Pesquisar este blog

sexta-feira, 31 de maio de 2019

UM MINUTO PARA DIZER QUE TE AMO


Um minuto para repetir... TE AMO

                                    por Moisés Monteiro de  Melo Neto*


parte da equipe da peça UM MINUTO PARA DIZER QUE TE AMO


        A peça UM MINUTO PARA DIZER QUE TE AMO vem acumulando prêmios desde a sua estreia com boa aceitação de público e crítica, são quase dois anos de sucesso. Fiz o dramaturgismo, a partir do texto de Navarro, a convite do grupo Matraca. Fico feliz pelo êxito de tantas temporadas, viagens etc. Há que se destacar aqui o trabalho do diretor Rudimar Constâncio e de Carlos Lira.  
Sempre amorodiei o Recife, sua toda repressão, liberdade e libertinagem contida neste lugar e sempre quis expressar a minha opinião sobre o que é viver aqui, como escritor, professor universitário, brincante, amante, intelectual etc. Quem, hoje em dia, quiser combater a mentira e a ignorância e escrever a verdade tem de vencer, pelo menos, cinco obstáculos. Tem de ter coragem  de escrever a verdade, muito embora, por toda parte, esta seja reprimida; tem de ter a argúcia de  reconhecê-la, muito embora, por toda a parte, ela seja encoberta; tem de ter a arte de a tornar manejável como uma arma; tem de ter capacidade de ajuizar, para selecionar aqueles em cuja, mãos ela será eficaz; tem de ter o engenho  de a difundir entre estes. Não podemos ficar sentados esperando a crise passar. O texto de Navarro e a direção de Rudimar, o elenco e técnica de UM MINUTO PARA DIZER QUE TE AMO trazem à luz algo que as brumas da memória tentam ocultar, desconstruir: a Doença de Alzheimer, incurável e progressiva, prima da demência, inimiga da memória, discutida desde 1906. Teatro como tribuna da linguagem amorosa que apresenta esse entrelugar onde eu, supereu e ID se confundem de volta ao pó cósmico, na intenção de um cântico poético que reflete 36 milhões de pessoas vítimas deste mal silencioso e fantasmagórico, o Alzheimer. No Brasil, são quase 2 milhões de casos registrados.
O texto de teatro não é puro, ele se mistura com a vulgaridade do mundo. Ela é instrumento polifônico de poder que permite aos excluídos a indignação pela exclusão; sem ciência da dramaturgia, o resto é desespero, a ordem em meio à lama e ao caos. A peça a peça de teatro é mais plausível que a vida e um palco é um bom lugar para reflexão. Somos seres de linguagem. A delicada direção de Rudimar, o cenário de Sephora, a música de Samuel, tudo isso nos remete a algo pré-verbal que podemos comparar com algo dentro e fora dos nossos corações e mentes: grunhidos, suspiros, gritos, sussurros, palavras, gestos etc.  Muitas coisas podem ser feitas, além da tristeza e do desespero. Devemos tentar entender a vida não apenas pelo conhecimento dividido das épocas passadas, o que foi, mas sim pelo que já não somos ou pelo que poderemos ser. UM MINUTO PRA DIZER QUE TE AMO interroga o espaço que nos cerca e suas cruéis intermitências. Textos teatrais são como embarcações: espaços flutuantes lançados na imensidão das águas são reflexos, como este agora o é, dos outros textos que lemos, ouvimos e sentimos no mundo. José Manoel Sobrinho uma vez me disse: “considero a literatura hoje uma das linguagens mais instigantes”. Sim, e a dramaturgia é o espaço do possível de ruptura com a noção primitiva do tempo. A linguagem da dramaturgia supera o tempo (embora uma peça aconteça dentro dele): realizando, e desrealizando, busca nas palavras a presença dos seres; é literatura como sendo um “outro” lugar, um acesso a um mundo onde se pode enxergar o que não se deveria ver: uma experiência extrema do pensamento. O buraco da fechadura nelsonrodriguiano. O dramaturgo reinventa as palavras, desliza entre os sentidos, penetra espaços, habita neles, sem se fixar num lugar, sem estar em terra firme, o texto no palco segue rumo ao horizonte da compreensão, do espectador ser enquanto ser múltiplo, plural, mutante, em comunhão com a cena.
*Moisés Monteiro de Melo Neto (professor universitário, pesquisador, escritor, Doutor em Letras pela UFPE)

terça-feira, 14 de maio de 2019

Elegia do desassombro indeciso (por moisesneto)



