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quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

INCENSO, FILME PERNAMBUCANO A PARTIR DA OBRA DE ASCENSO FERREIRA




Diretor, roteirista e artista plástico, Marco Hanois faleceu em de novembro de 2007, aos 42 anos. Como realizador de TV, Vídeo e Cinema, o artista tem no seu currículo mais de 10 curtas-metragens. Entre seus trabalhos mais conhecidos estão: “Cassino Americano” (diálogos do professor Moisés Monteiro de Melo Neto) Odoyá (adaptado pelo professor da Universidade de Pernambuco Moisés Monteiro de Melo Neto), premiado no Festival de Vídeo de Tokyo, “Chega de Cangaço”, exibido pela TV Globo, “Objeto Abjeto”, vencedor do prêmio de roteiro do 45º Salão de Artes de Pernambuco e melhor documentário do VI Festival de Vídeo do Recife e o mais recente “Incenso”, que recebeu o prêmio de roteiro no Concurso Firmo Neto – Edição 2005, da Prefeitura da Cidade do Recife e foi contemplado com o 2º Edital do Programa de Fomento à Produção Audiovisual de Pernambuco/ 2009 para finalização.

Ivonete melo em cena de INCENSO, o filme


Marco Hanois, Moisés Monteiro de Melo Neto e parte da equipe do filme INCENSO




Incenso na Escola aborda a obra de Ascenso Ferreira

Projeto foi contemplado no Sistema de Incentivo à Cultura de Pernambuco

Publicado em 16/05/2011, às 19h31
Do JC Online
Começou nesta segunda-feira (16/05), na cidade de Salgueiro, interior do Estado, o projeto Incenso na Escola, que visa o reconhecimento da literatura pernambucana, através da leitura cinematográfica de Marcos Hanois, cineasta que filmografou a poesia de Ascenso Ferreira no curta-metragem Incenso. O filme será exibido em escolas de dez cidades pernambucanas - Salgueiro, Exu, Santa Maria da Boa Vista, Floresta, Serra Talhada, Arcoverde, Nazaré da Mata, Palmares, Jaboatão dos Guararapes e Recife - e será seguido de debate com o pesquisador, doutor em Letras pela UFPE, dramaturgo  Moisés Monteiro de Melo Neto, que escreveu vários roteiros para cinema com Marco Hanois e fez a assistência de direção deste INCENSO, e performance poética da atriz Daniela Câmara.
Contemplado no Sistema de Incentivo à Cultura - SIC/PE, o Incenso na Escola ainda vai distribuir cinco mil cordéis inéditos para as Bibliotecas Públicas dos locais percorridos. O trabalho segue até o dia 9 de junho, quando o projeto chega a Recife, onde será realizado na Escola Estadual Ginásio Pernambucano. O Incenso na Escola é uma realização do Funcultura, Fundarpe e Secretaria de Educação/Governo de Pernambuco, com o apoio das Prefeituras Municipais/ Secretarias de Educação, da editora WMF Martins Fontes e da TV Pernambuco. O serviço completo de cada cidade pode ser conferido no blog www.incensonaescola.blogspot.com



SINOPSE





Numa imaginária cidade da Zona da Mata de Pernambuco, a vida, os costumes, as crenças, o jeito de ser, pensar e falar das pessoas comuns. O Coronel, o Padre, o Catimbozeiro, o Cachaceiro, a Beata e uma série de tipos que compõem um contexto cultural e humano. A voz do povo do Nordeste do Brasil, captada pelo poeta Ascenso Ferreira e adaptada para o cinema. O contraste entre o arcaico e o moderno, simbolizado pela Usina, pelo Cinema e o Zeppelin, uma sociedade dividida em classes, um povo emotivo, sentimental e místico, como os versos de Ascenso Ferreira, numa viagem ao coração da alma brasileira.




 Parte do roteiro de INCENSO

A História se passa nos anos 30 do século 20


1 – Ext/Dia – P.G. Canavial, céu, vento balança as folhas das canas.

1a – Estrada de terra corta o canavial. Carro de boi carregado de cana passa pela estrada. Uma placa indica o caminho do Engenho Esperança.

1b – Usina de açúcar no meio da paisagem verde. Usina.

1c – O carro de boi segue na perspectiva da estrada.

1d – Canas Passam (P.V. do Carreiro).

2 – Ext/Dia – P.G. canavial, estrada, carro de boi visto de uma posição mais alta – correção – casa grande, o senhor de engenho observa o carro de boi que passa lá embaixo, depois vira-se  para alguém fora de quadro e grita, depois aproxima-se Zé Estribeiro.

Coronel – Ô Zé Estribeiro! Zé Estribeiro!

Zé (off) – Inhôôr!

Coronel – Quantos litros de leite deu a vaca cumbuca?

Zé (off) – 25, seu Curuné.

Coronel – E a vaca malhada?

 – 27 seu Curuné.

Coronel  – E a vaca Pedrês?

­­Zé – 35 seu curuné.

Coronel – Só?! Diabo, os meninos hoje não tem o que mamar.

3 – Ext/Dia – Mãos de menino com castanhas de caju.

3a – Estrada de terra do canavial. Na beira da estrada estão alguns meninos pobres que brincam de castanha. O carro de boi passa por eles.

3b – Um dos meninos vê algo e avisa para os outros.

Menino 1 – O arco-íris!

3c – (P.V. o Menino) Campo. Arco-íris no céu.

3d – Os meninos correm pelo campo. O menino 2 grita. (aproxima-se da câmera).

Menino 2  – Está bebendo água no riacho.

3e – (Contra Plano) Meninos correm na perspectiva por uma outra estrada. Uma placa indica o caminho do engenho “Estrela D`alva”.

Menino 3  – Vamos cercá-lo. Vamos cercá-lo!

3f – (Traveling de) Crianças correm e gritam uns para os outros. Passam pela estrada de terra.

Menino 1 – Vamos passar nele por baixo!

Menino 2  – Vamos passá-lo... Vamos passá-lo!

3g – (traveling para trás) Menino corre olhando para o horizonte, sorrindo e grita para os outros.

Menino 3  – Fugiu do Riacho... Subiu o Monte...

4 – Ext/Dia – Riacho, crianças correm até o riacho. Param de correr, cansados.

Menino 2  – Vamos pegá-lo... Vamos pegá-lo.

4a– P.P. dos meninos cansados, ofegantes (Pan).

4b – P.M. menino 1 salta no riacho.

4c – P.A. (câmera baixa) Menino 2 salta no rio.

4d – P.P. Água do rio sacudida pelo mergulho de menino.

