FRANKENSTEIN
(texto
de Moisés Monteiro de Melo Neto)
(o fantasma da mãe de Victor o acalenta. Passa a mão
no cabelo dele. O põe no colo. O VICTOR está deitado, assiste TV, mexe muito no
celular; seu rosto reproduz emojis bebe
coca-cola como se fosse uísque. O fantasma da mãe tenta protegê-lo.
Aparentemente Victor está estranho. O fantasma da mãe sai lentamente. Entra o
monstro, com pacotes; Victor boceja e
demonstra pouca ansiedade)
VICTOR – Mamãe,
a senhora sabe os que são emojis? Emoji
é uma palavra derivada da junção dos seguintes termos em japonês: e + moji. Com
origem no Japão, os emojis são ideogramas e smileys usados em mensagens
eletrônicas e páginas web, cujo uso está se popularizando para além do país.
(fantasma da mãe parece
não ouvir/ interagir com certas coisas; nada responde sobre emojis, por exemplo;
tipo inalterada; Victor continua
explorando o fone, que talvez tenha
contato direto com imagen do datashow/ ou TV tela grande; houve os passos do Monstro que se aproxima;
olha para mãe; ela sacode a cabeça num abuso triste e faz gesto de recusa
absoluta ao Monstro, abraça o filho e sai))
VICTOR – Mamãe
não gosta de você.
MONSTRO – Velha chata,
problema dela. Preconceituosa, isso que ela é. Jamais aceitaria uma criatura
como eu. Mas mãe a gente não escolhe, não é?
VICTOR –
Conseguiu comprar alguma coisa. (Victor
tem um olho no fone outro nos lances da cena) O quê? Não. Não me diga: me daria
enjôo estas porcarias que você come. E não vou nem chamar você de monstro, pois
eu fiz você, não é?
MONSTRO – Eu sou
um amor de monstro, não sou, não? Olha: recargas!
VICTOR – Uau!
Pelo menos isso. É, ainda bem! E esses troços aí? Remédios? Comida? (olha o conteúdo dos sacos de papel do tamanho
grande; decepciona-se com o conteúdo deles) Estamos mesmo em guerra! Todos estão se
mobilizando, de novo. Maldito século XXI, já vai tarde, talvez, pois, no século
XXII. E esses escândalos.
MONSTRO – Uma
coisa realmente mons-tru-o-sa! (sacode sua
roupa que inclui barulho de guizos, acende em parte e brilha.) Arrepiante.
Essa vida é mesmo uma grande comédia. E quando a vida parece uma comédia, temos
que saber como rir dela, não é, Doc? Ninguém suspeita de nós. Culparam um
empregado da fazenda.
VICTOR – Não é
assim que eu penso. E de acordo com o que li na net... (pega algo dentro do saco que o monstro trouxe, joga às pressas na boca
e tem dificuldade para engolir, o monstro o ajuda; Victor zomba dele). Vixe!
sua pele está horrível! Seus olhos estão fora do lugar (corrige o ombro e a cabeça do bicho) não conseguiu comprar carne?
MONSTRO – A
coisa está terrível! Todos estão correndo como doidos. A qualquer minuto
estoura vem o pior da guerra. Foi por isso que hoje ninguém notou que sou um
monstro e me confundiram com um humano monstruoso qualquer. Tá assim deles no
meio da rua. O caos. Recife será alvo de várias explosões. Estão evacuando os
prédios mais altos e...
VICTOR – Uma
matéria sobre nós no Recife SKY FALL, de hoje. Escute: um famigerado monstro
vem atacando lojas e supermercados enchendo de admiração e repulsa alguns
cidadãos; a galerinha jovem está curtindo de montão; virou tendência nas
baladas; o monstro lembra aquela descrição do que foi visto na cena de um crime
que chocou tudo e todos; o dos dois jovens encontrados mortos na semana
passada, na fazenda de Victor Frankenstein, um era o capataz da fazenda, tinha
21 anos, era irmão da outra vítima, Judite, que morreu, inexplicavelmente, vestida de noiva no dia do casamento dela com
Victor (olha o monstro, os dois
riem. Fake news! KKKKKKKKKKKKKKKK! (Victor
para e faz um número de palhaçaria com o monstro). Mentiras!
MONSTRO – O
essencial é invisível aos olhos, não é? É melhor ser do que ter!
VICTOR – Meus
planos foram por água abaixo. Jamais pensei que você tivesse coragem de cumprir
suas promessas assassinas! (bebe mais)
A única coisa boa, neste exato momento é este refrigerante, acredite. Mesmo
sendo vagabundo... é refrigerante!
(pausa) E o dinheiro? Conseguiu no
cartão falso?
MONSTRO – (rindo
feito doido) Sim. Nas intermitências da rede. Eles estão temendo um colapso
financeiro em grande escala, de novo. Palhaçada!
VICTOR –
Você é tão sabidinho. (O monstro se deita) Conseguiu comprar
uma boa quantidade?
MONSTRO – Oh, sim! E meus suplementos, também.
VICTOR – Não
durma! Precisamos conversar.
MONSTRO – Eu já
lhe contei tudo.
VICTOR – Eu
quero escutar tudo novamente.
MONSTRO – Matei
as duas únicas pessoas que lhe amavam e podiam lhe ajudar. Porque você fugiu de
mim, traiu nossos princípios! Deixou-me só, abandonado à minha própria sorte. (música
dramática, monstro caricatura o sofrimento) Na minha mente tudo é
desordem... lembro-me de ter morrido.
