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quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Dorian Gray vai ficar nu!

PRIMEIRA EDIÇÃO DO PROJETO ALETRAR, NA LIVRARIA JAQUEIRA

A Livraria Jaqueira recebe a primeira edição do Projeto Aletrar, no próximo dia 30/11, às 17h, sob a mediação de Carlos Santos, recitação de Flávia Suassuna, tendo Edineide Silva e Moisés Neto como debatedores. 
O encontro vai abordar o tema: " Narcisismo - O retrato de Dorian Gray - Oscar Wilde". Confira, aberto ao público!

“ o horrível objeto [de] corrupção própria, pior ainda que a corrupção da morte”, ”você vai ver, Basil, o que, segundo se crê, só Deus pode ver”




assista a uma versão do romance para o cinema (não é a melhor)



segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Vaivém danado

Samico morreu hoje aos 85, no Recife/ Olinda da gente. Ele participou com Suassuna do movimento Armorial; 

                                                    SamicoHomem e cavalo (1958), xilogravura

Sua xilogravura cria alegorias, revela mitos e lendas da cultura popular do nordeste brasileiro. Influenciou-se pelo realismo social de Abelardo da Hora e da linha de Goeldi. Menos um no front dos vivos. Pena. 


Monty Python em ação no cinema


Gosto de lendas vivas, como os mediantes ingleses do Monty Python que se apresentarão em Londres, em julho de 2014, juntos depois de 30 anos. John Cleese, Eric Idle, Terry Giliam, Michael Palin e Terry Jones, só não Graham Chapman, abatido pelo câncer em 1989. Vale rever Munchausen e também A vida de Brian.


poema improvisado para inglês traduzir

Prova de literatura em língua inglesa
                                                           (por moisesneto)




Quando Joseph Conrad me atormentou eu adaptei robert louis stevenson para o teatro musical
Robert Burns me incendiou como uísque escocês
 James Heller me deu leite irlandês
E Edgar Allan Poe me embalou pesadelos
Salman Rushdie satanicamente me disse sim
Makepeeace Thackewrey foi neste momento para mim incenso indiano
Beowulf foi fichinha que troquei em cassino que me arruinou para sempre até o ano passado
Ali o inglês  lembrava o norueguês, o islandês,
Ai de mim, pobre Yorick
a poesia Jacobeana me consumiu
 ainda no século 13 quando Albion tornou-se independente
Rompeu  com a França enquanto a linguagem que falava emudecia
Aderi aos Normandos
E  penetrei nas classe mais baixa da sociedade mudando a gramática e o léxico do meu inglês antigo
 Fui  Chaucer, mais próximo ao inglês dos dias atuais do que a linguagem falada no século anterior
interlocutor de médio do inglês de mim mesmo
ser a temporal na alta Idade Média
cheio de ideais de amor cavalheiresco entraram na Inglaterra
 escrevi romances, em prosa ou verso
 os e especialmente populares contos arthurianos
 fui Gwain e cavaleiro verde
 Depois Chaucer até Pasolini
 Com contos da Contos da Cantuária na  variedade de gêneros
peregrino a dos estilos de vida,
book of common prayer
elizabeth elisabeth james I... todos me beijaram na boca e eu os cuspi
vomitei hamlet, macbeth, rei lear, tanto tudo que nem sei
Thomas Wyatt
Marlowe thoma dekker john fletcher, francis beaumont
Fui laranja Madura de Anthony burgess e mecãnico voltei no tempo de todos on the road
 Drawing on German lore (não entendi nada)
 mas apresentei Dr. Fausto a Inglaterra
cientista e mago que é obcecado pela sede de conhecimento 
desejo de empurrar o poder tecnológico humano aos seus limites
tive poderes sobrenaturais que o permitem até voltar no tempo e casar-me com Helena de Troia
depois de duas décadas me entreguei e me pedi de volta
era então Marlowe, a data de minha morte ainda é um mistério
como Ben johnson Jonson fui a figura condutora da literatura da era jacobina
fui  Tudor
incorporei características da teoria dos humores
terra, água, ar e fogo e comportamentos diferentes resultar na prevalência de um elemento sobre os outros três
 exemplifiquei tais diferenças do ponto de vista de criação de tipos, ou clichês
enquanto Shakespeare queria uma psicologia moderna
fui um mestre deste estilo, e um brilhante sátiro.
Vesti-me de Thomas Kyd e George Chapman, inspirei John Keats, Donne me abraçou que nem senti
Engolido pelo Leviatã de Hobbes fugi do paraíso perdido de John Milton
Areopagítca alma minha
Izaak walton me chamou, fiz que não ouvi
Andrew marvell, thomas browne izaac walton
 pois isto deu a ele tempo para trabalhar em seu livrot the complete angler
 com Robert Boyle seus  ataques histéricos aos teatros de Jeremy Collier
reneguei o pioneirismo da literatura crítica de Dryden, e os primeiros jornais...
 (como John Dryden fui agredido devido a mera suspeita de ter escrito Satire on Mankind)
Uma conseqüência deste anonimato é que a grande maioria dos poemas, alguns deles de mérito, não eram publicados e permaneciam desconhecidos.
John locke tentou me enquadrar  na sua filosofia, assustado disse não ico chico buarque anamente
 De nada valeram os Treatises on Government
John Bunyan que se danasse com  outros autores religiosos do período
Edmund Spenser  e a  (des)restauração com as novidades velhas para mim de nada valeram
William Wycherley, George Etherege me encheram a paciência com a atmosfera da Corte
William Congreve  John Vanbrugh John Evelyn, Samuel Pepys... não me saciaram
Nem john Vanderburg
 Alexander Pope na sua constante batalha com outros poetas, e sua serenidade
Uma  aparente abordagem neoclássica para poesia
competição com versos altamente virtuosos e competição pesada para mim
como para Ambrose Phiplips
james Thompsonm edward young
 mesmo a  experimentação do Inglêsde Joseph addinson e richar steele
 o que me aliviou foi Daniel dafoe com moll fladers robinsoe crusoe
ou johnathan swift de muitos gulliver que fui
John gay me seduziu com a ópera do mendigo
 Vieram henry fielding Henry fielding com tom jones e samuel richardson
Pra quê?
Laurence sterne com tristan shandy me animou um pouco, mas não durou tanto assim
Pois eu já estava na Idade da Sensibilidade
E a minhaa literatura refletia a visão de mundo do esclarecimento juntei-me aos lake poets e rompi comigo mesmo
 William wordsworth, coleridge
Pura introspecção
Byron, shelley, keats, todos me acenaram com certa indiferença e vício
E fui resagatado por oscar wilde que pintou meu retrato 
dorian para me torturar com a juventude vampiresca e cinzenta
 Jane austen com seus  romances sobre a vida da classe rural
 totalmente mulher irônica nas práticas sociais, especialmente focadas em temas sociais, casamento... dinheiro
me aborreceram com suavidade e inteligência ímpares
com a rainha victoria( 1837-1901) tornei meu romance uma forma principal na Literatura Inglesa.
Já os romances realistas de geworge Eliot resultariam vãs tentativas de real na arte
Um tal anthony tropolle jamis poderia se equiparar a Dickens pintor em letras da classe artesã e camponesa.
Ou mesmo a TESS QUE POLANSKI ME DEU DE de  thomas hardy
Embalado que eu estava ainda com tennyson, robert browning e elizabeth barret browning, dopado com lewis carroll, arthur conan doyle
Viajando com rudyard kipling
O século XX me encheu de guerras piores ainda
E rupert brooke, isaac rosenberg, blunden, sanssoon, buchan, me espionaram enquanto eu os curtia insensatamente
Já o ficcionista e ensaísta G. K. Chesterton
Eu troquei por Bernard Shaw e H. G. Wells.
Vieram evelyn waugh, d.h. lawrence, virginia woolf
Depois Huxley, ballard 
 até a danada da agatha christie... que me matou!