4e – P.G. Riacho, menino 1 e 2 nadam na água do rio. Menino 3 mergulha no rio. Uma placa indica a direção para o engenho “Flor do Bosque”.

5 – Int/Dia – Menino estudante olha pela janela gradeada da sala de aula, ele observa os meninos brincando lá fora.

6 – Ext/Dia – Riacho, meninos, nadam. (P.V. do estudante).

7 – Int/Dia – Na sala de aula o estudante observa os meninos brincando. Quando ouve a voz do homem, o estudante vira-se assustado.

Professor (off)  – As armas e os barões assinalados.

7a – Sala de aula, diante de um quadro negro e atrás de um birô cheio de livros grossos empilhados, o professor, irritado com a distração do aluno, pergunta.

Professor  – Quantas orações?

7b – P.P. do estudante que hesita e não responde.

7c – P.A O professor fica impaciente e faz logo outra pergunta.


Professor – Qual é o maior rio da China?

7d – P.P.P. – Palmatória pendurada na parede.

7e – O professor risca com giz uma equação no quadro negro e vira-se para continuar a perguntar ao aluno.

Professor – A2 + 2AB igual a quanto?

7f – P.P. O estudante fica cada vez mais angustiado com as perguntas.

Professor (off) – Que é curvilíneo, convexo?

7g – P.M. Sala de aula, o professor acena para que o estudante se aproxime, o estudante obedece e aproxima-se temeroso.

Professor – Menino, vem dar sua lição de retórica.

7h – P.A. Estudante na frente do quadro negro fala decorado depois para o professor que faz uma expressão de aprovação.

Estudante – “Eu começo, atenienses, invocando a proteção dos deuses do Olimpo para os destinos da Grécia”.

Professor  – Muito bem! Isto é do grande Demóstenes. Agora a de francês.

7i – Detalhe das mãos nervosas do professor.

7j – (P.V. do professor – câmera alta) P.A. do estudante, nervoso, esforçando-se para não errar. Concentra-se e fala num francês com sotaque nordestino.

Estudante – “Quand le christianisme avait apparu sur la terre...”

7k – Plano detalhe da boca do professor.

Professor – Basta.

7l – (P.V. do Estudante – câmera baixa) P.A do professor ameaçador.

Professor  – Hoje temos sabatina... o argumento é a bolo! Qual é a distância da terra ao sol?

7m – Detalhe do rosto do estudante, suando, nervoso, não consegue lembrar, não consegue falar. Olho do estudante.

7n – (P.V. do estudante – câmera baixa) P.P. O professor está zangado e pega a palmatória da parede.

Professor – Não sabe? Passe a mão à palmatória.

7o – Detalhe da mão do estudante aberta, recebendo a palmada do professor.

7p – P.A. O professor ameaça o aluno, que tenta segurar o choro, soluçando. Ouve-se o sino encerrando a aula.

Professor – Bem, amanhã quero isso de cor.


8 – Int/Dia – Sino tocado pela secretária no corredor da escola. Alguns alunos passam.

9 – Ext/Dia – P.M. Rua, escola, alunos saem da escola para a rua. Algumas mães acompanham. O menino que apanhou passa acompanhado de uma velha. Câmera acompanha (traveling) a velha e o estudante até passarem por uma casa. Janela da casa onde se vê Dona Nina e a mulher.

10 – Int/Dia – Casa de D. Nina, sala, próximo à janela estão D. Nina e a mulher. Conversam. A mulher folheia uma revista e mostra à D. Nina, ao fundo, na rua algumas crianças passam, saindo da escola.

10a – Detalhe da revista que a mulher mostra para D. Nina. Fotos de filmes.

Mulher (off) – ... Mas D. Nina, aquilo que é o tal de cinema?

10b – A mulher segura a revista e fala em tom de censura para D. Nina que escuta atentamente, enquanto faz um trabalho manual (bordado, costura ou renda).

Mulher – O homem saiu atrás da moça, pega aqui, pega acolá, pega aqui, pega acolá, até que pegou-la.

10c – D. Nina espanta-se (pan – correção) para a mulher que continua o relato.

Mulher – Pegou-la e sustentou-la. Danou-lhe beijo, danou-lhe beijo, danou-lhe beijo.

(inclusão de uma cena de filme do ciclo do Recife, “A Filha do Advogado”)

10d – (close) da Mulher que continua a falar para D. Nina.

Mulher – ... Depois entraram pra dentro dum quarto! Fez-se aquela escuridão (...)

10e – Detalhe da boca da mulher falando.

Mulher – (...) e só se via o lençol bulindo...

10f – D. Nina escuta horrorizada o que a mulher está dizendo, faz uma expressão de desgosto, benze-se, pensa um pouco, olha pela janela e vê algo que não gosta.

Mulher (off) – Me diga uma coisa D. Nina. Isso presta pra moça ver?

11 – Ext/Dia – (P.V. de D. Nina) Na rua, Chiquinha conversa com alguns rapazes que cortejam-na, um deles toca-lhes os cabelos e fala coisas no ouvido dela que ri. O rapaz dá uma flor para Chiquinha.

D. Nina (off) – Entra pra dentro Chiquinha...

12 – Int/Dia – Da janela D. Nina grita para Chiquinha.

D. Nina – Entra pra dentro Chiquinha! No caminho que você vai você acaba prostituta.

13 – Ext/Dia – Rua, os rapazes afastam-se rindo, Chiquinha despede-se e caminha para casa. (aproxima-se da câmera)

Chiquinha – Deus te ouça, minha mãe... Deus te ouça.

13a – Ext/Dia – Na rua, Chiquinha passa em direção à casa, o cachaceiro observa-a e fala, não para ela, mas para o copo cheio de cachaça.

Cachaceiro – Branquinha, branquinha, é suco de cana caiana, pouquinho é rainha, muitão é tirana.

14 – Int/Dia – Copo d`água é colocado sobre a mesa. (câmera corrige revelando) o coronel que lê uma carta, um bilhete. O coronel acaba de ler, guarda o papel no envelope e deixa-o perto do copo, chama a mulher.

Coronel – Ô Maria! Maria! Cumpadre Cazuza vem almoçar amanhã aqui em casa (...)

14a – P.P.P. O coronel fala com a mulher.

Coronel – Que é que tu preparaste pra ele?

14b – Sala, Maria chega de outro cômodo, aproxima-se do marido e conversa com ele.

Maria ­– Eu matei uma galinha, matei um pato, matei um peru, mandei matar um cevado...

14c – close do coronel.

Coronel – Oxente, Mulher! Tú estás pensando que cumpadre Cazuza é pinto? Manda matar um boi!

