PASSAGEM
Poemas
& contos
DE MOISÉS MONTEIRO DE MELO NETO
2ª
Edição
Recife/PE
2008
Impresso no Brasil
Printed in Brazil
Editor
Tarcísio Pereira
Diagramação
Verusca Mesquita de
Andrade
Capa
Jean Marcelo
Revisão
Rodrigo de Belli
Fotos
Rosenilda Rocha e Albemar
Araújo
M714p
MELO NETO, Moisés Monteiro de
Passagem : contos
&poemas / Moisés Monteiro de Melo Neto. – Recife : Edições Ilusionistas, 2005.
207 p.
1. FICÇÃO
BRASILEIRA – PERNAMBUCO. 2.
POESIA BRASILEIRA
– PERNAMBUCO. I. Título.
CDU 869.0(81)-3
CDD B869. 3
PeR-BPE
Editora Corisco
– Elógica
Rua Dr. João Tavares
Moura, 57/99 – Peixinhos
Olinda – PE CEP:
53230-290
Fone: (81) 2121.5300 Fax:
(81) 2121.5353
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Os textos que tenho lido de Moisés Neto
comprovam que ele domina a arte da escrita. Isso é resultado da extrema
familiaridade com o texto literário: conhece os melhores escritores e
pesquisadores, elabora novas conquistas.
Raimundo Carrero
PASSAGEM
Pela professora Bárbara Andalúzia
A competência do multicultural
Moisés Neto é imensurável. Passagem representa mais uma obra vinda para
enaltecer sua sensibilidade poética que tudo percebe. Moisés não atinge em seus
poemas apenas o seu mundo. Alcança também universos distantes através de suas
divagações. Universos nem sempre compreendidos ou respeitados ou até mesmo
inatingíveis apesar de tão próximo dos nossos olhos, mas tão longe de nossa
percepção simplesmente humana.
É fácil perceber a leveza na
qual o autor produz sua obra, reproduz sua vida e seduz o leitor, com a dureza
de suas palavras diretas, sem rodeios atingindo o lirismo incontido e expresso
profundamente em sua arte. Ele não
procura a expressão melhor para cada verso para representar seu lirismo, pois
já possui, em sua alma, uma excelente demonstração artístico-poética.
A
produção deste artista é coberta e recheada por suas raízes, por sua terra e de
suas terras, seja no Recife, no Janga, no Rio de Janeiro, no Cairo, em Lisboa,
em Barcelona, em Havana ou em qualquer lugar do mundo que ele vive percorrendo:
Moisés não está só. Ele está sempre dentro dos mundos e fora deles, com uma
visão de águia sobre sua presa, sentindo os cheiros dos arredores.
Um
cérebro não pára, um cérebro nunca está só, está acompanhado de idéias e
pensamentos que só ele sabe até o momento que fala. Moisés não pára, Moisés não
está só... não é egoísta, compartilha com os leitores seu mundo, despertando
fome de poesia e alimentando-nos. Qualquer coisa sem importância logo muda de
figura se for poetizado por ele: “Lobos”, ”Medula”, “Tarântula”, Licor”, “Bar”,
“Filme”, “Folhetim”, até pergunta: “Qual o sentido de ser feliz?”
Mas não é para responder, é
para provocar.
Neto observa cada traço do seu
objeto poetizado, representa cada momento com suma grandeza, cada sentimento –
próprio ou alheio – é retrato, cada movimento faz parte de suas considerações.
A
categoria depositada por Moisés Neto em sua arte (seja ela dramática, lírica,
ou qualquer outra) é exclusiva de um artista que inclui em suas obras um mundo
estranho ao qual se entrega “c-o-m-p-l-e-t-a-m-e-n-t-e”.
Os Poemas
de Moisés Neto
pelo escritor e filósofo Ednaldo Isidoro
Moisés
Neto, sua literatura – música dançante no cinema da vida – esculpe a pintura da
própria essência retratada no teatro de sua história. Moisés é Literatura: ela
sendo ele é sua senhora. Querem a prova? Então vejam quando ele resolveu
abandoná-la. Não conseguiu. Ele estava lá escrevendo as palavras da renúncia,
debruçado sobre o papel com a sua caneta. Pronto! A Literatura se fazia
presente na carta. A vida dele, registrada nesta Passagem em poemas e contos, faz-nos –
à medida que vamos andando pelos poemas – participantes dela. Transeuntes nesta
obra, Moisés nos dá dois mandamentos para que possamos compreendê-la: abre bem
os “Teus Olhos” e fique atento até chegar “A Hora e o
Lugar” – princípio e fim de uma autobiografia inovadora: vida através
da poesia. Ao posicionar os poemas na linearidade do tempo, vamos flagramos o
autor criança, adolescente, jovem e adulto através de suas análises da
realidade e de sua introspecção. Estes poemas também são cartas. Cartas ao
ninguém de Odisseu.
É assim
nesta guerra sem vencedores, que a arte superou a vida e a ficção, a realidade.
Constrói. Destrói. Reconstrói. Tudo é verdade. E ela proporciona que a autor
viva em seu livro. Os personagens estão vivos nas páginas da ficção. Só ali ela
é verdade. É isso que Moisés nos mostra, apesar de relutar consigo mesmo. Ele
tem a revelação e sabe que a ficção da arte é verdade.
E para
fazer jus a esta afirmação, já que vocês estão na fronteira do mundo de Moisés
Neto, virem a página e andem lentamente para perceber as maravilhas da vida
dele exposta aqui em Passagem.
Boa
Viagem!

POEMAS
Teus olhos
São
uns olhos muito negros
Olhos
de escuridão
Fazem-me
prisioneiro
Estes
olhos que me atraem
Minhas
forças esvaem
Possuído
sigo calmo
As
sombras caem
Como
negras azeitonas
Sobre
branca porcelana
Em
mesa cheia de morte
Teus
olhos...
Roletas
russas da sorte
A
loucura de quem ama
E...ai!
Não tê-los
Mesmo
com a fome que tenho
Não
poder comê-los...
LOBOS
No
espaço entre os seus dentes
restos
de almoço
vários
lobos foram espalhados
quero
te contar como foi:
eles
foram soltos com a boca cheia de fome
todos
os lobos
eles
comeram meus olhos
Eu os vi chegar
dancei
e cantei junto do fogo
vi
febre nos olhos deles
nos
olhos calmos que tinham.
E
sabia deles
pois
os pressenti sem direção
todos
os lobos, eles comeram os meus olhos
atravessaram
apressados os campos
que
rodeavam minha casa
comeram
meus frutos verdes
minhas
flores na varanda
sonhos
da juventude...
todos
os lobos
eles
comeram meus olhos
CANTO LISO
Começa a chover
Som a crepitar
crescendo de maneira estranha
Protejo-me e vejo a chuva engrossar
Passa uma mulher
vestida de modo tão simples
com umas crianças magras
com olhos grandes e inquietantes
nossos olhares se cruzam
vagam ensopadas
sobre o vapor do asfalto quente
parecem anjos apressados
sem nada para defender
agora correm na chuva
Penso em tantas outras guerreiras
Mas agora só há esta
Pobre trabalhadora, penso
Deus te guie
UM
MOMENTO QUE SE PERDE
Cá estou
Em volta do tempo
pelos dias
ao redor
rosto alegria
balanço de rede
um momento que se perde
esvaindo-se em minutos.
Na estrada do sem fim...
MEDULA
Envolvendo
tua medula
tem
um osso
que
te faz ficar de pé
moço
olhar
molhado e áspero
teu
rosto suando frio
em
frações
teu
olhar
boca
a tartamudear
coração,
em acordes dissonantes
cada
vez mais fluído, sangue-vinho
espalhando-se
pelo teu corpo
pelo
medo, pela vida
cada
vez mais
incontida
deslizando...
essa substância
leve
sensação
tragando...teus
desejos
envolvendo
tua ação
suor
frio
correndo
pelos teus ossos...
TARÂNTULA
Em qualquer canto da casa
existe uma
tarântula...
patas curvas, peludas
débeis
Trêmula...
Minha emoção é seu veneno.
Em qualquer canto
murmúrio dos ventos
Em qualquer canto da parede vê-se um pouco de alegria
que restou da última festa .
Estilhaços repousam também
n’algum lugar pelo chão...
Sob o portal
Os quadros balançam
Ventania sacode os vidros...
Cavalgo o Pégaso
Vôo despreocupado em aéreo galope
distraído
na neblina do sonho...
PLENITUDE
Este galope
Esta campina
este meu modo de pensar em você
néctar nascente de esperança
plenitude da montanha
o vento nos espera
ponte trêmula sobre os jardins
trêmulo nervo exposto ao sol
nossa amizade
águas claras...
LICOR
Luz branca e efervescente
Lua, aldeia de pescadores
Vales...montanhas
chão de estrelas
jovens dispersos pelo chão, alegres.
À beira-mar, ciganos
carícias, palavras
tontos de alegria, acampamento
O ar extraía da forte luz a sua força
para alimentar os sonhos
nestas bocas de licor
jeans, gestos, nomes e coisas
agora fundidas em silêncio
ondas arrebentam na madrugada mágica
fantasias desfilando, alegoria
sopros de flautas e apitos.
TARDE QUENTE, VERÃO & COCA-COLA
Uma volta
se dá no meio de mil
p’ra rir
passo a passo
prova do viver
estar por aí...
os trocados não damos
prova de existir
existir, se conhecer
amar o sono, partir sem fome
fome, sono
injetar as veias , sair
exilar a dor
o dia de amar
desconhecer / reconhecer
a poeira
o calor, fragmentos de rua no corpo
sair
descer pouco a pouco
pelo ar
gestos vagos
tarde quente de verão
vento fraco, quase nenhum
coisa parada
gente colorida
Na avenida brilha
coisa condensada
palavra inventada agora
massa úmida
Como astronauta cangaceiro
O poeta passeia
bebe Coca-cola
cola-caco dos Campos
Na tarde modorrenta
Final dos anos 70...
A
MAIS DOCE ALUCINAÇÃO
...
em busca de algo para mim invisível
à
margem de estranhos caminhos,
minha
sombra percorre o mundo...
Recordo
a profecia....
Versão I
Quando numa noite fria
você estiver perfumada e só
vivendo a mais doce alucinação
eu chegarei de repente
... como uma lembrança
como um mistério...
como uma lenda do sertão.
Deitarei com você
na sua cama
lhe darei calor
nos amaremos com sofreguidão
no escuro do quarto
como se fôssemos animais ferozes.
Sei que agora estamos distantes
mas o nosso amor
é para a vida inteira
Versão II
Quando numa noite você
corpo úmido de suor
Acender mais um cigarro, sabendo que
vai partir
num momento cravejado com pedras
brilhantes
da sua mais doce alucinação
Você ainda vai rolar e gemer mais um pouco
... ainda existem vozes na rua
nem tudo se resume em silêncio
em quase poder se escutar o sussurro das
ondas
nem tudo é isso – ainda ... e se tudo fosse agora?
uma oração no meio da noite talvez,
aliviasse o peso da culpa
E se lhe viesse uma lembrança para aquecer
o peito jovem?
Você poderia recorrer aos nossos mistérios
com duendes, gnomos, comadre
Florzinha
tomarmos uma infusão...
