Diretor,
roteirista e artista plástico, Marco Hanois faleceu em de novembro de 2007, aos
42 anos. Como realizador de TV, Vídeo e Cinema, o artista tem no seu currículo
mais de 10 curtas-metragens. Entre seus trabalhos mais conhecidos estão: “Cassino
Americano” (diálogos do professor Moisés Monteiro de Melo Neto) Odoyá (adaptado pelo professor da Universidade de Pernambuco Moisés Monteiro de Melo Neto), premiado no Festival de Vídeo de Tokyo, “Chega de Cangaço”, exibido
pela TV Globo, “Objeto Abjeto”, vencedor do prêmio de roteiro do 45º Salão de
Artes de Pernambuco e melhor documentário do VI Festival de Vídeo do Recife e o
mais recente “Incenso”, que recebeu o prêmio de roteiro no Concurso Firmo Neto
– Edição 2005, da Prefeitura da Cidade do Recife e foi contemplado com o 2º
Edital do Programa de Fomento à Produção Audiovisual de Pernambuco/ 2009 para
finalização.
Ivonete melo em cena de INCENSO, o filme
Marco Hanois, Moisés Monteiro de Melo Neto e parte da equipe do filme INCENSO
Incenso
na Escola aborda a obra de Ascenso Ferreira
Projeto
foi contemplado no Sistema de Incentivo à Cultura de Pernambuco
Publicado
em 16/05/2011, às 19h31
Do
JC Online
Começou
nesta segunda-feira (16/05), na cidade de Salgueiro, interior do Estado, o
projeto Incenso na Escola, que visa o reconhecimento da literatura
pernambucana, através da leitura cinematográfica de Marcos Hanois, cineasta que
filmografou a poesia de Ascenso Ferreira no curta-metragem Incenso. O filme
será exibido em escolas de dez cidades pernambucanas - Salgueiro, Exu,
Santa Maria da Boa Vista, Floresta, Serra Talhada, Arcoverde, Nazaré da Mata,
Palmares, Jaboatão dos Guararapes e Recife - e será seguido de debate com o
pesquisador, doutor em Letras pela UFPE, dramaturgo Moisés Monteiro de Melo Neto, que escreveu vários
roteiros para cinema com Marco Hanois e fez a assistência de direção deste INCENSO,
e performance poética da atriz Daniela Câmara.
Contemplado
no Sistema de Incentivo à Cultura - SIC/PE, o Incenso na Escola ainda vai
distribuir cinco mil cordéis inéditos para as Bibliotecas Públicas dos locais
percorridos. O trabalho segue até o dia 9 de junho, quando o projeto chega a
Recife, onde será realizado na Escola Estadual Ginásio Pernambucano. O Incenso
na Escola é uma realização do Funcultura, Fundarpe e Secretaria de
Educação/Governo de Pernambuco, com o apoio das Prefeituras Municipais/
Secretarias de Educação, da editora WMF Martins Fontes e da TV
Pernambuco. O serviço completo de cada cidade pode ser conferido no blog www.incensonaescola.blogspot.com.
SINOPSE
Numa
imaginária cidade da Zona da Mata de Pernambuco, a vida, os costumes, as
crenças, o jeito de ser, pensar e falar das pessoas comuns. O Coronel, o Padre,
o Catimbozeiro, o Cachaceiro, a Beata e uma série de tipos que compõem um
contexto cultural e humano. A voz do povo do Nordeste do Brasil, captada pelo
poeta Ascenso Ferreira e adaptada para o cinema. O contraste entre o arcaico e
o moderno, simbolizado pela Usina, pelo Cinema e o Zeppelin, uma sociedade
dividida em classes, um povo emotivo, sentimental e místico, como os versos de
Ascenso Ferreira, numa viagem ao coração da alma brasileira.
Parte do roteiro de INCENSO
A
História se passa nos anos 30 do século 20
1 –
Ext/Dia – P.G. Canavial, céu, vento balança as folhas das canas.
1a –
Estrada de terra corta o canavial. Carro de boi carregado de cana passa pela
estrada. Uma placa indica o caminho do Engenho Esperança.
1b
– Usina de açúcar no meio da paisagem verde. Usina.
1c
– O carro de boi segue na perspectiva da estrada.
1d
– Canas Passam (P.V. do Carreiro).
2 –
Ext/Dia – P.G. canavial, estrada, carro de boi visto de uma posição mais alta –
correção – casa grande, o senhor de engenho observa o carro de boi que passa lá
embaixo, depois vira-se para alguém fora
de quadro e grita, depois aproxima-se Zé Estribeiro.
Coronel
– Ô Zé Estribeiro! Zé Estribeiro!
Zé
(off) – Inhôôr!
Coronel
– Quantos litros de leite deu a vaca cumbuca?
Zé
(off) – 25, seu Curuné.
Coronel
– E a vaca malhada?
Zé – 27 seu Curuné.
Coronel
– E a vaca Pedrês?
Zé
– 35 seu curuné.
Coronel
– Só?! Diabo, os meninos hoje não tem o que mamar.
3 –
Ext/Dia – Mãos de menino com castanhas de caju.
3a
– Estrada de terra do canavial. Na beira da estrada estão alguns meninos pobres
que brincam de castanha. O carro de boi passa por eles.
3b
– Um dos meninos vê algo e avisa para os outros.
Menino
1 – O arco-íris!
3c
– (P.V. o Menino) Campo. Arco-íris no céu.
3d
– Os meninos correm pelo campo. O menino 2 grita. (aproxima-se da câmera).
Menino
2 – Está bebendo água no riacho.
3e
– (Contra Plano) Meninos correm na perspectiva por uma outra estrada. Uma placa
indica o caminho do engenho “Estrela D`alva”.
Menino
3 – Vamos cercá-lo. Vamos cercá-lo!
3f
– (Traveling de) Crianças correm e gritam uns para os outros. Passam pela
estrada de terra.
Menino
1 – Vamos passar nele por baixo!
Menino
2 – Vamos passá-lo... Vamos passá-lo!
3g
– (traveling para trás) Menino corre olhando para o horizonte, sorrindo e grita
para os outros.
Menino
3 – Fugiu do Riacho... Subiu o Monte...
4 –
Ext/Dia – Riacho, crianças correm até o riacho. Param de correr, cansados.
Menino
2 – Vamos pegá-lo... Vamos pegá-lo.
4a–
P.P. dos meninos cansados, ofegantes (Pan).
4b
– P.M. menino 1 salta no riacho.
4c
– P.A. (câmera baixa) Menino 2 salta no rio.
4d
– P.P. Água do rio sacudida pelo mergulho de menino.
4e
– P.G. Riacho, menino 1 e 2 nadam na água do rio. Menino 3 mergulha no rio. Uma
placa indica a direção para o engenho “Flor do Bosque”.