15 – Int/Noite – Boi de brinquedo feito de barro, quarto de dormir. Na rede, o estudante é embalado pela velha.

Velha – ... Lindas histórias do reino da mãe d´água. ... Tomar a benção à lua nova...

16 – Ext/Noite – Casa Grande. Janela do quarto de dormir, luz fraca. (Câmera corrige para pátio, grupo de homens tomam café, fumam, conversam.

Peão – O avô de Zé Pinga-Fogo amanheceu morto na mata com o peito varado pela canela do Pé-de-Espeto.

16a – O vigia bebe café e conversa com os outros (depois correção para o Zé Estribeiro que também fala).

Vigia – O cachorro de Brabo-Manso levou, sexta-feira passada, uma surra das caiporas.

Zé Estribeiro – A Mula-de-Padre quis beber o sangue da mulher de Chico Lolão...

16b – Close de Zé Estribeiro que continua a história enquanto acende um cigarro de palha num lampeão.

Zé Estribeiro – ... Lá embaixo, a almanjarra, a rara almanjarra gemia e rangia, que o engenho Alegria é bom moedor...

17 – Ext/Dia – Pasto, bois e cavalos pastam. (pan). Bois passam tangidos por vaqueiro.

Vaqueiro (off) – Eh, andorinha! Eh, moça-branca! Eh, Beija-flor!

18 – Ext/Noite – Os homens escutam impressionados o relato de Zé Estribeiro que fala e gesticula.

Zé Estribeiro – ... Foi quando se deu a coisa esquisita: mordendo, rinchando e aos pulos, se pondo de pé...

18a – Close de Zé Estribeiro falando para os outros.

Zé Estribeiro – Com artes do cão, surgiu uma besta, sem ser dali não.

19 – Ext/Dia – Crepúsculo – Cavalos passam na contra-luz, silhuetas, patas galopando, corda é lançada, mão do vaqueiro puxa a corda, patas de cavalos, poeira.

Vaqueiro (off) – - Atalha a bicha, Baraúna!
- Sustenta o laço, maracanã!

20 – Ext/Noite – Zé Estribeiro continua o relato próximo do lampião.

Zé Estribeiro – ... E a besta agarrada entrou na almanjarra.

21 – Ext/Crepúsculo – Próximo ao engenho, homens aproximam-se com pedaços de pau, chicotes, galhos de árvores, tochas.

22 – Int/Noite – Tochas iluminam mãos com cacetes e chicotes. Mãos armadas com paus e galhos atacam, golpeiam. Escutam-se os ruídos dos golpes, o relinchar da besta e o bater dos cascos no chão. O sangue molha a almanjarra.

23 – Ext/Dia – Amanhece o dia, sol nascente. Escuta-se ainda os ruídos dos golpes e o relinchar da besta, cantar de galo.

24 – Ext/Noite – Close de Zé Estribeiro que toma café e continua o relato.

Zé Estribeiro – Depois que ela foi solta, entupiu no oco do mundo... num abrir e fechar de olhos, a maldita se encantou.

24a – Zé Estribeiro finaliza a narrativa, observado pelos outros dois. Detalhe do lampião. Fogo.

Zé Estribeiro – De tardinha, gente vinda da cidade trouxe a nova de que a ama do padre serrador amanhecera tão surrada que causava compaixão.

25 – Int/Dia – Chamas, velas acesas, o oratório, várias imagens de santos, corrige revelando casa do Padre. O padre com um tufo de algodão embebido em um remédio passa com cuidado o algodão nos ferimentos (escoriações e hematomas) que cobrem o corpo da ama. Ela está semi-despida com os pés dentro de uma bacia ou tina. A ama geme a cada toque do padre. Ouvem-se batidas na porta da frente. O padre interrompe o que está fazendo, cobre-a com um pano e vai atender a porta.

25a – Antes de abrir a porta, o padre olha por um buraco para ver quem são os visitantes.

26 – Ext/Dia – (P.V. do padre) Visão parcial (através do buraco). D. Nina e a mulher esperam que ele abra a porta.

27 – Int/Dia – Na sala, o padre fica entediado com a presença das duas e caminha na ponta dos pés para que elas não escutem  e desistam. As mulheres continuam a bater na porta, ouve-se a voz de D. Nina.

D. Nina (off) – Seu vigário!

28 – Ext/Dia – Na frente da casa do padre, D. Nina bate na porta e grita para dentro da casa. A mulher traz nas mãos uma galinha. A porta vai abrindo-se lentamente.

D. Nina – Está aqui esta galinha gorda que eu trouxe pro mártir São Sebastião!

Padre – Está falando com ele! Está falando com ele!

29 – Int/Dia – São Sebastião ocupa um lugar de destaque no meio das garrafas e outros produtos vendidos na bodega onde está o cachaceiro que toma outra lapada.

Cachaceiro – - Adeus, mamãe de Loanda!
- Adeus, meu filho Nogueira! O que tu viste na feira?

29a – Copo de cachaça é enchido (P.P.P.) Mão pega o copo e ergue-o.

Cachaceiro – Cair dez de cada banda.

29b – O cachaceiro contempla o copo de cachaça momentos antes de bebê-lo.

Cachaceiro – Simeão por terra bêbo, Rafael no chão deitado...
Minha mãe, venha mais branda
Que em jejum eu te arrecebo.

29c – Detalhe da mão segurando o copo e deixando pingar um pouquinho pro santo.

30 – Int/Noite – Água escorre (tilt down), mãos são lavadas. (Traveling para trás revelando) o coronel lavando as mãos, termina. Maria entrega-lhe uma toalha. O coronel comenta algo com ela e sai.

Coronel – Os olhos brilhantes de cocainômano parecem ter coisas para me contar.

30a – Ext/Int – No terraço está Pedro Velho olhando para o céu. Pela porta aparece o coronel que se aproxima de Pedro Velho e também olha para o céu.

Coronel – Pedro Velho, cadê o teu engenho?

30b – Primeiro plano de Pedro Velho, desolado, responde ao coronel sem tirar os olhos do horizonte.

Pedro Velho – A usina passou no papo.

30c – P.A. O coronel coloca a mão no ombro de Pedro Velho.

Coronel – E onde vais fundar safra este ano?

30d – Rosto de Pedro Velho, os olhos injetados, voz embargada.

Pedro Velho – Na barriga da mulher, na barriga da mulher.

30e – Pedro Velho fica olhando para o céu, o coronel se afasta, entra pela porta da sala.

30f – Os olhos de Pedro Velho, brilhando.