Mas tudo isso é enquanto deitado na cama
você não consegue dormir com o calor
Filme acelerado
Corte em todo o pensamento
sua recordação dos tempos
memórias de solidão
contradizem-se faiscantes
Você procura o interruptor
com sofreguidão
no escuro quer acender o casamento
amor que numa vida inteira
não conseguiu entender
c-o-m-p-l-e-t-a-m-e-n-t-e.
NIRVANA
Paro em pleno movimento cósmico
mudo, quieto em meio ao trovejar de
pensamentos alheios.
Ferido, petrificado pelo sal, doçura do
amor impessoal...
Atemporal retrato imutável do ser na
diversidade...
Olho o céu azul
daqui, do mesmo lugar ou dos distantes
limites do universo.
Mãos no peito, perdido/ achado, junto ao
grande arquiteto, eterno, que é, no foi/ será.
Estou numa curva, arrecife, floresta
... em calmaria, tempestade.
Pés no chão,cubro-me com o lodo da
permanência, no voo.
à margem na complexidade do mundo
simples
sem
dor, sem esfuziante alegria ...Aqui, qualquer lugar:
Nirvana... agridoce trago. Vértice,
vórtice,saboroso travo sem gosto.
Colmeia, salitre, sobre vermes e cetáceos.
Este corpo ferido, penetrando
a mais pura entrega ativa.
pelo universo que me atravessa.
Platina / Seu beijo
Pensei no seu beijo quente
e você chegou
eu
estava deitado na areia
a
luz da lua
platinou o nosso amor
como um manto
envolvendo nossos corpos
você meu canto
esperança
suas mãos afagando-me
como num sonho bom
a água mais pura
da sua boca na minha
as estrelas eram pedras preciosas
você minha joia mais rara
sobre tecido indiano
prateados....
êxtase!
DOIS CORPOS
Em
riscos paralelos, nos espargimos pelo chão
em
faíscas
como
uma voz que se separa do ar
distintamente,
ambos invisíveis
o
resmungo de um bicho
o
ranger duma porta
algo
nos atrai
para centros diversos
moer
a lembrança como se mói pimenta
pegamos
estradas
alegria
rápida, vida na despedida
nos
separamos
na
explosão da última vez...
grito
medroso se esconde
n’
algum lugar dentro de nós
nos
arrastamos pelos minutos
nos
consumimos
com
sede
fome
...
Derrama-se
agora uma escuridão fria
sobre
nossas lembranças.
IMAGEM NOTURNA
Você saiu pela rua
com a fome de sete dias
querendo mais aventuras
perdendo-me e eu não via
você de boca rasgada
em busca de mais uma noite
em busca de fantasias
você se perdeu
me perdeu
na sua agonia
você com seus dentes
sua língua sem tranca
esqueceu o meu cansaço
nossa casa
Dormiu na rua
xícara sem asa, cigarro
um gole, um trago
relógio quebrado
mergulho no mundo
em noites sem cosmos, rota 66
rindo muito
tão longe
eu olho para o mar
este mar de azul profundo
dor
alegria
asfalto
longas avenidas esperam
curvas
montes
mais e mais noite
profundamente
luzes...
e ainda mais vida
atravessando essa nossa madrugada
do sangue dos filmes
de capa e espada dos livros
madrugada eterna dos sexos
nossos dentes de tigre
grito de Tarzan
pássaro na gaiola
sonho de acordar
viajando
latejando no bojo da vida
quente
muito quente
mundo à espera
cama que voou com você
desespero! Eu fiquei...
ah! como se não bastasse
como se viver fosse dormir
enrolar-se num lençol
e o silêncio espera que venha um dia
o café, pão e manteiga
fantasma na esquina
gritar
cruzar
pensar
viver
agir
vir até mim, você não volta
estranho salário, observo meu Pégaso
sonhos
caros
outras ruas, pedras preciosas
a polícia cósmica me limita
fontes, praça
águas esfuziantes
despertar, sem ter dormido, sem nada
o jornal
o crime, terror: vida renasce
será tudo lindo no sol que virá
lhe trará
eu sei...
enquanto isso eu não durmo
é a vida
Cavaleiro solitário.
SEM
GENTE
A casa velha sobre a montanha
velha morada
cor castanha
os tijolos expostos
desgastados pelo vento
sem portas, janelas, chão e teto
sem gente, sem vida
a velha casa da colina
no fim do vale,
é um mundo – uma invasão
murmúrio do vento, redemoinho
suas entranhas,
o silêncio da noite
o brilho pelos buracos
pelos cantos do chão,
flores selvagens
entre as paredes, colunas
jardim- quartzos, cristais
cintilam à noite.
A
casa do holandês
Gaibu-Suape
beira-mar
velha morada
estranho lugar
castanhos tijolos expostos
fustigados pelo tempo
sem portas, janelas, teto
assobio
de outros tempos.
Velha casa da colina
Sob o farol
no fim do vale,
ontem/amanhã
murmúrios do vento,
redemoinho nas entranhas
mato/ flores selvagens
entre
paredes, umbrais.
Estranha relíquia:
Prisão/liberdade/ lembranças
FURTA – COR
...
quando já sem dor ou emoção, penetro
no
escuro
começo
a escutar os sussurros de pavor
que
habitam meu silêncio
a
minha ausência
nas
noites de frio, quando ando pelas ruas
curando
feridas abertas.
Entro
sem querer
onde
podes me acompanhar
meus
gritos
no
sonho, delírio furta-cor
suor
frio que ensopa meu corpo
no
meio da noite
desenrolo
a trança
do
laço frouxo – esperança
tento
rasgar as fibras da tua lembrança
do
teu riso no poema
procuro
em mim o teu gesto
acelero
deslizo
nas estradas
Mutante.
PARA DORMIR NO ESCURO
Desde que vi a casa
sabia que era torta
seca, sem trinco nem porta
não tinha nada/ ninguém na rua
rua sem nada
sem festas
A rua sussurrava com o passar do tempo
Nossa casa
À espera ...
MORMAÇO
Corte
sem sopro
sem gosto
cansaço
os pássaros sem voar
imensidão
plenitude
meu corpo.
Blues
Noite
de chuva
Frio
Eu
sangrava
Nó
na garganta
rouca
corpo
molhado
róseo
pelo sangue
agonia
vontade
como há muito não sentia
meu
riso
vida
volúpia
medo
letal
estanca
riso
frouxo
corpo
a tremer
gesto
de dor
silêncio
silêncio
volta,
meu amor
Seu
herói está fraquejando
Volta
logo.
HEAVEN
À borda da mesa
num bar qualquer
a qualquer hora
sou comportado
perguntam algo
qualquer coisa
O paraíso me envolve
Lembrança do teu olhar
Neste silêncio
paz neste minuto...
Esquecer/ renascer...
VAGÃO - I
Subiram num trem
Vagões se agitam
atrás de olhos rachados
do
olhar perdido
entre paredes
de paixão
ventos da viagem.
Nova promessa.
IMAGEM DO SILÊNCIO
Espalhada
a alegria volta
como erva que se alastra
imagem refletida na superfície fria
do espelho, presa em estranha moldura
ausência renovada
antigo objeto
meu reflexo se repartindo
lugares ermos
cubismo
meus cabelos em desalinho
olhos arregalados
óculos
paisagem que passa
o mundo
música suave nos embala
outros sonhos
pensamentos sem tradução
queria que todos entendessem
...
nos entendam.
O
resto é mentira!
(Tango
final)
É inútil resistir, você não
acredita?
Dizer que o amor pagou o preço
do meu pranto
Parece inútil a pureza no meu
peito
Viveremos de nós mesmos!
E eu... como quem delira
De qualquer jeito
O resto é mentira
Chorei oceanos, vivi no fogo,
acordado como quem delira
Agora um novo dia se aproxima
Ai de quem zombar de mim, me
trocando
Miserável! Na mais rude
pressa!
Por um devasso...
Viveremos de nós mesmos!
E eu... como quem delira
Quaisquer que sejam os meios
O resto é mentira
Meus caprichos não fazem jus
ao
Meu coração arrancado
pela raiz
e estas ilusões perdidas...
Não valem orgulhosas
cicatrizes
Se mereço risos ou
admiração...
Não sei. Não direi mais nada!
Meu coração está feliz, pois é
só seu!
Está em chamas
E eu... como quem delira
É inútil resistir
Não posso mais fingir
Dizer que o amor pagou o preço
do meu pranto
Pra que guardar a pureza entre
os meus peitos?
E eu... como quem delira
Viveremos de nós mesmos!
O resto é... mentira!
(versão2)
É inútil resistir, você não acredita?
Bobagem dizer que a dignidade pagou
o preço do meu pranto.
Chorei oceanos, vivi no fogo,
sóbrio como quem delira.
De agora em diante
viveremos só de nós mesmos!
Quaisquer que sejam os meios:
Meus caprichos não fazem jus
a
um coração arrancado pela raiz.
Para que guardar a pureza no meu peito?
E essas ilusões perdidas?
Não valem orgulhosas cicatrizes!
Mereço risos ou admiração? Nem sei.
Não
direi mais nada!
Pra que lhe trocar por alguém?
Não tenho pressa.
Estou feliz por ser só seu!
É inútil resistir...Não posso mais fingir.
De qualquer jeito, o resto é mentira!
REVOLUÇÃO NA RUA DA GLÓRIA)
(A Menina da
Rua da Glória)
Recife-rua-revolução-menina
Ilusão latina
Amei-a no
carnaval
Noite finda, a
vejo agora:
Ela
suspira,transpira,vira,revolve
Suspensa,
indecisa, tranquila,se dissolve, se comove.
Mapa perdido:
Pernambuco
Menina-revolução
sem afeto
às margens
secas do Capibaribe
no bairro da
Boa Vista
Suplício,
precipício, meretrício
Meia-noite,
meio-dia: crioula carruagem,
lodo, lótus,
baronesa na correnteza,
verdade nua,
língua de prazer
Carnaval de
lágrima pintada, sina cigana
Nós dois na
cama, Éden hipotecado,
Festa, sorriso
emprestado, estrela bailarina
sem fio mágico
que se suspeite
Ela dorme
agora na memória
Como um
fantoche desconexo jogado do alto
Revolução: Rua
da Glória?
“O monstro”
Recife
Pequeno índio
Instinto
Computador
Piano
Harpa
Emitindo notas
E eu me guardo dentro deste coração
Emoção
Eu teço peças e projetos
Invoco rios e mares
E vou me entretendo
Neste lugar chamado infinito
Primitivo
Selva de sangue, ossos, cabelos, músculos
Seio materno
Corrida
Torpor
Versos soltos
Corpo
Pequeno celeiro
Raios
Solução
Na balada infame do caçador ferido
Recife me estende a mão...
II
(Éden)
A primeira rua
Os flamboyants
(folha de confete, flor alaranjada)
Tardes de chuva e sol de alvorada
Viver para distribuir entre os mais
estranhos
As experiências vulgares que me custaram
tanto
Modernas tavernas
Rimas estranhas
Banho-me
A Idade da Razão é uma fraude
Haja o que houver
foi
ontem e não dá mais.
Gozo gasoso
Espelhos alucinógenos
Colagens estapafúrdias
Amigos
Vôo de bruxo se inicia então
Na última hora, a última chance.
A esperança: esmagada
O escaravelho
Na pequena ilha perdida
Recife Antigo
Haverá salva-vida?