5 –
Int/Dia – Menino estudante olha pela janela gradeada da sala de aula, ele
observa os meninos brincando lá fora.
6 –
Ext/Dia – Riacho, meninos, nadam. (P.V. do estudante).
7 –
Int/Dia – Na sala de aula o estudante observa os meninos brincando. Quando ouve
a voz do homem, o estudante vira-se assustado.
Professor
(off) – As armas e os barões
assinalados.
7a
– Sala de aula, diante de um quadro negro e atrás de um birô cheio de livros
grossos empilhados, o professor, irritado com a distração do aluno, pergunta.
Professor
– Quantas orações?
7b
– P.P. do estudante que hesita e não responde.
7c
– P.A O professor fica impaciente e faz logo outra pergunta.
Professor
– Qual é o maior rio da China?
7d
– P.P.P. – Palmatória pendurada na parede.
7e
– O professor risca com giz uma equação no quadro negro e vira-se para
continuar a perguntar ao aluno.
Professor
– A2 + 2AB igual a quanto?
7f
– P.P. O estudante fica cada vez mais angustiado com as perguntas.
Professor
(off) – Que é curvilíneo, convexo?
7g
– P.M. Sala de aula, o professor acena para que o estudante se aproxime, o
estudante obedece e aproxima-se temeroso.
Professor
– Menino, vem dar sua lição de retórica.
7h
– P.A. Estudante na frente do quadro negro fala decorado depois para o
professor que faz uma expressão de aprovação.
Estudante
– “Eu começo, atenienses, invocando a proteção dos deuses do Olimpo para os
destinos da Grécia”.
Professor
– Muito bem! Isto é do grande
Demóstenes. Agora a de francês.
7i
– Detalhe das mãos nervosas do professor.
7j
– (P.V. do professor – câmera alta) P.A. do estudante, nervoso, esforçando-se
para não errar. Concentra-se e fala num francês com sotaque nordestino.
Estudante
– “Quand le christianisme avait apparu sur la terre...”
7k
– Plano detalhe da boca do professor.
Professor
– Basta.
7l
– (P.V. do Estudante – câmera baixa) P.A do professor ameaçador.
Professor
– Hoje temos sabatina... o argumento é a
bolo! Qual é a distância da terra ao sol?
7m
– Detalhe do rosto do estudante, suando, nervoso, não consegue lembrar, não
consegue falar. Olho do estudante.
7n
– (P.V. do estudante – câmera baixa) P.P. O professor está zangado e pega a
palmatória da parede.
Professor
– Não sabe? Passe a mão à palmatória.
7o
– Detalhe da mão do estudante aberta, recebendo a palmada do professor.
7p
– P.A. O professor ameaça o aluno, que tenta segurar o choro, soluçando.
Ouve-se o sino encerrando a aula.
Professor
– Bem, amanhã quero isso de cor.
8 –
Int/Dia – Sino tocado pela secretária no corredor da escola. Alguns alunos
passam.
9 –
Ext/Dia – P.M. Rua, escola, alunos saem da escola para a rua. Algumas mães
acompanham. O menino que apanhou passa acompanhado de uma velha. Câmera
acompanha (traveling) a velha e o estudante até passarem por uma casa. Janela
da casa onde se vê Dona Nina e a mulher.
10
– Int/Dia – Casa de D. Nina, sala, próximo à janela estão D. Nina e a mulher.
Conversam. A mulher folheia uma revista e mostra à D. Nina, ao fundo, na rua
algumas crianças passam, saindo da escola.
10a
– Detalhe da revista que a mulher mostra para D. Nina. Fotos de filmes.
Mulher
(off) – ... Mas D. Nina, aquilo que é o tal de cinema?
10b
– A mulher segura a revista e fala em tom de censura para D. Nina que escuta
atentamente, enquanto faz um trabalho manual (bordado, costura ou renda).
Mulher
– O homem saiu atrás da moça, pega aqui, pega acolá, pega aqui, pega acolá, até
que pegou-la.
10c
– D. Nina espanta-se (pan – correção) para a mulher que continua o relato.
Mulher
– Pegou-la e sustentou-la. Danou-lhe beijo, danou-lhe beijo, danou-lhe beijo.
(inclusão
de uma cena de filme do ciclo do Recife, “A Filha do Advogado”)
10d
– (close) da Mulher que continua a falar para D. Nina.
Mulher
– ... Depois entraram pra dentro dum quarto! Fez-se aquela escuridão (...)
10e
– Detalhe da boca da mulher falando.
Mulher
– (...) e só se via o lençol bulindo...
10f
– D. Nina escuta horrorizada o que a mulher está dizendo, faz uma expressão de
desgosto, benze-se, pensa um pouco, olha pela janela e vê algo que não gosta.
Mulher
(off) – Me diga uma coisa D. Nina. Isso presta pra moça ver?
11
– Ext/Dia – (P.V. de D. Nina) Na rua, Chiquinha conversa com alguns rapazes que
cortejam-na, um deles toca-lhes os cabelos e fala coisas no ouvido dela que ri.
O rapaz dá uma flor para Chiquinha.
D.
Nina (off) – Entra pra dentro Chiquinha...
12
– Int/Dia – Da janela D. Nina grita para Chiquinha.
D.
Nina – Entra pra dentro Chiquinha! No caminho que você vai você acaba
prostituta.
13
– Ext/Dia – Rua, os rapazes afastam-se rindo, Chiquinha despede-se e caminha
para casa. (aproxima-se da câmera)
Chiquinha
– Deus te ouça, minha mãe... Deus te ouça.
13a
– Ext/Dia – Na rua, Chiquinha passa em direção à casa, o cachaceiro observa-a e
fala, não para ela, mas para o copo cheio de cachaça.
Cachaceiro
– Branquinha, branquinha, é suco de cana caiana, pouquinho é rainha, muitão é
tirana.
14
– Int/Dia – Copo d`água é colocado sobre a mesa. (câmera corrige revelando) o
coronel que lê uma carta, um bilhete. O coronel acaba de ler, guarda o papel no
envelope e deixa-o perto do copo, chama a mulher.
Coronel
– Ô Maria! Maria! Cumpadre Cazuza vem almoçar amanhã aqui em casa (...)
14a
– P.P.P. O coronel fala com a mulher.
Coronel
– Que é que tu preparaste pra ele?
14b
– Sala, Maria chega de outro cômodo, aproxima-se do marido e conversa com ele.
Maria
– Eu matei uma galinha, matei um pato, matei um peru, mandei matar um
cevado...
14c
– close do coronel.
Coronel
– Oxente, Mulher! Tú estás pensando que cumpadre Cazuza é pinto? Manda matar um
boi!