31 – Ext/Noite – Lua Cheia.

32 – Int/Noite – Na sala, o coronel vai até um móvel, tira uma garrafa de Whisky escocês e dois copos, vai voltando para o terraço, passa por Maria que está tocando piano e comenta...

Coronel – Os olhos brilhantes parecem, agora, duas poças d`água tremendo ao luar.

33 – Ext/Noite – Lua cheia.

34 – Ext/Noite – Igreja, lá dentro, luzes acesas, vozes. Na porta, rapazes olham para dentro. O homem se aproxima dos rapazes que estão na porta e entra.

35 – Int/Noite Altar adornado.

Rapaz 1 – (voz off) Parece um ninho de noivado...

35a – (pan) Rapaz que está na porta comenta algo, o amigo ao lado inspira o cheiro que vem de dentro da igreja e comenta, um terceiro rapaz também fala.

Rapaz 1 – E a gente chega a interrogar se Nossa Senhora vai se casar...

Rapaz 2 – Hum... perfume de rosas no ar trescala.

Rapaz 3 – São as rosas de carne que há na sala.

35b – Moças rezam baixinho. Uma morena, uma loura e uma pálida.

35c – O homem que havia entrado observa o culto, benze-se.

35d – Close no rapaz 1 que fala baixo como se rezasse.

Rapaz 1 – Oh perfumosas e puras rosas pálidas como açucenas.

35e – Diante do altar, o padre dá prosseguimento ao culto.

Padre – Kirie eleison...

Todos (off) – Kirie eleison

35f – O homem observa atentamente o padre, depois muda a direção do olhar e muda a expressão para uma expressão de fascínio, emoção.

35g – (P.V. do homem) A mulher que está especialmente bonita, reza.

Mulher – Oh mãe castíssima! Oh vaso espiritual! Oh espelho da justiça.

35h – Rosto de Chiquinha que também reza.

Chiquinha – - Oh rainha concebida sem pecado original!
- Oh consolação dos aflitos
- Oh senhora dos infinitos.

35I – Moça 1 reza (pan). Moça 2 também reza.

Moça 1 – Oh torre de Davi! Oh estrela da manhã! Oh escada de Jacó!

Moça 2 – Oh rosa de sião! Oh lírio de Jericó! Oh rainha cristã! Oh...

35j – Moças rezam ao mesmo tempo.

Moças – Rogai por nós que recorremos a voz.

35k – No altar, o incenso queima.

35l – O homem comenta consigo mesmo.

Homem – O mês de maio vai terminar.

35m – As moças com “seus deliciosos braços nús, fazem o sinal da cruz”.

Moças – Amém.

35n – Ext/Noite - O homem acompanha com o olhar a mulher que vai saindo da igreja.

36 – Ext/Noite – Na frente da igreja, fiéis saem, rapazes flertam. D. Nina, Chiquinha e a mulher passam.

37 – Int/Noite – Tambor é percutido por mãos de homem negro. Ouve-se o batuque e vozes cantando.

Vozes (off) – Mestre Carlos, Rei dos Mestres, aprendeu sem se ensinar...

37a – Terreiro de Umbanda. Homens e mulheres dançam em círculo, sentado, mestre Carlos faz sinal para que o homem se aproxime. Ele chega e se ajoelha diante de mestre Carlos.

Todos (cantando) – Ele reina no fogo! Ele reina na água! Ele reina no ar!

37b – Mestre Carlos bate com uma folha de pinhão roxo na cabeça, nos ombros, faz um sinal da cruz na testa e no peito do homem que reza contrito. Depois mestre Carlos passa incenso ao redor do homem. Mestre Carlos sussurra no ouvido do homem que repete em voz alta.

Homem – Por isso, em minha amada acenderá a paixão que consome! Umedecerá sempre em sua lembrança o meu nome! Levar-lhe-á o perfume do incenso que vivo a lhe queimar.

37c – Close do homem falando concentrado.

Homem – E ela há de me amar... Há de me amar... Há de me amar...

37d – Mestre Carlos passando incenso interfere na oração.

Mestre Carlos – Como a coruja ama a treva e o bacurau ama o luar.

37e – O homem cercado pela fumaça do incenso continua a prece sussurrada por mestre Carlos.

Homem – À luz do sete estrelo nós havemos de casar e há de ser bem perto. Há de ser tão certo como este mundo tem de se acabar...

37f – Mestre Carlos se aproxima do homem com uma garrafa de cachaça, dá ao homem que toma um grande gole e depois fala para mestre Carlos. A fumaça cobre tudo.

Homem – Foi a jurema de sua beleza que embriagou os meus sentidos! Eu vivo tão triste como os ventos perdidos que passam gritando na noite enorme...

38 – Int/Noite – Na cama entre lençóis, o corpo da mulher dormindo, tendo um sonho erótico, ela se acaricia. As mãos nos lábios, na pele, nos cabelos, nos seios. Tudo à “meia-luz”. Depois ela desperta suada, ofegante. A voz do homem e a voz da mulher misturam-se.

Homem (off) – Mulher(in) – Porque quero gozar o viço que no seu lábio estua, quero sentir sua carícia branda como um raio de lua, quero acordar a volúpia que no teu seio dorme.

39 – Int/Noite – Terreiro de umbanda, o homem continua o ritual.

39/0 – Mãos batem no tambor

Homem – E hei de tê-la, hei de vencê-la, ainda mesmo contra seu querer... Porque de mestre Carlos é grande o poder.

39a – Mãos batem nos tambores freneticamente.

39b – O homem fecha os olhos enquanto mestre Carlos incensa-o novamente.

Mestre Carlos – Pelas três Marias... Pelos três Reis Magos... Pelo Sete Estrelo...

39c – Rosto de mestre Carlos, sério, concentrado.

Mestre Carlos – Eu firmo esta intenção, bem no fundo do coração, e o signo de Salomão ponho como selo...

39d – Mestre Carlos anda ao redor do homem que está quase em transe.

Homem – E ela há de me amar... Há de me amar... Há de me amar...

Mestre Carlos – Como a coruja ama a treva e o bacurau ama o luar.

39e – Terreiro, o homem levanta-se ao lado de mestre Carlos, as pessoas dançam em círculo cantando, com mais intensidade.

Todos – ... Mestre Carlos Rei dos Mestres. Reina no fogo... Reina na água... Reina no ar.

40 – Ext/Dia – Sol nasce, canavial.

Todos(off) – ... Ele aprendeu sem se ensinar.

41 – Ext/Dia – Rua da cidade. O cachaceiro está deitado no chão. Acorda-se, levanta-se, bebe no gargalo da garrafa. Cambaleia, apruma-se, arruma-se e caminha pela rua.

