estes versos a contragosto
Esparramo estas linhas ao relento.Ao contrário do que está
posto.
Reconheço o inatingível Deus
Suponho meu tão minúsculo bem
Suponho e peço aos seus Que ,ao interpretar-me ,pensem no
além...
Sigo para novo vampirismo.Entregando-me ,como vítima
Holocausto,ocultismo.No Janga, Gaibu- vítima.
E assim as linhas, as letras,o papel,o computador
Janis,Zeppelin e tantos
Ajudam-me a chegar a ti,tão longe do ardor.Anis,assim,espanto.
E no Recife agora tem absinto
Há algo adiante
Alma Mater...definitiva
Esperoe nasce assim o dia:Em espaço /expectativa.
Agora paro pela segunda vez –
A segunda queda
O Pai me observa e diz: força!
Porém nada me preserva.
E a rede de proteção-é ferida corça!
O sol nasce ontem e hoje.Crepúsculo através
Toda estrela no alforje .És o que és.
Não sobra nada de virtude
nada de esperanças
Nem o novo nem a velha atitude
Só uma velha de tranças.
Para que o final do livro?Dinheiro,saúde,filhos família
Uma velha no bilro,a
tecer rendas, perpetuar armadilha.
Aranhas são mães,que a vida tecendo
Fantasiam a falta de sentido- afãs de que perpetuando- se,
vão o sistema mantendo.
Ó, útero inicial...Por quê?
Ó, paraíso perdido até quando
É simples:é bom-a carne , vinho o auê.
O problema é ir agüentando !
As mulheres perdem mais
Num mundo onde o Monstro teima
Porque uma fêmea jamais
Chegará ao trono de onde ele reina.
Viajo aos setenta
Ardo querendo
Buscar onde ele se assenta.
Morro sofrendo
E assim seguem estes espíritos
Buscando a vingança, a vitória
Esgueirando-se pelos becos esquisitos
Desvirtuando a pança deste inseto- a História.
Não há caminho de volta para casa,conforto.
Nem lugar de curtição que nos salve,embale
Um porto
Nossa insatisfação, anseio, tudo: cale!
O Monstro é uma lagarta rastejando por uma dose
Sou borboleta querendo a flor
Ambos metamorfose
Buscando o néctar do infinito.
Morremos pelo mito da caverna, saída tão estreita
Um cometa que nos guia
Trajetória imperfeita
Nem só o amor alumia.
Dessa última vez vamos tentar
Ser família,ser feliz
Todos juntos no altar
Neste sábado que sempre se quis.
Porém você não quer entender
Não quer me incorporar
Meus medos satisfazer
Só posso me entregar.
Uma mulher e um homem no mundo
O peixe e o mar.Imolação.Tentar
Problema...caminho.CarinhoTestemunha
Acabrunha !
Este testamento é falho
Porque sou apenas a cela do Monstro-sexo
E não destruirei o espantalho
Que torna tudo desconexo.
Solidão incomoda minha busca
Ela tortura meu sossego de pedra
De qualquer modo ofusca
(Greco-romanos- egípcios- portugueses) engendra.
Digital.Mal.Setenta,oitenta,noventa,dois mil e um-fatal.
Conclui o Monstro: tenho o infinito
Acredito
Longo olhar , sobre o mar
Suave brisa- reflito.
E ele não me deixas encarar isso sozinho
Velho vinho
Guerra onde me afogo
e que me sacia
Nada me
alivia.
lll
Estou no 23º andar do edifício Marajó
Ao lado do Parque 13 de maio
Com o grande Recife aos pés,ao redor
Dentro de mim o monstro se retorce
Aceito-o pois não há saída
É melhor que tentar me enganar
A coisa se espalha em
mim,brinca
Nas minhas veias o mal que facilmente alastra-se num
contágio sem fim
Minha alma é posta à prova ,e como políticos que se esfaqueiam e se beijam,
Eu e o monstro mergulhamos nossos olhos no Atlântico.Logo
ali.
Os humanos ,como formigas , se movimentam
Em estranho tabuleiro
vejo Olinda.Boa Viagem.Arruda.
A minha torre (extensão do meu corpo)
a sombra de um
gavião é como o meu desejo,as memórias
que trouxe das montanhas,dos desertos,sertões,viagens,minhas
criações todas.
A natureza está quieta nesta manhã de sol tão urbana
E eu percebo através das poderosas lentes
Que ninguém sabe o jeito de amar a si próprio
Envolvidos pela ganância ou pela abstinência
Os desejos são embalados pedem empurrões.
A vontade cortaas raízes da vida
E eu respiro ao escutar o assobio vento nas janelas
Meus companheiros
chegam ,,partem
Lembranças fotografadas.Passado. Presente multicor
empurram -se em
sonho, para frente
–é tarde?
Recebo no rosto elogio e ingratidão-
Avanço para o desconhecido- Novos amigos?
Observo o violão sobre a mesa-
mudo há muito tempo.
Parece que os sentimentos mudam,
As nuvens desenham sombras entre os prédios,
O azul-/verde/cinza/dourado-prateado do mar,cintila
O telefone toca-
Alguém para dizer que me ama,é chato.