sábado, 23 de novembro de 2013

OS GIGANTES DA MONTANHA APARECEM NO RECIFE: SÍTIO TRINDADE SERVIU DE CENÁRIO PARA A TRUPE MINEIRA DO GALPÃO


 

"Hoje podemos afirmar que o Galpão já tem uma linguagem própria, onde se misturam Brecht e Stanislavski, as técnicas circenses com o teatro balinês, a música folclórica com os experimentos musicais mais contemporâneos, a dramaturgia clássica com o melodrama, Eugenio Barba com Gabriel Villela, Eduardo Garrido com Shakespeare, marujadas com Molière, teatro épico com drama psicológico, o provinciano com o universal, a tradição com a transgressão. Tudo se mistura nesse caldeirão que os alquimistas do Galpão transformam, com visão crítica e generosidade, em teatro da mais pura cepa, arte maior, celebração da vida"., diz Paulo José, diretor e ator do grupo Galpão, que se apresentou em Recife no final de novembro. Assisti, impressionado, à montagem de  Os Gigantes da Montanha

Gigantes invadem o Recife


Luigi Pirandello apoiou Mussolini recebeu crítica negativa por algumas peças, entrou em depressão, perdeu sua companhia de teatro e sentia ira morrer logo: tudo isso está no seu último texto, inacabado, Os gigantes da montanha. Lutava inutilmente contra o câncer e partiu em 1936 . É um texto complexo, o diretor Gabriel  Villela uniu-se mais uma vez ao grupo que já encenou “Romeu e Julieta” (1992), “As três irmãs”(Tchecov) “Tio Vânia” e “Eclipse” (2012). O que vi em cena foi um mix de commedia dell’arte. Ao Pirandello com sua arquitetura erudita, filosófica e paradoxalmente pelo popular, junta-se algo que o grupo chama  “gromelô”, palavas inventadas por eles para completar o texto de Pirandello (reflexo da sua própria vida: fantasmas e fantoches em cena de uma apresentação sobre uma “nobre” que tece o belo filho trocado por um menino feio como um fígado, e uma atriz atroz que levou um poeta ao suicídio (depois de escrever uma peça para ela, que o iludira com falsas promessas).

É o seguinte: um grupo de teatro ambulante chega a uma vila mal assombrada e chefiada pelo mago Cotrone. Os atores não têm onde cair mortos, aí a atriz-condessa (Ilse- cópia da mulher do autor?) conta com a ajuda do tal  mago (Pirandello?) chama os fantasmas para ajudar o tal elenco e apresentar-se para os tais “gigantes da montanha”, de um povoado das redondezas. Mas os gigantes não gostam da peça e os atores são banidos e assassinados, numa espécie de  metáfora da perseguição à poesia (e ao teatro) num mundo imbecil, cabendo ao  teatro vencer a morte (morrendo, renascendo, renovando-se).