Cachaceiro – Em jejum eu te arrecebo cuma xarope dos bêbo... tu puxas eu arrepuxo, bates comigo no chão, bato contigo no bucho. Adeus mamãe de Luanda. Adeus meu filho Nogueira.

42 – Int/Dia – Diante de um espelho, no quarto, o coronel endireita o nó da gravata, a mulher também se apronta, borrifa perfume.

43 – Ext/Dia – Canavial, riacho, as crianças passam correndo. Placa “Engenho Bom Mirar”.

44 – Ext/Dia – Na frente da igreja, a secretária, o professor e o padre.

45 – Ext/Dia – Porta da frente da casa de D. Nina abre-se. A mulher está do lado de fora da casa aguardando D. Nina e Chiquinha que saem. As três caminham juntas.

46 – Ext/Dia – Na frente da casa grande todos esperam olhando para o céu. (Coronel, Maria, Zé Estribeiro, Peão, Vigia).

47 – Ext/Dia – Frente da Igreja. Pequena aglomeração.

47a – A secretária está cansada. O padre está suando e enxuga-se com um lenço.

48 – Ext/Dia na cidade. O bêbado passa e percebe que todos estão parados olhando para o céu.

48a – Todos ficam virados para a mesma direção e olham para o céu.

48b – Os rostos das pessoas olhando para o céu.

49 – Ext/Dia – Aéreas de canaviais, velho engenho, usina, paisagem aérea da zona da mata de Pernambuco.

Piloto (off) – WZ! KDKA! UZQP!

Voz Rádio (off) – Alô Zeppelín! Alô Zeppelín! Jequiá!

50 – Int/Dia – Estação de rádio. Operador de rádio tenta fazer contato com o Zeppelin ou outro operador de rádio.

Operador de Rádio – Usted me puede dar nuevas dez Zepelin?

50a – Close do operador de rádio.

Op. Rádio – Dove il Zeppelin?

51 – Ext/Dia – (pan) Nuvens, céu.

Op. Rádio (off) – Where is the Zepelling?

52 – Ext/Dia – Fotos aéreas de Fernando de Noronha.

Op. Rádio 2 (off) - Passou agorinha em Fernando de Noronha, ia fumaçando.

53 – Ext/Dia – (Arquivo – filme da época) Zeppelin no céu.

Op. Rádio 3 (off) – Chegou em Natal! Augusto Severo, acorda de teu sono bichão.

54 – Int/Dia – Close do operador de rádio.

Op. Rádio ­– Alô Zeppelin! Alô Zeppelín!

55 – Ext/Dia – (arquivo – filme de época) Zeppelin voando.

Piloto (off) – Rádio! Rádio! Rádio! QZQPQP. GQAA…

56 – Ext/Dia – (tilt down) Pessoas (D. Nina, a mulher, o cachaceiro, o padre, as crianças, etc...) que olham para o céu. Uma menina é a primeira que vê.

Menina – Apontou!

Padre – Parece uma baleia se movendo no mar!

56a – (pan) Cachaceiro comenta, ao lado, Dona Nina benze-se e também comenta. Chiquinha também fala.

Cachaceiro  – Parece um navio avoando nos ares.

D. Nina – Credo, isso é invento do cão.

Chiquinha – Ó coisa bonita danada.

56b – Close do Cachaceiro.

Cachaceiro – Viva seu Zé Pelin!

56c – menina vibra.

Menina – Vivô!

57 – Ext/Dia – Zeppelin voando (imagens da época).

Piloto (off) – Deutschland uber Alles!

58 – Ext/Dia – O cachaceiro olhando para o Zeppelin que passa.

Cachaceiro – Olá, seu ferramenta, você sobe ou se arrebenta?

59 – Ext/Dia – (fotos da época) Zeppelin no solo pernambucano, oficiais alemães, populares. (foto do Zeppelin no jornal).

60 – Ext/Dia – (Fazenda, curral. Perto do curral, conversam Zé Estribeiro e meninos. Riem.

Zé Estribeiro  – O Coronel não gostava de apelido. Assim por volta das seis horas da tarde, ele estava sentado no terraço da Casa Grande, passeando prá lá e prá cá, quando aparece um sujeitinho...

61 – Ext/Noite – Campo, casa grande, o coronel na cadeira de balanço no terraço.

61a – O coronel avista alguma coisa.

61b – Um homem pobre aproxima-se da casa grande. Os cachorros latem. O coronel observa o homem pobre.

61c – Zé Estribeiro e depois mais dois peões vêem ver quem é.

61d – O homem pobre tira o chapéu respeitosamente, quando fica próximo à casa grande, pára e fala com o coronel.

Homem Pobre – Bom noite, seu curuné.

Coronel – Bom noite!

61e – Close do homem pobre.

Homem Pobre – Seu curuné, não tem um servicinho por aí pra mim não?

61f – (P.V. do homem pobre) P.A. o coronel conversa com o homem.

Coronel – Talvez se arrume, talvez se arrume. Como é que você se chama?

61g – O homem fala com o coronel, atrás estão Zé Estribeiro e outros peões observando.

Engole Cobra – Eu me chamo Engole Cobra.

Coronel – Engole Cobra?

61h – Na frente da casa grande o coronel chama a mulher.

Coronel – Engole cobra?... Ô Maria! Maria! Anda ver o homem que Engole Cobra.

62 – Ext/Dia. Fazenda, curral, Zé Estribeiro continua a contar a história.

Zé Estribeiro    Chamou a mulher que estava lá dentro. A mulher apareceu. Ele fez a apresentação e disse...

63 – Ext/Noite  - Casa Grande, o Coronel perto de Maria, fala ao Engole Cobre.

Coronel – Engole Cobra, meu nego, você vai morar aí naquele ranchinho pra você ficar.

64 – Ext/Dia – Fazenda, curral, Zé Estribeiro contando a história para os peões.

Zé Estribeiro – Passou-se sexta, sábado, no domingo o sujeito veio reclamar.

65 – Ext/Dia – Sol nasce, galo canta. O coronel está no terraço, Engole Cobra se aproxima tirando o chapéu.

65a – Engole Cobra fala com o coronel.

Engole Cobra – Seu curuné, não tem um servicinho pra mim, não?

Coronel – O que é que o senhor está reclamando, não recebeu suas férias?

Engole Cobra – Recebi, sim senhor.

65b – Close do coronel.

Coronel – Não se incomode. Logo aparece! Logo aparece!

66 – .Ext/Dia – Fazenda, curral, Zé Estribeiro continua a contar a história.

