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quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Relendo o livro Arte e Ilusão, do historiador e teórico da arte Ernst Hans Gombrich

O livro tem o subtítulo Um estudo da psicologia da representação pictórica. É uma das grandes obras que se debruça sobre o estatuto da representação. Por que um desenho de uma pessoa é reconhecido como uma pessoa? Onde está esse semelhança? É “natural” que tanto quatro traços + um círculo quanto uma retrato de Dürer represente uma pessoa? o que é o estilo? Todas essas perguntas, outras questões e pontos de encontro em todas são respondidas por Gombrich.
O miolo do livro começou a tomar forma em 1956 no final dos anos 50 numa série de conferências sobre “The Visible World and the Language of Art”, e foi lançado alguns anos depois. A charge que abre a introdução é  ótima para ajudar a compreender o tipo de problema que Gombrich investiga. A surreal cena da aula com uma modelo posando com os membros e cabeça de lado é o pontapé inicial da discussão sobre os estilos de representação. Discute porque a arte egípcia representava os seres humanos daquele modo, o porquê da busca pelo “naturalismo” da representação das convenções da arte ocidental e o estabelecimento do impressionismo.
A estrutura do livro, além de prefácios, notas etc:
Introdução
A psicologia e o enigma do estilo
Primeira parte: Os limites da semelhança
I – Da luz à tinta
II – Verdade e estereótipo
Segunda parte: Função e forma
III – O poder de Pigmalião
IV – Reflexões sobre a revolução grega
V – Fórmula e experiência
Terceira parte: A participação do observador
VI – A imagem nas nuvens
VII – Condições de ilusão
VIII – Ambiguidades da terceira dimensão
Quarta parte: Invenção e descoberta
IX – A análise da visão na arte
X – O experimento da caricatura
XI – Da representação à expressão
O texto foi revisado várias vezes, pelas reedições por qual passou. O prefácio à sexta edição inglesa, de 2000, tem o subtítulo “Imagens e Sinais”. Nele, Gombrich reconhece a semiótica como ferramenta de análise aplicável ao escopo de problemas que observa, e chega a dizer que “todas as imagens são sinais, e a disciplina que deve estudá-las não é a psicologia da percepção – como eu acreditava -, mas a semiótica, a ciência dos sinais”.
Mas esse reconhecimento na verdade só engrandece o livro e o trabalho de Gombrich. Afinal, a primeira edição de Arte e Ilusão é da década de 50. Por um lado influenciou parte do trabalho de semioticistas que se dedicaram à imagem, por outro incorporou algumas de suas descobertas.
Apresento aqui um trecho do capítulo X. O experimento da caricatura:
O borrão de tinta é um evento aleatório; o modo como reagimos à ele é determinado pelo nosso passado. Ninguém poderia predizer onde se rasgaria o papel que produziu a máscara fantasmagórica de Picasso – o que importa é que ele a conservou. Deve ter sido igualmente difícil saber antecipadamente como a exata posição das sobrancelhas poderia afetar a expressão do hipopótamo de Thurber – o que importa é que ele soube ver isso e explorá-lo.”
Entre os outros livros de Gombrich dois também merecem destaque, apesar de não os ter lido inteiros. O primeiro é Meditações Sobre um Cavalinho de Pau. Este título, o mais legal de todos os títulos de livros do mundo, se refere ao ato pelo qual uma criança (ou adulto, sabe-se lá) transforma uma vassoura em um cavalo, numa brincadeira ou encenação. Esse processo guarda semelhanças com o processo pelo qual traços em um papel se transformam em “arte”.
O outro livro, um dos maiores sucessos mundiais da área, é o História da Arte. Utilizado em boa parte dos cursos da área de artes pelo mundo, a obra foi editada várias vezes em diversos formatos. Na introdução de Arte e Ilusão, o autor adverte que o livro pode ser consumido por qualquer pessoa, desde que com um conhecimento básico das principais fases dos estilos de representação, contidos em História da Arte.
Recomendo a leitura de artigos de um pesquisador do Poscóm/Ufba chamado Benjamim Picado. Conheci Gombrich ao frequentar seu grupo de pesquisa, o Grupo de Análise da Fotografia. Da revista Contemporanea, pode ser lido o artigo Das Funções Narrativas ao Aspectual nos Ícones Visuais: notas sobre modos de interpretar imagens (pdf), no vol. 4, n°2 da publicação, no qual discute as idéias de Roland Barthes, Umberto Eco, E. H. Gombrich etc.

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