VICTOR – Sim, e
eu o ... (pausa) ressuscitei.Eu ressuscitei você! (abre
um frasco; toma uns comprimido; ri)
MONSTRO – Eu
lembro pouco, já faz um ano.
VICTOR – Um ano
que eu sofro incessantemente. Eu devia ter ficado na Fazenda. Nunca devia ter vindo para a universidade.
Ter criado você.
MONSTRO – Eu já
sei de tudo sobre sua vida. Está no meu cérebro.
VICTOR – Minha
mãe não se recuperou, morreu ontem, depois de muito tempo, naquele tão hospital (canta
um música absurda e dança com glamour inusitado). Ela é sua terceira
vítima.
MONSTRO – Desculpe.
VICTOR – Ah!
como se pudesse se desculpar uma coisa destas! Era a minha chance de ser
feliz! E Judite! A ... única mulher que eu amei.
(monstro deita; no plano da alucinação é
reconstituída quando o monstro tenta
beijar Judite, que experimentava o vestido de noiva; ela usa o véu e grita
“Nelson Rodrigues! Nelson Rodrigues!”. O monstro tenta estrangular, mas ela já
é um fantasma que se retira com um riso estranho nos lábios e gestos de desdém)
MONSTRO – Você
me desafiou! Antes do casamento lhe dei uma chance e o que você fez? ah! Você
me desprezou! Me ridicularizou. Eu sempre vivi escondido por sua causa, porque
você me fez esta caricatura grotesca de um homem!
VICTOR – Eu
busquei a perfeição!
MONSTRO – Não me
conte! Eu já sei de tudo. Matei Judite sim, com toda a raiva que eu tinha, e,
mataria mil vezes aquela menininha
impertinente. (ruge) Sabe? (pausa dramática) Eu me tornei mais humano
depois daquele assassinato!
VICTOR – Eu não
vou conseguir emprego como cientista, nunca mais, em lugar nenhum.
MONSTRO –
Podíamos ir para uma ilha distante.
VICTOR – Que
ilha? Aonde nós chegamos, somos escorraçados! Você podia ser apenas um projeto!
Mas não! Eu tinha que construir você.
MONSTRO – Eu não
pedi para nascer!
(o monstro canta uma música brega originalmente feita para a peça)
VICTOR – Pare já
com esse número ridículo!
MONSTRO – Não
podemos ter tanto medo assim do ridículo, não é, doc?
VICTOR – Matou
Judite (começa a andar em círculos)
Matou... o irmão dela!... e fingiu o tempo todo que...
MONSTRO – Se
feche pro meu lado! Hum! Já disse: eu não fingi nada!
VICTOR – Fingiu
sim!
MONSTRO – Nunca!
Pelo menos isso eu tenho.
VICTOR – O quê?
O que é que você tem de seu? De só seu? Hein?
Eu reconstruí o seu corpo. (pega
na cabeça do monstro que está sentado e indefeso) o seu cérebro! Ah! Como
um matemático... um diretor de cinema... Mas você reagiu de forma
estranha à sua formação... é isso que eu
digo: você não deu certo!
(NÚMERO DE PALHAÇARIA: dá um murro
na cabeça do monstro)
MONSTRO – Morra de
falar. Vá, seu ridículo! Uhu! (estica a boca e faz munganga de palhaçaria) Uh! KKKKKKKKKKKKK: eu não sofro! Eu sou
apenas um monstro. (faz pose de galã de
vitrine) Um amor de monstro. Se eu tivesse um canal no youtube, eu ia virar
tendência!
VICTOR – Estrangular
minha noiva Judite... uma garota fantástica!
MONSTRO –O
capataz de 21 anos também era um (zomba) garoto... fantástico . Não era?
VICTOR – Sua
mente é pior do que eu pensava. Parece aquele seriado americano pra fazer
idiota rir de porcaria! (chora como num drama de circo) Eu os
amava como se fossem meus irmãos...
MONSTRO – Dois
matutos. Animaizinhos do interior!
VICTOR – Eu
também sou “matuto”... Um animal do interior...este verniz acadêmico nada
significa.
MONSTRO – Tolice
sua, você exagerou na Coca-Cola! Foi isso!
VICTOR – Viver
de golpes! Ah,se eu pudesse vender você (pausa irônica) ...para um circo, ou
talvez para um laboratório, sei lá...
MONSTRO – (geme profundamente) Ahhhhhhhhh...! (pausa atormentada e obviamente
ridícula) De que me valeu levantar dos mortos? (muda para erótico doido) Me
sinto tão... tão... tão fragmentado... pós-modernidade líquida! Tão... Tão...
digital... to muito doido com isso tudo...
VICTOR – (vai até uma mesinha, senta-se numa cadeira
e olha-se num espelho que está voltado para a plateia) Palavras. Palavras. Palavras.
Palavras não podem descrever... o
horror! (afasta-se do espelho). Desde
que resolvi me dedicar aos estudos sobre o ser humano, fui me afastando cada
vez mais... do povo, da no Hellcife...