Zé Estribeiro  – Lá para o meio da outra semana, descobriram uma surucucu que não tinha mais prá onde crescer.

67 – Ext/Dia – Casa Grande, P.P., Coronel abre um sorriso e fala com Zé Estribeiro.

Coronel – Não bole com ela não, vai chamar ali seu Engole Cobra.

68 – Ext/Dia – Fazenda, curral, cocheira. Zé Estribeiro concluindo a história.

Zé Estribeiro – O Engole Cobra veio nas carreiras. Disse:

69 – Ext/Dia – Fazenda, curral, cocheira. Engole Cobra conversa com o coronel que lhe aponta uma coisa, Engole Cobra olha para onde o coronel apontou.

Coronel – Engole Cobra, meu nego, está aí um servicinho pra você!

70 – Ext/Dia - (P.P.) Coronel apontando o lugar.

Coronel – É só essa besteirinha pra você engolir.

71 – Ext/Dia – Num canto da cocheira, uma enorme cobra.

72 – Ext/Dia – (pan) Próximo a cocheira, Engole Cobra com riso amarelo. O coronel observa calado. Zé Estribeiro coça a cabeça prevendo que aquilo não vai acabar bem.

Engole Cobra – Está doido, seu curuné, eu nunca engoli cobra, isso é apelido.

72a – Close do coronel zangado.

Coronel – Ahh... é apelido? Vigia! Vigia! Dá uma surra neste homem, vigia! (Zé Estribeiro ri e Vigia se aproxima).

73 – Ext/Dia – Chaminé da usina.

74 – Ext/Dia – Canavial

75 – Ext/Dia – Almanjarra

76 – Ext/Dia – Canavial, carro-de-boi passa na estrada de terra. Crianças passam correndo.

77 – Ext/Dia – Rua da cidade. Placa numa casa indica o nome da rua. Rua do Rio. (plano seqüência). Na frente da casa um homem deficiente físico come alguma coisa que ele esconde na mão. Mastiga. Olha para os lados, desconfiado. Câmera desloca-se até outra casa seguindo D. Nina e a mulher que passam. Elas param para cumprimentar um pedreiro que organiza uma pilha de tijolos. Elas falam com ele que responde grosseiramente. Elas despedem-se e caminham comentando algo entre si. D. Nina vê alguma coisa que não gosta, benze-se e segura a mulher pelo braço para mudarem de caminho, saindo empertigadas, virando o rosto para não cruzarem com a preta Inês (a câmera acompanha a preta Inês). Inês que passa segurando algumas penas pretas na mão. Preta Inês aproxima-se cobrindo todo o quadro. (Cortina)

Voz (off) – No começo da rua morava agostinho, o aleijado, a quem o povo acusava de alimentar-se de coisas imundas: bichos mortos apanhados no fundo dos quintais!

Fronteiro à ele morava o pedreiro Manuel Belo, que por ter sido mordido de cachorro da moléstia, quando falava com a gente avançava como um cão.

No meio da rua morava a celebérrima preta Inês. Catimbozeira afamada sempre às voltas com sapos e urubus!

77a – Ext/Dia – (cortina) Rua do rio, Preta Inês descortina o quadro passando pela frente da casa onde na janela, está a mulata Filomena  que observa a rua e penteia os cabelos.

Voz (off) – Na outra ponta morava a mulata Filomena, a quem um jacaré acuou...

78 – Ext/Dia – Água, jacaré meio submerso observa.

Voz (off) – ...Dentro de um banheiro no rio.

79 – Ext/Dia – Estrada de terra no meio da floresta. A mulata Filomena, nua, corre assustada.

Filomena – Me acudam! Me acudam!

80 – Ext/Dia – Calçamento de pedra (traveling). Pedras ocupam todo o quadro.

81 – Ext/Noite – Calçamento de pedra (traveling).

Voz (off) – Mas nem tudo, na rua do rio, era infâmia, nojo, abominação!

82 – Ext/Noite – (traveling – câmera na mão). Casa, frente, lateral, fundos, quintal,  muro, outra casa, homem toca pífano, pára, acende um foguete e volta a tocar pífano, pára de tocar outra vez e acende outro foguete, voltando a tocar o pífano em seguida.

Voz (off) – ... Na outra ponta da rua, bem nos fundos do quintal da casa da minha mãe, morava o fogueteiro Lulu Higino, que, no silêncio das noites consteladas...

82a – Ext/Noite – Lulu Higino toca pífano.

Voz (off) – Arrancava da flauta uns acordes tão suaves, que até parecia...

83 – Ext/Noite – Céu estrelado. Fogos de artifício.

Voz (off) – ... Serem as estrelas lá no céu que estavam tocando.



FIM


A oralidade da poesia de Ascenso Ferreira em curta-metragem

Cineasta Marco Hanois começou a gravar Incenso, filme que presta homenagem ao poeta Ascenso Ferreira