15
– Int/Noite – Boi de brinquedo feito de barro, quarto de dormir. Na rede, o
estudante é embalado pela velha.
Velha
– ... Lindas histórias do reino da mãe d´água. ... Tomar a benção à lua nova...
16
– Ext/Noite – Casa Grande. Janela do quarto de dormir, luz fraca. (Câmera
corrige para pátio, grupo de homens tomam café, fumam, conversam.
Peão
– O avô de Zé Pinga-Fogo amanheceu morto na mata com o peito varado pela canela
do Pé-de-Espeto.
16a
– O vigia bebe café e conversa com os outros (depois correção para o Zé
Estribeiro que também fala).
Vigia
– O cachorro de Brabo-Manso levou, sexta-feira passada, uma surra das caiporas.
Zé
Estribeiro – A Mula-de-Padre quis beber o sangue da mulher de Chico Lolão...
16b
– Close de Zé Estribeiro que continua a história enquanto acende um cigarro de
palha num lampeão.
Zé
Estribeiro – ... Lá embaixo, a almanjarra, a rara almanjarra gemia e rangia,
que o engenho Alegria é bom moedor...
17
– Ext/Dia – Pasto, bois e cavalos pastam. (pan). Bois passam tangidos por
vaqueiro.
Vaqueiro
(off) – Eh, andorinha! Eh, moça-branca! Eh, Beija-flor!
18
– Ext/Noite – Os homens escutam impressionados o relato de Zé Estribeiro que
fala e gesticula.
Zé
Estribeiro – ... Foi quando se deu a coisa esquisita: mordendo, rinchando e aos
pulos, se pondo de pé...
18a
– Close de Zé Estribeiro falando para os outros.
Zé
Estribeiro – Com artes do cão, surgiu uma besta, sem ser dali não.
19
– Ext/Dia – Crepúsculo – Cavalos passam na contra-luz, silhuetas, patas
galopando, corda é lançada, mão do vaqueiro puxa a corda, patas de cavalos,
poeira.
Vaqueiro
(off) – - Atalha a bicha, Baraúna!
-
Sustenta o laço, maracanã!
20
– Ext/Noite – Zé Estribeiro continua o relato próximo do lampião.
Zé
Estribeiro – ... E a besta agarrada entrou na almanjarra.
21
– Ext/Crepúsculo – Próximo ao engenho, homens aproximam-se com pedaços de pau,
chicotes, galhos de árvores, tochas.
22
– Int/Noite – Tochas iluminam mãos com cacetes e chicotes. Mãos armadas com
paus e galhos atacam, golpeiam. Escutam-se os ruídos dos golpes, o relinchar da
besta e o bater dos cascos no chão. O sangue molha a almanjarra.
23
– Ext/Dia – Amanhece o dia, sol nascente. Escuta-se ainda os ruídos dos golpes
e o relinchar da besta, cantar de galo.
24
– Ext/Noite – Close de Zé Estribeiro que toma café e continua o relato.
Zé
Estribeiro – Depois que ela foi solta, entupiu no oco do mundo... num abrir e
fechar de olhos, a maldita se encantou.
24a
– Zé Estribeiro finaliza a narrativa, observado pelos outros dois. Detalhe do
lampião. Fogo.
Zé
Estribeiro – De tardinha, gente vinda da cidade trouxe a nova de que a ama do
padre serrador amanhecera tão surrada que causava compaixão.
25
– Int/Dia – Chamas, velas acesas, o oratório, várias imagens de santos, corrige
revelando casa do Padre. O padre com um tufo de algodão embebido em um remédio
passa com cuidado o algodão nos ferimentos (escoriações e hematomas) que cobrem
o corpo da ama. Ela está semi-despida com os pés dentro de uma bacia ou tina. A
ama geme a cada toque do padre. Ouvem-se batidas na porta da frente. O padre
interrompe o que está fazendo, cobre-a com um pano e vai atender a porta.
25a
– Antes de abrir a porta, o padre olha por um buraco para ver quem são os
visitantes.
26
– Ext/Dia – (P.V. do padre) Visão parcial (através do buraco). D. Nina e a
mulher esperam que ele abra a porta.
27
– Int/Dia – Na sala, o padre fica entediado com a presença das duas e caminha
na ponta dos pés para que elas não escutem
e desistam. As mulheres continuam a bater na porta, ouve-se a voz de D.
Nina.
D.
Nina (off) – Seu vigário!
28
– Ext/Dia – Na frente da casa do padre, D. Nina bate na porta e grita para
dentro da casa. A mulher traz nas mãos uma galinha. A porta vai abrindo-se
lentamente.
D.
Nina – Está aqui esta galinha gorda que eu trouxe pro mártir São Sebastião!
Padre
– Está falando com ele! Está falando com ele!
29
– Int/Dia – São Sebastião ocupa um lugar de destaque no meio das garrafas e
outros produtos vendidos na bodega onde está o cachaceiro que toma outra
lapada.
Cachaceiro
– - Adeus, mamãe de Loanda!
-
Adeus, meu filho Nogueira! O que tu viste na feira?
29a
– Copo de cachaça é enchido (P.P.P.) Mão pega o copo e ergue-o.
Cachaceiro
– Cair dez de cada banda.
29b
– O cachaceiro contempla o copo de cachaça momentos antes de bebê-lo.
Cachaceiro
– Simeão por terra bêbo, Rafael no chão deitado...
Minha
mãe, venha mais branda
Que
em jejum eu te arrecebo.
29c
– Detalhe da mão segurando o copo e deixando pingar um pouquinho pro santo.
30
– Int/Noite – Água escorre (tilt down), mãos são lavadas. (Traveling para trás
revelando) o coronel lavando as mãos, termina. Maria entrega-lhe uma toalha. O
coronel comenta algo com ela e sai.
Coronel
– Os olhos brilhantes de cocainômano parecem ter coisas para me contar.
30a
– Ext/Int – No terraço está Pedro Velho olhando para o céu. Pela porta aparece
o coronel que se aproxima de Pedro Velho e também olha para o céu.
Coronel
– Pedro Velho, cadê o teu engenho?
30b
– Primeiro plano de Pedro Velho, desolado, responde ao coronel sem tirar os
olhos do horizonte.
Pedro
Velho – A usina passou no papo.
30c
– P.A. O coronel coloca a mão no ombro de Pedro Velho.
Coronel
– E onde vais fundar safra este ano?
30d
– Rosto de Pedro Velho, os olhos injetados, voz embargada.
Pedro
Velho – Na barriga da mulher, na barriga da mulher.
30e
– Pedro Velho fica olhando para o céu, o coronel se afasta, entra pela porta da
sala.
30f
– Os olhos de Pedro Velho, brilhando.
31
– Ext/Noite – Lua Cheia.