Eu queria, meu antigo amor, te incensar
fazendo-te certa elegia
lembrar-te assim num cantar
que dissipasse esse melancólico rancor
porque me deixaste e fiquei sem alegria
queria a melhor literatura
de poeta que, fingindo se lamentar, não se tortura
fazer da lamentação um brinde porque partiste
clamor à tua morte que já não foi grande perda
mas tua lembrança quase não persiste, é lerda
pois levaste contigo o teu desamor por mim
e tu eras a razão de algo cruel e chinfrim
pobre Moisés, aqui ficou, a diluir o fel que em vão lançaste,
a passar o tempo pensando noutras bobagens
que não em articulada fúnebre homenagem
agora, que és pessoa falecida,
cicatrizada ficaria nos versos a tal ferida
ah, pensar sempre em ti, em vão
sem saber se faço o danado do poema
ou exorcize tua assombração!



sexta-feira, 10 de maio de 2019

Eliana Alves Cruz e Cristiane Sobral: um encontro acadêmico muito bom

Robson Silva, Luciano, Eliana Alves Cruz, Padilha, Moisés Monteiro de Melo Neto e Cristiane Sobral


Gosto muito de Cristiane Sobral, estive com esta figuraça, ontem, na Universidade, ela, dentre tantas outras coisas, é ganhadora em 2017,do Prêmio FAC-Secult-DF de Culturas Afro-Brasileiras. Imortal cadeira 34 (Academia de Letras do Brasil). Mestre em Artes (UnB), Especialista em Docência Superior pela Universidade Gama Filho, RJ. Licenciada em Educação Artística; Bacharel em Interpretação Teatral (Universidade de Brasília), Cristiane Sobral: atriz, escritora, dramaturga, atriz e poeta brasileira , mudou-se para Brasília, onde montou a peça Acorda Brasil. Foi a primeira atriz negra graduada em Interpretação Teatral pela Universidade de Brasília. Atuou no curta-metragem A dança da Espera, de André Luís Nascimento, e em diversos espetáculos teatrais, estreou na literatura em 2000, publicando textos nos Cadernos Negros. Foi crítica teatral da revista Tablado, de Brasília. Mestre em Artes (UnB) com pesquisa sobre as estéticas nos teatros negros brasileiros. Membro da Academia de Letras do Brasil seção DF onde ocupa a cadeira 34 e do Sindicato dos Escritores do DF.

 Eliana Alves Cruz que como escritora, vem se destacando na ficção, inicialmente com o romance Água de barrela, fruto de cinco anos de pesquisa sobre a história de sua família desde os tempos da escravidão. Em 2015, o livro foi contemplado em primeiro lugar no Prêmio Oliveira Silveira, concurso promovido pela Fundação Cultural Palmares, que o publicou no ano seguinte. E uma nova edição já se encontra disponível pela Malê Editora. Para a antropóloga Ana Maria da Costa Souza. A profundidade dos personagens e a verossimilhança das situações por eles vividas são os pontos chave deste romance baseado em 3 séculos de história real de uma família negra no Brasil. Não há como não ser tocado por emoções intensas diante de muitos momentos do texto. A força da narrativa reside, precisamente, na riqueza de detalhes que conferem densidade e vigor à história.
Em 2016, integrou a edição 39 da série Cadernos Negros, com poemas de sua autoria. E, no ano seguinte, contribuiu com dois contos para a 40ª edição dos Cadernos, entre eles a narrativa de ficção científica intitulada “Oitenta e oito”. Neste mesmo ano, participou também da premiada antologia Novos poetas.
Empenhada no resgate da memória social e cultural afro-brasileira, seu mais novo romance – O crime do cais do Valongo – figura como romance histórico e policial, com uma instigante narrativa que se inicia em Moçambique e chega até o Rio de Janeiro. A influência que a autora teve para escrever sobre o Valongo, foi a descoberta dos objetos encontrados em escavações recentes. Entre o período de 1811 a 1831 muitos escravos chegaram ao Brasil por esse cais, todos os artefatos despertaram a criatividade da autora, possibilitando assim o começo da escrita do seu livro, que é feito de inúmeras memorias dos ancestrais que foram escravizados e mortos no cais, - diz autora em entrevista a Médium Books(https://medium.com/blooks/entrevista-com-eliana-alves-cruz-).





