Capítulo Um Havia um
menino diferente dos outros meninos. Tinha o olho direito preto, o esquerdo
azul e a cabeça pelada. Os vizinhos mangavam dele e gritavam:
— Ó pelado! Tanto
gritaram que ele se acostumou, achou o apelido certo, deu para se assinar a carvão,
nas paredes: Dr. Raimundo Pelado. Era de bom gênio e não se zangava; mas os
garotos dos arredores fugiam ao vê-lo, escondiam-se por detrás das árvores da
rua, mudavam a voz e perguntavam que fim tinham levado os cabelos dele.
Raimundo entristecia e fechava o olho direito. Quando o aperreavam demais,
aborrecia-se, fechava o olho esquerdo. E a cara ficava toda escura. Não tendo
com quem entender-se, Raimundo Pelado falava só, e os outros pensavam que ele
estava malucando. Estava nada! Conversava sozinho e desenhava na calçada coisas
maravilhosas do país de Tatipirun, onde não há cabelos e as pessoas têm um olho
preto e outro azul. Capítulo Dois Um dia em que ele preparava, com areia
molhada, a serra de Taquaritu e o rio das Sete Cabeças, ouviu os gritos dos
meninos escondidos por detrás das árvores e sentiu um baque no coração. — Quem
raspou a cabeça dele? perguntou o moleque do tabuleiro. — Como botaram os olhos
de duas criaturas numa cara? berrou o italianinho da esquina. — Era melhor que
me deixassem quieto, disse Raimundo baixinho. Encolheu-se e fechou o olho
direito. Em seguida, foi fechando o olho esquerdo, não enxergou mais a rua. As
vozes dos moleques desapareceram, só se ouvia a cantiga das cigarras. Afinal as
cigarras se calaram. Raimundo levantou-se, entrou em casa, atravessou o quintal
e ganhou o morro. Aí começaram a surgir as coisas estranhas que há na terra de
Tatipirun, coisas que ele tinha adivinhado, mas nunca tinha visto. Sentiu uma
grande surpresa ao notar que Tatipirun ficava ali perto de casa. Foi andando na
ladeira, mas não precisava subir: enquanto caminhava, o monte ia baixando,
baixando, aplanava-se como uma folha de papel. E o caminho, cheio de curvas,
estirava-se como uma linha. Depois que ele passava, a ladeira tornava a empinar-se
e a estrada se enchia de voltas novamente. Capítulo Três — Querem ver que isto
por aqui já é a serra de Taquaritu? pensou Raimundo. — Como é que você sabe?
roncou um automóvel perto dele. O pequeno voltou-se assustado e quis
desviar-se, mas não teve tempo. O automóvel estava ali em cima, pega não pega.
Era um carro esquisito: em vez de faróis, tinha dois olhos grandes, um azul,
outro preto. — Estou frito, suspirou o viajante esmorecendo. Mas o automóvel
piscou o olho preto e animou-o com um riso grosso de buzina: — Deixe de
besteira, seu Raimundo. Em Tatipirun nós não atropelamos ninguém. Levantou as
rodas da frente, armou um salto, passou por cima da cabeça do menino, foi cair
cinqüenta metros adiante e continuou a rodar fonfonando. Uma laranjeira que estava
no meio da estrada afastou-se para deixar a passagem livre e disse toda amável:
— Faz favor. — Não se incomode, agradeceu o pequeno. A senhora é muito educada.
— Tudo aqui é assim, respondeu a laranjeira. — Está se vendo. A propósito, por
que é que a senhora não tem espinhos? — Em Tatipirun ninguém usa espinhos,
bradou a laranjeira ofendida. Como se faz semelhante pergunta a uma planta
decente? — É que sou de fora, gemeu Raimundo envergonhado. Nunca andei por
estas bandas. A senhora me desculpe. Na minha terra os indivíduos de sua
família têm espinhos. — Aqui era assim antigamente, explicou a árvore. Agora os
costumes são outros. Hoje em dia, o único sujeito que ainda conserva esses
instrumentos perfurantes é o espinheiro-bravo, um tipo selvagem, de maus bofes.
Conhece-o? — Eu não senhora. Não conheço ninguém por esta zona. — É bom não
conhecer. Aceita uma laranja? — Se a senhora quiser dar, eu aceito. A árvore
baixou um ramo e entregou ao pirralho uma laranja madura e grande. — Muito
obrigado, dona Laranjeira. A senhora é uma pessoa direita. Adeus! Tem a bondade
de me ensinar o caminho? — É esse mesmo. Vá seguindo sempre. Todos os caminhos
são certos. — Eu queria ver se encontrava os meninos pelados. — Encontra. Vá
seguindo. Andam por aí. — Uns que têm um olho azul e outro preto? — Sem dúvida.
Toda gente tem um olho azul e outro preto. — Pois até logo, dona Laranjeira.