Aqui onde o mundo começa
Estrelas hoje gotejam chuva louca,
Nestas praias ermas
Cinta de pedra inculta
Apenas seres imaginários na memória
Estou na nascente dos meus rios de tinta
Pernambucútero.
Crepúsculo & Aurora.
Negócio? O ócio?
Vida caleidoscópio.
Agonia atlântica
Psicodélicanálise
Erguem-se, do fundo do oceano
Do leito dos rios
Capibeberibe:
Estranhas criaturas, estranhos monumentos
animais,
minerais e vegetais.
Metamórficos
Espaciais
Guturais
Espalham-se
Conjuram-se
Tantos!
Dentro do coração
Ondas arrebentam
Ameaçadoras
Pedras chacoalham
O inconsciente
Torre de Cristal.
Sonhos dos espíritos
De todas as metrópoles
Envolvem-me no Recife
Leite doce,puro,virginal,reluzente
Gotas,pétalas, transparência.
Esta cidade que
me ressuscita
Ergue-se em nova vida
Qual ferida entorpecente
Cosmos presente
Recife Mamãe
Papai Serpente
O livro,
a dor, as lentes,
o orgasmo, silenciosamente
Contrastes
Terror
Olhos ardentes
Satisfação
Língua que badala o que o domingo calara
Agora já o sabe toda a gente:
É chegada a hora do Recife
Já não há tranca que o sustente.
Nem
corrente.
Porque não existe pintura
Claustro
Cadeia
Nem porrada,câncer,igreja
Nada
Caça / caçador
Gato manco depois de atropelado
Arrastando-se estrada adentro
Assustadora busca
Por uma flor perfeita
O choro dos bebês e dos velhos
Às margens das mortes.
Recifeclipse!
Julgamento
Tribunal
da língua
Palavras, sabores, desejos...
Cidade oblíqua
Oblíqua
Cabeças paspalhonas...
A desumana corte
O processo
Os espasmos
A ferocidade do Recife/ Espantalho.
O
revólver em minha direção
Fujo para meu inútil algo mais
Espaço que transcende satélites
Mofo
Chego sangrando
Percebo dedos quentes & reluzentes
Os
olhos que parecem Chicletes de frutas perigosas
Dopam
Amalgamam
Metaforizam
minha grande necessidade
Ó Grande- Mãe,desperta!
Chama teu filho Recife
Arranca-o de mim de novo: vai!
E os dias passam
Modorrentos
Sedentos
cheios de suores
Chuvas, calores, calafrios.
Castelo, casebres, lojas
Espalhados pela cidade
Os
pensamentos
Trilhas adiamantadas, quilates exagerados
Procissões
Apavorante andor
Ardor
Poreja
sangue das paredes psicodélicas.
Sinos repicando velhos dobres
Pela cidade em cada um
Nas ruas.
Calçadas
Risadas ecoam
Há um fundo medroso em cada ouvido
Fingem não ouvir
O pedido de amor que lhes dê coragem para
desafiar
A metrópole
Nó
...destino...
Estranha aranha,
Suas teias de agonia
A realidade derrotada pela imaginação
Não mais à altura do sonho
Vira pó
Dissolve
vidas inteiras
Parece sempre tão pouco tempo para a
paixão
Sacrifício
Dar sentido à existência.
No meio da procissão
Tomado por vã inspiração,
A pior idiotice é pensar que o homem nasce livre.
Olhos ao infinito
Ele se aproxima
Cores tão intensas tocam minha alma.
Minha mente tão apressada
Quem quisesse acompanhar esse encontro
Teria que dar saltos inacreditáveis
Minha música toca
Quando Recife atira para o lado o corpo de
um guarda
Os outros mergulhados no absurdo se afogam
Na ilusão de algo que os afaste deste
lugar
Unhas,pêlos pretos,olhos vermelhos
Estranho sinal o anuncia
Envolve a criatura.
Ele se arrasta em busca de mim
Pela fria entrada dos meus aposentos
Na varanda um pássaro pousa.
Um pássaro canta na varanda
Estridente
Com aquela cara boba de passarinho
A metrópole aproxima-se
O pássaro foge
Recife olha-me
Flamejante
Encrespa-se
A noite vai descendo até o chão.
III
(A Missa)
Ele sente o poder da minha fortaleza
Vácuo
Igreja de antigas solidões
Ele quer a minha essência
Paralisa o meu corpo
Não há escapatória
Nem improviso
Possíveis
Escrevo estes versos a contragosto
Esparramo estas linhas ao relento
Agora que tudo está para se decidir
Através do vitral
Estranha luz barroca nos redimensiona
Paraíso perdido
Vingança
Vitória
Labirinto
História.
Não há caminho de volta
Nem lugar que me salve?
Recife-lagarta rastejando para a metamorfose
Casulo
Néctar do infinito.
Quer interromper a minha Missa
Evitar a consagração
IV
(Rainha Memória)
Tenta dominar minha alma
Sinto algo estranho
Nas minhas veias o mal tenta alastrar-se
Minh´alma e corpo postos à prova ,
Amor & morte
Eu e a Metrópole
Em estranho tabuleiro
A minha torre: a extensão do meu corpo
O rei: a sombra de um gavião
A rainha:minha memória
Os peões estão nos morros
Os bispos: os desertos,
Os cavalos: sertões
A natureza silencia
Eu percebo através das poderosas lentes
A Lira
sobre a mesa-
Muda há muito tempo.
Estranha epifania nos envolve
Isso provoca tosse no monstro
Ele ruge.
Seus tentáculos etéreos
Buscam meu pescoço.
Sinto o calor de uma imensa fogueira.
A cidade recua
Percorre-me as veias um sentimento de
alquimista
As coisas ao meu redor parecem verduras
apodrecendo.
Cabeças de Medusa petrificando Brennand
Estátuas morenas onde Amor pousou um dia...
Recife exibe as suas feridas e pesadelos
Cicatrizes .Ossaturas,quadros –
Ouro envelhecido pelos séculos
Nudez
Legião
Consciência
Infâmia
O céu
Parece
rasgado por golpes de facão
Estranho
Cai colorida chuva fina
Relâmpagos...
Raios.
As engrenagens da cidade derrotada brilham ao longe
É a verdade como ficção
Arranha-céus se contorcem
Recife volta-se para mim
Aumenta o barulho da chuva
Um vento frio vem do lado do quebra-mar
Grandes serpentes negras avançam
O pássaro da sabedoria espreita,
O espírito do mal vagueia
A magia bebe na grande fonte
Os gestos do Recife tentam incorporar o
infinito
O fracasso da humanidade humilhou ricos e
pobres
Há muitos cadáveres boiando no rio
A cidade observa tudo
Sem pressa
Não há vaidade no Recife?
Nem remorso?
Ele se transforma em todos?
Misturo meus desejos com os da cidade
Ela que me mostrou um caminho e seguiu
outro
Não choro
A dor é grande pela cruel destruição
Cada minuto que se esvai
Contém ânsia de eternidade
A chuva acaba com tudo
A peste devora o resto,
O fogo
cresce
Explosões
Não há como fugir
Resta-me a insensatez.
Não lutar
mais
Entregar-me
Improvável, mas não impossível
Lateja ainda o meu coração
Em concerto com o coração de pedra da
cidade
Em estertor
Vigiado pela Metrópole sorridente
Que me mostra que tinha razão
É o pulsar final do amargo verbo
chamado esperança
A suspeita e a certeza.
Recife abraça-me.
Volver a los 17”
(O
Monstro, VERSÃO 2.0)
Dorme dentro de mim
Ainda
Um monstro,
Um pequeno índio chamado Instinto.
E, como se fosse um pequeno computador
Um pequeno piano
Uma pequena harpa
Emitindo notas maravilhosas
Às vezes me faz chorar
E eu me guardo dentro deste coração
Eu me protejo na emoção
Eu teço peças e projetos
Invoco rios e mares
Seres cósmicos, novas espécies
E vou me entretendo
Com velhas canções .
Este monstro chamado Instinto
Neste lugar chamado infinito
Domina-me de modo selvagem
Sinto-me primitivo
Ó selva de sangue,ossos,cabelos,músculos
Que penetro
Que espero desde os 17.
Vida que me prometi
Ó, sonho que acalentei!
Ó, seio materno!
Ó, verão de setenta,vinho-lua-licor do céu
Paro.
Frenética corrida- Frenético torpor
Versos soltos – Espumas Flutuantes- Castro Alves-
Ninguém responde ali:
Eco do meu corpo ao redor deste pequeno coração- celeiro.
Emito raios, descubro soluções
Descubro outro monstro, que me dá sua mão.
Filmes,viagens, fotografias de Marte.
Primeira estrela da noite.Primeira Paris.
Ó, Balada Infame, ,esta do caçador ferido
II
Ainda lateja nos meus sonhos a primeira rua
Ali vivo e percorro por entre os flamboyants
O caminho que conduz ao Éden
Sublime desejo das tardes de chuva e sol dourado
Tecidos do pequeno príncipe,paixões de Buda e silêncio
Vivo para distribuir entre os mais estranhos
As experiências vulgares que me custaram tanto
Escorro dólares afanados, as publicidades warholianas.
Poucos me entendem, menos Ainda incensam-me.
Beiro as décadas qual Dante apavorado pelo tédio.
Busco nas modernas tavernas rimas estranhas e convictas:
Surge,surjo.Vêm como em Romaria.
Encontro-me Jerusalém, Pompéia, Cairo, Assuan.Penetro Abu Simbel ,
sou Agatha,Poe,Paglia,tantos.
Banho-me em Sartre: a Idade da Razão é uma fraude
Haja o que houver, foi ontem e não dá mais.
Fazenda Nova? Quantos modelos rejeitados!
Sexo que lateja,sexo que entorpece.Gozo gasoso.
Espelhos alucinógenos- colagens estapafúrdias
Amigos que vão do nada para mim.
Vôos de bruxos mulheres que se abrem.
Vaginas lúbricas,pênis que fazem doer.
Na última hora, a última chance.Lá está a esperança:esmagada
O escaravelho de Londres.
Noronha escrachada em Sanharó.Em Nápoles
Numa pequena ilha da Paraíba.
Quem jamais saberá de mim?
- multitude.
Só no Marco zero haverá minha paz.
Quero o Marco Zero onde o mundo começa
no Recife.
Os versos continuam em narrativa teatral.
As estrelas hoje gotejam chuva louca,
Amanhã novos voluntários “cerebram”
Haja português que agüente minhas praias
ermas de seres imaginários
Meus rios de tinta,papel e máquinas.
Vejam:céu,inferno e purgatório
Florença rediviva.
Pernambuco útero.
Recife crepúsculo auróreo.
Vida caleidoscópio.
Escorpião melhor amigo
Leão do meu conforto
agonia pacífica.
Erguem-se, já vejo,do fundo do Atlântico, do leito do Capibaribe:
Estranhas criaturas, estranhos monumentos
Pedras e vegetais.
Seres metamórficos,espaciais,guturais
Lá de Triunfo,lá do Vale do Catimbau, Buíque sem fim
Vêm de Fort Lauderdale,das montanhas da Áustria,da
Suíça,Washington,
já nem sei.
Espalham-se velhos e novos espíritos.Conjuram-se em Hamlets
Cordões Encarnados.Palcos do Valdemar,Santa Isabel, Apolo e mais
tantos!