Três poemas de Cristiane Sobral

Meu corpo nunca estará em liquidação

Retina Negra

Sou preta fujona
Recuso diariamente o espelho
Que tenta me massacrar por dentro
Que tenta me iludir com mentiras brancas
Que tenta me descolorir com os seus feixes de luz
Sou preta fujona
Preparada para enfrentar o sistema
Empino o black sem problema
Invado a cena
Sou preta fujona
Defendo um escurecimento necessário
Tiro qualquer racista do armário
Enfio o pé na porta e entro

Black Friday

Alguns homens sonham com meu corpo
Entre os seus lençóis
Eles desejam desesperadamente
Consumir meu sexo
Mas não suportariam meu banzo
Meu clamor
Não aguentariam vestir a minha pele negra
Nem por um segundo
Eles poderiam tomar posse de tudo que sou
E até germinar ali os seus filhos
Mas sairiam sem olhar pra trás
Esses homens devorariam o meu corpo
Com ardor
Como lobos sugariam o meu interior
Até secar meu ventre…
Impunes, voltariam para os seus lares brancos
Sem o meu menor pudor
Tenho medo desses homens
Que rezam para o criador
Que juram um falso amor
Eu tenho medo desses homens
Não aceito os seus sorrisos
Nem me iludo com as suas promessas
Não sou produto com desconto
Esqueçam as ofertas
Black Friday
Meu corpo nunca estará em liquidação!
Para vocês jamais venderei barato
O que sempre custará o dobro.

Tente me amar

Tente me amar
Enquanto a chuva não vem
Depois que o leite derramar
Ame como nunca amou ninguém
Tente me amar
Sem pensar em voltar
No balanço do trem
Esperando a hora certa
De fazer um neném
Tente me amar
Sem desculpas pra me deixar
De anel no dedo
Ame completamente sem medo
Tente me amar
Sem me confundir com ninguém
Enquanto seu lobo não vem
Tente me amar
E consiga.

Escritor, professor, pesquisador Moisés Neto e Cristiane Sobral, atriz, dramaturga, poeta, ativista


terça-feira, 7 de maio de 2019

RETORNO aos ATENTADOS POÉTICOS DE jmb, O TERRÍVEL E INSUPERÁVEL VELHINHO DO RECIFE Jomard Muniz de Britto



Como se ainda fosse necessário             
      atravessar limites do imaginário:        
                       do real sem nada dever a ninguém.   
                     Todas as dúvidas não se Apagam entre  
             abismos fenomenológicos e outros.               
     Sem temor ou temeridades. Sem tremor          
    nem teimosias acadêmicas pós-doutorais.  
  Impossível esquecer as poluições e até      
    politicagens do contemporâneo.            
               Da escada ao sem limites dos infernos      
cotidianos. Segredos não sagrados, pois          
quase tudo pode ser FI GU RA ÇÃO em        
   filmes castamente documentários.                 
    Tudo ainda pode ser e parecer inédito.          
     Por quem A I N D A? Pelas vozes das              
escritas e cantorias nos abismos                      
         de AMARO FREITAS e seu disco RASIF. 
Reconhecer nossa VOZ alimentando               
silênCIOS em quase todas pulsações.                   
Além dos temores e deveres escolares.           
Vivenciar nossas contraDICÇÕES sem     
repensar o VIVENCIAL DIVERSIONES.       
Alimentar silêncios impossíveis.                
  VIVENCIAR nossas diárias contradições:      
    sem medo de ser muito mais pelo GOZO!       
Gozar nunca foi pecado nem perdão...         
AMARO FREITAS no disco RASIF intenso.     
     Por ele seguimos sem temer nossas              
   outras convicções. Sem tremor das banais              
  e cruéis politicagens diárias.                                     
Tudo pode ser figuração e fome sedenta               
de outros horizontes que abrem e fecham             
banais convicções conformistas.                           
Amargor das impetuosas amorosidades.               
   Energia solar para todos.