Meu amor dispensa declarações assim
As palavras atropelam minha calma.
Há momentos de epifania que se dissolvem
Não têm fim nesta busca
Minha vontade provoca tosse no monstro
Ele ruge.
Suas mãos assassinas e etéreas
Buscam meu pescoço.
Eu tusso,escarro, me beijo.
Procurar saídas excita.
As bandeiras vermelhas se agitam,o país busca.
As notícias em ondas reverberam
Livros,
CDs-
imensa fogueira.
A verdade muda
como a direção dos ventos
O brilho,o calor, alfinetam nossa lentidão
Não adianta racionalizar sentimentos.
O monstro sai de mim ,se espalha pelo mundo.
Diz que os maus momentos
ensinam o que é bem,
E que não há razão na terra
Capibaribe .
Nas ruas do corredor que sai do mar
E se joga pelas ruas
1º de Março,
Nova, Imperatriz e...arrebenta na Praça Maciel Pinheiro.
Amar-se,descuidar-se refletindo céu e inferno
O monstro a voar passeia pelas orlas
Mostra-me sexos ardendo, peles , pêlos salgados, perfumados,
preparados.
Lá longe em Casa
Forte, a umidade,o perfume das plantas,
o conceito armorial encastelado.
Devo corrigir meus versos?
Os freios da consciência,a velocidade da vida...
Não sinto somente seu olhar,compartilho com o monstro
este sentimento
cósmico de alquimista solitário.
Entramos no submundo
Faróis,portos .Recebem e sacodem
A beleza destrói quem a possui,o poema tece um chicote
a açoitar a estranha placenta
Respingos nas imagens sacras, o que sobrou dos séculos
Frutas apodrecendo. Insetos.Cabeças de Medusa petrificando
Estátuas morenas onde
Amor pousou.
O monstro brinca na lama do meio-dia da pressa e da
perfeição,
das feridas e pesadelos,enquanto ao sul ,aproximam-se
nuvens cinzentas, vindas do Cabo de Santo Agostinho.
Minhas cicatrizes .Ossaturas,quadros
–
ouro envelhecido pelos séculos
Nudez lasciva,
Guerra dos Mascates em mim,
farsa da batalha dos
Guararapes,
eterna Confederação do Equador.
Balelas,panelas,gravuras
amarelas
Jovens e velhos estes versos
tropeçam,como rebanho tangido pelo monstro
Consciência .Indecência,
animal Recife a se deslocar inseguro
buscando no horizonte aberturas subterrâneas ,
golpes de facão
Aqui a verdade vale tanto
quanto a hipocrisia
Festa ,trabalho e pão
Poetas fingidores acostumam- se
,viram asfalto melancólico.
A força da engrenagem alimenta
a única verdade:
Nada é definitivo.
Se a cidade for derrotada não
vai ser porque desistiu
Seguimos, apertando parafusos,
estruturando a verdade como ficção
O animal dentro da capital de
Pernambuco paralisa alegria e tristeza,
rouba honestamente pois sabe
que seus filhos tornam-se mais humanos
a cada perda.
Pequenos tiranos zeram contas
,erguem arranha-céus fascinantes.
O monstro volta com trovões e vento frio.
Todos correm sobre ruas que
lembram serpentes negras
O pássaro da sabedoria espreita
,enquanto o espírito do mal vagueia
A magia bebe na grande fonte
Os gestos do monstro tentam
agarrar o infinito
O fracasso da humanidade
humilha ricos e pobres,empesta
Ação:o cadáver quando nasceu já
sabia de tudo,brincou com a morte
Futebol,dominó,barrigas,novelas,caninha,caldinho,três
sexos
O medo recebe a luz:ninguém vai
levar a sério
Sem medo de ser tolo ,de si
mesmo,sem pressa,sem se afligir,improvisando,
sem chorar o monstro é o
campeão na arena do mundo real
eu olho a platéia penso nas apostas.
Não há vaidade no monstro.Nem
remorso.
Cada passo contém todos
Tento arriscar o que levei
tanto tempo para conseguir ,
Misturo meus desejos com a
cidade que me mostrou um caminho e seguiu outro,
inútil confiar num senhor de mãos
vazias
As vítimas das secas e
das enchentes,os miseráveis querem
sexo,vinho,pão,orações,abrigo.
Não choro: muito choro demonstra espírito fraco.
Se a dor da perda foi grande ,
a nova aquisição não será,
não há o que escolher entre
coisas estragadas...
Na cidade destruída cada minuto
contém a eternidade-
a chuva acabou com tudo, a peste devorou o
resto,
o fogo cresceu ficou difícil de apagar,
Fugir dele é afogar-se na
insensatez.
O hábito de não lutar contra as injustiças destruiu os sentimentos
dos recifenses.
Improvável,mas não impossível,
lateja ainda o coração da cidade,
um coração de pedra vigiado
pelo monstro sorridente que me mostra que tinha razão.
É o pulsar final do amargo
verbo chamado esperança
A suspeita mostrou-se pior do
que a certeza.
O monstro abraça-me.