Vêm de Robertos Lúcios, Cadengues, Bartolomeus
Caio, sangro, levanto, Rio-São Paulo-Gaúcho Belém
E dentro do meu coração
O pequeno índio inocentemente,transformou em nuvens brancas num
céu azul
Aquelas pedras que chacoalhavam no inconsciente.
Nos sonhos calaram-se os gritos do Norte- Sul
O que apareceu,
O que não podia ser sempre semente
O que deixou as trevas e brotou de repente
Foi um leite tão doce,puro,virginal,reluzente
Gotas,pétalas,amor transparente.
Rompeu-se o dique,pressionado pelo Monstro /mente
Ergueu-se uma nova vida.Perdoou-se a causa da ferida
As portas de par em par abriram-se
Um tráfico entorpecente sol e luas novamente
Cosmo da arte tão presente
Mamãe,papai- o resto tão serpente
As maçãs,o vento,o livro.
O testamento,a dor, as lentes
Escorre o orgasmo em anos,silenciosamente
Em contrastes com o terror:os olhos do doente.
Não se adia a satisfação- para frente
As línguas badalam o que os domingos calaram
E agora já o sabe toda a gente :
É chegada a hora do monstro
Já não há tranca que o sustente.
É o fim,é o fim...de toda a corrente.
Porque não existe pintura
psicanálise
cadeia
nem porrada,câncer,igreja
que tenha justificado o Monstro
porque ser – sem ser captado,caçador,gato manco depois de
atropelado
arrastando-se estrada adentro em busca de um bar
de um sexo que nem ele quer
O Monstro fica de costas
às avessas travessuras.
O Monstro é uma flor graciosa,perfumada,maquiada,travestida.
Cercam-no rosas multicores:espanholas,alemães,inglesas...
Ele vaga por sessões espíritas
Toma café da manhã com Roma Católica
Em todos os filmes ele está no choro dos bebês e dos velhos
à beira das mortes.
O Monstro é como Petróleo
Ele ri do ridículo Apocalipse prometido há dois mil anos...
Falso cálculo de eclipse!
Julgamento dentro de mim- gordo coração crescendo.Garganta
fumaça,comida,beber
Língua de palavras,sabores,artifícios
Guerra oblíqua,putas paspalhonas...
O Monstro no celular- na fita celulóide
Desfalco.Falso andróide,humana ponte de safena
Despejo,trançando planos ao redor do meu sangue
Possuidor possesso.Eu sangro, no interior...de Pernambuco
Espasmo, perco minha ferocidade no Recife
Espalho, espero, atiço
Espantalho.Aponto o revólver para a sua caverna
Esparramo .É inútil,só quero algo mais
Espeto.Tendo e tido tudo
Espaço
A gula me transcende .Explico
Maldita lei ...satélites caindo
Mofo-
Madonna arreganhada sangrando
Dedos na vagina quente
Reluzente
Desuso.Encantada pela oração que a redime, pecadora infame
Disco, digito.Petrodólares tilintam ,arregalando os olhos do
Monstro
Mastigo !Chicletes tutti- frutti acalmam,amalgamam a
ânsia.
fazendo,
participando.
Ó, Grande- Mãe Canguru,desperta!
Chama teu filho Monstro.Arranca-o de mim de novo:vai!
E os dias passam,modorrentos,sedentos,cheios de suores,
chuvas,calores,calafrios.Castelos,casebres,
lojas empilhando-se pelas cidades,nos pensamentos
Trilhas adiamantadas, quilates exagerados
Dispersões,conjurações,passeatas.
Eu seguindo o cortejo.Eu me carregando,em apavorante andor
Ardor ,fervilhando sangue
Paredes psicodélicasRituais angelicais.
Sinos repicando velhos dobres pelo Monstro em cada um
Nas ruas.Calçadões.
Indo e voltando.Dando risadas que ecoam
no fundo medroso de cada ouvido
pedindo ao amor que lhes dê coragem para desafiar
este Monstro ,chamado destino
Estranha aranha,que trabalha as teias da agonia
fazendo com que a realidade,sempre derrotada pela imaginação
não esteja mais à altura do sonho
e que uma vida inteira pareça sempre
tão pouco tempo para a glória,paixão,sacrifício,
tudo que dá sentido à existência.
No meio da procissão,tomado por vã inspiração,
imagino que a pior idiotice é pensar que o homem nasce
livre.
Dirijo meus olhos ao infinito,capto-o pelo canal dos meus olhos
Nunca cores tão intensas tocaram minha alma.
Minha mente anda tão depressa
Quem quisesse me acompanhar teria que dar saltos inacreditáveis
Omitindo os elementos de ligação
Inconseqüente como criança
que não tem a menor idéia do que a vida pode fazer com ela.
A única maneira (à qual me agarro enquanto rezo,oro,entôo
ladainhas)
de
ser feliz,
é não saber que sou feliz.
Recuso-me a acreditar que o passado é um bom lugar para se viver.
Imagino-me um tipo que faz alguém ter vontade de fugir da cadeia
Esfrego minha bola de cristal e vejo que para ser atacado pelo
monstro
basta alguém provocá-lo((ele devora seres humanos
rapidamente)
nem a música acalma sua selvageria
e com o mundo do jeito que está, ninguém tem muitas chances
e o monstro quando se apossa de um corpo(ele não perdoa nada)
velhos e jovens são mergulhados no absurdo e lá se afogam
na ilusão de algo que os torne humanos novamente
o Monstro faz-nos pensar que não há relação espontânea
que o trabalho e o estudo só nos desgastam
ele nos quer no inferno,ele enerva até um santo
transforma todos em seres vulgares.
Chego em casa depois do culto
O Monstro está fora de mim.Unhas,pêlos pretos,olhos verdes,
varanda para o mar.
Uma estranha melodia se faz ouvir ,envolve o ébano da criatura.
Ele se arrasta em busca de alimento pela fria cerâmica do meu
apartamento
Na varanda um pássaro pousa.Um pássaro canta na varanda
Estridente.Com aquela cara boba de passarinho
O Monstro aproxima-se.O pássaro foge
O monstro olha-me diabolicamente.Olhos mortiços, sem vida, cheios
de frieza .
Ao longe várias flores exalam perfume.
O mar encrespa-se
A noite vai descendo até o chão.
II
O Monstro sabe que ao deixar meu corpo,o contaminará com o fim do
poema
Ele sabe que qualquer que seja o escopo,será ruir a escultura,o
sistema
Por isso ao olhar para outro espaço
Ele sente palpitar nas paredes do seu lar-meu coração
Um novo castelo,novo paço(chamado vácuo)antiga solidão
Ele não se importa,ele segue buscando seu prazer
Experimentando nova sensação
Na verdade só o que lhe interessa é se satisfazer
É ejacular,curtir,tocar novos corpos,explosão.
Meu corpo não tem como fugir dos antigos poetas
Não há escapatória ,nem improviso.
Novas cidades,novos estetas
Só o que é detalhado,é assim conciso.
A ignorância não entenderá os anseios deste corpo
Os intelectos dirão “foi fraco”
O que digo é: o monstro chegou morto
Ao reavivá-lo conheci o vácuo.
Com tanto para fazer e tão pouco tempo
Escrevo estes versos a contragosto
Esparramo estas linhas ao relento.Ao contrário do que está posto.
Reconheço o inatingível Deus
Suponho meu tão minúsculo bem
Suponho e peço aos seus Que ,ao interpretar-me ,pensem no além...
Sigo para novo vampirismo.Entregando-me ,como vítima
Holocausto,ocultismo.No Janga, Gaibu- vítima.
E assim as linhas, as letras,o papel,o computador
Janis,Zeppelin e tantos
Ajudam-me a chegar a ti,tão longe do
ardor.Anis,assim,espanto.
E no Recife agora tem absinto
Há algo adiante
Alma Mater...definitiva
Esperoe nasce assim o dia:Em espaço /expectativa.
Agora paro pela segunda vez –
A segunda queda
O Pai me observa e diz: força!
Porém nada me preserva.
E a rede de proteção-é ferida corça!
O sol nasce ontem e hoje.Crepúsculo através
Toda estrela no alforje .És o que és.
Não sobra nada de virtude
nada de esperanças
Nem o novo nem a velha atitude
Só uma velha de tranças.
Para que o final do livro?Dinheiro,saúde,filhos família
Uma velha no bilro,a tecer rendas, perpetuar armadilha.
Aranhas são mães,que a vida tecendo
Fantasiam a falta de sentido- afãs de que perpetuando- se,
vão o sistema mantendo.
Ó, útero inicial...Por quê?
Ó, paraíso perdido até quando
É simples:é bom-a carne , vinho o auê.
O problema é ir agüentando !
As mulheres perdem mais
Num mundo onde o Monstro teima
Porque uma fêmea jamais
Chegará ao trono de onde ele reina.
Viajo aos setenta
Ardo querendo
Buscar onde ele se assenta.
Morro sofrendo
E assim seguem estes espíritos
Buscando a vingança, a vitória
Esgueirando-se pelos becos esquisitos
Desvirtuando a pança deste inseto- a História.
Não há caminho de volta para casa,conforto.
Nem lugar de curtição que nos salve,embale
Um porto
Nossa insatisfação, anseio,
tudo: cale!
O Monstro é uma lagarta rastejando por uma dose
Sou borboleta querendo a flor
Ambos metamorfose
Buscando o néctar do infinito.
Morremos pelo mito da caverna, saída tão estreita
Um cometa que nos guia
Trajetória imperfeita
Nem só o amor alumia.
Dessa última vez vamos tentar
Ser família,ser feliz
Todos juntos no altar
Neste sábado que sempre se quis.
Porém você não quer entender
Não quer me incorporar
Meus medos satisfazer
Só posso me entregar.
Uma mulher e um homem no mundo
O peixe e o mar.Imolação.Tentar
Problema...caminho.CarinhoTestemunha
Acabrunha !
Este testamento é falho
Porque sou apenas a cela do Monstro-sexo
E não destruirei o espantalho
Que torna tudo desconexo.
Solidão incomoda minha busca
Ela tortura meu sossego de pedra
De qualquer modo ofusca
(Greco-romanos- egípcios- portugueses) engendra.
Digital.Mal.Setenta,oitenta,noventa,dois mil e um-fatal.
Conclui o Monstro: tenho o infinito
Acredito
Longo olhar , sobre o mar
Suave brisa- reflito.
E ele não me deixas encarar isso sozinho
Velho vinho
Guerra onde me afogo e que me sacia
Nada me alivia.
lll
Estou no 23º andar do edifício Marajó
Ao lado do Parque 13 de maio
Com o grande Recife aos pés,ao redor
Dentro de mim o monstro se retorce
Aceito-o pois não há saída
É melhor que tentar me enganar
A coisa se espalha em mim,brinca
Nas minhas veias o mal que facilmente alastra-se num contágio sem
fim
Minha alma é posta à prova ,e como políticos que se
esfaqueiam e se beijam,
Eu e o monstro mergulhamos nossos olhos no Atlântico.Logo ali.
Os humanos ,como formigas , se movimentam
Em estranho tabuleiro vejo Olinda.Boa Viagem.Arruda.
A minha torre (extensão do meu corpo)
a sombra de um gavião é como o meu desejo,as memórias
que trouxe das montanhas,dos desertos,sertões,viagens,minhas
criações todas.