MONSTRO –
(dopado, repete mecanicamente)
Mmmaaallldittto Recife! (cai na
cama no primeiro andar, a gargalhar)
VICTOR – Meu
nariz está sangrando! A minha fazenda, meu lugar,meu país,minha casa (pega um lenço) esta cidade, minha
cultura (assoa o nariz). Eu não
aguento mais este... carnaval de falsidades. ( tenta parar a peça, dirige-se à
plateia). Se Leidson Ferraz estivesse vivo, pelo menos... pelo menos ele... Ah,
sei lá! Ou fosse na época dos grandes críticos de São Paulo m e do Rio de
Janeiro... (procura os biscoitos) Nem a porra de um biscoito
tem aqui (pega uma garrafa de coca-cola). Meus inimigos estão no poder (olha o monstro). Seu desgraçado! (bate violentamente no monstro) Devolva!
MONSTRO – Pare
com isso!
VICTOR – Devolva
tudo (como um ator caricato de Hollywood) para mim... para o povo... para o Senhor do
Cosmos.
MONSTRO – Você? (como cego) é você o Senhor do Cosmos?
Que veio me visitar? (cai)
VICTOR – (delira
comicamente) Eu quis mais... Agora
cheguei à beira do abismo. O país está
em chamas e todos têm de se redimir para encarar o espírito nacional. O povo...
as favelas... os prostitutos... e as crianças famintas, e a minha mãe morrendo
e as minhas terras e os camponeses e os assassinos de aluguel e esses dias todos. E eu?
MONSTRO – (ri) KKKKKKKKKKKK! Você é um péssimo ator!
(fazem um número musical)
VICTOR – Você
também não é nenhum Johnny Depp!
MONSTRO –
(levantando-se um pouco) Me dê um gole disto. (bebe) Ah! Como é terrível não
ter paladar. Não sentir gosto!
VICTOR – (tomando o copo)
Então não beba. Não é bom para sua constituição. A bebida vai corroer suas
entranhas. (pega na cabeça do monstro) Tanta coisa boa eu coloquei no seu
cérebro. Você seria o homem perfeito para governar esse país. Onde foi que eu
errei?
(soa primeiro o alarme)
MONSTRO – O
alarme! Temos que ir para o abrigo! Avisaram que todo mundo vai fazer isso.
Abrigos subterrâneos. E o preconceito contra sujetos como eu? Vão me
esquartejar, de novo!
VICTOR – Canalhas!
Todos! Nos espremer em bu-ra-cos. Como ratos , embaixo do chão.
Nunca mais poder desfrutar da luz do sol. Eu sou um condenado...um prisioneiro
condenado. Numa masmorra terrível: eu mesmo!(bebe mais coca-cola falsificada) Tanto
que eu lutei por uma situação melhor! E quando não tiver mais desse refrigerante
para beber?! O que vai ser da minha vida?
MONSTRO – O
senhor é um homem exemplar, professor.
VICTOR – Não se
atreva a repetir isto.
MONSTRO – Não
sei o que dizer para lhe agradar.
VICTOR – Eu
preciso falar, conversar com alguém nem que seja com você. Diga qualquer coisa.
(pega mais uma lata no pacote que o monstro trouxe; bebe mais refrigerante; olha dentro do pacote e pega uma lata de
carne) legal essa carne basta comer uma colher por dia e qualquer outra coisa,
até papel para formar fezes...
MONSTRO –
(deitado no divã, como no psicanalista) Judite e o irmão dela; ele era um belo
rapaz, eu, que fui criado este traste que você fez de mim, mas que sei me
truquear, às vezes. Percebi logo que o senhor era apaixonado pelos dois.
VICTOR – E o que
é que você tinha com isso?
MONSTRO – Pra
que você me criou?
VICTOR – Minhas
intenções foram boas.
(número curto
com o monstro dublando DON'T
LET ME BE MISUNDERSTOOD , com o Santa esmeralda)
Baby, do you understand me now
Sometimes I feel a little mad
Well don't you know that no-one alive
Can always be an angel
When things go wrong I seem to be bad
I'm just a soul who's intentions are good
Oh Lord, please don't let me be misunderstood
Baby, sometimes I'm so carefree
With a joy that's hard to hide
And sometimes it seems that
All I have to do is worry
And then you're bound to see my other side
I'm just a soul who's intentions are good
Oh Lord, please don't let me be misunderstood
If I seem edgy, I want you to know
That I never mean to take it out on you
Life has it's problems and I get my share
And that's one thing I never mean to do
Cause I love you
Oh, oh, oh, baby, don't you know I'm human
Have thoughts like any other one
Sometimes I find myself alone and regretting
Some foolish thing, some little simple thing I've done
I'm just a soul who's intentions are good
Oh Lord, please don't let me be misunderstood
Yes, I'm just a soul who's intentions are good
Oh Lord, please don't let me be misunderstood
Yes, I'm just a soul who's intentions are good
Oh Lord, please don't let me be misunderstood
Yes, I'm just a soul who's intentions are good
Oh Lord, please don't let me be misunderstood
MONSTRO – Eu não
tinha emoções. (pausa chorona)
Naquele dia, surpreendi o irmão de
Judite, no banheiro. Era o dia do casamento do seu casamento com a irmã, dele.
Ele tentou gritar. Eu queria apenas conversar com ele. Me explicar! Daí as
coisas se confundem na minha cabeça. O beijo, as fezes... o sangue...
VICTOR – Beijo?
Mas que beijo?
MONSTRO- Um beijo... as fezes... o sangue, o grito
sufocado, eu batendo a cabeça dele na pia.