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

O mundo gira

Fico triste com a tragédia nas Filipinas, Tufão Haiyan, também aconteceu algo assim lá em 2004, quando morreram mais de 220 mil pessoas. As imagens dos corpos na areia das praias foram terríveis e agora fome e falta de teto chocam o mundo. É o pior tufão a tocar nosso planeta. Agora são outras milhares de vítimas. Nossa solidariedade aos companheiros filipinos que exibem a fragilidade de todos nós neste mundo imprevisível.
Enquanto isso, no Chile duas louras disputam a presidência num país marcado pela educação (e outros setores) em crise; fica para 15 de dezembro. É o matriarcado latino em movimento.
Cai mais um avião na Rússia e mata toda a tripulação. O país é conhecido quase como campeão de desastres aéreos, além de preconceitos como racismo, homofobia, xenofobia etc. Até quando?
Agora deu! Comenta-se que a extradição do ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, com ordem de prisão pelo envolvimento com o esquema chamado mensalão e que fugiu para a Itália, vai ser complicada pelo fator Cesare Battisti, ativista italiano refugiado no Brasil e condenado em seu país, não extraditado para a Itália por decisão do governo daqui.


domingo, 17 de novembro de 2013

Fliporto: fim de semana soberano; por Moisés Neto


Desde a época da curadoria de Lucila Nogueira, a  Festa Literária Internacional de Pernambuco sempre me deu prazeres, poderia ser melhor para mim: já participei como palestrante em outros anos e lá encontrei Thiago de Mello, Camile Paglia, Barry Miles e tanta gente boa, sou público também e escuto com paciência.Nesta  9ª edição, que aconteceu de 14 a 17 de novembro, em Olinda, compartilheia as ideias do  argentino Andrés  Neuman, do angolano valter hugo mãe, com suas histórias de santidade, São Bento, exorcismos, cura de doenças nas mãos na infância por pedir em frente à virgem Maria... um milagre... agora na Islândia,  as incertezas de Andrea Del Fuego, as certezas deLuiz Ruffato e as estruturas expostas do grande Ronaldo Correia de Brito. Estive com a filha, a neta e o bisneto do  homenageado José Lins do Rego.

Interior gelado da barriga negra
 tenda das palestras principais 
que nos abrigou em Olinda, novembro de 2013
 PRAZER DE VER

Não se falou muito das angústias de ser um escritor, salvo um certo tom melancólico da parte de Andrea del Fuego. O clima era mesmo de celebração dos famosos presentes ou os que eram objeto de estudo. O tema-pretexto para o magnífico encontro de intelectuais e simpatizante  foi “A literatura é um jogo”. A curadoria de Mário Helio Gomes é sempre uma menção honrosa. Mário já editou muitos textos meus. Andrés Neuman (1977, Buenos Aires, Argentina), autor dos livros Bariloche, O viajante do século , dos livros de contos El que espera, El último minuto e Alumbramiento; e de Década (seus livros de poesia). Indicado pela revista britânica Granta como um dos Melhores Ficcionistas Jovens em Espanhol! Já Ana Maria Machado (1941, Rio de Janeiro)com seus mais de cem livros publicados no Brasil, traduzida em vinte países(18 milhões de exemplares, invejável!). Detentora dos principais prêmios literários no Brasil ( e em 2003 o Hans Christian Andersen, importante prêmio internacional de literatura infantil). Em 2001, a Academia Brasileira de Letras concedeu à escritora o Prêmio Machado de Assis pelo conjunto da obra e em 2003, integrou a ABL (é a  atual presidente). O caso Andrea del Fuego (1975, São Paulo) é mais delicado: os contos de Minto enquanto posso (2004), Nego tudo (2005) e Engano seu (2007fizewram dela um nome conhecido.  Levou o Prêmio Literário José Saramago por seu livro Os Malaquias. Não conseguiu nesta Fliporto um brilho a  sua altura. Luiz Ruffato (1961, Cataguases, Minas Gerais)
autor de Eles eram muitos cavalos, Estive em Lisboa e lembrei de você (prêmios APCA, Machado de Assis, Jabuti e Casa de las Américas e estão publicados na França, Itália, Espanha, Alemanha, Portugal, Argentina, México e Colômbia). Pilar del Río não encontrei (sim: todos terminam se misturando com a audiência. Mas Maitê Proença (bem louquinha, uma delícia!) mandou logo avisar que só ia autografar o livro que organizou: É duro ser cabra na Etiópia, fotos seriam no dia seguinte para quem comprasse ingresso para a peça dela no Parque Dona Lindu (duas sessões no teatro Luiz Mendonça, $40 e 80); desnecessário louvar Ronaldo Correia de Brito (1951, Saboeiro, Ceará) escritor e médico (formado pela Universidade Federal de Pernambuco) com seus relatos de pesquisas, seus textos sobre literatura oral e “brinquedos de tradição popular”, autor dos livros Galileia (2008, Prêmio São Paulo de Literatura/2009, Melhor Livro do Ano), contos Retratos imorais (contos, 2010), Faca (2003), Livro dos homens (2005) e Estive lá fora (2012), praticame nte sufocou Ana Maria Machado com sua sapiência estratégica. Walcyr Carrasco (1951, Bernardino de Campos, São Paulo) não vi, nem soube. Mas o autor de telenovelas, jornalista, (Veja e IstoÉ ,O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo e Diário Popular), autor dos infanto-juvenis Vida de droga e O selvagem, traduções e adaptações de clássicos da literatura como Os miseráveis , (diversas menções de “Altamente Recomendável” da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil), que precioso!). Para “adultos”, segundo release, estão Pequenos delitos e Juntos para sempre. Presenciei Sylvio Back (1937, Blumenal, Santa Catarina, cineasta, poeta, roteirista e escritor, trinta e sete filmes, vinte e um livros, entre poesia, ensaios, contos e os argumentos/roteiros dos filmes). Um sabor de veneno veio à boca com Consumir, protestar, espionar e outros temas incômodos, no jogo da sociedade moderna em mudança constante, palestra em vídeo com o sociólogo Zygmunt Bauman (gravada em Leeds, na Inglaterra), comentado pelo economista Sergio Besserman Vianna, em conversa com o jornalista Silio Boccanera (só a primeira parte, a segunda quem quisesse ver e não ganhou no sorteio improvisado, que comprasse no stand da Carpe Diem. Fernando Báez e Klester Cavalcanti, com mediação de Samarone Lima, compuseram a mesa Jogos de Guerra – duas conferências: Báez: “Censura, mentiras e poder: a verdade da espionagem dos Estados Unidos no século XXI”, tomou o microfone  diante de uma escassa plateia e metralhou durante uma hora, sem parar, a partir das 14: 20, uma lista da espionagem maliciosa dos EUA, Samaroni teve que pedir 3 vezes para o venezuelano calar-se! Cavalcanti com “Um Jornalista Brasileiro na Guerra da Síria”, falou sobre sua prisão, como jornalista, na  Síria. No mais a presença sempre agradável de Sidney Rocha.
Muito boa, quero mais.




sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Moisés Neto encontra Francisco Brennand

Brennand: sangue de barro
                                                                por Moisés Neto
Francisco de Paula Coimbra de Almeida Brennand  escreve seu nome com barro, tinta e fogo na história, desenvolve seu trabalho com diversos suportes. Sua Torre de Cristal, em frente à Praça do Marco Zero, no Recife, sua oficina na Várzea, marcam a cidade e aglutinam elogios e críticas. Mas afinal: quem é este octagenário tão cheio de monstros e com o poder divino de salvar o pó trazendo-o à vida? Descendente de ingleses, ele cheira a gênio e vive recluso há 40 anos. Renega a ligação com o Armorial e diz que Ariano tem algo dele. Tem como ex-esposa uma poeta, Deborah e em 2012, ganhou mais um documentário, desta vez feito por uma sobrinha-neta. Há algo de Gaudí na sua obra, de Gaugin, de Picasso, mas é algo próprio é o Recife latejando todas as épocas e etnias. No seu ateliê, instalado nas terras do antigo Engenho (depois Cerâmica) São João, estão expostas muitas de suas obras, parte delas dispostas a céu aberto, em um grande jardim central. Nasceu em 11 de junho de 1927,  em Recife, e em 1971, começou a reconstruir a São João da Várzea, fundada pelo seu pai em 1917, encontrada em ruínas, transformando-a num colossal projeto de esculturas cerâmicas que deveriam povoar os espaços internos e externos do ambiente; um trabalho intenso, interminável, obsessivo, um complexo escultórico, cosmogônico, visionário; eis um esboço da arte brennandiana. “Recordo-me de ter encontrado a velha cerâmica São João em ruínas. Inclusive, cabe salientar que não havia necessidade de um anteprojeto, pois as antigas paredes já indicavam aquilo que devia ser refeito: as ruínas balizavam tudo. Portanto, toda e qualquer idéia chegava à medida do trabalho em progressão. Talvez, por isso, eu providenciei chamar o lugar de “oficina”, baseado na origem da palavra ofício (officium, em latim) que quer dizer “trabalho”; local de trabalho, evitando o francesismo atelier. Ao mesmo tempo, há a idéia de uma comunidade, à maneira das coletividades de ofício medievais e renascentistas, onde o mestre e os discípulos trabalhavam em conjunto, a serviço de um só desígnio”, diz ele. 





Moisés Neto & Francisco Brennand


Um incompreendido a serviço de Eros e Tânatos? Um senhor feudal que se mistura com o povo? Um mistério? Há algo de podre no Reino da Várzea. Seu primo Ricardo, exímio milionário colecionador construiu um castelo próximo à sua oficina: mesmo clã? Adoro os dois espaços, onde já dei aulas bem satisfatórias. Um dos males do Recife é falar mal e destruir iniciativas magníficas como expor obras artísticas deste porte. O que acontece no molhe do porto do Recife é algo fantástico, deveria haver mais e mais e nunca menos! Ovos e aves são recorrentes no trabalho de Francisco e têm acompanhado todo o percurso de sua obra cerâmica. O ovo cósmico, risos e siso à parte, o começo da vida, emblema da imortalidade. As figuras totêmicas, os abutres, como guardiães, senhores do “templo”, desafiando com seus enigmas, lembrando que a linguagem é um bem cheio de dubiedade. Seria ele um escultor? Um modelador? E sua oficina: um arremedo de catedral gótica? E seu Oxossi, de arco e flecha, forma tensa e viril, que quer? “Confesso minha ignorância em relação a qualquer religião a não ser a católica”, afirma o senhor da Várzea, intuindo o mistério e coincidindo-o com o eixo do mundo, do universo. Um Oxossi, deus inquieto nas matas do Recife a procura do que jamais encontrará ou já encontrou e a prepara? Nessa caça, em busca da verdade, da beleza, do Absoluto; um xamã, um artista oci­dental na cidade-abis­mo aonde vai resvalando sem saber o que encontrará no fundo. Arrecife de ardores. Notáveis são também suas pinturas, onde ele é mais... naturalista, digamos assim. Mas até ali surge o Recife de terra, sangue, feitiço, cidade rio abaixo. Brennand: Pernambuco reproduzido na vã (?) tentativa de catálise, de eternidade, sexualizado, antropocósmico, de um lirismo ameno, na expressão de hor­ror e dor a encher de calmo júbi­lo o espírito, acreditando na sobrevivência da arte, na condição humana, num futuro com coração antigo. Um artista só, no coração de Pernambuco, forjando serres que nos entretêm e fazem pensar.