A natureza está quieta nesta manhã de sol tão urbana
E eu percebo através das poderosas lentes
Que ninguém sabe o jeito de amar a si próprio
Envolvidos pela ganância ou pela abstinência
Os desejos são embalados pedem empurrões.
A vontade cortaas raízes da vida
E eu respiro ao escutar o assobio vento nas janelas
Meus companheiros chegam ,,partem
Lembranças fotografadas.Passado. Presente multicor
empurram -se em sonho, para frente
–é tarde?
Recebo no rosto elogio e ingratidão-
Avanço para o desconhecido- Novos amigos?
Observo o violão sobre a mesa-
mudo há muito tempo.
Parece que os sentimentos mudam,
As nuvens desenham sombras entre os prédios,
O azul-/verde/cinza/dourado-prateado do mar,cintila
O telefone toca-
Alguém para dizer que me ama,é chato.
Meu amor dispensa declarações assim
As palavras atropelam minha calma.
Há momentos de epifania que se dissolvem
Não têm fim nesta busca
Minha vontade provoca tosse no monstro
Ele ruge.
Suas mãos assassinas e etéreas
Buscam meu pescoço.
Eu tusso,escarro, me beijo.
Procurar saídas excita.
As bandeiras vermelhas se agitam,o país busca.
As notícias em ondas reverberam
Livros,
CDs-
imensa fogueira.
A verdade muda
como a direção dos ventos
O brilho,o calor, alfinetam nossa lentidão
Não adianta racionalizar sentimentos.
O monstro sai de mim ,se espalha pelo mundo.
Diz que os maus momentos ensinam o que é bem,
E que não há razão na terra Capibaribe .
Nas ruas do corredor que sai do mar
E se joga pelas ruas 1º de Março,
Nova, Imperatriz e...arrebenta na Praça Maciel Pinheiro.
Amar-se,descuidar-se refletindo céu e inferno
O monstro a voar passeia pelas orlas
Mostra-me sexos ardendo, peles , pêlos salgados, perfumados,
preparados.
Lá longe em Casa Forte, a umidade,o perfume das plantas,
o conceito armorial encastelado.
Devo corrigir meus versos?
Os freios da consciência,a velocidade da vida...
Não sinto somente seu olhar,compartilho com o monstro
este sentimento cósmico de alquimista solitário.
Entramos no submundo
Faróis,portos .Recebem e sacodem
A beleza destrói quem a possui,o poema tece um chicote
a açoitar a estranha placenta
Respingos nas imagens sacras, o que sobrou dos séculos
Frutas apodrecendo. Insetos.Cabeças de Medusa petrificando
Estátuas morenas onde Amor pousou.
O monstro brinca na lama do meio-dia da pressa e da perfeição,
das feridas e pesadelos,enquanto ao sul ,aproximam-se
nuvens cinzentas, vindas do Cabo de Santo Agostinho.
Minhas cicatrizes .Ossaturas,quadros –
ouro envelhecido pelos séculos
Nudez lasciva,
Guerra dos Mascates em mim,
farsa da batalha dos Guararapes,
eterna Confederação do Equador.
Balelas,panelas,gravuras amarelas
Jovens e velhos estes versos tropeçam,como
rebanho tangido pelo monstro
Consciência .Indecência, animal
Recife a se deslocar inseguro
buscando no horizonte aberturas subterrâneas
, golpes de facão
Aqui a verdade vale tanto quanto a
hipocrisia
Festa ,trabalho e pão
Poetas fingidores acostumam- se
,viram asfalto melancólico.
A força da engrenagem alimenta a única
verdade:
Nada é definitivo.
Se a cidade for derrotada não vai ser
porque desistiu
Seguimos, apertando parafusos,
estruturando a verdade como ficção
O animal dentro da capital de Pernambuco
paralisa alegria e tristeza,
rouba honestamente pois sabe que seus
filhos tornam-se mais humanos
a cada perda.
Pequenos tiranos zeram contas ,erguem
arranha-céus fascinantes.
O monstro volta com trovões e vento
frio.
Todos correm sobre ruas que lembram
serpentes negras
O pássaro da sabedoria espreita ,enquanto
o espírito do mal vagueia
A magia bebe na grande fonte
Os gestos do monstro tentam agarrar o
infinito
O fracasso da humanidade humilha ricos e
pobres,empesta
Ação:o cadáver quando nasceu já sabia de
tudo,brincou com a morte
Futebol,dominó,barrigas,novelas,caninha,caldinho,três
sexos
O medo recebe a luz:ninguém vai levar a
sério
Sem medo de ser tolo ,de si mesmo,sem
pressa,sem se afligir,improvisando,
sem chorar o monstro é o campeão na arena
do mundo real
eu olho a platéia penso nas apostas.
Não há vaidade no monstro.Nem remorso.
Cada passo contém todos
Tento arriscar o que levei tanto tempo
para conseguir ,
Misturo meus desejos com a cidade que me
mostrou um caminho e seguiu outro,
inútil confiar num senhor de mãos vazias
As vítimas das secas e
das enchentes,os miseráveis querem
sexo,vinho,pão,orações,abrigo.
Não choro: muito choro demonstra espírito fraco.
Se a dor da perda foi grande , a nova
aquisição não será,
não há o que escolher entre coisas
estragadas...
Na cidade destruída cada minuto contém a
eternidade-
a chuva acabou com tudo, a peste
devorou o resto,
o fogo cresceu
ficou difícil de apagar,
Fugir dele é afogar-se na insensatez.
O hábito de não lutar contra as
injustiças destruiu os sentimentos dos recifenses.
Improvável,mas não impossível, lateja
ainda o coração da cidade,
um coração de pedra vigiado pelo monstro
sorridente que me mostra que tinha razão.
É o pulsar final do amargo verbo
chamado esperança
A suspeita mostrou-se pior do que a
certeza.
O monstro abraça-me.
BALADA NO JANGA
Em busca de aventura, compus um poema
Versos astutos, tema cruel
Vento da noite assobiava na janela.
Bebi um pouco de rum que trouxe
Noite escura que não esqueço,
Coloquei entre as estrelas meu endereço
O ouro que trouxe do Recife esgotara-se,
Os sonhos de rapaz tiveram alto preço...
Cão da cidade no meu encalço
Todo oceano é pequeno para fugir
Todo brinquedo insuficiente,para me
divertir.
Numa espécie de jogo esquisito e perigoso
,
Apostei minha última chance
Calças vermelhas, casaco blue
jeans,
Óculos de Lennon,num lance
Entre os deuses coloquei minha sorte,
Fui julgado por um jumento fedorento
Não vacilei um só segundo na hora do corte
Que foi lançar meu pensamento
Criando meu próprio universo:
Novos seres,nova geografia
Desci da montanha da maldição
Trazendo vivo o mandamento que lá jazia
Cabala de emoções,
Multipliquei-me de várias formas
Em paisagens dramáticas
Subvertendo normas
Animando a imaginação
Acirrando a fúria
Pela morte do preconceito
Sete mares (nada é tão profundo)
Nunca foi suficiente para mim só olhar.
A solidão do mundo
Bebi o ácido licor dos vales encantados
Amotinei-me contra a Razão
Barco sem rumo sob lua nascente/Sol poente
Dados rolando
Janga
tango
Refaço o tempo com letras
Vivo intensa aventura
Na espuma desse mar jungle/ jangada
Novo tempo se estrutura
Esqueletos não me assustam
Deserto eu não temo
O mar enfrento
Solidão é brinquedo de poeta
Se é para não me calar,eu tento
Balada
do Janga vou compondo
Incrementando minha jornada
Portugueses,holandeses:
Recife ao longe nunca está parada
A cada barco,novo sonho.
Voz de mãe a lembrar
Mistérios do mar
Mistérios do mar...
Filho: estarei rezando
Eu
te amo tanto
Esse
mundo é tão grande
Pode-se
ir para sempre
O
horizonte se expande
Filho:vou
fingir que não sofro
Que
você não faz falta.
Filho:chorarei
todo dia
Ao
lembrar que está longe o meu filho
A
roleta
Olhos
faiscantes
Paixão
enlouquecendo
Perigo
da deriva
O
mundo dá tantas voltas
Na
trama vai se perdendo
A
minha vista animada
Vê
depois da ponte
O
fim do Rio Doce
Atrás
de Olinda está a Metrópole
Roendo
as unhas
Contando
os dedos, como se criança fosse
Tal
uma ilha perdida,sem mapa
Sem saída:nem lei, nem lenda
Enquanto isso, toca num rádio bem velho “Hotel Califórnia ”
Posso pedir a conta a qualquer hora
Mas nunca posso ir embora
Tripas para fora da TV
Cachimbada
Comida de vermes
Boca de tubarão
Sem demora
Um velho anuncia o resultado do embate:
A lâmina,a ponta do facão: zaz!
É chegada
minha hora
Desenrola-se o carretel
O corvo diz nunca mais...
Tirei a sorte grande!
Quem mata
a esperança,engana-se
Bem se vê
Ergo os braços:vitória
Como num desenho animado futurista
Compartilho com seres mutantes, essa
conquista
A noite ter assim terminado
Esta foi a Balada no Janga :
Eu,vencedor de mim mesmo
Sigo mais relaxado.
“PASSAGEM”
Lá vai
sem graça
madrugada
largando a caça
Madrugada
a vida meio chata
impossibilidade transpassa
Francamente
Displicentemente
distraída
apartamento,vazio
perto da praça
Jogo inútil
metáforas repetidas
carcaça
Suspiro, transpiro, respiro,me viro,
disfarço
Varo a vida
nem ódio,nem amor
Descalço sapatos novos
Visto roupas eletrônicas
Pego o elevador
Playground assassino
armadilha suicida
Leve tremor
Dia passado
falta de amparo
inútil rancor
Levantar das âncoras
Quebra das correntes
nenhum frescor
Suspiro, transpiro, respiro,me viro,
disfarço
Nada espanta
músculos se fortalecem
olhos se atiçam
Um certo clima
certo dancing day
Ritmo dissoluto
Drink transparente
mulheres cantam
Suspiro, transpiro, respiro,me viro,
disfarço
Cabelos incendiados
desejo que insulta
Luto
Cerveja de novo
Cigarros
noite vazia
carro com multa
Amanhece
crepitando
sol
Aviões que chegam,
Eu parto
Suspiro, transpiro, respiro,me viro,
disfarço
Nuvens vagueiam
sacudidas pela repentina brisa
Dentes
Narinas
O filho aparece no café expresso com bolo,
indeciso
fatias do fígado de Prometeu
o coração repisa
Suspiro, transpiro, respiro,me viro,
disfarço
Aperto os dedos
Paletó
entreaberto
Coragem
Banco de táxi
lágrima furtiva
no meio da viagem
na paisagem
Rito de passagem.
CONHECER
A VERDADE
Conhecer a Verdade
Saber da ávida ânsia
negra claridade
Iluminar abismos confusos
menos favorecidos ou profusos
A verdade é conceito vão.
O futuro é sonho que se faz.
Crer ou morrer.. pensar, tolo afã
No erro, na Ilusão/desilusão
Triste/ alegre Canção
Não torço pelo esforço/ Alvoroço
Não descasco máscaras no calabouço
vale
tudo dos lúgubres repousos,
céu da divina comédia...
Alma e asas abertas...