VICTOR – Pare! (pega na cabeça, tentando não ouvir, põe as
mãos no ouvido. Entra o fantasma de Judite)
MONSTRO – Corri
para o quarto de Judite. Ela já estava pronta para o casamento. Se perfumava quando
eu entrei. Quis fugir, eu a detive. Ela
notou o sangue nas minhas mãos sujando seu vestido branco, depois eu lembro dos
olhos dela nas minhas mãos... ela perdendo a consciência, eu rasgando os peitos
dela, o pescoço... Ela caindo, eu caindo, eu com as jóias, na casa de um
empregado, ninguém me viu. Aí surgiram minhas primeiras emoções.
VICTOR – Seu
monstro!
MONSTRO – Você
me criou.
VICTOR –
Desgraçado!
MONSTRO – Você
me criou.
VICTOR – Porque
você não vai embora?
MONSTRO – Porque
você é tudo que eu tenho. O meu elo com o mundo. Porque é que você não desiste
de mim? Mate-me! Mas não me trate sempre como se estivéssemos diante de um
tribunal onde expurgássemos todas as nossas culpas. Você não é meu juiz!
VICTOR – Você
acabou com a minha vida.
MONSTRO – Você
acabou com a sua vida. Seu trouxa! Seu bunda mole!
VICTOR – Monstro
assassino!
MONSTRO – A
única coisa que eu sabia fazer era matar... o mundo era estranho pra mim ... eu
não sabia fazer nada, fui aprendendo tudo lentamente. Até o sol me assustava.
Por sua vez, o povo também me desprezava. Onde eu passava era apedrejado,
vaiado, cuspido, (olha para o VICTOR) podiam ter me dado um corpo melhor, um rosto
bonito, mas não! Eu assusto as pessoas só de olhar para elas! Esses meus
olhos...(pega o espelho) Você tem
obrigação de me dar uma vida melhor.
VICTOR – Onde
foi que eu errei? (acende um cigarro)
MONSTRO – Nós
não erramos, eles é que não entraram na viagem.
VICTOR – Que
viagem? (soa o segundo toque)
2ª ATO
MONSTRO – É o
sinal da bomba! (bate com a cabeça no chão depois de se ajoelhar-cai) me sinto como Lúcifer...
expulso da casa de Deus-pai... eu originei o perdão... Tive que refazer a
terra... quis criar um novo lugar... mas este lugar é o Recife ... sou um anjo
repugnante! Eu não dei certo. Sua experiência é o que eu sou! Você não sabe
explorar meus potenciais nem eu tenho
como explicar! E eu o sigo mesmo assim... não quero fugir! Sou um escravo!
VICTOR – Lá vem
você com esta história. (pausa) Você
é livre. Vá embora. Fuja! Ai! (simula câimbras)
como dói!
MONSTRO – (um pouco indiferente, um pouco cuidadoso)
São... (pigarreia) as ...câimbras? As
câimbras voltaram? (inclina a cabeça)
VICTOR – Sim!
Depois daquele acidente, nunca mais fui o mesmo.
MONSTRO – Está
vendo? Foi tentar fugir... deu nisso. Deixe-me massagear...
VICTOR – Nunca!
(pausa) Eu não me arrependo de ter
saído pelo mundo! Devemos sempre viajar... tenho minhas mãos... meu cérebro,
minha fé. E sobrou algo em mim que a ciência não pode destruir! (olha para um
horizonte imaginário) É essa minha vontade... uma fonte de energia que
vai brotando à medida que dela me conscientizo! A vontade de acima dos vícios e
virtudes! A vontade de mudar...
MONSTRO – Do
Recife?
VICTOR – (pausa)
De vida!
MONSTRO – No
Recife?(começa a tocar uma melodia bem suave)
VICTOR – Na
minha infância havia um lugar... era lindo! O areial...o vento na campina...as
pequenas flores do campo...a imensidão...O trenzinho apitando...os livros...As
vaquinhas...os gansos,as ovelhas...o mel...as comidas de São João. E agora que
estou assim... sinto que a inveja e a
incompreensão destruíram tudo pelo poder, que eles juram que será do povo.
(bebe) Descubro horrorizado que somos nós, que de nada usufruímos, que vamos
pagar a conta!
MONSTRO –
Façamos a revolução, mestre ! (curva-se)
VICTOR – Já
houve a “Revolução” no Recife! Mas por causa das alianças políticas, o
processo é... lento..
MONSTRO – Não
sinto os efeitos da revolução.
MONSTRO –
Maldito Recife! Não há lugar para pessoas como
nós, aqui. Não é? (ri) Você teme a opinião dos outros a nosso respeito? Você tem vergonha de mim?
VICTOR – Se você
desaparecesse de repente, seria ótimo! Não agüento mais carregar você para cima
e para baixo. Você é como se fosse o meu
câncer! (som alarmante)
MONSTRO – (monstro
coloca a mão na boca,para evitar grito de horror, que explode de repente) Carrasco! (esbofeteia o cientista). Dane-se ,com sua mania de onipotência!
Mate-me! Mas você não tem o direito de me julgar! Homem oco! Suas
entranhas, são de palha! (pausa) Uma
vez, tive um sonho! Estava num campo.(pausa)
Perdido. Desesperado. Sozinho... sem saber que direção tomar; pois todas
levavam a lugar nenhum... até que na linha do horizonte, apareceu o senhor,mestre, em cima de um cavalo muito
bonito, rápido, vindo em minha direção, e , ao ver-me triste
naquela imensidão de agonia, puxou-me para cima do cavalo e seguimos. Eu me
acalmei, não queria nem saber aonde íamos!