Mistérios do Allen

Bela e talentosa Cate, vale um prêmio, sempre

Preparando-me para ir ao cinema assistir ao novo Allen. Depois de muitos filmes feitos na Europa, Woody ambienta seu novo roteiro nos Estados Unidos, Blue Jasmine; trata-se, segundo alguns críticos, de algo que lembra a peça Um Bonde Chamado Desejo. Do norte-americano Tennessee Williams, mas há controvérsia. A película traz uma história que se passa em San Francisco, para onde, de Nova York, vem a grã-fina Jasmine (Cate Blanchett) para “visitar” sua irmã pobre, Ginger (Sally Hawkins),as duas são filhas adotivas, isto é não irmãs de sangue. A primeira foi esposa de um milionário trambiqueiro, que, arruinado, se suicida, ela chega de mala e cuia na casa da segunda;  Jasmine aproxima-se de Blanche Dubois, mas parece que Woody navega em outros mares, instalado o confronto passado-presente, resta-nos, enquanto espectadores observar como o mestre do cinema vai jogar com suas concepções de vida, ser e estar num mundo que para ele ainda está arraigado a um estilo do século XX. Atrás do óbvio Allen ainda tem certo mistério, um charme só seu, que pulsa com amor e humor discreto; aí está um novo drama.



quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Antunes Filho: Toda Nudez será castigada!

Nudez: para além de Eros e de Tânatos
                      por Moisés Neto*[i]

Que fazemos nós desde que nascemos, senão teatro, autêntico, válido, incoercível teatro?
A ficção para ser purificadora tem que ser atroz. O personagem é vil para que não sejamos...             
                                                   Nelson Rodrigues

Herculano, Patrício, Serginho, as tias, o libidinoso ladrão boliviano... todos estão de volta. Escutamos a voz de Geni: Aqui quem te fala é uma morta... e tudo recomeça; são eles que voltam, somos nós mesmos a ouvir Nelson Rodrigues (cem anos sem solidão: o autor está vivo!) com regência de Antunes Filho, que retorna ao texto por ele trabalhado em 1981. Lares e lupanares acendem-se intensamente qual origami se desdobrando, qual flor da obsessão desabrochando em plena noite paulistana.
Em Nelson, é a partir da tragicidade e do mergulho no inconsciente (onde estariam os rejeitos do consciente) que o desespero, o êxtase, o retorno do recalcado fazem a negociação intensa entre real, simbólico e imaginário (ou o poético). A linguagem é usada para livrar os personagens do sentimento de culpa. O inconsciente coletivo seria a camada mais profunda da psique: um material herdado da humanidade, nele todos os humanos são iguais. Nelson busca essa raiz comum, dentre outras coisas e o faz de maneira um tanto quanto cínica e exagerada na expressão. Está atento ao perigo do homem se ligar ao papel (persona) e se esquecer de si. Mas o registro aqui vai além dos clichês freudo-marxistas e os põe em xeque. O choque de ricos / granfinos com pobres é também transgressão. Há que se estilhaçar esse painel rodriguiano e reorganizá-lo acentuando o que há de comédia, não de cômico, em Nelson, afastando-se do naturalismo, mas partindo da constituição realista. Para Antunes montar Nelson Rodrigues é algo similar a um desafio cósmico: desdobrar a totalidade da existência, observar o todo desdobrado em si e sua relação com a “realidade”. Ele talvez queira oferece-nos mais uma vez sua catalisação num espetáculo onde cada parte, no contexto do todo, se coloca em superposição. Isto é, cada acontecimento cruza o outro, em simultaneidade (tão presente na vida), em ritmo frenético. Fazer nossos sentidos ficarem ligados em várias coisas, simultaneamente. Fazer o tempo comprimir-se ao ponto de explodir.
No barroquismo do texto o sentido dialético é levado ao extremo e a verdade dramática, as formas estéticas, tempo, espaço e ação não se dobram a disposição de análises sociológicas ou psicológicas, o castigo pela nudez é também imagem caleidoscópica sempre aberta a um novo giro, novo desenho, oferecendo múltipla percepção e estabelecendo insólitas relações. “Quando com dificuldade não conseguimos entender ou ver claramente um acontecimento, seja em lugar público ou num espetáculo teatral, a nossa imaginação vem sempre nos socorrer preenchendo os vazios”, sentencia Antunes Filho. Desde sua última versão para A Falecida, ele vem aprimorando seu método com vieses bem peculiares, como sempre. Propondo cenas articuladas de tal modo, que gestos e olhares, efeitos plásticos e sonoros, tudo calcado, neste caso, no sugestivo texto rodriguiano, incitando a percepção aguda, que não quer se alienar e que se mantém longe do convencional, em linguagem própria e dinâmica onde o ator é um servidor do poeta, sendo ele mesmo um poeta, um criador. É bom não esquecer que Nelson é também essa expressão brasileira, não através de filtros intelectuais ou conceitos generalizantes, mas de um farto material humano que é oferecido para a criação do ator.