DESAPARECE
O SOL NA MINHA JANELA
Desaparece o sol na nossa janela
De um dia feliz sem mazela
Azul púrpura alaranjado, repicar de
sino
Homem sombreando menino
Ventania cinza de outro lugar
Recife, Boa Vista , cores em profusão
Claro-escuro...Outros lumes, jomardmunizdebrittianiano
escreviver...
Na recifense tarde, há canto gregoriano ao longe, talvez na Igreja
da Soledade
Em nós acende-se a fome de viver...
GATO
PRETO EM CÉU AZUL
Porque numa tarde como aquela
A última chance
Alguém que o esperava na janela
E apostou as fichas no lance
Não era jogo perfeito
Nem céu azul nem gato preto
Algo assim transcendental
Olhar, toque sobrenatural
Os dois sorriram
Ele agarrou a estranha mulher
E não perderam um minuto sequer
Mas o desenlace malvado
Foi inusitada dança
Ritmo desencontrado.
“NOVELA”
Ah, meu amor!/ Por que teve que/ ser
assim?
Cada copo que bebo/ tudo sempre parece
/começo e fim
Do amor/ entre quatro paredes
Eu caí nesta rede/ de intrigas, /trapaças
Como numa novela,/ tal e qual /folhetim?
Ah,/ meu amor!/ Escuto a porta batendo
Que maldita surpresa!
Seu bilhete na mesa
Explicando tintim/ por tintim
É bem/ melhor /que seja/ assim
A jogada perfeita
Que com toda certeza
Antecipa o meu fim
Se ainda/ resta/ alguma/ chance
Talvez/ alguém/ me ofereça/ champanhe
Me convide pra dançar/...ah, meu amor!
Ah, meu amor! Por que tinha/ de ser assim?
Que destino fatal,/ presa num hospital
Sem dinheiro,/ é o fim!
Até que a Sorte/ sorriu/ pra mim
E no lance final/ como numa novela,/ eu
/venci!
A jogada perfeita
Como numa novela...
Tal e qual Folhetim!
“ROMA”
Anagrama
do amor hoje
ontem
Itália
colossal
Minha
própria vida
No
fórum
No
Coliseu
Eu
mesmo devorado
Deuses
e estátuas, imperadores, basílicas
Mercados
dos meus amores
Dores
etílicas
Uma
praça tão triste nessa hora
Sou
sacrificado entre muros caídos
Paredes
das termas de Caracala
Atravesso
as portas monumentais
Carrego,
pela Via Ápia
sentimentos momentâneos
Tremulam
mediterrâneos pinheiros
Catacumbas
Esplendores
barrocos
Abraço
de Bernini
Aperto
universal de pedra e cacos
Igrejas,
templos, esmagadora arte
Colo
da Pietá
Sansão
amarrado nos baldaquins
Pareço
o Vaticano
Sou
o menor país do mundo
Roma
que me tenta
No
claustro me acho cristão arcaico
Perdido
entre naves
Pórticos
Panteões
Guetos
hebraicos
Gerânios,
colunas, calçadas prosaicas
Vida
inteira jogada fora
Sigo
rápido margeando a fonte das tartarugas
Busco
beijo à luz de velas
Vinho,
massas, molhos, desculpas amarelas
Que
chegam com a noite para este viajante
cansado,
Continuo
através dos dias
Espantado
Hóspede
Palácios
mal assombrados
La
dolce vita na Fontana de
Trevi
Doce vida!
Dá-me logo a espumante abundância!
Mesmo que seja por um instante breve
Compara-me ao efeito ágil desses cavalos
Rochas, desses deuses
Desse teatro danado
Desta fachada artificial
Nesta pequena praça
Eu, amolador de facas
Jogo moeda, ágeis cavalos, esguicham,
escorrem,
Já nem sei, neste labirinto de ruas, para
quem...
Ó água incessante
Vento do crepúsculo
Como acabará esta noite?
Ando até a praça de Espanha, carícias
Bem sei, virá depois o açoite
Escadaria grandiosa
Vou descendo lentamente, sozinho
Azaléias, café & burburinho
Curvas & reentrâncias
Festa ininterrupta!
Transeuntes & becos escuros
Estrelas, gritos italianos
Cadê meus avós?
Perderam-se nos subúrbio dos anos
Em parque sombrio que já nem sei mais
Tanta música na memória
Súbita alegria, de mármore, aliás
Metafísica
Metamórfico reencontro
“O
SOPRO”
Coisinha linda toda a magia
é difícil de acreditar
É difícil conceber
Nunca pensei
Nunca pensei
Veio como num gesto mortal
Gozado, não é?
Que uma pessoa tão jovem
fizesse o mundo parecer pequeno
Difícil de crer que fosse tão forte
esta coisa chamada amor
É assim que funciona: como um sopro
Que nos leva para lugares,
onde se pode conseguir o beijo da vida!
E onde é fácil de viver (tão fácil!)
Eu agora vejo o anjo que me vê
Ele sopra nuvens douradas
num céu azul e laranja
Flauta soprada, ritmo de eternidade.
ODE
AO LIVRO
Luar solidificado
fogo congelado
dor que murmuro
Barcos em estranhos mares de vinho escuro
Que me fazem Deus no quarto
Grito que não cala
me crucificam na sala
Maravilhas e perigo: loucura breve
Com água de serpente
ou com sangue
se escreve
A teia de homens
truques da alma
em animal e flor
Sonho da vida de sonho
monstro feito de olhos e dor
Paperback,pulp fiction, luxo
melodia que não posso traduzir
Que me leva de volta às fontes
ao porvir
Velho-moço aprendendo
errando
Corvo e pomba branca casando
O livro
Senti-lo até sem lê-lo
tateá-lo penetrando-o
Buquê jogado no espaço
vento despetalando-o
Fantasma atravessando meu último recôndito
Cascavel celestial
me deixa atônito
Papel
Tinta
luz na minha memória
Vários dias e noites numa só história
Que faz os vencedores se curvarem
Paraísos de leite e mel,secarem
Pavão perder suas cores,
desnudando-se até a essência
Necessário pecado,
nossa arrependida convivência
Livro
Tentativa e erro
retorno à pátria e desterro
Que me faz sombra e candeeiro
Sonho em claro labirinto-frio ou quente
Espelho temeroso/ livre metáfora/inverdade
Alusão às inatingíveis estrelas no fim da
tarde
Irrompível cadeia (criação/ imitação)
Online ou na minha mão...
Livre livro.
Versão
2: Poema para o livro
Luar
solidificado, fogo congelado/Barco em estranhos mares de vinho/Com água de
serpente/Ou com sangue se escreve/Teia de homens,truques da alma/Que me leva de
volta às fontes/Ao porvir/Velho-moço aprendendo e errando/Livro é corvo (letras
pretas)/E pomba branca (páginas) casando/Lê-lo,tateá-lo penetrá-lo/É pegar
buquê jogado no espaço/Do meu último
recôndito/Livro: cascavel celestial que me deixa atônito/Papel, tinta, luz na
minha memória/Dias e noites, muitas histórias/Livro: faz os vencedores se
curvarem/Livros de leite, mel & fel/Livro: Solidão/sociedade/Sucesso e
erro/Amor & Ódio/Retorno à pátria e desterro/Sombra e candeeiro/Presença e
indiferença/ Labirinto/ Espelho/Nos levando às inatingíveis estrelas/Livro:
Inrrompível cadeia (criação/ imitação)/ On line ou na minha mão...
AGNUS CASTUS
No canto/canteiro
Casto cordeiro
Estranho vinho
Cupido sem niño
Na jangada imprecisa
Que interesse visa?
Ritual em antigas vestes
Hóstia, promessas celestes
Deus, até o fim
Agnus
castus, sim
Remédio bendito, amor maldito.
BALÉ BOUGANVILLE
Os
ventos levam pólen
e
as abelhas também
Orquídeas,
lírios,
flores
são tão simples, mas incríveis !
Todos
os amores convivendo em pleno ar
Pétalas,
mistérios e flor a girar
Tantas
cores, no verde
de
noite ou de manhã,
Chuva,
sol, sereno: lilás flor da jurubeba
Flor
do coco, do jambo, e do maracujá,
Estrelas,
muitos peixes, no céu e no mar
Flamboyants e
dálias, bouganvilles
mais
que lindos
Perfumes,
carícias, de um amor tão infinito
Não
está no cofre e nem na tela da TV
É
na Natureza que você vê
Todos
os amores convivendo em pleno ar
Estrelas,
muitos peixes, no céu e no mar
QUAL
O SENTIDO DE SER FELIZ? (nonsense)
Pagar um preço
tóxico por ser
emocionalmente analfabeto quer dizer
não demonstrar fraqueza nem carência
quando doem os próprios sentimentos.
Quando se está assim neste estado
vivendo assim... na pele do triste amado
a felicidade nega-se manifestar
Intimidade vira mudez explosiva e
estabanada
Encarcera-se a fúria de Marte
agonia de Áries, deste modo
Dogmas projetados
personas sexuais
Raiz latina não se arrepende
Faz a felicidade ter sentido e não doer.
ARRECIFE
A cidade... velhas ruas
O cinema Moderno
Veneza
Vitrines do final do século vinte
História viva
Lágrimas de Boa Viagem
Estragada
em jardins suspensos
Mas te abençôo, cidade, pois és o meu chão
E ainda te amo, Recife
cada
vez mais e loucamente
Porque desperto em ti
E em ti alegria e desespero encontro com fartura
Teatro onde me apresento, platéia cubista, extemporânea
Meus amigos, meus inimigos
Encontrem o Recife de amanhã
Digam que fui um homem sem orgulho
Vai, Recife, faz com outros
O
que fizemos juntos tantas vezes
Mas não esquece, Recife, quem te amou
E entre pontes e descaminhos se encantou.
SETE
FACES PARA O AMOR
Quem sai por aí uivando
ou perplexo de saudade
sofrendo revelações
torturado por olhos inesquecíveis
preso na fé cega do amor
pode ser colocado em xeque
pela própria natureza do sentimento.
Com o sexo e o sacro sem nome
o carnal e o místico revelando-se
sem renúncias ou fronteiras
nem culpa nem subversão de nada
a entrega se dá
Shiva masturba-se e nasce mais mundo
em orgasmo individual conhece-se o supremo.
Dos campos desertos
sai o amante para o encontro também
mas é no seu interior que está o labirinto
para desvendar o próprio coração-enigma
ele é todo puro desejo
deseja ser ele mesmo, plenamente
e ter satisfação no querer e fazer
Seu amor pode não ter sentido
feito de coincidências: perdas e ganhos
entre vivências aparentemente absurdas
Ele é cavaleiro das trevas ou da luz
anonimato desmedido & super exposição
orgia do nunca desistir
anjo misterioso - pena bendita / maldita
Ele tem amor excessivo
transpassa o supra-racional
recebe a revelação espantosa
entra em crise profunda
converte-se a si mesmo
descobre o mal dentro de si
mas se entrega ao Divino
Ele ama até a paixão
sem referências
e na corda bamba
tenta o equilíbrio para descobrir
acirra a descoberta do “nós”
projeta no ser amado o Deus (des)esperado
é fiel no profundo mergulho
Não encontra paz no amor
sua epifania é apenas um prolongado exercício
busca a plenitude
fogo e gelo nos olhos tristes
enganam possíveis leitores
desses versos acabrunhados
livres como ele nunca será.