Passe bem. — Divirta-se. Capítulo Quatro Raimundo continuou a caminhada,
chupando a laranja e escutando as cigarras, umas cigarras graúdas que passavam
sobre enormes discos de eletrola. Os discos giravam, soltos no ar, as cigarras
não descansavam — e havia em toda a parte músicas estranhas, como nunca ninguém
ouviu. Aranhas vermelhas balançavam-se em teias que se estendiam entre os
galhos, teias brancas, azuis, amarelas, verdes, roxas, cor das nuvens do céu e
cor do fundo do mar. Aranhas em quantidade. Os discos moviam-se, sombras
redondas projetavam-se no chão, as teias agitavam-se como redes. Raimundo
deixou a serra de Taquaritu e chegou à beira do rio das Sete Cabeças, onde se
reuniam os meninos pelados, bem uns quinhentos, alvos e escuros, grandes e
pequenos, muito diferentes uns dos outros. Mas todos eram absolutamente calvos,
tinham um olho preto e outro azul. Capítulo Cinco O viajante rondou por ali uns
minutos, receoso de puxar conversa, pensando nos garotos que zombavam dele na
rua. Foi-se chegando e sentou-se numa pedra, que se endireitou para recebê-lo.
Um rapazinho aproximou-se, examinou-lhe, admirado, a roupa e os sapatos. Todos
ali estavam descalços e cobertos de panos brancos, azuis, amarelos, verdes,
roxos, cor das nuvens do céu e cor do fundo do mar, inteiramente iguais às
teias que as aranhas vermelhas fabricavam. — Eu queria saber se isto aqui é o
país de Tatipirun, começou Raimundo. — Naturalmente, respondeu o outro. Donde
vem você? Raimundo inventou um nome para a cidade dele que ficou importante: —
Venho de Cambacará. Muito longe. — Já ouvimos falar, declarou o rapaz. Fica
além da serra, não é isto? — É isso mesmo. Uma terra de gente feia, cabeluda,
com olhos de uma cor só. Fiz boa viagem e tive algumas aventuras. — Encontrou a
Caralâmpia? — É uma laranjeira? — Que laranjeira! É menina. — Como ele é bobo!
gritaram todos rindo e dançando. Pensa que a Caralâmpia é laranjeira. Capítulo
Seis Raimundo levantou-se trombudo e saiu às pressas, tão encabulado que não
enxergou o rio. Ia caindo dentro dele, mas as duas margens se aproximaram, a
água desapareceu, e o menino com um passo chegou ao outro lado, onde se
escondeu por detrás dum tronco. A terra se abriu de novo, a correnteza tornou a
aparecer, fazendo um barulho grande. — Por que é que você se esconde? perguntou
o tronco baixinho. Está com medo? — Não senhor. É que eles caçoaram de mim
porque eu não conheço a Caralâmpia. O tronco soltou uma risada e pilheriou: —
Deixe de tolice, criatura. Você se afogando em pouca água! As crianças estavam
brincando. É uma gente boa. — Sempre ouvi dizer isso. Mas debicaram comigo
porque eu não conheço a Caralâmpia. — Bobagem. Deixe de melindres. — É mesmo,
concordou Raimundo. Eu pensava nos moleques que faziam troça de mim, em
Cambacará. O senhor está descansando, hein? — É. Estou aposentado, já vivi
demais. Raimundo levantou-se: — Bem, seu Tronco. Eu vou andando. — Espera aí.
Um instante. Quero apresentá-lo à aranha vermelha, amiga velha que me visita
sempre. Está aqui, vizinha. Este rapaz é nosso hóspede. Capítulo Sete A aranha
vermelha balançou-se no fio, espiando o menino por todos os lados. O fio se
estirou até que o bichinho alcançou o chão. Raimundo fez um cumprimento: — Boa
tarde, dona Aranha. Como vai a senhora? — Assim, assim, respondeu a visitante.
Perdoe a curiosidade. Por que é que você põe esses troços em cima do corpo? —
Que troços? A roupa? Pois eu havia de andar nu, dona Aranha? A senhora não está
vendo que é impossível? — Não é isso, filho de Deus. Esses arreios que você usa
são medonhos. Tenho ali umas túnicas no galho onde moro. Muito bonitas. Escolha
uma. Raimundo chegou-se à árvore próxima e examinou desconfiado uns vestidos feitos
daquele tecido que as aranhas vermelhas preparam. Apalpou a fazenda, tentou
rasgá-la, chegou-a ao rosto para ver se era transparente. Não era. — Eu nem sei
se poderei vestir isto, começou hesitando. Não acredito... — Que é que você não
acredita? perguntou a proprietária da alfaiataria. — A senhora me desculpa,
cochichou Raimundo. Não acredito que a gente possa vestir roupa de teia de
aranha. — Que teia de aranha! rosnou o tronco. Isso é seda e da boa. Aceite o
presente da moça. — Então muito obrigado, gaguejou o pirralho. Vou
experimentar. Capítulo Oito Escolheu uma túnica azul, escondeu-se no mato e,
passados minutos, tornou a mostrar-se vestido como os habitantes de Tatipirun.