VICTOR – (bebendo,distraído) Não sabia que você
tinha sonhos.
MONSTRO – Esse
foi o único. (baixa a cabeça)
VICTOR – Muito
fácil de decifrar, este seu sonho, os arquétipos...
MONSTRO – Estou
acima dos arquétipos da “psicologia doentia” do Dr. Freud e de outros canalhas
que não fizeram mais do que emporcalhar a cultura humana! Estou acima da
“moral” dos homens! Sou um soldado! Não sou uma vítima como você, Victor: Que
faço mestre?
VICTOR – Isto é
teatro ou vida real?
MONSTRO – Não
sei. Me deixe desacordado, enquanto
o senhor encontra a solução. Ou enquanto não explode ...a bomba!
VICTOR – Não
acredito na... bomba !!!
MONSTRO – Eu
gostaria de ficar congelado (pausa) até amanhecer de uma nova raça.
VICTOR – Eu o
manterei drogado até que possa achar uma solução.
MONSTRO –
Talvez, hoje quando acabar o espetáculo, alguém nos procure e, juntos,
poderíamos...quem sabe? É! Encontrar uma
resposta, que sirva para sair deste labirinto...
VICTOR – Sim,
talvez atrás do palco, hoje, esteja a minha chance, ou talvez no camarim quando
eu estiver retirando minha maquiagem, eu veja através do espelho, o fio que nos
guiará para fora deste...labirinto...e sabe qual é ele? O clarão atômico...o
som da destruição em massa! Talvez amanhã...O fim sempre está mais próximo do
que imaginamos... (um som de explosão, vidros estilhaçando-se, gritos de crianças tiros.
Alguém grita: “larga o que é meu!” Latidos) Será o fim?
MONSTRO – É a
guerra!
VICTOR – O
pacato povo do Recife foi obrigado a fazer guerra! Os zumbis malvados na
essência escondida até deles mesmos, se revoltaram, não assistem mais à
televisão, estão nas ruas!
MONSTRO – No
meio de uma guerra... ninguém vai nos notar... sim! Podemos desenvolver milhões
de projetos! Imagine a quantidade de
miseráveis ,dispostos a qualquer coisa...
VICTOR – Cala a
boca! Idiota!
MONSTRO – Você
me fez assim!
VICTOR – Não meu
filho!
MONSTRO – Sim:
seu filho! (explosão mais próxima). Diga-me VICTOR: o senhor vai imortalizar-me
na sua obra? Eu sou sua obra prima?
VICTOR – Sim. Você
é minha obra-prima! Meu ...melhor aluno! Você, será imortal. Mas não sei se
algum dia... alguém vai lhe entender...
sabe? É muito difícil... (bebe) De que adianta viver assim? Você é igual a
merda! (bebe, completamente indiferente ) Não serve para nada.
MONSTRO – Sua
vaca!
VICTOR – (levanta-se)
E você é uma girafa no Polo-Norte!
MONSTRO –
Alienado! Estamos nos últimos dias do Recife, talvez, desta vez a gente
consiga... e você ainda se dá o luxo de delirar...
VICTOR – Nunca
haverá um fim para o Recife. Porque Recife é como uma Fênix. Das cinzas do
Recife se erguerá sempre uma nova folia da e vai ter cachaça e sangue quente,
fertilizará a terra atômica e uma nova raça surgirá.
MONSTRO – Eu sou
o protótipo de uma nova raça.
VICTOR – Você é
nada! É fruto de um “alienado” flor de uma frágil planta parasita, talvez (bebe mais Coca-cola) nunca, por mais que
você tente me destruir...você não vai conseguir...
MONSTRO –
Nunca... eu tentaria destruir o senhor...meu...pai... quer dizer ...o mestre que eu sempre imaginei...
VICTOR – Um pai?
Um mestre? (está confuso). Que horas
são?
MONSTRO – O
tempo parou.
VICTOR – O tempo
nunca pára ... só quando é para olhar o boi voador (ri) ...vendedor de
caranguejo, comedor de lixo, explorador do povo (ri assustadoramente para a
platéia) Vampiros! Lobisomens! E lá de um
tempo bem distante,vêm as beatas... sagradas! Anjos, demônios ...do
sertão... do litoral! De todo o lugar.
Todos curvam-se e olham para cima e
alguém grita: “Olha a guerra!”
MONSTRO – (atento)
Eu escutei um barulho.
VICTOR – Como
assim? (batem na porta)
MONSTRO – Assim
(batem mais forte). Quem será?
VICTOR – Não
abra. Pode ser a política! Esconda-se!
MONSTRO – A
polícia?
VICTOR – Se não
é a polícia... quem será?
(entra uma dançarina de programa de TV, muito nervosa,
olhar e modos de quem pede abrigo; chega perto do doutor, ela tem um aparelho
de som que toca música de pastoril eletrônico; insinua-se sexualmente, mas
quando vê o monstro, grita apavorada e sai correndo por onde entrou)
MONSTRO – (entediado) Odeio vedetes, toda vitrine do Recife agora
tem uma, ou tinha antes da grande crise de 99; uma vedete seminua? Pedindo
socorro... que horror... só falta eu
quebrar o pescoço dela para ela e o público aqui presente saber o que é bom pra
tosse...
VICTOR – Vamos ficar em silêncio. Pensarão que não há
ninguém aqui e irão embora... (ficam em silêncio por um tempo) Devem estar
convocando todos para os abrigos...