Detectada
(Misteriosa fonte)
Detectada em Londres, ontem
(por nave européia, anotem)
Misteriosa fonte de calor no pólo sul
Numa lua de Saturno, a lua Enceladus.
Disseram que esta lua é toda de gelo
500 quilômetros de diâmetro (como vê-los?)
O que intriga os cientistas
É que a tal lua tem... atmosfera
(Vapor de água e dióxido de carbono)
Colocar num lugar desses, quem me dera
O seu ódio monótono
Sabe-se que ela é pequena demais
Para ainda guardar o calor
Ali você ficaria, meu amor.
Poemas
de Minas Gerais
O pico do Itacolomy alaranjou-se
Cai o sol sobre Ouro Preto
Esconde-se furtivo entre a neblina
Vento do crepúsculo pelas ladeiras
Carrega o passado inútil
A reconstrução da vida
Liga o que fui ao que farei
Passam-se os dias em
Minas Gerais
O vulgar presente me atravessa
Em vão o soluço silencia
Meus passos rufam rápidos
sobre o destino dos inconfidentes
Tudo repetição e deserto
II
Sopram as folhas sobre o monte
Descanso tranqüilo no vale
A cidade de Ouro Preto comove
Com tantos silêncios guardados...
Sussurros apontam outros lugares
São João Del Rey, Tiradentes, Mariana
Profetas e Cristos de Congonhas
Cedro, e pedra sabão desafiando séculos, amém
Vaivém
das pessoas
Tempo descabido e vão
romaria
Soam sinos e trovões
Alternam-se cinza e azul
no
céu purpúreo
III
Um novo ano, novas preces, acaso, ocaso
O chá do fim da tarde, rito colonial
A dança dos convidados
A busca na escuridão
Brisa suave, silvestre aroma
IV
Janeiro
A igreja do Pilar
Leitura do apóstolo Paulo
O poeta comungou, chorou
Assistiu a missa ao lado da irmã
V
Luzes
de natal esfuziantes
Diamantes multicoloridos
Translúcidos caminhos
Passam-se os dias
Noites
Sonhos de cobrança
O passado transformando-se
Em combates e esperanças
Ar monástico
Montes ao longe, quintais frutíferos
Algo no eu-lírico vai adiando
O livro
A
vida
Algo de ansioso, algo de calmo
Algo que não se esquece
Nem
se lembra nitidamente.
Mundo
deserto de pais
Mundo deserto
Sem
você perto
chegou setembro, nordestinada
primavera
eu não entendo, tempo de espera
tudo se esvai
tudo
é incerto
longa estrada
vida
parada
olhar vazio
essa
janela
repleta do que eu não entendo
beijo
vazio
braços em que não caibo
tanta gente
mundo
tão vão
ó vaidade!
espero
à toa
uma vida boa
tantas crianças se distraindo
queria ter você sorrindo, pai
O
tempo passa em comprimidos
homens deprimidos
tantos anseios
angústia de mundo que se esvai
gemidos
sonhos
esperança
mensagem
passagem
colo no vidro
adesivo de tantos ais
vida tripla, vida dribla
ninguém escuta
resposta vazia
criaturas
da noite
procuram
a desculpa
para
o mistério
sem saída, sério
O
fogo no coração
a queda
choques
chorinhos
copos com fumaça
estranho desejo
passeio
o mundo pelo meio
telefone
computador
tanta pergunta
poço escuro
mar
profundo
olhos confusos ao amanhecer
tinta se esvai
inútil
pergunta
cadê o pai?
Novamente flores ao sol
Personagens principais
a
me dar beijo de língua
O galo canta
chama
você
Incêndio imenso
esse
dia
o universo, o capricho
Preparo a bagagem
vou em frente
parente
serpente
paraíso
O mapa
o caminho
a
curva no mato
versos, livros, tantas pessoas
A existência... uma flecha.
REVEILLON
1
Rasgo agora mesmo teu retrato
recuso
o passado
Amasso um resto da embalagem de bombom
Os dentes
um
cálice de vinho do porto
meu apetite se abre
O próximo prato
A salada passou, o dia passou
Que venha o jantar, eu espero.
Toalha, os talheres, o pianista
A memória d’outros tempos
Os
dois dançarinos vendados
Alugados
Os
dois artistas, nós dois
Profissionais ao som do tango
Sou máquina masculina
Olhos de amêndoa, pele morena
Você é flor tão viva na sala
Um violoncelo
O
licor, o veludo, a joia de presente
A meia-noite
Coloco
a mão no bolso
Sinto as chaves hermenêuticas
Coquetel de neblina
água
de beijo
lágrimas
Reveillon.
A
HORA E O LUGAR
Deságue sobre mim:
O fluxo do seu declínio
Venceu a minha força
Seria arte como verdade
Se você me amasse
como o poeta ama o poema
que o mata...
Teria sido mais fácil
escapar das conseqüências
do que você fez
A arte foi a mentira
que me levou à verdade
eu
bem sei
Verdades e mentiras são tão relativas
Dedos pálidos reclamam seus mortos
A lua, que a noite esqueceu
Me chama
Me sinto muito bem na minha pele
A poesia traçou para mim um horizonte
Aberturas por onde as palavras deslocam-se
Lúdicas
Desconstruindo/
reconstruindo meios-tons
Verdade em versos
Sentimentos delicados
Nobre melancolia
O papel-espectador de mim mesmo
Era com o que contava pra sair dessa
Este ator: o que quer?
O que necessita?
O que conseguirá?
Sobre o ser humano não há certeza alguma
Você sem me entender
eu tentando explicar quem é você!
Paixão e elegância nem sempre andam juntas
Suja e feia a guerra prossegue
Acrescento uma última volta ao parafuso:
Voltarei quando a noite cair
E o céu não me esquecerá...
JMB, Foucault & o Jaguar
para Jomard Muniz de Britto
Não existe filosofia, só o filosofar
Saber é poder: sexo e loucura podem punir, não disciplinar
Intelectualismo?
ó Hegel, a História é jogo de azar.
O que é de verdade? A razão ou o querer?
Agora
eternamente,
algo além da razão a nos entreter.
Mais importante que a verdade do passado,
a do presente deve ser
Sartre? Heidegger?
nossa existência é o que dela podemos
fazer
Nossa vida é o que improvisamos:
de prazer quero morrer
Sadomasoquista na neblina, ópio do povo:bem-querer.
Psicanálise selvagem?
Conhecimento do eu errático? Eduardomaiemo-nos
Com Louis Althusser, cheio de marxismos & (limpando os pós)
estruturalismos,
O conceito de humanidade poderia evoluir?
A verdade é sempre algo que temos que construir.
Vamos e vaiemos o viver no perigo
do mal virá o meu melhor?
Do erótico, o meu limite? o labirinto-maior?
Que buraco é este do 1° de abril? Quem
abriu?
Melodia desintegrada, sugada pelo vazio,
Provemos e provoquemos o gosto e o odor
Será tudo alucinação?
Qual o porquê da supremacia da razão?
E da des-razão?
Tragam-nos um divã encorajador
E excitante(calma!)
A loucura vive em si mesma,
Van Gogh, Sade, Artaud, tanto amor!
No caos estrelas dançam em glorioso azul
JMB desconstruindo certezas
Em diferenças de Norte a Sul
Faz-nos parceiros do seu tempo
(Agora Ágora/ Picuí)
Tão cheio de frutos, tão quente, tão cru
Palavras, coisas, pressupostos preconceitos:
Aproxima-se como Foucault no seu Jaguar
Episteme que nos surpreende sempre
Toda identidade é incerta.
Vamos tratar do sexo
Comer e beber bem, o resto é blue!
ORAÇÃO
PARA INVOCAR LUCILA
Há quem diga
Há quem peça
Há quem mande
Ela se atreve
Ela diz
Ela pronuncia
Profecia
Passado
Presente
Ela advinha o presente
Ó translúcida Lucila
Entrega afetos
Luzes na natalina Casa Forte
Nossos açúcares, nossas taxas
Contas (a ajustar com a vida)
Dissolvem-se diante de ti
Ave poeta, pitonisa! Vem!
Eletriza, chama de Eleusis!
Elegíaca Lucila...
Elegíacos torpores, oferendas,
graças...
Lerei o teu futuro agora
mesmo! (difícil é o presente e o passado)
Quem a vir vaporosa, poesia e
prosa, trocadilho, sem filho
Dirá apenas algumas letras,
Erguerá os copos, recolherá o
líquido,
Na coxa, na Grécia, em Roma,
Na Índia.
Badulaque
Cristal antigo, lapidado por
mestres do além.
Lucila, te invocamos
Te invocaremos, sempre
Ó lírica Lucila,
Intercedei pelos que entendem
o Cosmos
Tão cada dia, tão salvação e
armadilha
Guia precioso
Ó mítico oráculo para incertos
futuros
Outros muros
Vem já e multiplica tua força
Venceremos!
Há quem diga
Há quem peça
Há quem mande
Ela se atreve
Ela diz
Ela pronuncia
Profecia
Passado
Presente
Ela advinha o presente
Ó grandiosa Lucila
Entenderão aqui os teus
mistérios?
Haverá hermenêutica suficiente
para saciar tantos devotos?
Sobrarão alguns versos
totalmente incompreendidos?
O que será feito deles?
Das tardes impressionistas?
Quem saberá dos cálculos e
perspectivas?
Que a todos dissolvem
Quem circulará contigo no
Grande Banquete Cósmico/ cômico?Cosmotrônico?
Rogamos que entres neste culto
Que venhas e comandes
Este espaço é teu
E nós devotos te saudamos
Ave Lucila!
Vem e nos ensina
Orienta/ Ocidenta
Nos faz cruz/ cruzamento
Vem cruzar os hemisférios
Faz nevar na cidade
universitária
Faz fluir a verdade mais
oculta pelo cálculo
Descobre
Extrai
Nova Teoria que se anuncia
E tu és a assinalada
Tu estás pronta
Finalmente
E nós
Acólitos invocamos o momento
Do gozo absoluto
O poder é teu
A hora é esta
A cabala se abre
A gestalt se fecha
A sorte está lançada
Recebe nossas oferendas e
atende nosso pedido
A terra hoje se abrirá!
Lucila se diverte
Faceira
Dengosa
Da gema
Diadema , vestido de cetim
florido
Há quem diga
Há quem peça
Há quem mande
Ela se atreve
Ela diz
Ela pronuncia
Profecia
Passado
Presente
Ela advinha o presente
Serpente original do tempo
Atende nossos pedidos
Entra em nós para sempre
Te invocamos, ó Xamã de todos
os sexos!
Todos domados por ti!
Paralela!
Vem, ó mulher!
Disfarçada de verdades
inventadas
Desde o princípio dos tempos
A verdade é o seu disfarce
Sua comparsa
Elas brincam de destino
Ó imaculada Lucila, teus
poemas dormem nossos pecados e cálculos.
Rogai por nós
Nesta madrugada interminável
Neste quase ser tudo
Rogai
Ó Lucila!