Moisés Neto e Antunes Filho




E você? Nunca pisou num rendez-vous? É um habitué? Conhece o método do nosso regisseur?  Leu os registros anteriores? Sabe onde está se metendo? Tem conhecimento de causa? Acredita em anjo pornográfico? Antunes desenha, pinta, arquiteta meticulosamente: nem santa nem dominatrix, Geni é claro enigma do bordel à sala da família: noiva, esposa, morta rediviva, muito além de Eros e Tânatos. Da cornucópia verbal do autor estão intactos o sarcasmo e o humor nas montagens de Antunes. Nelson escrevia escutando ópera, seu método abarca tudo, suas dezessete peças ecoam tragédias para rir, são textos escandalosamente líricos e Antunes extrai de maneira primorosa o implacável senso crítico do autor na sua crítica ao cretino fundamental, aos imbecis que o arruinavam. Há dentro da mente oceânica de Nelson, um Pierrô de antigos carnavais cheio de fúria, frustração, insatisfação ao constatar sempre que todos nós somos cruéis e ferimos, que o brasileiro é um cafajeste em seu complexo de vira-lata, no seu empate pior do que a derrota.  Os personagens de Toda Nudez... detonam frases como “o ser humano é louco” (o maquiavélico Patrício), “eu mesma não me entendo”, “vou me entregar a qualquer um, na primeira esquina”, “beije meus sapatos, como eu beijei os teus”, “não quero nada senão um prato de comida e um canto para dormir” (a suicida Geni), “pederasta, eu matava”, “o menino serviu de mulher [...] o guarda viu, mas não fez nada” (a tia solteirona), “o sujeito mais degradado tem a salvação dentro de si, lá dentro” (o médico). Em seu folhetinesco mundanismo vermelho-sangue dito reacionário Nelson explora os limites da virtude e do maniqueísmo em ritmo frenético, compulsivo, desconstruindo o senso comum. O câncer no seio que matou a falecida esposa de Herculano é o mesmo da praga rogada pela mãe de Geni à filha.
Para salvar a plateia, Rodrigues encheu o palco com seus “monstros”, quis forçar ao seu público um “pavoroso fluxo de consciência”. Suas frases curtas, o jeito malcriado de escrever, seu conhecimento das condições do gênero teatral. O bom teatro sacode o público, não teme o grotesco e questiona conceitos, afinal o homem só se salva se reconhecer sua própria hediondez, não é? O teatro é também uma espécie de expurgo, acerto de contas do ser humano com sua história, com todos os homens, com a vida e Nelson o faz de modo cético, sombrio e até... romântico.  Sábato Magaldi enquadrou Toda nudez... como uma tragédia carioca, mas o que temos aqui, com essa montagem do CPT, é a voz de todos os homens e mulheres de todos os tempos e lugares.
Pausa.
Grito.
Rompe-se o limite entre lua de mel e separação final dos amantes.
Como anda sua nudez? Você pensa que sabe de tudo? Você não sabe de nada!


[i][i]Moisés Neto é Mestre e Doutor em Letras pela UFPE, dramaturgo recifense.








Tempestade de ideias para estudos posteriores

Rascunhos para estudos posteriores:


Desconstruir uma oposição é mostrar que ela não é natural e nem inevitável, mas uma construção, produzida por discursos que se apoiam nela, e mostrar que ela é uma construção num trabalho de desconstrução que busca desmantelá-la e reinscrevê-la - isto é, não destruí-la, mas dar-lhe uma estrutura e funcionamento diferentes; há, tanto no texto da História da Filosofia quanto no texto dito literário,  unidades de simulacro, ‘falsas’ propriedades verbais, nominais ou semântica, que não se deixam mais compreender na oposição filosófica (binária) e que, entretanto, habitam-na, mas, sem nunca constituir um terceiro termo, sem nunca dar lugar a uma solução na forma dialética especulativa. Se pensarmos na desconstrução inserida no espaço da Literatura, veremos que ela foi e continua sendo, em alguns casos, confundida com o Pós-Estruturalismo, ou, pelo menos, inserida no âmbito dessa corrente teórica literária. É, por exemplo, o que faz Terry Eaglaton, em Teoria da Literatura: uma introdução, quando, no capítulo dedicado ao Pós-Estruturalismo, proporcionará, ao mesmo, uma discussão mais ampla acerca da Desconstrução, além de abordar a difusão dela em solo anglo-americano. Mas, devemos fazer uma observação aqui e registrar que, apesar do prefixo "pós" de "pós-estruturalismo", este aconteceu ao mesmo tempo em que o estruturalismo e foi, na verdade, uma forma de questionar algumas ideias estruturalistas que ainda apresentavam lacunas, ou seja, "o pós-estruturalismo, portanto, não veio cronologicamente depois do estruturalismo, mas no mesmo momento em que este triunfava, na França e alhures. Em plena euforia estruturalista, Derrida anunciava seu fim" (Leila PERRONE-MOISÉS). Diante disso, o que o teórico francês proporá é que se ameace "metodologicamente a estrutura para melhor percebê-la", com isso, vemos, sobretudo em A escritura e a diferença, toda uma série de textos nos quais Derrida se volta para a questão da estrutura, circunscrita aos mais diferentes campos. Tal atitude será empregada com o propósito de se rediscutir e redimensionar a noção de estrutura sobre a qual se erigiam todos os estudos estruturalistas, de Saussure, Lacan, Lévi-Strauss, entre outros. A lucidez teórica derridiana o levará a afirmar, em plena efervescência estruturalista, "como vivemos da fecundidade estruturalista, é demasiado cedo para chicotear nosso sonho" . Mas, apesar disso, Derrida o faz. O centro não era um lugar fixo mas uma função, uma espécie de não-lugar no qual se faziam indefinidamente substituições de signos. Foi então o momento em que a linguagem invadiu o campo problemático universal; foi então o momento em que, na ausência de centro ou de origem, tudo se torna discurso - com a condição de nos entendermos sobre essa palavra - isto é, sistema no qual o significado central, originário ou transcendental, nunca está absolutamente presente fora de um sistema de diferenças. Com isso, Derrida acaba abalando a dominação do centro, concedendo às margens um lugar de destaque. Na verdade, podemos observar, tendo a atenção voltada para o fragmento acima, que Derrida chama de "diferenças" as "margens". No plano da Literatura, começam a emergir essas "diferenças" ou essas "margens", sejam elas as formas não canônicas da Literatura ou as expressões particulares de literaturas antes marginalizadas por situação geográfica ou por opressão ideológica. Dentro dessa ideia de abalo do centro em detrimento das "diferenças", podemos pensar, por exemplo, que a Desconstrução abriu espaço para que se realizassem os estudos de literatura emergentes ou de grupos minoritários, algo que contribuiu, ainda, para o grande êxito dos Estudos Culturais. Isso significou uma abertura revolucionária nos estudos literários, como ideologia democrática e não preconceituosa. Vemos, então, que a Desconstrução proporcionou significativos abalos no interior das Ciências Humanas e, por conseguinte, no interior dos discursos sobre a Literatura, ao promover a decomposição e reconfiguração desses mesmos discursos, de dentro e de fora, detonando, assim, a tranquilidade dos discursos. Logo, podemos aprender com Derrida, a "re-colocar, a cada vez, tudo em jogo, de acabar para recomeçar, de acabar por recomeçar. Não no sentido de esquecer o já sabido, de reinventar o mesmo, mas de se colocar a tarefa de redefinir as tonalidades do acontecimento". E essa atitude nós podemos assumir diante da fenomenologia, da psicanálise, da filosofia, dos estudos culturais, da teoria literária e, inclusive, diante da Desconstrução.