Descalçou-se e sentiu nos pés a frescura e a maciez da relva. Lá em cima os enormes
discos de eletrola giravam; as cigarras chiavam músicas em cima deles, músicas
como ninguém ouviu; sombras redondas espalhavam-se no chão. — Este lugar é
ótimo, suspirou Raimundo. Mas acho que preciso voltar. Preciso estudar a minha
lição de geografia. Nisto ouviu uma algazarra e viu através dos ramos a
população de Tatipirun correndo para ele: — Cadê o menino que veio de
Cambacará? Eram milhares de criaturas miúdas, de cinco a dez anos, todas
cobertas de teias de aranha, descalças, um olho preto e outro azul, as cabeças
peladas nuas. Não havia pessoas grandes, naturalmente. — Cadê o menino que veio
de Cambacará? — Que negócio têm comigo? resmungou o pequeno alarmado. Parece
uma procissão. — Parece um “meeting”, disse uma rã que pulou da beira do rio. —
Parece um teatro, cantou um pardal. Raimundo pôs-se a rir: — Que passarinho
besta! Ele pensa que teatro é gente. Teatro é casa. — Eu estou falando nos
sujeitos que estão dentro do teatro, pipilou o pardal. — Bem, isso é outra
cantiga, concordou Raimundo. Capítulo Nove — Cadê o menino que veio de
Cambacará? gritava o povaréu. — Essa tropa não sabe geografia, disse Raimundo.
Cambacará não existe. — E por que é que não existe? perguntou a rã. — Não
existe não, sinha Rã. Foi um nome que eu inventei. — Pois faz de conta que
existe, ensinou a bicha. Sempre existiu. — A senhora tem certeza? —
Naturalmente. — Então existe. A rã fechou o olho preto, abriu o azul e foi
descansar numa poça d'água. — Cadê o menino que veio de Cambacará? — Estou
aqui, pessoal, bradou Raimundo. Que é que há? O rio se fechou de repente e a
multidão passou por ele num instante. Depois as margens se afastaram, a água
tornou a aparecer. — Que rio interessante! exclamou Raimundo. Deve ter um
maquinismo por dentro. — Por que foi que você fugiu de nós? perguntou o
rapazinho que tinha falado sobre a Caralâmpia. — Espere aí. Eu já digo. Como é
o seu nome? — Pirenco. — Que nome engraçado! Pirenco! Não há ninguém com esse
nome. — Eu sou Pirenco, replicou o outro. — Pois sim. Não discutamos. Vamos ao
caso do rio. Tem algum maquinismo por dentro? — Não tem maquinismo nenhum,
disse uma garota de túnica amarela. Todos os rios são assim. — Claro! concordou
Pirenco. Essa é a Talima. — Prazer em conhecê-la, Talima. Você é bonita. — E
boa, interrompeu um menino sardento. Meio desparafusada, mas um coraçãozinho de
açúcar. Aquela é a Sira. — O tronco me falou em vocês todos. Como vai, Sira? —
Por que foi que você fugiu da gente? Raimundo ficou acanhado, as orelhas
pegando fogo: — Sei lá! Burrice. Julguei que estivessem troçando de mim. Eu não
tinha obrigação de conhecer a Caralâmpia. Quem é a Caralâmpia? — Onde andará
ela? inquiriu o sardento. — Sumiu-se, explicou Talima. Foi uma menina que virou
princesa. — Caso triste, gemeu uma criatura miúda, de dois palmos. Quando penso
que pode ter acontecido alguma desgraça... Capítulo Dez Talima baixou-se e
consolou o anão: — Cala a boca, nanico. Não há desgraça. — Imaginem que ela
encontrou o espinheiro-bravo e espetou os dedos. — Encontrou nada! — Pode ter
crescido e ido morar em Cambacará. — Não foi não, informou Raimundo. Não vi lá
ninguém destas bandas. Como é a figura dela? — É uma menina pálida, alta e
magra. — Princesa? — É. Sempre teve jeito de princesa. Agora virou princesa e
levou sumiço. — Que infelicidade! choramingou o anão. — Vamos procurar a
Caralâmpia, convidou Talima. Deixe de choradeira, nanico. — Já deixei, murmurou
o anãozinho enxugando os olhos. Saíram todos, gritando, pedindo informações a
paus e bichos. O sardento ia devagar, distraído. Puxou Raimundo por um braço: —
Eu tenho um projeto. — Estou receando que anoiteça, exclamou Raimundo. Se a
noite pegar a gente aqui no campo... Era melhor entrar em casa e deixar a
Caralâmpia para amanhã. — O meu projeto é curioso, insistiu o sardento, mas
parece que este povo não me compreende. — É sempre assim, disse Raimundo.