Recife, maio e junho de 2019                        

domingo, 5 de maio de 2019

RASCUNHO/ ROTEIRO SOBRE PEÇA/ PERFORMANCE MODERNISMO 1ª FASE Exercício TEATRO COMO FERRAMENTA PEDAGÓGICA



Prof. Moisés Monteiro de Melo Neto



Slide de um quadro surrealista; jovens ao redor de uma mesa grande de centro (que eles a usarão para subir e fazer suas “performances”; há jarras com chá gelado, frutas, alguns doces, num carrinho de chá, ao lado; há um grande arranjo de flores , à esquerda; um som baixinho com um excelente jazz, que não interfira na compreensão do que os jovens que estão na sala dizem)

ALUNA 1: acho bom começarmos logo o ensaio; a galera que ainda não chegou que se vire depois... solidariedade tem limite e o meu já esgotou...
ALUNO 2: vou logo dizendo, sei que não sou a única: não decorei tudo, mesmo sabendo que a professora Fátima não vai dar sopa... e que  o negócio da apresentação no teatro é pra já; sugiro que quem quiser fique com o texto na mão; os que decoraram podem ficar sem...

ALUNO 1: concordo. Alguém discorda?

(ninguém levanta a mão)

ALUNO 1: então...observem bem o slide desta pintura! Os surrealistas admitem que a razão nos dá a ciência, mas defendem que só a “não-razão” pode dar-nos a arte. Apropriam-se da técnica de colagem dos dadaístas...

(exibição de slide com composição dadá e exibe novo quadro surrealista)

ALUNO 1:  Olhem bem!  Eles exibem objetos deslocados dos seus lugares, formados à maneira do sonho cujo resultado são misturados interessantes (ou insólitas, desconcertantes), trabalham com a idéia do INCONSCIENTE. Para os surrealistas, o importante é:
– a imaginação contra a lógica.
– o maravilhoso e o sobrenatural.
– a escrita automática (escrever ao fluxo do inconsciente):
“Quando sinto a impulsão lírica, escrevo sem pensar tudo o que meu inconsciente me grita.”, como avisa Mário de Andrade. Enquanto isso, no Brasil da década de 20 do século passado...

(Aluna 1 fica no centro de uma roda como se a sala fosse um acampamento de jovens e declama como se fosse um pajé explicando uma lenda à tribo)

ALUNA 1: “(...)  Macunaíma enxergou numa lapa bem no meio do rio uma cova cheia d’água. E a cova era que nem a marca dum pé gigante. Abicaram. O herói depois de muitos gritos por causa do frio da água entrou na cova e se lavou inteirinho. Mas a água era encantada porque aquele buraco na lapa era marca do pezão do Sumé, do tempo em que andava pregando o evangelho de Jesus pra indiada brasileira. Quando o herói saiu do banho estava branco louro e de olhos azuizinhos, água lavava o pretume dele.”

ALUNO 1: Macunaíma, o herói sem nenhum caráter, romance, ou melhor rapsódia, de Mário de Andrade)

ALUNO 2: Seria bom deixar claro quel o que é RAPSÓDIA... é como o filme sobre o QUEEN? Bohemian RhapsodY, SOBRE O Freddie Mercury e tal...
ALUNO 1: Rapsódia é uma composição livre que obedece características especiais ou clássicas, é uma justaposição, de escassa unidade formal de melodias populares e de temas conhecidos, extraídos com frequência de óperas ou uma peça próxima ao improviso, com fulcro em temas de inspiração folclórica (como podemos ainda ver na literatura, como em MACUNAÍMA, de Mário de Andrade, participante da Semana de 22.
ALUNA 2: eu posso acrescentar que as rapsódias caracterizam-se por terem apenas um movimento,  mas podendo integrar fortes variações de tema, intensidade,  sem necessidade de seguir uma estrutura pré-definida,  não há necessidade de repetir os temas, podem-se criar novos ao sabor da inspiração.