O Engenho Massangana, no Cabo de Santo Agostinho, foi moradia do escritor e abolicionista Joaquim Nabuco até os oito anos e é uma das construções mais representativas do Pernambuco do século 19. O espaço, atualmente funcionando como centro cultural, emprestou suas particularidades históricas ao início das gravações do novo curta de Marco Hanois, Incenso, no último sábado.
O filme presta homenagem à obra de Ascenso Ferreira e busca, segundo o diretor e roteirista, “resgatar as peculiaridades orais do texto do poeta e reviver um período da história pernambucana, que ficou esquecido”: as primeiras décadas do século 20, com suas beatas, coronéis, crendices e o espanto diante da modernidade tardia que o Brasil começava a vivenciar. Uma das cenas de Incenso mostra a perplexidade dos personagens diante de um Zeppelin rasgando os céus de um Pernambuco ainda rural.
Apesar de Ascenso Ferreira ter nascido em Palmares, o curta de Hanois não se fecha numa cidade específica. Sua proposta é ter como cenário um interior arquetípico, que traga pormenores de todas as cidades pernambucanas do início do século passado sendo apresentadas ao espectador durante os 20 minutos da trama. Dessa forma, as filmagens, que se prolongam até o próximo mês, terão como cenário ainda os casarões antigos e ruas do Poço da Panela.
O primeiro dia de filmagens de Incenso registrou os diálogos entre os atores Alexandre Zachia e Tuca Andrada. Zachia interpreta um personagem chamado apenas de Coronel, que funciona como uma espécie de “alter ego” do próprio Ascenso. O poeta costumava dizer que um dos seus sonhos era ter sido coronel de engenho, figura das mais representativas do imaginário nordestino. Tuca vive Zé Estribeiro, que serve como elo das várias tramas do curta.
Amigo de longa data de Hanois, Tuca explicou que, por pouco, ficou de fora do elenco de Incenso devido à sua apertada agenda, que divide espaço entre a novela Cidadão brasileiro e a turnê da peça Orlando Silva, o cantor das multidões. “Eu queria muito fazer esse curta, tanto por minha amizade com Hanois quanto pela homenagem que ele faz à obra de Ascenso, um poeta importantíssimo. Foi um verdadeiro milagre que neste fim de semana eu tenha conseguido participar das gravações”, explicou o ator, durante uma das pausas da filmagem.
Incenso tem um elenco numeroso com mais de 30 atores, que conta ainda com nomes como Bruno Garcia, Aramis Trindade e com as cantoras Lia de Itamaracá e Mônica Feijó. No caso de Mônica, que atualmente participa do elenco de Páginas da vida, ela volta a Pernambuco nas próximas semanas especialmente para gravar sua participação em Incenso. A assistência de direção fica a cargo de Moisés Neto. A atriz Patrícia França foi um nome cotado para atuar no curta, mas acabou ficando de fora por problemas na sua agenda. Patricia, nos anos 80, trabalhou em projetos teatrais de Hanois.
Todos os diálogos de Incenso são permeados por fragmentos de textos de Ascenso. O título do curta faz referência ao poema Mês de maio: “O incenso queima diante do altar,/ o mês de maio vai terminar.../ Com seus deliciosos braços nus,/ as rosas fazem o sinal-da-cruz.../ Amém...” - presente no livro Catimbó, de 1927. Ao fragmentar diversos textos de Ascenso, segundo o diretor, o curta resgata para toda uma nova geração a oralidade típica da obra do poeta.
O roteiro do curta foi vencedor do prêmio Ary Severo-Firmo Neto, concedido pela Prefeitura do Recife no ano passado, e foi orçado em R$ 80 mil. Durante a fase de gravação, o filme está contando ainda com apoio de, entre outras instituições, Chesf e Fundação Joaquim Nabuco, que cedeu gratuitamente a utilização do Engenho Massangana. No entanto, a equipe ainda procura recursos para a etapa de pós-produção.
Marco Hanois chega a Incenso depois de trabalhos bem-sucedidos como Objeto abjeto e Cassino Americano, que recebeu Menção Honrosa no festival Internacional de Vídeo promovido pela JVC em Tóquio. Sua homenagem a Ascenso será lançada no primeiro semestre de 2007. “Ainda não sei se a estréia será no Festival de Cinema do Recife, mas quero muito que ele faça parte da programação do evento”, afirmou o diretor.



Ascenso Ferreira



O VII Festival de Vídeo de Pernambuco divulgou os vencedores de 2005 em cerimônia realizada nesta quinta-feira, 15 de dezembro, no Teatro Arraial, na Rua da Aurora. Este ano, foram inscritos 73 vídeos, dos quais 38 foram selecionados para a Mostra Competitiva, ocorrida esta semana no Teatro do Parque.

Os prêmios do Júri Popular foram os primeiros a serem entregues. Na Categoria Documentário ganhou Daniel Barros, com Mais Um Domingo; Dando Crédito, de Rafael Infa levou em Ficção; Plínio Uchôa e Marcos Buccini em Experimental com A Morte do Rei de Barro e Ireny, de Gabriel Mascaro e Daniel Aragão venceu na categoria Vídeo Clip.

A Comissão Julgadora, composta pelas jornalistas Clara Angélica e Carol Almeida, pelo programador visual Fernando Vasconcelos, pelo produtor Osmar Barbalho e pela cineasta Kátia Mesel, premiou nove vídeos em três categorias e decidiu também premiar cinco vídeos com Menções Honrosas, atribuindo a cada um o valor de R$ 1.000,00, equivalente a um terceiro lugar.

Já o Concurso de Roteiros Firmo Neto/Ary Severo teve, este ano, 47 projetos inscritos, que foram analisados pelo jornalista Ernesto Barros, pelo pesquisador Lula Cardoso Ayres, pelos cineastas Osman Godoy e Fernando Monteiro e pelo fotógrafo Roberto Santos Filhos.

O Prêmio Ary Severo, pago pelo Governo do Estado de Pernambuco, foi para Um Lugar ao Sol, de Gabriel Mascaro e o Prêmio Firmo Neto, pago pela Prefeitura do Recife, escolheu  Incenso, de Marco Hanois (assistência de direção Moisés Neto). Cada um receberá R$ 80 mil para produzirem um curta-metragem de 15 minutos. Ambos os vencedores ganham pela primeira vez o concurso público.


quinta-feira, 5 de agosto de 2010
INCENSO DE MARCOS HANOIS PERFUMOU A TÃO AGUARADADA ESTREIA DO NOVO PROJETOR DO CINE THEATRO GUARANY
Por Lucivaldo Ferreira

Foi assim, sem nenhum alarde, sem pronunciamentos oficiais e casa praticamente vazia que o Cine Theatro Guarany viu a máquina de mais de 50 mil dólares lançar oficialmente sobre a grande tela seus primeiros feixes de luz.
Talvez o pequeno publico ali presente sequer houvesse se apercebido, mas viviam naquele instante, exatamente às 17:39h da tarde do dia 04 de agosto de 2010, um momento histórico. Ali, depois de tantos anos o Cine Theatro Guarany dava um talvez pequeno, porém importante passo em seu renascimento. Rodava em seu projetor o curta-metragem do cineasta pernambucano Marcos Hanois, “Incenso”.
O curta 35mm pintou a tela da despercebida festa com a oralidade e a poesia do grande poeta Ascenso Ferreira e trouxe ao baile de cores e sensações beatas, coronéis, crendices e memórias de um Pernambuco esquecido nas prateleiras das bibliotecas.
De repente um Zeppelin rasga o céu do filme e seus personagens de olhos arregalados se espantam diante da bela “espaçonave” e toda sua modernidade naquele Pernambuco rural. E ali na sessão das cinco outro grande Zeppelin irrompia a escuridão com suas fotografias correndo um após a outra. Fotografias do nosso povo, fotografias de mim, de quem ali esteve vendo a “história” passar.