Faltará muito para o sol se pôr? Capítulo Onze O anãozinho bateu na perna dele:
— Nós nos esquecemos de perguntar como é que você se chama. — Raimundo. Sou
muito conhecido. Até os troncos, as laranjeiras e os automóveis me conhecem. —
Raimundo é um nome feio, atalhou Pirenco. — Muda-se, opinou o anão. — Em
Cambacará eu me chamava Raimundo. Era o meu nome. — Isso não tem importância,
decidiu Talima. Fica sendo Pirundo. — Pirundo não quero. — Então é Mundéu. —
Também não presta. Mundéu é uma geringonça de pegar bicho. — Pois fica Raimundo
mesmo. — Está direito. Eu queria saber como a gente se arranja de noite. — Que
noite? — A noite, a escuridão, isso que vem quando o sol se deita. — Besteira!
exclamou o anão. Uma pessoa taluda afirmando que o sol se deita! Quem já viu
sol se deitar? — Essa coisa que chega quando a Terra vira, emendou Raimundo. A
noite, percebem? Quando a Terra vira para o outro lado. — Ele vem cheio de
fantasias, asseverou Talima. Escute, Fringo. Ele cuida que a Terra vira.
Capítulo Doze Fringo, um menino preto, estirou o beiço e bocejou: — Ilusões. —
Qual nada! Vira. Em Cambacará ninguém ignora isto. Vá lá e pergunte. Vira para
um lado — tudo fica no claro, a gente, as árvores, as rãs, os pardais, os rios
e as aranhas. Vira para o outro lado — não se vê nada, é aquele pretume.
Natural. Todos os dias se dá. — É engano, interrompeu Fringo. — Não há noite? —
Há o que você está vendo. — Não escurece, o sol não muda de lugar... — Nada disso.
— Está bom. Preciso consertar o meu estudo de geografia. Continuaram a marcha,
andaram muito, e nenhuma notícia de Caralâmpia. O sol permanecia no mesmo
ponto, no meio do céu. Nem manhã nem tarde. Uma temperatura amena, invariável.
— Deve haver um maquinismo de relógio lá por cima, calculou Raimundo. Vão ver
que ele perdeu a corda e parou. — Quer ouvir o meu projeto? interrompeu o
sardento. — Vamos lá, acedeu Raimundo. Mas antes me tire uma dúvida. Vocês não
descansam nunca? — Descansamos, explicou o outro. Quando a gente está fatigada,
deita-se e fecha um olho. — O olho preto ou o azul? — Isso é conforme. Fecha-se
um olho. O outro fica aberto, vendo tudo. Capítulo Treze — Pois eu acho que
está chegando a hora de voltar e descansar. — Voltar para onde? — Voltar para a
beira do rio, entrar em casa, dormir. — Não vale a pena. Se quer ver o rio, é
tocar para a frente. O rio das Sete Cabeças faz muitas curvas. Adiante aparece
uma delas. Aqui nós nunca voltamos. Vou contar o meu projeto. — É bom. Conte.
Mas andando à toa, sem destino, como é que vocês entram em casa? — Entrar em
coisa nenhuma! A gente se deita no chão. — Macio, realmente. E as casas? — Não
entendo. — Pois vou chamar o Pirenco. Venha cá, seu Pirenco. Onde estão as
casas? Talima encolheu os ombros: — Ele veio de Cambacará cheio de idéias
extravagantes. — Perguntas insuportáveis, acrescentou Sira. Raimundo observou
os quatro cantos, não viu nenhuma construção. — Está bem, não teimamos. Vocês
dormem no mato, como bichos. — Descansamos à sombra dessas rodas que giram,
disse Fringo. — Debaixo dos discos de eletrola. Sim senhor, bonitas casas. E
quando chove? — Quando chove? — Sim. Quando vem a água lá de cima, vocês não se
ensopam? — Não acontece isso. Raimundo abriu a boca e deu uma pancada na testa:
— Que lugar! Não faz calor nem frio, não há noite, não chove, os paus
conversam. Isto é um fim de mundo. Capítulo Quatorze — Quer ouvir o meu
projeto? segredou o menino sardento. — Ah! sim. Ia-me esquecendo. Acabe
depressa. — Eu vou principiar. Olhe a minha cara. Está cheia de manchas, não
está? — Para dizer a verdade, está. — É feia demais assim? — Não é muito bonita
não. — Também acho. Nem feia nem bonita. — Vá lá. Nem feia nem bonita. É uma
cara. — É. Uma cara assim assim. Tenho visto nas poças d'água. O meu projeto é
este: podíamos obrigar toda a gente a ter manchas no rosto. Não ficava bom? —
Para quê? — Ficava mais certo, ficava tudo igual. Raimundo parou sob um disco
de eletrola, recordou os garotos que mangavam dele. Capítulo Quinze A cigarra
lá de cima interrompeu a cantiga, estirou a cabecinha. Era uma cigarra gorda e
tinha um olho preto, outro azul. — Qual é a sua opinião? perguntou o sardento.