ALUNO 2: o surrealismo na poesia BRASILEIRA, AS HERANÇAS CUBOFUTURISTAS... os poemas de Oswald de Andrade mostram o mundo fragmentado do contemporâneo numa luta caótica em busca de sua realização: a síntese representada e expressa pelo poema.
ALUNA 1: vejam só esse poema de Oswald:
Chove chuva choverando
que a cidade de meu bem
está-se toda se lavando
Senhor
que eu não fique nunca
como esse velho inglês
aí ao lado
que dorme numa cadeira
à espera de visitas que não vêm
Chove chuva choverando
que o jardim de meu bem
está-se todo se enfeitando
A chuva cai
cai de bruços
A magnólia abre o pára-chuva
pára-sol da cidade
de Mário de Andrade
A chuva cai
escorre das goteiras do domingo
Chove chuva choverando
que a cidade de meu bem
está-se toda se molhando
Anoitece sobre os jardins
Jardim da Luz
Jardim da Praça da República
Jardim das platibandas
Noite
Noite de hotel
Chove chuva choverando

ALUNO 2: não gosto, deveríamos cortar este poema, Oswald tem melhores...

ALUNO 1: quem é a favor de cortar esse poema?

(ninguém levanta a mão)

ALUNO 1: ninguém?! Prossiga, aluna 1; fale logo sobre a poética de um cara que não foi ao Teatro Municipal de São Paulo, na Semana de arte moderna de 22 , mas mandou o poema OS SAPOS, o recifense Manuel bandeira que torpedeou os parnasianos...
(os 4 alunos, ou mais, de acordo com a direção, podem ser até 10...)
Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.
Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
- "Meu pai foi à guerra!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".
O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: - "Meu cancioneiro
É bem martelado.
Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.
O meu verso é bom
Frumento sem joio.
Faço rimas com
Consoantes de apoio.
Vai por cinquenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A fôrmas a forma.
Clame a saparia
Em críticas céticas:
Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas..."
Urra o sapo-boi:
- "Meu pai foi rei!"- "Foi!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".
Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
- A grande arte é como
Lavor de joalheiro.
Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo".
Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas,
- "Sei!" - "Não sabe!" - "Sabe!".
Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Veste a sombra imensa;
Lá, fugido ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é
Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio...

ALUNO 1: todos agora  misturam como a poética, poema onde Bandeira declara a essência da sua poesia...

“Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados
O lirismo difícil e pungente dos bêbados
O lirismo dos clowns de Shakespeare
– Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.”

ALUNA 3: quase um século depois e a Semana de Arte Moderna, comenta as relações entre o Modernismo e o contexto político; o movimento da inteligência que representamos, na sua fase verdadeiramente “modernista”, não foi o fator das mudanças político-sociais posteriores a ele no Brasil. Foi essencialmente um preparador, o criador de um estado-de-espírito revolucionário e de um sentimento de arrebentação. [...] Os movimentos espirituais precedem sempre as mudanças de ordem social. “O passado é lição para se meditar, não para reproduzir.”  Mário de Andrade

ALUNO 2: Reação de caráter demolidor ao ademicismo reinante nas nossas artes...
ALUNA 2:  escritores, pintores, escultores e poetas compuseram naquele teatro um espetáculo de inteligência cultural jamais visto na história brasileira.

(chega um aluno molhado de chuva e todos fazem pausa, comem doces, toma chá gelado, coca cola... fruta, alguém pega uma banana e diz..)

ALUNO 1: antes tarde do que nunca, não é JR?

ALUNO 3: CHUVA, TRÂNSITO... whatsapp, Instagram... mamãe... meu irmão pequeno...

ALUNA 2; pare (coloca a mão no peito e dramatiza) se você falar mais eu choro... DEIXA DE PAPO E LÊ AÍ A PÁGIUNA 4, VAI...


ALUNO 3:  (depois de se acomodar e escutar a música que ficou mais alta enquanto ninguéM falava) :   em meio a vaias e berros, ao executar composições como “Impressões da Vida Mundana”, Villa-Lobos reforçou naquele palco sua imagem de gênio da música; carioca, acabou entrando para sempre na memória da cidade, onde, tempos depois, veio a organizar projetos de educação musical nas escolas.