32
– Int/Noite – Na sala, o coronel vai até um móvel, tira uma garrafa de Whisky
escocês e dois copos, vai voltando para o terraço, passa por Maria que está
tocando piano e comenta...
Coronel
– Os olhos brilhantes parecem, agora, duas poças d`água tremendo ao luar.
33
– Ext/Noite – Lua cheia.
34
– Ext/Noite – Igreja, lá dentro, luzes acesas, vozes. Na porta, rapazes olham
para dentro. O homem se aproxima dos rapazes que estão na porta e entra.
35
– Int/Noite Altar adornado.
Rapaz
1 – (voz off) Parece um ninho de noivado...
35a
– (pan) Rapaz que está na porta comenta algo, o amigo ao lado inspira o cheiro
que vem de dentro da igreja e comenta, um terceiro rapaz também fala.
Rapaz
1 – E a gente chega a interrogar se Nossa Senhora vai se casar...
Rapaz
2 – Hum... perfume de rosas no ar trescala.
Rapaz
3 – São as rosas de carne que há na sala.
35b
– Moças rezam baixinho. Uma morena, uma loura e uma pálida.
35c
– O homem que havia entrado observa o culto, benze-se.
35d
– Close no rapaz 1 que fala baixo como se rezasse.
Rapaz
1 – Oh perfumosas e puras rosas pálidas como açucenas.
35e
– Diante do altar, o padre dá prosseguimento ao culto.
Padre
– Kirie eleison...
Todos
(off) – Kirie eleison
35f
– O homem observa atentamente o padre, depois muda a direção do olhar e muda a
expressão para uma expressão de fascínio, emoção.
35g
– (P.V. do homem) A mulher que está especialmente bonita, reza.
Mulher
– Oh mãe castíssima! Oh vaso espiritual! Oh espelho da justiça.
35h
– Rosto de Chiquinha que também reza.
Chiquinha
– - Oh rainha concebida sem pecado original!
-
Oh consolação dos aflitos
-
Oh senhora dos infinitos.
35I
– Moça 1 reza (pan). Moça 2 também reza.
Moça
1 – Oh torre de Davi! Oh estrela da manhã! Oh escada de Jacó!
Moça
2 – Oh rosa de sião! Oh lírio de Jericó! Oh rainha cristã! Oh...
35j
– Moças rezam ao mesmo tempo.
Moças
– Rogai por nós que recorremos a voz.
35k
– No altar, o incenso queima.
35l
– O homem comenta consigo mesmo.
Homem
– O mês de maio vai terminar.
35m
– As moças com “seus deliciosos braços nús, fazem o sinal da cruz”.
Moças
– Amém.
35n
– Ext/Noite - O homem acompanha com o olhar a mulher que vai saindo da igreja.
36
– Ext/Noite – Na frente da igreja, fiéis saem, rapazes flertam. D. Nina,
Chiquinha e a mulher passam.
37
– Int/Noite – Tambor é percutido por mãos de homem negro. Ouve-se o batuque e
vozes cantando.
Vozes
(off) – Mestre Carlos, Rei dos Mestres, aprendeu sem se ensinar...
37a
– Terreiro de Umbanda. Homens e mulheres dançam em círculo, sentado, mestre
Carlos faz sinal para que o homem se aproxime. Ele chega e se ajoelha diante de
mestre Carlos.
Todos
(cantando) – Ele reina no fogo! Ele reina na água! Ele reina no ar!
37b
– Mestre Carlos bate com uma folha de pinhão roxo na cabeça, nos ombros, faz um
sinal da cruz na testa e no peito do homem que reza contrito. Depois mestre
Carlos passa incenso ao redor do homem. Mestre Carlos sussurra no ouvido do
homem que repete em voz alta.
Homem
– Por isso, em minha amada acenderá a paixão que consome! Umedecerá sempre em
sua lembrança o meu nome! Levar-lhe-á o perfume do incenso que vivo a lhe
queimar.
37c
– Close do homem falando concentrado.
Homem
– E ela há de me amar... Há de me amar... Há de me amar...
37d
– Mestre Carlos passando incenso interfere na oração.
Mestre
Carlos – Como a coruja ama a treva e o bacurau ama o luar.
37e
– O homem cercado pela fumaça do incenso continua a prece sussurrada por mestre
Carlos.
Homem
– À luz do sete estrelo nós havemos de casar e há de ser bem perto. Há de ser
tão certo como este mundo tem de se acabar...
37f
– Mestre Carlos se aproxima do homem com uma garrafa de cachaça, dá ao homem
que toma um grande gole e depois fala para mestre Carlos. A fumaça cobre tudo.
Homem
– Foi a jurema de sua beleza que embriagou os meus sentidos! Eu vivo tão triste
como os ventos perdidos que passam gritando na noite enorme...
38
– Int/Noite – Na cama entre lençóis, o corpo da mulher dormindo, tendo um sonho
erótico, ela se acaricia. As mãos nos lábios, na pele, nos cabelos, nos seios.
Tudo à “meia-luz”. Depois ela desperta suada, ofegante. A voz do homem e a voz
da mulher misturam-se.
Homem
(off) – Mulher(in) – Porque quero gozar o viço que no seu lábio estua, quero
sentir sua carícia branda como um raio de lua, quero acordar a volúpia que no
teu seio dorme.
39
– Int/Noite – Terreiro de umbanda, o homem continua o ritual.
39/0
– Mãos batem no tambor
Homem
– E hei de tê-la, hei de vencê-la, ainda mesmo contra seu querer... Porque de
mestre Carlos é grande o poder.
39a
– Mãos batem nos tambores freneticamente.
39b
– O homem fecha os olhos enquanto mestre Carlos incensa-o novamente.
Mestre
Carlos – Pelas três Marias... Pelos três Reis Magos... Pelo Sete Estrelo...
39c
– Rosto de mestre Carlos, sério, concentrado.
Mestre
Carlos – Eu firmo esta intenção, bem no fundo do coração, e o signo de Salomão
ponho como selo...
39d
– Mestre Carlos anda ao redor do homem que está quase em transe.
Homem
– E ela há de me amar... Há de me amar... Há de me amar...
Mestre
Carlos – Como a coruja ama a treva e o bacurau ama o luar.
39e
– Terreiro, o homem levanta-se ao lado de mestre Carlos, as pessoas dançam em
círculo cantando, com mais intensidade.
Todos
– ... Mestre Carlos Rei dos Mestres. Reina no fogo... Reina na água... Reina no
ar.
40
– Ext/Dia – Sol nasce, canavial.
Todos(off)
– ... Ele aprendeu sem se ensinar.
41
– Ext/Dia – Rua da cidade. O cachaceiro está deitado no chão. Acorda-se,
levanta-se, bebe no gargalo da garrafa. Cambaleia, apruma-se, arruma-se e
caminha pela rua.