Raimundo hesitou um minuto: — Não sei não. Eles caçoam de você por causa da sua
cara pintada? — Não. São muito boas pessoas. Mas se tivessem manchas no rosto,
seriam melhores. A aranha vermelha deu um balanço no fio e chegou ao disco de
eletrola: — Que história é aquela? — Palavreado à-toa, explicou a dona da casa.
— À-toa nada! bradou o sardento. Cigarra e aranha não têm voto. Cada macaco no
seu galho. Isto é um assunto que interessa exclusivamente aos meninos. — Eu
aqui represento a indústria dos tecidos, replicou a aranha arregalando o olho
preto e cerrando o azul. — E eu sou artista, acrescentou a cigarra. Palavreado
à-toa. Raimundo esfregou as mãos, constrangido, olhou os discos e as teias
coloridas que se agitavam. — Parece que elas têm direito de opinar. São
importantes, são umas sabichonas. — Direito de dizer besteiras! resmungou o
sardento. — Não senhor. A cigarra tem razão. Palavreado à-toa. — Então você
acha o meu projeto ruim? — Para falar com franqueza, eu acho. Não presta não.
Como é que você vai pintar esses meninos todos? — Ficava mais certo. — Ficava
nada! Eles não deixam. — Era bom que fosse tudo igual. — Não senhor, que a
gente não é rapadura. Eles não gostam de você? Gostam. Não gostam do anão, do
Fringo? Está aí. Em Cambacará não é assim, aborrecem-me por causa da minha
cabeça pelada e dos meus olhos. Tinha graça que o anão quisesse reduzir os
outros ao tamanho dele. Como havia de ser? — Eu sei lá! rosnou o sardento
amuado. O caso do anão é diferente. Parece que ninguém me entende. Vamos
procurar os outros? Capítulo Dezesseis Deixaram a artista e a representante da
indústria dos tecidos, andaram cinqüenta passos e foram encontrar os meninos
brincando na grama verde, fazendo um barulho desesperado. — Isto é agradável,
murmurou Raimundo. Tudo alegre, cheio de saúde... A propósito, ninguém adoece
em Tatipirun, não é verdade? — Adoece como? — Julgo que vocês não vão ao
dentista, não sentem dor de barriga, não têm sarampo. — Nada disso. — Não
envelhecem. São sempre meninos. — Decerto. — Eu já presumia. Pois é, meu caro.
Boa terra. Mas se todos fossem como o anãozinho e tivessem sardas, a vida seria
enjoada. O sardento pigarreou: — É difícil a gente se entender. As crianças
dançavam e cantavam, enfeitadas de flores, agitando palmas. — Viva a princesa
Caralâmpia! gritavam. Viva a princesa Caralâmpia, que levou sumiço e apareceu
de repente. Caralâmpia estava no meio do bando, vestida numa túnica azulada cor
das nuvens do céu, coroada de rosas, um broche de vaga-lume no peito, pulseiras
de cobras-de-coral. — Credo em cruz! gemeu Raimundo assombrado. Tire essa
bicharia de cima do corpo, menina. Isso morde. O vaga-lume tremelicou,
brilhante de indignação: — É comigo? — Não senhor, é conosco, informaram as
cobras. Aquilo é um selvagem. Na terra dele as coisas vivas mordem. — Viva a
Caralâmpia! repetia a multidão. Viva a princesa Caralâmpia! — Onde já se viu cobra
servir de enfeite? suspirava Raimundo. Que despropósito! — Deixe disso,
criatura, aconselhou Fringo, o menino preto. Você se espanta de tudo. Venha
falar com a Caralâmpia. — Eu sei lá falar com princesa! exclamou Raimundo
encabulado. — Ela é princesa de mentira, explicou Talima. É princesa porque tem
jeito de princesa. Veja, Caralâmpia. Este é o Pirundo, que veio de Cambacará. —
Pirundo não. Ficou estabelecido que eu me chamo Raimundo mesmo. — É. Ficou
estabelecido que ele se chama Raimundo mesmo. — Aproxime-se, convidou
Caralâmpia. Capítulo Dezessete O hóspede chegou-se a ela, desconfiado, espiando
as cobrinhas com o rabo do olho. Curvou-se num salamaleque exagerado: — Como
vai vossa princesência? — Princesência é tolice, declarou Pirenco. — Tolice é amarrar
cobras nos braços, replicou Raimundo. Onde já se viu semelhante disparate? —
Acabem com isso, ordenou Caralâmpia. Vamos deixar de encrenca. Por que é que
não pode haver princesência? Isso é uma arenga besta, Pirenco. Raimundo bateu
palmas: — Apoiado. Se há excelência, há princesência também. Está certo. —
Claro! concordou Talima. Se há Raimundo e Pirenco, há Pirundo também. Pirundo
está certo. — Não senhora. Pirundo está errado. — Pois está, concedeu Talima. —
Está mesmo. Para que dizer que não está? triunfou Raimundo. Então você é
princesa, hein? Como foi que você virou princesa? — Virando, respondeu
Caralâmpia. A gente vira e desvira. — Logo vi, murmurou Raimundo. Pois é. Uma
terra muito bonita a sua, princesa Caralâmpia. Estou com vontade de me mudar
para aqui. Se eu vier, trago o meu gato. É um gato engraçado, diferente de
vocês, com dois olhos verdes. E medroso, tem medo de rato. — Como é que ele se
chama? perguntou a princesa. — Não tem nome não. Mas eu vou botar um nome nele.