O PROJETOR

Na manhã da terça-feira, dia 22 de setembro de 2009 teve fim uma longa espera. O Cine Theatro Guarany finalmete recebeu o seu tão aguardado projetor.
O equipamento de última geração vindo diretamente de Miami (FL USA), custou mais de 50 mil dólares e opera nos sistemas analógico e digital.
A montagem do novo equipamento foi feita pelo Sr. Zé Hildo, o único técnico responsável pela montagem dos cinemas em Pernambuco e pelo engenheiro Sr. Claudiney , que veio diretamente de São Paulo para executar a tarefa de instalar o projetor. Ambos foram auxiliados pelos triunfenses Sandro Martins e Serginho.
O projetor da marca Christie é um dos poucos do país. Segundo o Sr. Zé Hildo, o novo equipamento é o que há de mais moderno em se tratando de projeção, e no Brasil só existem três além do nosso: um fica em Aracaju/SE, outro em Natal/RN e o outro em São Paulo/SP.
Capturado em 30 de julho de 2012
in  http://www.triunfob.com/2010/08/incenso-marcos-hanois-perfumou-tao.html


Ascenso era um humanista
Publicado em 08.05.2008
Viúva queixa-se do descaso com a memória do poeta. D. Lourdes rejeita rótulo de que ele era comunista e lembra a amizade com Arraes


Dona Lourdes mora numa casa no bairro de Campo Grande. Tem um cachorro e 23 gatos. Mas seu sonho é criar cavalo. Não só um, mas muitos. “O bicho que eu mais gosto é cavalo, mas não dá para ter um cavalo dentro de casa”, justifica cheia de dó. Mas tantos animais não dão trabalho? “Se não fossem por esses gatos, não haveria trabalho nessa casa”, diz e aponta para uma cadeira de balanço que comprou para um dos seus gatos, o mais novo deles. “Só quem senta é ele.”
D. Lourdes vive também cercada por imagens do poeta e ex-companheiro Ascenso. O corredor que dá para o seu quarto tem a placa “R. Ascenso Ferreira”. Ela pede para o caseiro colocar uma fita VHS com um documentário de imagens do poeta. “Olhem ele”, aponta para uma foto de Ascenso que aparece na TV.
Ela diz que nem se lembra quantos anos morou com o poeta – “Parece que foi a vida inteira.” Tanto foi/é a vida inteira que “parece que ele está vivo, que nunca foi embora”. Após a morte de Ascenso, D. Lourdes saiu de Pernambuco. “Tive de ir embora porque as pessoas achavam que eu era comunista. Mas nunca fui comunista, nem eu nem Ascenso. As pessoas achavam isso dele porque era um homem que falava com todo mundo, tinha uma personalidade bastante forte. Ascenso não era comunista, era humanista”.
D. Lourdes tem na ponta da língua as razões do esquecimento em torno do nome do seu marido. “Primeiro porque ele foi muito amigo de Miguel Arraes, diziam que Miguel Arraes era comunista, mas nunca foi comunista. Ele foi um grande amigo da gente, um amigo de verdade, um pai de família linha dura. A outra, é que as pessoas tinham inveja da personalidade dele”, destaca. “As pessoas esquecem de tudo com o tempo, o tempo corrói tudo. Tanta gente importante e ninguém lembra”, reflete D. Lourdes.
Outra frustração de D. Lourdes é o filme Incenso, de Marco Hanois, que está parado. “O diretor faleceu ano passado mas não teve dinheiro para terminar o projeto”, reclama. O filme coloca em imagens os poemas de Ascenso, com um elenco formado por nomes como Aramis Trindade e Bruno Garcia. “São todos atores da Globo e tem um personagem que faz Ascenso, ele é igual a Ascenso, igual. Parece que você está vendo ele”.
Quando Marco Hanois faleceu em novembro passado, deixou o filme montado. Falta apenas a finalização. “Colocamos no concurso de audiovisual da Fundarpe, mas ele não foi aprovado. Isso é incrível, sobretudo se lembramos a importância da obra de Ascenso Ferreira e a própria carreira de Hanois, que teve filmes premiados no exterior”, destaca o produtor de Incenso, Pedro Celso, que diz que o projeto precisa reunir ainda R$ 50 mil. “Como é que deixam parado um projeto desses, o filme é emocionante”, diz D. Lourdes.
Enquanto o filme não fica pronto, é o Ascenso poeta que chega ao público com a cuidadosa edição da Martins Fontes. E desta vez é importante que apareça o poeta e não o homem. “Uma das coisas que chamam a atenção de quem se propõe a estudar a poesia de Ascenso Ferreira é o contraste entre a escassez de textos críticos e a abundância do anedotário a seu respeito. Com efeito, nas escassas publicações sobre Ascenso Ferreira, os comentadores centram-se sobremodo na sua figura ‘descomunal’, na espirituosidade, nas atitudes pouco convencionais, no vozeirão e no modo único de recitar suas próprias poesias”, explica Valéria Torres Costa e Silva.
ANIVERSÁRIO
O aniversário de 113 anos de Ascenso Ferreira, que acontece amanhã, é duplamente comemorado. Às 18h30, a Livraria Cultura recebe o lançamento da edição que reúne Catimbó, Cana caiana e Xenhenhéim. Haverá encenação de poesia com as participações de Geninha da Rosa Borges e Adriano Cabral e uma mesa-redonda com Nagib Jorge Neto, Fernando da Mota Lima, Juareiz Correya e a própria Valéria. Às 22h, haverá recital da poesia de Ascenso no bar Casa da Moeda, com nomes como Jomard Muniz de Brito e Cida Pedrosa. (S.C.)
Prefeitura entrega novo túmulo de Ascenso Ferreira


Um dos nomes mais importantes do Modernismo no Brasil, o poeta pernambucano Ascenso Ferreira recebe uma homenagem nesta segunda-feira, quando a Prefeitura do Recife entrega à viúva do escritor, Lurdes Ascenso, o novo túmulo do poeta, no Cemitério de Santo Amaro. Na ocasião, às 10h, alguns poemas do autor pernambucano serão recitados e o toque de silêncio será executado pelos clarins da Polícia Militar.

Todo em granito, o túmulo ocupa um terreno de 3m2, doado pelo Governo Municipal. Na lápide, foi reproduzido o poema “Noturno”, em que Ascenso Ferreira alude a ícones da capital pernambucana, como as ruas do Bairro do Recife e o rio Capibaribe.

A cerimônia também marca os 43 anos da morte do poeta, que aconteceu em 05 de maio de 1965. Ascenso Carneiro Gonçalves Ferreira nasceu, no ano de 1895, na cidade de Palmares. Em 1920, mudou-se para o Recife, onde foi colaborador de alguns jornais locais e deu início a sua carreira literária. Ele se voltou para temas regionais que foram reunidos em livros, como "Catimbó" (1927), "Cana caiana" (1939), "Poemas 1922-1951" (1951), entre outros.


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