(batida na porta e uma voz em OFF diz: “último aviso: sigam para o quartel mais próximo,
de lá sairão as conduções para os abrigos. “Atenção! Última chamada”)
MONSTRO – Acho
que foram embora... (pausa)
VICTOR – É. (ri) Nesta hora, todas as lojas, bancos,
supermercados, devem estar sendo saqueados... as procissões vindas do interior
deparam com o horror e vão logo se integrando à festa... porque hoje também é
carnaval, é São João... São Pedro... fim de ano... é ciranda à beira mar. Tem
canjica, pamonha... galinha assada... piquenique ... e todos que colocarem uma
moeda terão seus desejos atendidos (bebe
mais Coca-cola)
MONSTRO – Devo
estar ficando cego... este calor... abafado... não consigo respirar;
VICTOR – Eu vou
encontrar uma saída. No final via dar tudo certo.
MONSTRO – Não
acredito mais. Nunca acreditei.
VICTOR – Vamos
voltar para a fazenda, viver ao lado dos camponeses! (pausa). Esqueça. (pausa)
Você acredita em Deus?
MONSTRO – Agora
eu acredito.
VICTOR – Eu
acredito em mim e no que faço. Se pelo menos Judite estivesse aqui!
MONSTRO – Sim.
Ela bem que podia estar conosco!
VICTOR – Como?
MONSTRO – Você
me usou para matar Judite! Me criou para isso: para demonstrar sua
superioridade à maioria dos humanos...
VICTOR – (tentando não escutar) Não!
MONSTRO – Eu sou
a muralha que lhe protege!
VICTOR – Não
preciso de defesa! (ri)
MONSTRO – Está
rindo do quê? Hein?
VICTOR – Você
tem razão. Estamos repetindo a mesma história há anos!
MONSTRO – E qual
a solução?
VICTOR – Tem que
haver um final decente. Chega de sangue! Chega de horror! Eu quero rir! Recife foi
a terra do teatro de revista! Eu quero sacanagem!
MONSTRO –
Explique isso aos outros. Não a mim.
VICTOR – Eu não
preciso explicar nada! Você é minha explicação a tudo!
MONSTRO – Não fico
contente em ouvir isso.
VICTOR – Também
não consigo ficar alegre. A plateia também não. Aí esse negócio afunda que nem
o Titanic...
MONSTRO – Vamos
fazer um número bem animado! Contrarregra! (pausa;
olha a plateia de modo provocativo). Vocês sabem até que ponto o serviço de
um contrarregra no teatro? Um técnico
responsável pelo acompanhamento do desenrolar de uma encenação teatral, show,
filmagem cinematográfica, programa de rádio ou TV, providenciando o necessário
aos cenários, indicando cada entrada e saída de cena dos atores,
supervisionando a equipe técnica etc. É caros espectadores…Teatro tem
dessas coisas...
VICTOR – Você é
uma conserva! Seu cérebro é como um legume dentro de uma lata! Mas... que entre
a Contrarregra!
(número musical que inclui a atriz que fez os outros
papeis femininos; depois da música , ela sai gargalhando)
VICTOR – Você é
uma máquina feita de carne pelo homem! Um zumbi! É o que você é!
MONSTRO –
(sonoplastia: som de tiro e vidro quebrando; uma mulher grita: “Não! Por
favor, pelo amor de Deus não! Ela só tem doze anos! Não”(pausa).
“Rapazes! Por favor! E... eu sou uma velha! Não! Ai! Ai!Ahhhhhhhh!”.
MONSTRO – É o
efeito deste refrigerante! Este hotel é muito mal freqüentado. Essas piranhas
trazem todo tipo de homem pra cá! E as pobres criancinhas.
VICTOR – Onde
estamos? Estou tão bêbado que nem sei mais!
MONSTRO – Entre
o mar e esse refrigerante.
VICTOR – Que
calor! (olha como se fosse pela janela).
Tá tudo se acabando... (bebe). Mas tem que ser assim para o povo poder
construir algo novo. O problema daqui é que o povo morre de saudade... É
verdade! Somos sentimentais ao extremo! Temos que explodir! Temos que... (bebe)
Guerra é paz! Vamos fazer a guerra antes que a população inteira passe pro lado
dos... dos... imperialista! (bebe)
MONSTRO – Quando
acabará esta guerra?
VICTOR – Está só
começando. Ah! Eu juro! Esta guerra veio no momento certo. (levanta-se) Vamos!
Vamos nos alistar!
MONSTRO –
Ninguém aceitaria uma criatura como eu.
VICTOR – Então
companheiro! Adeus! (abraça o monstro
cordialmente) Tenho que ir. O país... tenho que cumprir... o dever... a
missão... de... divertir... (toca um
frevo, vassourinhas, talvez, é um carro de som na rua) Agora é carnaval...
tudo num disquete... dinheiro no computador... Adeus!
MONSTRO – Eu lhe
acompanho até o posto de alistamento. (os dois rodam o palco em 180º graus)
Atenção! Descansar armas! Soldados! Levantar armas! Ombros...
VICTOR – Não
agüento mais repetir essa cena!
MONSTRO – Os
deuses do teatro... Cuidado!
VICTOR – Você
tem os olhos de Judite nas... mãos... os olhos da justiça que você arrancou.
Estou cheio. A culpa que sinto é insuportável! (pausa). Às vezes olho para você e me pergunto: (aperta as bochechas do monstro) Quem é
ele?