— Bote Pirundo, sugeriu Talima. — Boto nada! Vou procurar um nome bonito na
geografia. A propósito, aquele rio que fecha é mesmo o rio das Sete Cabeças? —
Sem dúvida, informou Sira. — Por que é que ele se chama rio das Sete Cabeças? —
Porque se chama. Sempre se chamou assim. — Muito obrigado. Eu podia botar esse
nome no meu gato. Mas ele só tem uma cabeça. — Bobagem! exclamou Pirenco. Gato
das Sete Cabeças! Quem já viu isso? Bote Tatipirun. — Tatipirun é bonito,
murmurou a princesa. — Pois fica sendo Tatipirun. Quando eu vier, trago
Tatipirun. Ele vai estranhar e miar no princípio, depois se acostuma. Vamos
brincar de bandido? — Aqui ninguém conhece esse brinquedo não, respondeu Sira.
Vamos correr, saltar, dançar. — Isso é cacete. — Pois vamos fazer o anão virar
príncipe. — Não dou para isso não, protestou o anãozinho. É melhor conversar
com os bichos. Vamos procurar um bicho que saiba histórias compridas e bonitas.
Capítulo Dezoito Partiram. Caminharam bem meia légua e encontraram uma guariba
cabeluda, que andava com as juntas perras, escorada num cajado, óculos no
focinho, a cabeça pesada balançando. Raimundo avizinhou-se dela, curioso: —
Como é, sinha Guariba? A senhora, com essa cara, deve conhecer história antiga.
Espiche uns casos da sua mocidade. — Eu não tive isso não, meu filho. Sempre
fui assim. — Assim coroca e reumática? estranhou Raimundo. — Assim como vocês
estão vendo. — Foi nada! A senhora antigamente era aprumada e vistosa. Sapeque
aí umas guerras do Carlos Magno. — Eu sei lá! Estou esquecida. Sou uma guariba
paleolítica. — Paleo quê? — Lítica. A princesa Caralâmpia arrepiou-se: — Que
barbaridade! Ela está maluca. — Não está não, atalhou Raimundo. Meu tio diz
essas atrapalhadas. É um homem que estudou muito, andou na arca de Noé e tem
óculos. Direitinho a guariba. É do tempo dela e usa palavrões difíceis. — Traga
também esse quando se mudar para aqui, lembrou Talima. — Ele não vem não. E não
vale a pena. É um sujeito ranzinza e paleo como? — Lítico, respondeu a guariba.
— Isso mesmo. Não vem não. Ele se enjoa de meninos, só gosta de livros. Um tipo
sabido como nunca se viu. — Não serve, decidiu Talima. Tem a palavra, sinha
Guariba. Conte uma história. Capítulo Dezenove — Eu conto, balbuciou o bicho
acocorando-se. Foi um dia um menino que ficou pequeno, pequeno, até virar
passarinho. Ficou mais pequeno e virou aranha. Depois virou mosquito e saiu
voando, voando, voando, voando... — E depois? perguntou Sira. A guariba velha
balançava a cabeça tremendo e repetia: — Voando, voando, voando... Fringo
impacientou-se: — Que amolação! Ela pegou no sono. Tinha pegado mesmo. E falava
dormindo, numa gemedeira: — Voando, voando, voando... — Vamos embora, pessoal,
convidou Sira. Ela não acaba hoje. O bicho começou a chorar. — Sou uma guariba
paleo... — Já sabemos, interrompeu Caralâmpia. Toca para frente, povo. Que
significará aquele nome encrencado? — Vou perguntar a meu tio, prometeu
Raimundo. Quando eu voltar aqui, explico a vocês. Capítulo Vinte A guariba
paleolítica ficou tiritando, acocorada, a gemer. — Dorminhoca! rosnou Sira. Que
teria acontecido ao menino que virou mosquito? — Parece que tornou a virar
menino, disse Fringo. — Não dá certo, gritou o anãozinho. É melhor continuar
mosquito. — Vamos consultar a guariba? — Não convém, interveio a princesa
Caralâmpia. Ela perdeu a bola. Voando, voando... Nunca vi animal tão idiota. —
Não senhora, protestou Raimundo. É um bicho sabido. Meu tio é aquilo mesmo,
sabido que faz medo. Mas não fala direito. Resmunga. E engancha-se nas
perguntas mais fáceis. A gente quer saber uma coisa, e ele se sai com umas
compridezas, que dão sono. Vai resmungando, resmungando e muda no fim, acaba
dizendo exatamente o contrário do que disse no princípio. — Isso é
insuportável, bradou Pirenco. Não tolero conversa fiada, panos mornos. — Nem
eu, concordou Talima. Pão pão, queijo queijo. — Preciso voltar e estudar a
minha lição de geografia, suspirou Raimundo. — Demore um pouco, pediu Talima.