(slides exibem quadros de anitta malfatti)

ALUNA 1: Anita Malfatti, considerada  quase uma mártir do movimento modernista, devido às reações que uma exposição de seus quadros, em  1917, provocou na intelectualidade da época. E por causa do artigo de Monteiro Lobato: “Paranóia ou Mistificação?”, tentando detonar a exposição dela...
ALUNO 2: lembrando que Graça Aranha – da Academia Brasileira de Letras – aderiu às novas idéias eDi Cavalcanti, coloca o cartaz da semana que ele fez, inspirado no O nascimento de Vênus, mostra também o nascimento de Vênus e compara com o cartaz, logo! Tas comendo mosca é JR?
(JR assume os slides)

ALUNO 3: (mostrando foto de Graça Aranha/  slide, claro)  Graça Aranha abre a Semana com a palestra “EMOÇÃO ESTÉTICA NA OBRA DE ARTE.” A arte e a literatura precisam mudar.

ALUNA2 : bem depois  Menotti Del Picchia fala sobre “Arte Moderna”. Reivindica liberdade total de expressão (vaias e mais vaias do público). A Semana de Arte Moderna aconteceu devido ao apoio financeiro dos fazendeiros de café.

(alunos agora formam como se fosse uma marcha de protesto pelas ruas/ corredores do teatro, ao redor da sala etc.)

Queremos escrever com sangue – que é a humanidade;com eletricidade – que é movimento, expressão dinâmica do século; violência –  que é energia bandeirante.” (Menotti Del Picchia)

Aluno 1:          (voltando ao normal) O Modernismo, segundo Mário de Andrade, não tinha um programa comum, uma direção a ser seguida. “A estética do Modernismo ficou indefinível” , disse Mário,
Mas predomina a renovação literária e o experimentalismo, a inspiração nacionalista, o desenvolvimento e o estímulo à pesquisa formal.

TODOS GRITAM: (como se fossem esnobes)  ICONOCLASTAS! Queriam destruir tudo que não fosse moderno!  Interesse pelas coisas do Brasil!  VALORIZAÇÃO DO INCONSCIENTE, DE CENAS COMUNS DO DIA A DIA!
A linguagem da poesia se aproxima da linguagem da prosa! Rupturas sintáticas e lógicas; caricatura da retórica!

IRREVERÊNCIA! PARÓDIA, como poema-piada na “língua brasileira” alicerçada no falar da nossa gente; linguagem coloquial, a linguagem oral das camadas mais humildes) é incorporada à linguagem literária. Liberdade lingüística – criam-se palavras, mudam-se as classes gramaticais (os sempres, os amanhãs), linguagem sintética; liberdade, na poesia, quanto à metrificação (uso de versos livres ou metrificados). Postura agressiva e combativa:

ALUNA 2: Eu insulto o burguês! O burguês-níquel
o burguês – burguês!
A digestão bem feita de São Paulo!
O homem – curva! O homem – nádegas!
O homem que sendo francês, brasileiro, italianos,
é sempre um cauteloso pouco a pouco!
(Mário de Andrade)


Aluno 1:  (os outros fazem mímica desta cena, atrás)
No baile da corte
Foi o Conde d’Eu quem disse:
Pra dona Benvinda
Que farinha de suruí
Pinga de Parati
Fumo de Baependi
É come bebê pita e caí.
(Oswald de Andrade)

TODOS:  textos fragmentados; quebra dos nexos lógicos, uso do fluxo de consciência, da enumeração caótica. intertextualidade – paródia; textos marcados pelo humor e pela atividade irônico-crítica. PROSA que se assemelha à narrativa cinematográfica.
·           
 ( slides exibem REVISTAS DO MODERNISMO)
LUNO 2 (grita como num teatrão) ATENÇÃO! As revistas do Modernismo no Brasil!!
KLAXON – No projeto gráfico as lições do Cubismo. No segundo volume, aparece encarte com desenho do pintor Di Cavalcanti.





