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domingo, 10 de abril de 2016

50 ANOS DE CHICO SCIENCE: Estamos tirando o pé da lama?


por Moisés Monteiro de Melo Neto
(Jornal RIBALTA, SATED PE)



 detalhe de quadro de Isac Vieira para ilustrar capa de livro de moisesmonteirodemeloneto sobre chico science


Dia 13 de março de 2016, 50 anos de nascimento de Chico Science. Já? Chico e seu grupo souberam catalisar o pensamento da minha geração? O Movimento Mangue traçou rumos que abalariam os alicerces das concepções artísticas no Brasil no início dos anos 90. Hoje é só lembrança, mas o termo Manguebeat tatuou-se na história cultural do país (ou não?). Science e Fred Zeroquatro (Mundo Livre), ligados na produção underground internacional, arquitetaram (quase inusitadamente?) inovações na Kultura (Freud explicaria?) brasileira. Questionou-se e desmentiu-se se o beat viria da geração beatnik, ou simplesmente de “batida”/ ritmo. Dentre outras experiências, a Nação Zumbi misturava hip hop ao Maracatu, para horror de alguns puristas locais. O momento-chave chegou para a Geração Mangue quando, em 1993 (ah, passado distante tão próximo!), Science (CSNZ) assinou com a Sony Music e sedimentou o seu sucesso (foi até trilha de novela da Globo, não que eles gostassem disso). O movimento, que havia lançado seu 1º manifesto-release em 1991, ganha forte expressão na mídia nacional e internacional. Sairíamos enfim do celeiro cultural? O lançamento dos CDs Da Lama ao Caos e Afrociberdelia colocava o Recife como epicentro de uma nova vanguarda que se estabelecia. A crítica social misturava-se ao prazer e à recriação da cidade metamorfoseada na pop Manguetown dos homens caranguejos (uma espécie de HQ criada por Dolores e Morales falava de uma cerveja com água do mangue que provocava metamorfoses, coisa de fazer Ionesco e Kafka remexerem na tumba; mesclando-se em cambalacho com resquícios de Josué de Castro e João Cabral que ressoavam na psicográfica voz poética de Science?), nela passeavam (em músicas afrociberdélicas, claro) Lampião, Biu do Olho Verde, Galeguinho do Coque e até a Perna Cabeluda (risos e sisos imprecisos!). Era o início dos anos 90! Pululavam CDs, plano Real se aproximava, disquetes, Internet, as ianques MTV (oGrunge explodia como movimento em Seattle e a tendência “pegou” por aqui) e McDonald’s se estaberleciam em plena lama urbana; tudo isso azucrinava a capital de Pernambuco (tal e qual, nada igual!), enquanto o novo milênio se aproximava. Além de Fred & Chico, outros entravam para o hall da fama: Renato Lins, Mabuse, Helder Aragão (o DJ Dolores, também envolvido com produção de trilha e programação visual para o teatro recifense nos anos 90: a peça Para um amor no Recife, é exemplo disso), Hilton Lacerda (cineasta) e Jorge du Peixe, dentre outros.  Locais como a Soparia do Pina, onde vimos Science pela primeira vez, eu e Ivonete Melo, tornavam-se epicentro de algo que até agora não foi superado enquanto movimento cultural (será?), mas poderia até ser posto em xeque: o modo como o Brasil abriu as portas para a cultura urbana recifense e como esta se modificou a partir de então. No cinema surgiam filmes como Amarelo Manga e Baile Perfumado, em plena ruptura com a, digamos assim, estética anterior, na criação de um novo (?) modo de ver as coisas, desnudando-as (não esquecer que desde os anos 20, com Jota Soares e outros, a cidade foi referência na área) e aqui devemos lembrar o famigerado Manifesto Regionalista (1926, saído da cozinha freyriana em frenesi de sabor e saber). Ver a Mauriceia por estes novos ângulos “mangueníficos” (com a licença de tão terrível trocadilho) abriu a cabeça de muita gente boa que está aí agora. Aqueles artistas negociaram numa dialética bem particular, nova, diferente com o gigante deitado eternamente em berço esplêndido, na terra dos altos coqueiros. Também nas artes plásticas, dança, moda, essa geração mostrou suas armas. Esse Movimento expressou não só a mundividência de Chico, mas a de tantos outros artistas. Porém ele foi o porta-voz inicial; portanto, saudação ao Mestre Chico Science no seu cinquentenário: Muitos anos de vida! Entretanto há a pergunta que não quer calar: viveremos das glórias do passado até quando? Como anda o pensamento brasileiro? A estagnação que sobreveio ao pós-moderno nos jogou a todos no marasmo do óbvio ululante, mesmo?


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