Vamos ouvir a Caralâmpia. Por onde andou você quando esteve perdida,
Caralâmpia? A Caralâmpia começou uma história sem pé nem cabeça: — Andei numa
terra diferente das outras, uma terra onde as árvores crescem com as folhas
para baixo e as raízes para cima. As aranhas são do tamanho de gente, e as
pessoas do tamanho de aranhas. — Quem manda lá? São as aranhas ou a gente? perguntou
Raimundo. — Não me interrompa, respondeu Caralâmpia. Os guris que eu vi têm
duas cabeças, cada uma com quatro olhos, dois na frente e dois atrás. — Que
feiúra! exclamou Pirenco. — Não senhor, são muito bonitos. Têm uma boca no
peito, cinco braços e uma perna só. — É impossível, atalhou Fringo. Assim eles
não caminham. Só se for com muleta. — Que ignorância! tornou Caralâmpia.
Caminham perfeitamente sem muleta, caminham assim, olhe, assim. Pôs-se a saltar
num pé: — Para que duas pernas? A gente podia viver muito bem com uma perna só.
Tentaram andar com um pé, mas cansaram logo e sentaram-se na grama. Capítulo
Vinte e Um — Preciso voltar, murmurou Raimundo. O anãozinho chegou-se a ele e
soprou-lhe ao ouvido: — Tudo aquilo é mentira. Esta Caralâmpia mente!... Sira
agastou-se: — Mente nada! Por que é que não existem pessoas diferentes de nós?
Se há criaturas com duas pernas e uma cabeça, pode haver outras com duas
cabeças e uma perna. Este anão é burro. — Estão mexendo comigo, choramingou o
anãozinho. Mexem comigo porque eu sou miúdo. A princesa Caralâmpia puxou-o por
um braço, deitou-o no colo e embalou-o: — Não chore, nanico. Na terra que eu
visitei ninguém chora, apesar de todos terem oito olhos, quatro azuis e quatro
pretos. As árvores têm as raízes para cima, as folhas para baixo e dão frutas
no chão. Os frutos são enormes, as pessoas são como as aranhas. — Onde fica
essa terra, Caralâmpia? perguntou o sardento. — Não muito longe, no fim do
mundo, respondeu a princesa. A gente chega lá voando. — Como o mosquito da
guariba, interrompeu o anão. Desconfio disso. Gente não voa. — Ora não voa!
exclamou Raimundo. Em Cambacará os homens voam. — Voam de verdade ou de
mentira? inquiriu Talima. — Voam de verdade. Antigamente não voavam, mas hoje
andam pelas nuvens em aviões, uns troços de metal que fazem zum... Certamente a
Caralâmpia viajou num deles. — Não foi não, disse Caralâmpia. Entrei num
automóvel. — Os automóveis aqui andam pelos ares, eu sei, confirmou Raimundo. —
Pois é. Entrei, mexi numa alavanca, o automóvel subiu, subiu, passou a lua, o
sol e as estrelas. — E chegou à terra dos meninos duma perna só, grunhiu o
anãozinho. Não creio. — Coitado, murmurou Talima. Este anão é um infeliz. Não
faça caso, Pirundo. — A senhora me troca sempre o nome. Eu já lhe disse um
milhão de vezes que me chamo Raimundo. Capítulo Vinte e Dois — Isso mesmo.