Cachaceiro
– Em jejum eu te arrecebo cuma xarope dos bêbo... tu puxas eu arrepuxo, bates
comigo no chão, bato contigo no bucho. Adeus mamãe de Luanda. Adeus meu filho
Nogueira.
42
– Int/Dia – Diante de um espelho, no quarto, o coronel endireita o nó da
gravata, a mulher também se apronta, borrifa perfume.
43
– Ext/Dia – Canavial, riacho, as crianças passam correndo. Placa “Engenho Bom
Mirar”.
44
– Ext/Dia – Na frente da igreja, a secretária, o professor e o padre.
45
– Ext/Dia – Porta da frente da casa de D. Nina abre-se. A mulher está do lado
de fora da casa aguardando D. Nina e Chiquinha que saem. As três caminham
juntas.
46
– Ext/Dia – Na frente da casa grande todos esperam olhando para o céu.
(Coronel, Maria, Zé Estribeiro, Peão, Vigia).
47
– Ext/Dia – Frente da Igreja. Pequena aglomeração.
47a
– A secretária está cansada. O padre está suando e enxuga-se com um lenço.
48
– Ext/Dia na cidade. O bêbado passa e percebe que todos estão parados olhando
para o céu.
48a
– Todos ficam virados para a mesma direção e olham para o céu.
48b
– Os rostos das pessoas olhando para o céu.
49
– Ext/Dia – Aéreas de canaviais, velho engenho, usina, paisagem aérea da zona
da mata de Pernambuco.
Piloto
(off) – WZ! KDKA! UZQP!
Voz
Rádio (off) – Alô Zeppelín! Alô Zeppelín! Jequiá!
50
– Int/Dia – Estação de rádio. Operador de rádio tenta fazer contato com o
Zeppelin ou outro operador de rádio.
Operador
de Rádio – Usted me puede dar nuevas dez Zepelin?
50a
– Close do operador de rádio.
Op.
Rádio – Dove il Zeppelin?
51
– Ext/Dia – (pan) Nuvens, céu.
Op.
Rádio (off) – Where is the Zepelling?
52
– Ext/Dia – Fotos aéreas de Fernando de Noronha.
Op.
Rádio 2 (off) - Passou agorinha em Fernando de Noronha, ia fumaçando.
53
– Ext/Dia – (Arquivo – filme da época) Zeppelin no céu.
Op.
Rádio 3 (off) – Chegou em Natal! Augusto Severo, acorda de teu sono bichão.
54
– Int/Dia – Close do operador de rádio.
Op.
Rádio – Alô Zeppelin! Alô Zeppelín!
55
– Ext/Dia – (arquivo – filme de época) Zeppelin voando.
Piloto
(off) – Rádio! Rádio! Rádio! QZQPQP. GQAA…
56
– Ext/Dia – (tilt down) Pessoas (D. Nina, a mulher, o cachaceiro, o padre, as
crianças, etc...) que olham para o céu. Uma menina é a primeira que vê.
Menina
– Apontou!
Padre
– Parece uma baleia se movendo no mar!
56a
– (pan) Cachaceiro comenta, ao lado, Dona Nina benze-se e também comenta.
Chiquinha também fala.
Cachaceiro – Parece um navio avoando nos ares.
D.
Nina – Credo, isso é invento do cão.
Chiquinha
– Ó coisa bonita danada.
56b
– Close do Cachaceiro.
Cachaceiro
– Viva seu Zé Pelin!
56c
– menina vibra.
Menina
– Vivô!
57
– Ext/Dia – Zeppelin voando (imagens da época).
Piloto
(off) – Deutschland uber Alles!
58
– Ext/Dia – O cachaceiro olhando para o Zeppelin que passa.
Cachaceiro
– Olá, seu ferramenta, você sobe ou se arrebenta?
59
– Ext/Dia – (fotos da época) Zeppelin no solo pernambucano, oficiais alemães,
populares. (foto do Zeppelin no jornal).
60
– Ext/Dia – (Fazenda, curral. Perto do curral, conversam Zé Estribeiro e
meninos. Riem.
Zé
Estribeiro – O Coronel não gostava de
apelido. Assim por volta das seis horas da tarde, ele estava sentado no terraço
da Casa Grande, passeando prá lá e prá cá, quando aparece um sujeitinho...
61
– Ext/Noite – Campo, casa grande, o coronel na cadeira de balanço no terraço.
61a
– O coronel avista alguma coisa.
61b
– Um homem pobre aproxima-se da casa grande. Os cachorros latem. O coronel
observa o homem pobre.
61c
– Zé Estribeiro e depois mais dois peões vêem ver quem é.
61d
– O homem pobre tira o chapéu respeitosamente, quando fica próximo à casa
grande, pára e fala com o coronel.
Homem
Pobre – Bom noite, seu curuné.
Coronel
– Bom noite!
61e
– Close do homem pobre.
Homem
Pobre – Seu curuné, não tem um servicinho por aí pra mim não?
61f
– (P.V. do homem pobre) P.A. o coronel conversa com o homem.
Coronel
– Talvez se arrume, talvez se arrume. Como é que você se chama?
61g
– O homem fala com o coronel, atrás estão Zé Estribeiro e outros peões
observando.
Engole
Cobra – Eu me chamo Engole Cobra.
Coronel
– Engole Cobra?
61h
– Na frente da casa grande o coronel chama a mulher.
Coronel
– Engole cobra?... Ô Maria! Maria! Anda ver o homem que Engole Cobra.
62
– Ext/Dia. Fazenda, curral, Zé Estribeiro continua a contar a história.
Zé
Estribeiro – Chamou a mulher que estava lá dentro. A
mulher apareceu. Ele fez a apresentação e disse...
63
– Ext/Noite - Casa Grande, o Coronel
perto de Maria, fala ao Engole Cobre.
Coronel
– Engole Cobra, meu nego, você vai morar aí naquele ranchinho pra você ficar.
64
– Ext/Dia – Fazenda, curral, Zé Estribeiro contando a história para os peões.
Zé
Estribeiro – Passou-se sexta, sábado, no domingo o sujeito veio reclamar.
65
– Ext/Dia – Sol nasce, galo canta. O coronel está no terraço, Engole Cobra se
aproxima tirando o chapéu.
65a
– Engole Cobra fala com o coronel.
Engole
Cobra – Seu curuné, não tem um servicinho pra mim, não?
Coronel
– O que é que o senhor está reclamando, não recebeu suas férias?
Engole
Cobra – Recebi, sim senhor.
65b
– Close do coronel.
Coronel
– Não se incomode. Logo aparece! Logo aparece!
66
– .Ext/Dia – Fazenda, curral, Zé Estribeiro continua a contar a história.