    Estética (1924 – Rio de Janeiro)

A Revista (1925 – Minas Gerais)
Madrugada (1925 – Rio Grande do Sul)
Terra Roxa e Outras Terras (1926 – São Paulo)
Festa (1928 – Rio de Janeiro)

ALUNA 3: Vale destacar ainda em 1926 o Manifesto Regionalista do Recife

(VAI MOSTRANDO FOTOS DE Gilbertto Freyre na década de 20, 1926)que provocaria mais tarde (década de trinta) o surgimento de importantes obras regionalistas.
Costuma-se dividir o modernismo brasileiro em duas fases mais ou menos distintas.
ALUNO 2 : observem os slides! Na1ª fase (1922 a 1930) – Os autores não sabiam o que queriam, mas sabiam o que “não” queriam. Ironizam com a idéia de Escola literária.” Destaca a liberdade de pesquisa estética, o experimentalismo. Prefácio interessantíssimo em Pauliceia Desvairada. Mário destaca ainda a necessidade de renovação da intelectualidade brasileira.

ALUNA 1: vejam os quadros de Tarsila!  Tarsila do Amaral.
(slides dos quadros de Tarsila)
No Movimento Pau-Brasil, de1924,   Oswald de Andrade buscou uma poesia de redescoberta do mundo e do Brasil, combateu a linguagem retórica e vazia.

ALUNO 3: “Contra o gabinetismo, a prática culta da vida. (...) a língua sem arcaísmos, sem erudição. Natural e neológica. A contribuição milionária de todos os erros. Como falamos. Como somos.”

ALUNA 1: DIZIA Oswald de Andrade – Manifesto Pau-Brasil, de1924:  trabalho contra o detalhe naturalista – pela síntese; contra a morbidez romântica – pelo equilíbrio geômetra e pelo acabamento técnico; contra a cópia, pela invenção e pela surpresa (...) Nenhuma fórmula para a contemporânea expressão do mundo. Ver com olhos livres!



ALUNA 2: Como desdobramento do movimento Pau-Brasil surge o MOVIMENTO ANTROPOFÁGICO, de OSWALD, inspirado pelo Abaporu de Tarsila, 1928!

TODOS: “Só a Antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente Filosoficamente.
Única lei do mundo. Expressão mascarada de todos os individualismos, de todos os coletivismos. De todas as religiões. De todos os tratados de paz.
Tupi or not tupi, that is the question.
Contra todas as catequeses. E contra a mãe dos Gracos.
Foi porque nunca tivemos gramáticas, nem coleções de velhos vegetais.
(...) Antes de os portugueses descobrirem o Brasil, o Brasil tinha descoberto a felicidade!”

ALUNO 1: E PARA ENCERRAR:

 

Manifesto Regionalista de 1926

ALUNO 2:
(exibindo vários slides de coisas do Recife, da primeira metade do século passado)
Os anos de 1925 a 1930 marcam a divulgação do Modernismo pelos vários estados brasileiros. Assim é que o Centro Regionalista do Nordeste, com sede em Recife, lança o Manifesto Regionalista de 1926, em que procura “desenvolver o sentimento de unidade do Nordeste” dentro dos novos valores modernistas. Apresenta como proposta “trabalhar em prol dos interesses da região nos seus aspectos diversos: sociais, econômicos e culturais”. Além de promover confer6encias, exposições de arte, congressos, o Centro editaria uma revista. Vale lembrar que, a partir da década de 1930, o regionalismo nordestino resultou em brilhantes obras literárias, com nomes que vão de Graciliano Ramos, José Lins do Rego, José Américo de Almeida, Rachel de Queiroz e Jorge Amado, no romance, a João Cabral de Melo Neto, na poesia.

(todos riem e fazem uma festinha, podem até dançar ou tentar musicar estes textos abaixo)

Vício na fala
Para dizerem milho dizem mio
Para melhor dizem mio
Para pior pio
Para telha dizem teia
Para telhado dizem teiado
E vão fazendo telhados. (Oswald)











Pronominais
Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro. (Oswald)


brasil
O Zé Pereira chegou de caravela
E perguntou pro guarani da matavirgem
– Sois cristão?
– Não. Sou bravo, sou forte, sou filho da Morte
Teterê tetê Quizá Quizá Quecê!
Lá longe a onça resmungava Uu! ua! uu!
O negro zonzo saído da fornalha
Tomou a palavra e respondeu
– Sim pela graça de Deus
Canhem Babá Canhem Babá Cum cum!
E fizeram o Carnaval.(Oswald)