MONSTRO – Veja,Victor:
Ninguém suspeita de nós. Em nenhum dos casos. Eles culparam outras pessoas por
isso.
VICTOR –
Inocentes que perderam a liberdade por nossa causa.
MONSTRO – Nós
também não temos liberdade!
VICTOR – Mas não
temos o direito de tirar a liberdade dos outros! Você acabou com a vida deles.
MONSTRO – Dá no
mesmo! Eu era um cadáver e você me ressuscitou.
VICTOR – Não é
bem assim.
MONSTRO – É mais
ou menos isso. Tanto fez para mim vida ou morte.
VICTOR – Pois
para mim é muito diferente. Deixe-me sair daqui!
MONSTRO – O
senhor está livre. Mas, amanhã: aqui. Certo? Tem espetáculo. E cuidado com as
bombas.
VICTOR – Não
acredito que isto está acontecendo comigo.
MONSTRO – E se o
senhor fechar os olhos e imaginar: Isto não precisa estar acontecendo. Como
quase todo mundo, isto não precisa acontecer nunca. Mas, todo dia acontece...
milhões de vezes.
Som da bomba. Blackout. Trombetas soam, Trovões.
Um coração bate descompassado e a voz do VICTOR em OFF cita Newton:
“Não sei como pareço aos olhos do mundo,mas eu mesmo me vejo como um
pobre garoto que brincava a praia e se divertia em encontrar uma pedrinha mais
lisa de vez em quando,ou uma concha mais bonita
do que de costume,enquanto o
grande oceano da verdade se estendia totalmente inexplorado diante de
mim...”
(Ouve-se uma risada. O coração pára de bater: Toca um
telefone. Luz sobre a cama. Monstro está só. Atende).
MONSTRO – Alô?
(pausa) Não. Não sei. Talvez nunca mais. Desculpe, não tenho a resposta.
(desliga o telefone).
FIM
"Poe o fantástico"
refere-se a Edgar Allan Poe e sua obra que funde o gênero fantástico com o
terror, explorando o medo, a loucura e o sobrenatural de forma
psicológica. O termo também pode ser entendido como a introdução do horror
no mundo da fantasia e do maravilhamento, que é a essência do fantástico, e a
aplicação da literatura de terror em uma experiência de um indivíduo. Ele é considerado o "pai dos contos de
terror" por sua forma de narrar a morte, o mistério e o macabro,
conectando os personagens de suas histórias ao plano terreno de forma muito
pessoal, o que o torna uma figura central para o gênero. Poe usava uma
abordagem psicológica do terror, muitas vezes narrada em primeira pessoa, o que
criava a sensação de que o leitor estava vivenciando os eventos ao lado do
personagem. Suas obras exploram temas de doenças, loucura e atos infames.
·
No contexto literário, o fantástico é um modo
narrativo que explora o extraordinário e o sobrenatural, levando o leitor a um
estado de hesitação, pois o mundo da história se afasta da lógica do
real.
·
Horror:
O
horror é um gênero que visa causar medo e pavor ao leitor, utilizando elementos
macabros, assustadores e sobrenaturais. No entanto, o horror pode ser a
experiência de estar diante de um fato que causa repulsa e pavor, e a
literatura de terror se apropria disso.
·
Sinergia ( o todo é maior do que a soma das partes)
Quando o fantástico se une ao horror, ele oferece a
base para a construção do gênero, que se utiliza dos contos de terror como um
modo de produção de literatura que busca o medo. A partir do fantástico é
que a hesitação do leitor perante o sobrenatural se manifesta no horror.
o terror é a antecipação e o
medo psicológico de algo que vai acontecer, enquanto o horror é a repulsa e o choque
físico que se seguem a uma experiência assustadora ou grotesca. O terror
envolve a expectativa e a ansiedade pelo perigo, ou seja, o medo do
desconhecido, enquanto o horror é o momento em que o desconhecido se revela e
choca os sentido
Terror (O que é
antes)
·
Sentimento: Pavor, apreensão, expectativa,
medo psicológico, ansiedade.
·
Origem: Desconhecido ou a ameaça
iminente de um perigo, antes de ser revelado.
·
Caráter: Sutil, focado na construção de
uma atmosfera e no clima de mau presságio.
·
Exemplo: Esperar o médico com o
resultado de um diagnóstico, ou o medo de um fantasma que se ouve de
madrugada.
Horror (O que é
depois)
·
Sentimento: Repulsa, choque, pavor, asco,
paralisia dos sentidos.
·
Origem: A visão explícita de algo horrendo,
grotesco ou violento, como um corpo desmembrado.
·
Caráter: Explícito, apelativo aos
sentidos, que paralisa as faculdades humanas.
·
Exemplo: A cena de uma decapitação, ou a
visão de um ataque violento.
Para
simplificar
·
Terror: A ansiedade que se sente antes
de encontrar o monstro.
·
Horror: O pavor e a repulsa que se
sente ao ver o monstro.
.
Todorov define a literatura fantástica em seu
livro Introdução à Literatura Fantástica como a hesitação do leitor entre
o natural e o sobrenatural, onde o acontecimento narrado pode ser explicado de
forma racional ou aceito como sobrenatural, sem resolver essa
ambiguidade. Ele também estabelece as categorias do maravilhoso, quando o
sobrenatural é aceito como parte do mundo, e do estranho, quando os fenômenos
inexplicáveis recebem uma explicação racional no final
Stephen King, um mestre da
literatura, equilibra o horror com o fantástico, usando a fantasia para
criar um terror mais profundo e psicológico, muitas vezes focado no
desenvolvimento de personagens e na sua imersão nos dramas que os levam ao
limite. Ele mistura elementos de suspense e ficção científica em suas
narrativas, explorando a condição humana através de um medo que vai além do
superficial, como visto em obras como "O Iluminado e Carrie, a estranha
A teoria de Foucault sobre a morte do autor.