Gilberto Freyre, óleo sem título

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

O outro lado da meia-noite: O teatro de Jeison Walace & Celibi, com Flávio Luiz e os atores sem auxílio da lei de incentivo

O teatro recifense sob preconceito
Mãezona
parte I
por Moisés neto

                   Em Mãezona, a comédia, temos Jeison Wallace (programa Clube da Cinderela, diariamente na TV CLube/Record), conhecido por interpretar o personagem Cinderela, como diretor numa peça que faz uma homenagem peculiar às figuras maternas. O figurino e adereços são de Roberto Costa, cenografia e projeto gráfico de Célio Pontes.No elenco Flávio Luiz, André Lins, Diógenes de Lima, Múcio Ricardo, Vanessa Porto e Peterson Eloy, produção é de Gugga Macel e Oxe Mainha Produções. 
Henrique Celibi (autor), Jeison e Diógenes de Lima (colaboradores) escreveram o texto MãeZona. O espetáculo reúne três histórias distintas (Ser mãe é padecer no paraíso, O filho da P... e Dormindo com o gorila), abordando o comportamento das mães.  Flávio interpreta as mães, ele teve como últimos trabalhos as peças Cleópatra e As criadas malcriadas.      
Há uma interessante relação intersemiótica com o vídeo neste espetáculo. Jeison, que há muito tempo trabalha na TV, traz imagens desta mídia e as incorpora neste seu novo trabalho. Imagina-se que tipo de críticas Barreto Júnior recebia ou, se formos pensar assim, todo o teatro de revista, com seus artistas apontados como tipos "alienados". Mas o que vemos em "Mãezona" é uma equipe de trabalhadores conscientes do seu ofício e dispostos a levar adiante um projeto de vida.

Artistas pernambucanos: Flávio Luiz, André Lins, Diógenes de Lima, Múcio Ricardo e Vanessa Porto

Na primeira das peças,Ser mãe é padecer no paraíso, Dona Edileuza é uma mãe tradicional do subúrbio. Ela acredita que os filhos dela são perfeitos e os da vizinha não prestam. Na segunda, O filho da p... - Uma mãe vira prostituta para poder criar os filhos. Karla Kelly tenta sair da vida, mas não consegue e na terceira, Dormindo com o Gorila, temos a história da cientista Zilda Isolda. Desiludida com os homens, ela alimenta a tese de que pode engravidar com um macaco. Como tem o sonho de ser mãe, Zilda tenta colocar a teoria em prática. 
Há quem critique a falta de "essência" ou veja neste tipo de espetáculo um tipo de imediatismo. revisando as mesmas piadas e estereótipos (de gays, domésticas e tipos populares) ou busque o "verdadeiro teatro pernambucano", de textos inteligentes, artistas preparados "de currículo”, como postou  um internauta. Um dia haverá um julgamento menos agressivo para este tipo de cena? São os pioneiros depois do teatro de revista e do Vivencial, em Recife. Traduzem poesia simples ao retratar tipos marginalizados, sem cacos, desta vez, artistas dispostos a produzir sem o auxílio das  Leis de Incentivo à Cultura que seguram hoje em dia praticamente toda a produção teatral em Recife, no Brasil, ditando rumos do mercado de trabalho. Arriscando a vida num teatro que está em crise e só enxerga o apedrejamento, ainda, das madalenas da meia-noite de verão. Sonhos de palco e plateia, eis Mãezona. Há muitos tipos de espetáculos em Recife, com diretores e grupos variados, Cadengue, Magiluth, Fiandeiros etc., mas o outro lado da meia-noite é de Jeison, Flávio e esse pessoal aí, Celibi... irmãos na fé de uma voz que não se cala, fui o primeiro da Academia a observar o fenômeno, a seguir veio Luiz Reis, virão outros, analisar como menos rancor o que fazem esses equilibristas das bilheterias... e o resto? Ainda é silêncio.


domingo, 10 de novembro de 2013

A Pedra do Reino!