Zé
Estribeiro – Lá para o meio da outra
semana, descobriram uma surucucu que não tinha mais prá onde crescer.
67
– Ext/Dia – Casa Grande, P.P., Coronel abre um sorriso e fala com Zé
Estribeiro.
Coronel
– Não bole com ela não, vai chamar ali seu Engole Cobra.
68
– Ext/Dia – Fazenda, curral, cocheira. Zé Estribeiro concluindo a história.
Zé
Estribeiro – O Engole Cobra veio nas carreiras. Disse:
69
– Ext/Dia – Fazenda, curral, cocheira. Engole Cobra conversa com o coronel que
lhe aponta uma coisa, Engole Cobra olha para onde o coronel apontou.
Coronel
– Engole Cobra, meu nego, está aí um servicinho pra você!
70
– Ext/Dia - (P.P.) Coronel apontando o lugar.
Coronel
– É só essa besteirinha pra você engolir.
71
– Ext/Dia – Num canto da cocheira, uma enorme cobra.
72
– Ext/Dia – (pan) Próximo a cocheira, Engole Cobra com riso amarelo. O coronel
observa calado. Zé Estribeiro coça a cabeça prevendo que aquilo não vai acabar
bem.
Engole
Cobra – Está doido, seu curuné, eu nunca engoli cobra, isso é apelido.
72a
– Close do coronel zangado.
Coronel
– Ahh... é apelido? Vigia! Vigia! Dá uma surra neste homem, vigia! (Zé
Estribeiro ri e Vigia se aproxima).
73
– Ext/Dia – Chaminé da usina.
74
– Ext/Dia – Canavial
75
– Ext/Dia – Almanjarra
76
– Ext/Dia – Canavial, carro-de-boi passa na estrada de terra. Crianças passam correndo.
77
– Ext/Dia – Rua da cidade. Placa numa casa indica o nome da rua. Rua do Rio.
(plano seqüência). Na frente da casa um homem deficiente físico come alguma
coisa que ele esconde na mão. Mastiga. Olha para os lados, desconfiado. Câmera
desloca-se até outra casa seguindo D. Nina e a mulher que passam. Elas param
para cumprimentar um pedreiro que organiza uma pilha de tijolos. Elas falam com
ele que responde grosseiramente. Elas despedem-se e caminham comentando algo
entre si. D. Nina vê alguma coisa que não gosta, benze-se e segura a mulher
pelo braço para mudarem de caminho, saindo empertigadas, virando o rosto para
não cruzarem com a preta Inês (a câmera acompanha a preta Inês). Inês que passa
segurando algumas penas pretas na mão. Preta Inês aproxima-se cobrindo todo o
quadro. (Cortina)
Voz
(off) – No começo da rua morava agostinho, o aleijado, a quem o povo acusava de
alimentar-se de coisas imundas: bichos mortos apanhados no fundo dos quintais!
Fronteiro
à ele morava o pedreiro Manuel Belo, que por ter sido mordido de cachorro da
moléstia, quando falava com a gente avançava como um cão.
No
meio da rua morava a celebérrima preta Inês. Catimbozeira afamada sempre às
voltas com sapos e urubus!
77a
– Ext/Dia – (cortina) Rua do rio, Preta Inês descortina o quadro passando pela
frente da casa onde na janela, está a mulata Filomena que observa a rua e penteia os cabelos.
Voz
(off) – Na outra ponta morava a mulata Filomena, a quem um jacaré acuou...
78
– Ext/Dia – Água, jacaré meio submerso observa.
Voz
(off) – ...Dentro de um banheiro no rio.
79
– Ext/Dia – Estrada de terra no meio da floresta. A mulata Filomena, nua, corre
assustada.
Filomena
– Me acudam! Me acudam!
80
– Ext/Dia – Calçamento de pedra (traveling). Pedras ocupam todo o quadro.
81
– Ext/Noite – Calçamento de pedra (traveling).
Voz
(off) – Mas nem tudo, na rua do rio, era infâmia, nojo, abominação!
82
– Ext/Noite – (traveling – câmera na mão). Casa, frente, lateral, fundos,
quintal, muro, outra casa, homem toca
pífano, pára, acende um foguete e volta a tocar pífano, pára de tocar outra vez
e acende outro foguete, voltando a tocar o pífano em seguida.
Voz
(off) – ... Na outra ponta da rua, bem nos fundos do quintal da casa da minha
mãe, morava o fogueteiro Lulu Higino, que, no silêncio das noites
consteladas...
82a
– Ext/Noite – Lulu Higino toca pífano.
Voz
(off) – Arrancava da flauta uns acordes tão suaves, que até parecia...
83
– Ext/Noite – Céu estrelado. Fogos de artifício.
Voz
(off) – ... Serem as estrelas lá no céu que estavam tocando.
FIM
A
oralidade da poesia de Ascenso Ferreira em curta-metragem
Cineasta
Marco Hanois começou a gravar Incenso, filme que presta homenagem ao poeta
Ascenso Ferreira
O Engenho Massangana, no Cabo de Santo Agostinho, foi moradia do escritor e
abolicionista Joaquim Nabuco até os oito anos e é uma das construções mais
representativas do Pernambuco do século 19. O espaço, atualmente funcionando
como centro cultural, emprestou suas particularidades históricas ao início das
gravações do novo curta de Marco Hanois, Incenso, no último sábado.
O
filme presta homenagem à obra de Ascenso Ferreira e busca, segundo o diretor e
roteirista, “resgatar as peculiaridades orais do texto do poeta e reviver um
período da história pernambucana, que ficou esquecido”: as primeiras décadas do
século 20, com suas beatas, coronéis, crendices e o espanto diante da
modernidade tardia que o Brasil começava a vivenciar. Uma das cenas de Incenso
mostra a perplexidade dos personagens diante de um Zeppelin rasgando os céus de
um Pernambuco ainda rural.
Apesar
de Ascenso Ferreira ter nascido em Palmares, o curta de Hanois não se fecha
numa cidade específica. Sua proposta é ter como cenário um interior
arquetípico, que traga pormenores de todas as cidades pernambucanas do início
do século passado sendo apresentadas ao espectador durante os 20 minutos da
trama. Dessa forma, as filmagens, que se prolongam até o próximo mês, terão
como cenário ainda os casarões antigos e ruas do Poço da Panela.
O
primeiro dia de filmagens de Incenso registrou os diálogos entre os atores
Alexandre Zachia e Tuca Andrada. Zachia interpreta um personagem chamado apenas
de Coronel, que funciona como uma espécie de “alter ego” do próprio Ascenso. O
poeta costumava dizer que um dos seus sonhos era ter sido coronel de engenho,
figura das mais representativas do imaginário nordestino. Tuca vive Zé
Estribeiro, que serve como elo das várias tramas do curta.