“Como falamos. Como somos (...).
O trabalho contra (...) a
cópia, pela invenção e
pela surpresa. (...) ver
com olhos livres”.
Manifesto da poesia pau-Brasil


O Rebanho
Oh! Minhas alucinações!
Vi os deputados, chapéus altos,
sob o pálio vesperal, feito de mangas-rosas,
saírem de mãos dadas do Congresso... Como um
possesso num acesso em meus aplausos
aos salvadores do meu estado amado. (Mário de Andrade)


A Meditação sobre o Tietê
“Água do meu Tietê,
Ondas me queres levar?
– Rio que entras pela terra
E que me afastas pela terra
É noite. E tudo é noite. Debaixo do arco admirável
Da ponte das bandeiras o rio
Murmura num banzeiro de água pesada e oliosa...” (Mário de Andrade)

ALUNO Em O Poeta Come Amendoim, Mário se identifica com o Brasil (nacionalismo) pela linguagem.

“Brasil amado não porque seja minha pátria,
Pátria é acaso de migrações e do pão-nosso onde Deus der...
Brasil que eu amo porque é o ritmo do meu braço aventuroso,
O gosto dos meus descansos,
O balanço das minhas cantigas amores e danças.
Brasil que eu sou porque é a minha expressão muito engraçada,
Porque é o meu sentimento pachorrento.
Porque é o meu jeito de ganhar dinheiro, de comer e de dormir.”

(todos silenciam e, talvez, depois de pausa dramática, ou blackout, se possível , falam com tom xamanístico; exibição de trechos do filme MACUNAÍMA, de Joaquim Pedro de Andrade)

No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói da nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da noite. Houve um momento em que o silêncio foi tão grande escutando o murmurejo do Uraricoera, que a índia tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança é que chamaram de Macunaíma.
Já na meninice fez coisa de sarapantar. De primeiro passou mais de seis anos não falando. Si o incitavam a falar exclamava:
– Ai! Que preguiça!...
e não dizia mais nada. Ficava no canto da maloca, trepado no jirau de paxiúba, espiando o trabalho dos outros e principalmente os dois manos que tinha, Maanape já velhinho e Jiguê na força de homem. O divertimento dele era decepar cabeça de saúva. Vivia deitado mas si punha os olhos em dinheiro, Macunaíma dandava pra ganhar vintém. E também espertava quando a família ia tomar banho no rio, todos juntos e nus: Passava o tempo do banho dando mergulho, e as mulheres soltavam gritos gozados por causa dos guaimuns diz que habitando a água-doce por lá. No mucambo si alguma cunhatã se aproximava dele pra fazer festinha, Macunaíma punha a mão nas graças dela, cunhatã se afastava. Nos machos cuspia na cara. Porém respeitava os velhos e freqüentava com aplicação a murua a poracê o toré o bocorocô a cucui-cogue, todas essas danças religiosas da tribo.
Quando era pra dormir trepava no macuru pequeninho sempre se esquecendo de mijar. Como a rede da mãe estava por debaixo do berço, o herói mijava quente na velha, espantando os mosquitos bem. Então adormecia sonhando palavras-feias, imoralidades estrambólicas e dava patadas no ar.



O Poeta Come Amendoim

“Brasil ...
Mastigado na gostosura quente do amendoim...
Falado numa língua curumim
De palavras incertas num remeleixo
melado melancólico...
Saem lentas frescas trituradas pelos meus dentes
bons...
Molham meus beiços que dão beijos alastrados
E depois semitoam sem malícia as rezas bem nascidas...
Brasil amado não porque seja minha pátria,
Pátria é acaso de migrações e do pão-nosso onde
Deus der...
Brasil que eu amo porque é ritmos do meu braço aventuroso,
O gosto dos meus descansos,
O balanço das minhas cantigas
amores e dansas.
Brasil que eu sou porque é minha expressão muito engraçada,
Porque é o meu sentimento pachorrento, Porque é o meu jeito de ganhar
dinheiro, de comer e de dormir.
(M. de Andrade – Clã do Jaboti)