O Romance d´A pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e- Volta : Todos os estilos  num só.

por Moisés Neto

A comédia da antiguidade, o teatro religioso, a arte popular do Nordeste e seus folguedos são as salutares influências deste mestre das letras que é o paraibano Ariano Suassuna, Ex-aluno do Colégio Americano Batista do Recife (dos 10 aos 15 anos, uma fase de sua vida que sempre recorda com saudade), professor de Filosofia, foi secretário de cultura do governo Arraes (e agora do governo Eduardo Campos) . É autor de três romances: "Fernando e Isaura" (sobre um amor impossível, inspirado na história de Tristão e Isolda) , "Romance d´A pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai- e- Volta" (Ed. José Olympio. RJ. 1970), exibe como herói um poeta que na década de 30 sonha em escrever um épico nordestino e acaba preso como comunista e "História d´O Rei Degolado nas Caatingas do Sertão: Ao sol da onça Caetana", suas lembranças de infância e do pai, mescladas num sertão mítico.

foto: Moisés Neto (autor das pintura: anônimo)

"Não faço distinção entre a cultura popular e a erudita. A cultura brasileira, a cultura popular brasileira, não está ameaçada . Ela é resistente. Estão tentando matá-la, mas não conseguirão" , diz Ariano e nos convida ao deleite com pérolas do cancioneiro ibérico, a arquitetura africana, as cores da África, textos de José de Alencar, de Aluízio Azevedo. E é no Romanceiro popular que Ariano mais se inspira. Nas novelas de cavalaria, nos amores incríveis, nos heróis picarescos (zombeteiros) que permeiam as histórias que o povo conhece. Ele chega a usar um mesmo texto várias vezes como base para sua recriação. "A novela da Renascença é picaresca. O personagem principal é a Fome".Emigra para o Brasil o herói pícaro ibérico, o astucioso que difere do opressor que é o lado ruim . Ao comentar o Brasil antes de Cabral, Ariano reafirma nossa cultura milenar : "Existia teatro indígena antes da chegada dos jesuítas . É absurdo centralizar a origem do teatro. O teatro japonês não nasceu na Grécia. Tem outra origem. O teatro indígena é um teatro de máscaras e excelentes figurinos e enredos fascinantes que envolvem sua religiosidade. Eu queria que um cineasta brasileiro fizesse com este tipo de teatro brasileiro o que o cineasta japonês Kurosawa fez com o antigo teatro japonês, o teatro Nô e com o Kabuki . Injustiça social não é base para a arte popular. Ela também não é primitiva. Os violeiros vêem televisão, os artistas populares transformam as informações universais em linguagem com temática local. Temos que fortalecer nossa cultura". Para isso, Ariano usa seus conhecimentos de Filosofia, História e Literatura, trabalhando o belo de forma dialética, unindo-o ao cômico misturando o espírito intelectual com a esperança no homem, fundindo nossa herança barroca com um espírito neoclássico.

 Análise do "Romance d´A Pedra do Reino" (1970) : Ariano recheia seu livro "Romance d´ A Pedra do Reino" com humor malicioso e exibe sua perícia na selva das palavras. Mistura nobres e pobres num processo criativo ímpar. Os colonizadores do Brasil aparecem como bravos que tiveram coragem de matar para estabelecer novos rumos. Ariano traz para a narrativa suas experiências com o teatro e a poesia, brinca com a metalinguagem, expõe os "mistérios" da criação. O tema central do romance são as artimanhas de Quaderna e a trágica história dos seus antepassados na cidade de São José do Belmonte, interior de Pernambuco. Ariano, através da narração em primeira pessoa (Quaderna), descreve paisagens e situações alucinantes, reinventa a cronologia, adapta fatos históricos à sua ficção ( a magia das grandes navegações, as cruzadas, os romances de cavalaria, as revoluções. Se Alencar foi exuberante mas não ousou exibir um herói picaresco, Ariano, com seu Regionalismo natural, busca as interseções entre o popular e o erudito, misturando a poética aristotélica com Romantismo e buscando o êxtase criativo num realismo que alguns intelectuais rotulam de mágico, fantástico. O encatatório, o mítico, o exótico vão delineando o espaço criativo que traça o painel do sonho de uma monarquia de esquerda , sonho que Ariano alimentou durante algum tempo. Obcecado em criar uma epopéia nordestina, o narrador torna- se cômico e o recurso Deus ex machina (sobrenatural) surge para resolver as inquietações da alma que perturbam a raça humana. Outro mito recorrente é o sebastianismo.

Podemos até arriscar em julgar o discurso de Ariano como um discurso maniqueísta que recusa a polifonia. Mestre na arte literária, ele criou um herói bufão numa espécie de circo fantasioso e hedonista em busca de um sentido , de dignidade, num emaranhado de "causos" alinhados por uma escrita competente que se utiliza do pictórico (xilogravuras) para reforçar seu discurso que, no fundo, transforma o interior de Pernambuco numa espécie de Camelot da caatinga, onde humor e malícia unem-se ao ingênuo, à lenda do cavaleiro que enfrenta as instituições (representadas no texto pelo Corregedor) e o imaginário supera o racional na reinvenção do passado histórico, através da alquimia verbal típica de Suassuna que rompe a linearidade, enxertando a todo instante várias tramas secundárias à narrativa central, numa colagem que redimensiona a obra em pequenos contos. O julgamento de Quaderna é a espinha dorsal do texto que vai buscar nos poetas populares (cordel e emboladores) suas referências. Depois de trair seus amigos covardes, Quaderna busca a imortalidade através da Literatura , quer ser fidalgo. Quer louvar sua estirpe. Tenta reiventar Homero , a sua Odisséia é através do Atlântico nordestino e sua Ilíada tem como palco o sertão, ali está a Onça Caetana (a morte, a vida , o amor, a nacionalidade). Seres fantásticos pululam ao lado de personagens estilizados numa narrativa explosiva recheada de situações absurdas.