Fique com a gente. Aqui é tão bom... — Não posso, gemeu Raimundo. Eu queria
ficar com vocês, mas preciso estudar a minha lição de geografia. — É
necessário? — Sei lá! Dizem que é necessário. Parece que é necessário. Enfim...
não sei. Aí Raimundo entristeceu e enxugou os olhos: — É uma obrigação. Vou-me
embora. Vou com muita saudade, mas vou. Tenho saudade de vocês todos, as
pessoas melhores que já encontrei. Vou-me embora. — Volte para viver conosco,
pediu Caralâmpia. — É, pode ser. Se acertar o caminho, eu volto. E trago o meu
gato para vocês verem. Não deixe de ser princesa não, Caralâmpia. Você fica
bonita vestida de princesa. Quando eu estiver na minha terra, hei de me lembrar
da princesa Caralâmpia, que tem um broche de vaga-lume e pulseiras de
cobras-de-coral. E direi aos outros meninos que em Tatipirun as cobras não
mordem e servem para enfeitar os braços das princesas. Vão pensar que é
mentira, zombarão dos meus olhos e da minha cabeça pelada. Eu então ensinarei a
todos o caminho de Tatipirun, direi que aqui as ladeiras se abaixam e os rios
se fecham para a gente passar. Raimundo afastou-se lento e procurou
orientar-se. Os outros o seguiram de longe, calados. Andaram até o rio. Lá
estavam à margem, perto do tronco, os sapatos e a roupa. O garoto escondeu-se
no mato, vestiu-se de novo, tornou a pendurar no ramo a túnica azul que a
aranha lhe tinha dado. — Devolução? perguntou o bichinho. — É, dona Aranha.
Muito obrigado, não preciso mais dela. — Quer dizer que volta para Cambacará,
não é? coaxou a rã na beira da poça. — Volto, sim senhora. Volto com pena, mas
volto. — Faz tolice, exclamou o tronco. Onde vai achar companheiros como esses
que há por aqui? — Não acho não, seu Tronco. Sei perfeitamente que não acho.
Mas tenho obrigações, entende? Preciso estudar a minha lição de geografia.
Adeus. Capítulo Vinte e Três Atravessou o rio com um passo. As crianças peladas
foram encontrá-lo. Caminharam algum tempo e chegaram à serra de Taquaritu. Aí
Raimundo se despediu: — Adeus, meus amigos. Lembrem-se de mim uma ou outra vez,
quando não tiverem brinquedos, quando ouvirem as conversas das cigarras com as
aranhas. Fiquei gostando muito delas, fiquei gostando de vocês todos. Talvez eu
não volte. Vou ensinar o caminho aos outros, falarei em tudo isto, na serra de
Taquaritu, no rio das Sete Cabeças, nas laranjeiras, nos troncos, nas rãs, nos
pardais e na guariba velha, pobrezinha, que não se lembra das coisas e fica
repetindo um pedaço de história. Quero bem a vocês. Vou ensinar o caminho de
Tatipirun aos meninos da minha terra, mas talvez eu mesmo me perca e não acerte
mais o caminho. Não tornarei a ver a serra que se baixa, o rio que se fecha
para a gente passar, as árvores que oferecem frutos aos meninos, as aranhas
vermelhas que tecem essas túnicas bonitas. Não voltarei. Mas pensarei em vocês
todos, no Pirenco e no Fringo, no anãozinho e no sardento, na Sira, na Talima,
na Caralâmpia. Você me troca sempre o nome, Talima. E eu quero bem a você, ando
até com vontade de virar Pirundo, para não teimarmos se ainda nos virmos.
Lembre-se do Pirundo, Talima. Longe daqui, fecharei os olhos e verei a coroa de
rosas na cabeça da Caralâmpia, o broche de vaga-lume, as pulseiras de
cobras-de-coral. Adeus, meus amigos. Que fim terá levado o menino da guariba?
Quando um mosquito zumbir perto de mim, pensarei nele. Pode ser que esteja
zumbindo o menino que a guariba deixou voando. Pobre da guariba. Está
balançando a cabeça, falando só, e não acorda. Eu volto um dia, venho conversar
com ela, ouvir o resto da história do menino que virou mosquito. E hei de
encontrar a Caralâmpia com as mesmas rosas na cabeça, o vaga-lume aceso no
peito, as cobras-de-coral nos braços. Vou prestar atenção ao caminho para não
me perder quando voltar. E trarei uns meninos comigo. Os meninos melhores que
eu conhecer virão comigo. Se eles não quiserem vir, trago o meu gato, que é
manso e há de gostar de vocês. Adeus, seu Fringo. Adeus, seu Pirenco. Sira,
Caralâmpia, todos, adeus! Não é preciso que me acompanhem. Muito obrigado, não
se incomodem. Eu acerto o caminho. Adeus! Lembre-se do Pirundo, Talima.
Raimundo começou a descer a serra de Taquaritu. A ladeira se aplanava. E quando
ele passava, tornava a inclinar-se. Caminhou muito, olhou para trás e não
enxergou os meninos que tinham ficado lá em cima. Ia tão distraído, com tanta
pena, que não viu a laranjeira no meio da estrada. A laranjeira se afastou,
deixou a passagem livre e guardou silêncio para não interromper os pensamentos
dele. Agora Raimundo estava no morro conhecido, perto de casa. Foi-se chegando,
muito devagar. Atravessou o quintal, atravessou o jardim e pisou na calçada. As
cigarras chiavam entre as folhas das árvores. E as crianças que embirravam com
ele brincavam na rua.
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