Amigo
de longa data de Hanois, Tuca explicou que, por pouco, ficou de fora do elenco
de Incenso devido à sua apertada agenda, que divide espaço entre a novela Cidadão
brasileiro e a turnê da peça Orlando Silva, o cantor das multidões. “Eu queria
muito fazer esse curta, tanto por minha amizade com Hanois quanto pela
homenagem que ele faz à obra de Ascenso, um poeta importantíssimo. Foi um
verdadeiro milagre que neste fim de semana eu tenha conseguido participar das
gravações”, explicou o ator, durante uma das pausas da filmagem.
Incenso
tem um elenco numeroso com mais de 30 atores, que conta ainda com nomes como
Bruno Garcia, Aramis Trindade e com as cantoras Lia de Itamaracá e Mônica
Feijó. No caso de Mônica, que atualmente participa do elenco de Páginas da vida,
ela volta a Pernambuco nas próximas semanas especialmente para gravar sua
participação em Incenso. A assistência de direção fica a cargo de Moisés Neto.
A atriz Patrícia França foi um nome cotado para atuar no curta, mas acabou
ficando de fora por problemas na sua agenda. Patricia, nos anos 80, trabalhou
em projetos teatrais de Hanois.
Todos
os diálogos de Incenso são permeados por fragmentos de textos de Ascenso. O
título do curta faz referência ao poema Mês de maio: “O incenso queima diante
do altar,/ o mês de maio vai terminar.../ Com seus deliciosos braços nus,/ as
rosas fazem o sinal-da-cruz.../ Amém...” - presente no livro Catimbó, de 1927.
Ao fragmentar diversos textos de Ascenso, segundo o diretor, o curta resgata
para toda uma nova geração a oralidade típica da obra do poeta.
O
roteiro do curta foi vencedor do prêmio Ary Severo-Firmo Neto, concedido pela
Prefeitura do Recife no ano passado, e foi orçado em R$ 80 mil. Durante a fase
de gravação, o filme está contando ainda com apoio de, entre outras
instituições, Chesf e Fundação Joaquim Nabuco, que cedeu gratuitamente a
utilização do Engenho Massangana. No entanto, a equipe ainda procura recursos
para a etapa de pós-produção.
Marco
Hanois chega a Incenso depois de trabalhos bem-sucedidos como Objeto abjeto e Cassino
Americano, que recebeu Menção Honrosa no festival Internacional de Vídeo
promovido pela JVC em Tóquio. Sua homenagem a Ascenso será lançada no primeiro
semestre de 2007. “Ainda não sei se a estréia será no Festival de Cinema do
Recife, mas quero muito que ele faça parte da programação do evento”, afirmou o
diretor.
Ascenso
Ferreira
O VII
Festival de Vídeo de Pernambuco divulgou os vencedores de 2005 em cerimônia
realizada nesta quinta-feira, 15 de dezembro, no Teatro Arraial, na Rua da
Aurora. Este ano, foram inscritos 73 vídeos, dos quais 38 foram selecionados
para a Mostra Competitiva, ocorrida esta semana no Teatro do Parque.
Os prêmios do Júri Popular foram os primeiros a serem entregues. Na Categoria
Documentário ganhou Daniel Barros, com Mais Um Domingo; Dando Crédito, de
Rafael Infa levou em Ficção; Plínio Uchôa e Marcos Buccini em Experimental com A
Morte do Rei de Barro e Ireny, de Gabriel Mascaro e Daniel Aragão venceu na
categoria Vídeo Clip.
A Comissão Julgadora, composta pelas jornalistas Clara Angélica e Carol
Almeida, pelo programador visual Fernando Vasconcelos, pelo produtor Osmar
Barbalho e pela cineasta Kátia Mesel, premiou nove vídeos em três categorias e
decidiu também premiar cinco vídeos com Menções Honrosas, atribuindo a cada um
o valor de R$ 1.000,00, equivalente a um terceiro lugar.
Já o Concurso de Roteiros Firmo Neto/Ary Severo teve, este ano, 47 projetos
inscritos, que foram analisados pelo jornalista Ernesto Barros, pelo
pesquisador Lula Cardoso Ayres, pelos cineastas Osman Godoy e Fernando Monteiro
e pelo fotógrafo Roberto Santos Filhos.
O Prêmio Ary Severo, pago pelo Governo do Estado de Pernambuco, foi para Um
Lugar ao Sol, de Gabriel Mascaro e o Prêmio Firmo Neto, pago pela Prefeitura do
Recife, escolheu Incenso, de Marco
Hanois (assistência de direção Moisés Neto). Cada um receberá R$ 80 mil para
produzirem um curta-metragem de 15 minutos. Ambos os vencedores ganham pela
primeira vez o concurso público.
quinta-feira,
5 de agosto de 2010
INCENSO DE MARCOS HANOIS PERFUMOU A TÃO AGUARADADA
ESTREIA DO NOVO PROJETOR DO CINE THEATRO GUARANY
Por
Lucivaldo Ferreira
Foi assim, sem nenhum alarde, sem pronunciamentos oficiais e casa praticamente
vazia que o Cine Theatro Guarany viu a máquina de mais de 50 mil dólares lançar
oficialmente sobre a grande tela seus primeiros feixes de luz.
Talvez o pequeno publico ali presente sequer houvesse se apercebido, mas viviam
naquele instante, exatamente às 17:39h da tarde do dia 04 de agosto de 2010, um
momento histórico. Ali, depois de tantos anos o Cine Theatro Guarany dava um
talvez pequeno, porém importante passo em seu renascimento. Rodava em seu
projetor o curta-metragem do cineasta pernambucano Marcos Hanois, “Incenso”.
O curta 35mm pintou a tela da despercebida festa com a oralidade e a poesia do
grande poeta Ascenso Ferreira e trouxe ao baile de cores e sensações beatas,
coronéis, crendices e memórias de um Pernambuco esquecido nas prateleiras das
bibliotecas.
De repente um Zeppelin rasga o céu do filme e seus personagens de olhos
arregalados se espantam diante da bela “espaçonave” e toda sua modernidade
naquele Pernambuco rural. E ali na sessão das cinco outro grande Zeppelin
irrompia a escuridão com suas fotografias correndo um após a outra. Fotografias
do nosso povo, fotografias de mim, de quem ali esteve vendo a “história”
passar.
O PROJETOR
Na manhã da terça-feira, dia 22 de setembro de 2009 teve fim uma longa espera.
O Cine Theatro Guarany finalmete recebeu o seu tão aguardado projetor.
O equipamento de última geração vindo diretamente de Miami (FL USA), custou
mais de 50 mil dólares e opera nos sistemas analógico e digital.