Para se compreender as particularidades do processo de composição da personagem
da literatura fantástica, de terror e horror é preciso que voltemos nossos
olhos para o que é intrínseco ao homem: o medo de algo que foge do seu mundo
natural. Para tal, utilizaremos como corpus a obra FRANKENSTEIN, da inglesa
Mary Shelley, início do speculo XIX, e, para o referencial teórico, vamos nos
debruçar sobre A personagem de ficção, de Antonio Candido; Introdução à
Literatura Fantástica, Tzvetan Todorov; A história do Medo no Ocidente, de Jean
Delumeau e outros autores canônicos que se dedicam ao estudo do fantástico, do
terror, do medo e do infamiliar, este sob a perspectiva da psicanálise
freudiana.
O ponto de encontro
entre o terror e o horror
Nas narrativas, a interseção entre
terror e horror ocorre ao explorar profundamente
nossos medos. O terror
instiga o medo ao sugerir m elementos assustadores, enquanto o horror busca
provocar reações intensas por meio de eventos impactantes. Juntos, esses
elementos contribuem para histórias que mergulham nas complexidades dos nossos
temores, seja de maneira psicológica ou por meio de momentos visceralmente
impactantes.
Stephen King é um mestre em explorar os
dois gêmeos juntos. Em obras renomadas
como “It: A Coisa” e “O
Iluminado” o autor mergulha de maneira detalhada no horror e no terror,
construindo uma trama complexa que além de provocar sustos intensos, também
desafia a psique do leitor, revelando os medos ocultos nos recantos mais
sombrios daimaginação humana
H.P. Lovecraft é um
escritor renomado do gênero fantástico e de horror, conhecido por popularizar o
horror cósmico. Este subgênero combina fantasia com elementos de ficção
científica, explorando o terror da insignificância humana perante divindades
cósmicas e entidades indescritíveis do universo. As histórias de Lovecraft
exploram o medo do desconhecido, a loucura e a percepção da fragilidade da
realidade humana diante de verdades cósmicas aterrorizantes
Características do Fantástico
e do Horror em Lovecraft:
·
Horror Cósmico:
O
pavor advém da descoberta de uma realidade onde a humanidade é insignificante e
insignificante em um cosmos vasto e indiferente.
·
Entidades Cósmicas:
As
histórias apresentam criaturas amorfas e divindades antigas, como Cthulhu, que são
incomensuráveis e além da compreensão humana.
·
Loucura e Percepção Distorcida:
O
conhecimento de verdades cósmicas leva à insanidade e à distorção da realidade
para os protagonistas.
·
Conhecimento Proibido:
Um
tema central é o perigo de buscar e desvendar conhecimentos que são além da
capacidade da mente humana de assimilar.
·
Atmosfera Aterrorizante:
A prosa de Lovecraft cria uma atmosfera sufocante e
tenebrosa, utilizando descrições vívidas e oníricas que imergem o leitor em um
universo de pesadelos.
Influência:
O legado de
Lovecraft estende-se a outras formas de arte, influenciando escritores
contemporâneos como Stephen King e Neil Gaiman , e sendo adaptado em
séries de TV, filmes e jogos. Sua obra é um marco no gênero de horror,
expandindo os limites do que é considerado assustador.
Teatro do Absurdo é uma expressão criada pelo crítico Martin
Esslin na década de 1950 para descrever um conjunto de peças teatrais do
pós-Segunda Guerra Mundial que exploram a falta de sentido, a solidão e a
incomunicabilidade do homem moderno através de situações ilógicas e diálogos
sem nexo. Não é um movimento organizado, mas um termo que abarca obras que
usam o ilógico, o trágico-cômico e o estranhamento para questionar a condição
humana e a fragilidade da linguagem. Autores como Samuel Beckett e Eugène
Ionesco são os principais representantes desse estilo.
Origens e
Contexto
·
Pós-Guerra Mundial:
As
peças surgiram num contexto de desolação e vazio, refletindo o impacto do
conflito e o questionamento dos fundamentos racionais do mundo.
·
Conceito de Esslin:
O
termo foi cunhado pelo crítico Martin Esslin para agrupar peças que
compartilhavam a mesma essência de representação da condição humana.
·
Influências:
O teatro do absurdo bebeu em movimentos de
vanguarda como o DADAÍSMO e o SURREALISMO, além da influência
do EXISTENCIALISMO, de Camus.
Características
Principais
·
Ausência de Lógica:
O
mundo e a linguagem são apresentados de forma sem sentido e ilógica,
evidenciando a falta de comunicação real entre as pessoas.
·
Incomunicabilidade e Solidão:
As
peças retratam a atmosfera de isolamento e solidão do homem moderno.
·
Trágico-Cômico:
Há
uma união entre o trágico e o cômico, tratando situações cotidianas com
estranheza.
·
Ruptura com o Realismo:
Os
textos rompem com o realismo psicológico, adotando uma linguagem poética e
imagens concretas no palco.
·
Estranhamento:
A obra provoca um efeito de distanciamento no
espectador, forçando-o a questionar a realidad





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