A montagem do novo equipamento foi feita pelo Sr. Zé Hildo, o único técnico
responsável pela montagem dos cinemas em Pernambuco e pelo engenheiro Sr.
Claudiney , que veio diretamente de São Paulo para executar a tarefa de
instalar o projetor. Ambos foram auxiliados pelos triunfenses Sandro Martins e
Serginho.
O projetor da marca Christie é um dos poucos do país. Segundo o Sr. Zé Hildo, o
novo equipamento é o que há de mais moderno em se tratando de projeção, e no
Brasil só existem três além do nosso: um fica em Aracaju/SE, outro em Natal/RN
e o outro em São Paulo/SP.
Capturado
em 30 de julho de 2012
in http://www.triunfob.com/2010/08/incenso-marcos-hanois-perfumou-tao.html
Ascenso
era um humanista
Publicado em 08.05.2008
Viúva
queixa-se do descaso com a memória do poeta. D. Lourdes rejeita rótulo de que
ele era comunista e lembra a amizade com Arraes
Dona
Lourdes mora numa casa no bairro de Campo Grande. Tem um cachorro e 23 gatos.
Mas seu sonho é criar cavalo. Não só um, mas muitos. “O bicho que eu mais gosto
é cavalo, mas não dá para ter um cavalo dentro de casa”, justifica cheia de dó.
Mas tantos animais não dão trabalho? “Se não fossem por esses gatos, não
haveria trabalho nessa casa”, diz e aponta para uma cadeira de balanço que
comprou para um dos seus gatos, o mais novo deles. “Só quem senta é ele.”
D.
Lourdes vive também cercada por imagens do poeta e ex-companheiro Ascenso. O
corredor que dá para o seu quarto tem a placa “R. Ascenso Ferreira”. Ela pede
para o caseiro colocar uma fita VHS com um documentário de imagens do poeta.
“Olhem ele”, aponta para uma foto de Ascenso que aparece na TV.
Ela
diz que nem se lembra quantos anos morou com o poeta – “Parece que foi a vida
inteira.” Tanto foi/é a vida inteira que “parece que ele está vivo, que nunca
foi embora”. Após a morte de Ascenso, D. Lourdes saiu de Pernambuco. “Tive de
ir embora porque as pessoas achavam que eu era comunista. Mas nunca fui
comunista, nem eu nem Ascenso. As pessoas achavam isso dele porque era um homem
que falava com todo mundo, tinha uma personalidade bastante forte. Ascenso não
era comunista, era humanista”.
D.
Lourdes tem na ponta da língua as razões do esquecimento em torno do nome do
seu marido. “Primeiro porque ele foi muito amigo de Miguel Arraes, diziam que
Miguel Arraes era comunista, mas nunca foi comunista. Ele foi um grande amigo
da gente, um amigo de verdade, um pai de família linha dura. A outra, é que as
pessoas tinham inveja da personalidade dele”, destaca. “As pessoas esquecem de
tudo com o tempo, o tempo corrói tudo. Tanta gente importante e ninguém
lembra”, reflete D. Lourdes.
Outra
frustração de D. Lourdes é o filme Incenso, de Marco Hanois, que está parado.
“O diretor faleceu ano passado mas não teve dinheiro para terminar o projeto”,
reclama. O filme coloca em imagens os poemas de Ascenso, com um elenco formado
por nomes como Aramis Trindade e Bruno Garcia. “São todos atores da Globo e tem
um personagem que faz Ascenso, ele é igual a Ascenso, igual. Parece que você
está vendo ele”.
Quando
Marco Hanois faleceu em novembro passado, deixou o filme montado. Falta apenas
a finalização. “Colocamos no concurso de audiovisual da Fundarpe, mas ele não
foi aprovado. Isso é incrível, sobretudo se lembramos a importância da obra de
Ascenso Ferreira e a própria carreira de Hanois, que teve filmes premiados no
exterior”, destaca o produtor de Incenso, Pedro Celso, que diz que o projeto
precisa reunir ainda R$ 50 mil. “Como é que deixam parado um projeto desses, o
filme é emocionante”, diz D. Lourdes.
Enquanto
o filme não fica pronto, é o Ascenso poeta que chega ao público com a cuidadosa
edição da Martins Fontes. E desta vez é importante que apareça o poeta e não o
homem. “Uma das coisas que chamam a atenção de quem se propõe a estudar a
poesia de Ascenso Ferreira é o contraste entre a escassez de textos críticos e
a abundância do anedotário a seu respeito. Com efeito, nas escassas publicações
sobre Ascenso Ferreira, os comentadores centram-se sobremodo na sua figura
‘descomunal’, na espirituosidade, nas atitudes pouco convencionais, no vozeirão
e no modo único de recitar suas próprias poesias”, explica Valéria Torres Costa
e Silva.
ANIVERSÁRIO
O
aniversário de 113 anos de Ascenso Ferreira, que acontece amanhã, é duplamente
comemorado. Às 18h30, a Livraria Cultura recebe o lançamento da edição que
reúne Catimbó, Cana caiana e Xenhenhéim. Haverá encenação de poesia com as
participações de Geninha da Rosa Borges e Adriano Cabral e uma mesa-redonda com
Nagib Jorge Neto, Fernando da Mota Lima, Juareiz Correya e a própria Valéria.
Às 22h, haverá recital da poesia de Ascenso no bar Casa da Moeda, com nomes
como Jomard Muniz de Brito e Cida Pedrosa. (S.C.)
Prefeitura
entrega novo túmulo de Ascenso Ferreira
Um dos nomes mais importantes do Modernismo no Brasil, o poeta pernambucano
Ascenso Ferreira recebe uma homenagem nesta segunda-feira, quando a Prefeitura
do Recife entrega à viúva do escritor, Lurdes Ascenso, o novo túmulo do poeta,
no Cemitério de Santo Amaro. Na ocasião, às 10h, alguns poemas do autor
pernambucano serão recitados e o toque de silêncio será executado pelos clarins
da Polícia Militar.
Todo em granito, o túmulo ocupa um terreno de 3m2, doado pelo Governo
Municipal. Na lápide, foi reproduzido o poema “Noturno”, em que Ascenso
Ferreira alude a ícones da capital pernambucana, como as ruas do Bairro do
Recife e o rio Capibaribe.
A cerimônia também marca os 43 anos da morte do poeta, que aconteceu em 05 de
maio de 1965. Ascenso Carneiro Gonçalves Ferreira nasceu, no ano de 1895, na
cidade de Palmares. Em 1920, mudou-se para o Recife, onde foi colaborador de
alguns jornais locais e deu início a sua carreira literária. Ele se voltou para
temas regionais que foram reunidos em livros, como "Catimbó" (1927),
"Cana caiana" (1939), "Poemas 1922-1951" (1951), entre
outros.