Incertos versos se ajustando
Desajustando
Querendo através de mim e ti
Concertar o mundo
Balada
com Conceição Camarotti
Na linha do horizonte do Recife há uma
mulher
Na melhor concepção do escracho,
não é uma qualquer
Da Trindade, das telas, dos palcos
Driblando
funerais no jogo estrangeiro, fortes e fracos
Como luz e sombras de constantes carnavais
são
Seus olhos, unhas, cabelos, trajes de Lady
Conceição
Primadona do Mangue,
camarote para garotos duvidosos
Brincante antiburocrática entre poderosos
Da cerveja com
canudo,
do Janga,
do amor
Catirina
Marco Zero a lembrar que Mateus alucina
Não, não. Sim, sim, nossa querida é assim
Ei, mulher! Vem cá! Me ensina como
recuperar
Meu tempo perdido de poeta
a esperar o circo passar
Vem cá, Bochecha, quero ter mais fantasia
Mas é assim: o
jogo do Janga para mim
Homem niño maldito, bendita até o
fim!
Olha: um beijo do nosso “cais”
Jangadeiros que
somos a querer sempre mais
um abraço do tamanho do espaço,
certo
do teu Moisés Neto.
Poemanifestomoisesneto
Tanta gentileza
de sua parte lírica,
quanta rudeza de
meus, nossos
a-tentados
tentadores tentáculos...
Com muita simpatia.
Devemos assumir as contradições de cada dia
Com muita simpatia
Ninguém mais quase faz
Meio rebelde... mais acidental...visceral.
Assombrado pelo espectro político
que me acompanha desde sempre
(paranóia sublimada)
e que não pode ser ignorado.
Com muita simpatia
minhas posições continuam radicais.
Minha coragem é questão de dialética
Com teorias pouco dogmáticas,
sedimento logo
abro portas da consciência
não aceitando o inconsciente?
instantaneamente consciência.
Intencionalidade!
E não é uma questão intelectual, esta agora
(qual? Quando? Por quem?)
é mais ampla,
Não pega só a inteligência.
Pega também as emoções, sentimentos.
Tudo em mim (egolatria?) é mais ou menos intencional:
intencionalidade radicalizada.
Tão radicalmente intencional
que se não existisse o intencionado,
eu não seria/ teria nada, nada de consciência ou sereia do nonada?
(Haja retórica poética? Pop- filosofia do nadismo?)
Nadando no na-dadaísmo das distâncias
No infernolento sartriano
É por isso que radicalizo a intencionalidade:
O fundamento do homem é o Nada?
O Nada não é nenhum mistério.
O Nada é a distância do sujeito.
Eu sou
Definitivamente
separado
de tudo que me cerca
de tudo.
Com muita simpatia
Só tenho consciência da consciência...
Ela me impede de me identificar com
as coisas.
Eu estou separado do Outro.
E essa separação
é justamente
o Nada.
Com muita simpatia
Eu sou sempre meio duplo,
isso vem da coisa que o irracional não
tem:
A consciência.
Ela: em primeiro lugar.
Depois vem a dicotomia: sujeito-objeto.
E na intimidade da dicotomia
sujeito
objeto
está instalado o Nada.
Hino ao nada!
Elegia do nada inaugural!
Com muita simpatia
Entre eu & você:
um tende a ser mais sujeito
e outro
mais objeto.
Sempre.
Com muita simpatia
chego a dizer que nossa relação é sadomasoquista
o que não quer dizer
patológica, necessariamente
mas tem um grau de sadomasoquismo
porque não dá para fugir
dessa desigualdade.
O sadomasoquismo como intersubjetividade.
Ode às Re-velações.
Com muita simpatia.
O amor? Não existe.
É ilusão.
Não é que não exista
mas não tem estabilidade
tem que ser conquistado a cada momento.
Procurar sacramentar o amor
institucionalizar o amor no casamento
na família
isso tudo parece falso.
Só o ato de responsabilidade absoluta
nesse instante faz-se fundamental
temos pavor do determinismo...
Eles
(Quem? Os Pais? Os Mestres? Os
Imperadores?)
inventam o determinismo
para se proteger contra a liberdade
porque é difícil ser livre.
Ter a responsabilidade absoluta.
Viver não é uma coisa aleatória.
Temos que reinventar a responsabilidade
a cada ato cometido.
Com-prometido.
Quero des-hotdog-matizar
O importante é justamente a contradição.
Para se integrar ao processo
não se pode sair do processo
pois a totalidade sempre é gradativa.
A história
sendo feita
é uma tentativa enorme
Disforme
Demente
deprê
de humanização
Quanto ao PC (grande enigma do Nada?)
Seu programa impede a reinvenção.
A sociedade (abismos do tudo?)
Ela tenta cercear as liberdades do homem
sepultando o individual.
O ‘‘nós’’? É falsificador; é serialidade.
Tudo sempre é a mesma coisa
(Em qualquer retórica con-textual?)
não há possibilidade de escolha.
É a inércia através da repetição.
Serialidade.
O homem tende a ficar inerte
Se nega na sua condição de homem
A repetição mecaniza o homem
e a inércia o reduz à inação
Levantem
heróis do novo mundo!
(Outro Castro Alves em Rimbaud?)
Tomem consciência de que é cegada a hora...
Cega chegada!
Woodstock, hoje
Vi o fogo nas brechas
Das cascas de pedra
Sabedoria que não se diz
Sonho maravilhoso paz & amor
Flor selvagem unissex
A roçar o céu
Fita azul, nova estação
Despedida inconsistente, hey Joe
Laços nunca enfraquecidos
Hoje, 40 anos depois
Pós lisérgico Imperialismo?
Castelo de nuvens
Palavras profanam lembranças
Manguebeatnik
Joplin música ao longe
Pulso dos invisíveis
Amor que muda de cor
Tempo de sono
Cair mudo das estrelas
Circo, pão e lágrimas
Liberdade é não ter o que perder?
Ágata
Num mundo de compra e venda
eu iria arrasar
Minha roupa, meu cabelo
Só eu ia desfilar
Para o mundo assim criado
Todo para me adorar!
O aplauso no final
Tudo tão sensacional
Mas um dia a esperança
Assim veio e me falou
de um novo amanhecer
muito mais que essa princesa
que um dia eu sonhei ser
Então eu vi a mim mesma
Meio assim noutro lugar
Nosso sonho tem mais vida
Quando a gente acreditar
Que é plantando que se colhe
E os frutos vão brotar
Água
e terra
Mato e gente
Natural é mesmo amar...
A busca
Que aprendizado novo nos
aguarda?
o da doçura?
talvez o do ar mais puro...
da correnteza tranquila das águas?
talvez o do fogo do sol
o de como se comunicar melhor
com a terra
sobre sermos joias preciosas
sobre deixar a bebida sagrada
tocar nossos lábios
para sermos puros
sermos felizes
nessa busca
que é sempre um presente
um dom inestimável
bom.
Matei o sujeito
Matei aquele desgraçado
Ninguém se importa comigo, mesmo
Até mamãe e papai me deixaram na sarjeta
ao nascer
Ninguém pode reclamar do que me tornei ao
crescer
Pelas ruas fiz de tudo
Luto para mim é carnaval
Vivi pelas BRs
Pelo mundo
Em Amsterdã trafiquei também
Babilônia de desejos reprimidos/
resolvidos
Prostituí meu corpo
Esse mapa do meu saber
Li, escrevi, hoje estou torto
E os anjinhos da igreja vêm com essa
história
E aquele porra gordo
Derramei o sangue dele
Que nem porco
Cabeça, tronco e membros
Eu estava muito lúcido.
Néctar
Se o vinho forte
do meu corpo
Deixa teus
sentidos perdidos
Não hesites...
Minha carne doce
Falará do amor
que sinto por ti
Do paraíso de me
teres em ti
Nesse minuto
fugidio
Que é a
existência.
Vem!
Bebe a essência
do meu ser!
Pois desde que te
vi parou o meu relógio
O ouro teve seu
brilho ofuscado
Meu corpo virou
apenas um suporte
Da vida que te
quer
Néctar 2
Se o vinho forte do meu corpo
Deixa teus sentidos perdidos
Não hesites...
Minha carne doce
Falará do amor que sinto por ti
Do paraíso de me teres na tua boca
Nesse minuto fugidio
Que é a existência.
Vem!
Bebe a essência do meu ser!
Pois desde que te vi parou o meu relógio
O ouro teve seu brilho ofuscado
Meu corpo virou apenas um suporte
Da vida que te quer
Com prazer
BALADA RECIFENSE
Sem
dor ou emoção, visto a roupa justa.
Olho
no espelho do quarto
acaricio
o corpo que te quer muito
repito
a mesma música cinco vezes, bem alto
contra
o silêncio da tua ausência
pela
janela a noite estrelada cura quase tudo. Entro na boate te procurando.
Peço
uma bebida doce.
Ouço
gritos no dancing
como
num sonho divertido,
observo os que dançam/ multicoloridos
corpos
& copos no meio da noite... fumaça.
De
repente, como num filme moderninho,
Escuto
o teu riso.
Sinto
tua presença.
Tuas
unhas me arranham suavemente por trás do
pescoço.
Teu
perfume está no ar.
Eu
me emociono e meu corpo vibra.
Me viro e
beijo... são lábios úmidos, com gosto de frutas...
Mas...
não é você!
LA
NEGRA ACENA DÚBIA DESPEDIDA
Lá se vai Mercedes Sosa
Se vai para ficar para sempre
O amor que nos libertou tantas vezes com
sua voz
Índia de sentimento profundo
Mãos de mãe
Mãos de mulher
Hoje o mundo guarda tua voz tão carinhosa
Que nos embalou em meio à guerra dos dias
Morreu o corpo
Viverá a força revolucionária do teu amor
tão profundo
Pássaro sobre os Andes
Condor de esperança & fé
Viverá no mistério da arte
Mercedes- coração americano
Latino de fronteiras móveis
Até a próxima canção, querida Mercedes
Obrigado, por entregar-nos com tanto
carinho
Tua despedida neste outubro é apenas mais
uma canção
Tua participação no doce mistério da vida.
Teu sorriso e tua voz ficarão
Através do
universo
Retrabalhando o tempo e o espaço
Nesse eterno teatro da arte.
Por que choro tanto agora?
(Recife, 4 de outubro de 2009)
Feriado
romano
A vi num terraço em Roma.
Soube que ela andava agora em altas
esferas.
Meu anjinho de louça, bonequinha de luxo.
Nos encontramos ao som dos pássaros
italianos...
Ela usava veludo grená e uma
maquiagem suave.
Seus 29 anos escorriam na ampulheta dos
míticos 30.
Sua beleza fazia nosso trágico passado
virar cinzas.
O prosecco dava o tom gostoso daquela
tarde.
AmorÓdio nos unia naquele momento.
Tentamos levar a farsa da indiferença
adiante...
Mas um enigmático cupido resolveu brindar
conosco.
Fomos possuídos pelo desejo ardente do
nosso cruel amor.
Não encenamos bem a peça, não sei.
O sentimento
de alegria ou prazer
pelo sofrimento ou infelicidade dos outros
dissolveu-se
num ato final
sem cortina teatral fechada,
aplausos fervorosos ou vaias.
Quisemo-nos novamente e
nos possuímos.
Como leões, escravos e gladiadores
num feriado romano.
VERSÃO 2: Feriado romano
A vi num terraço cheio de plantas
ao som dos pássaros...
Usava veludo grená e maquiagem suave.
Era uma beleza trágica
naquela tarde
na farsa da indiferença
Cupido espreitava
o desejo ardente do nosso cruel amor
proibido.
Encenamos uma farsa, não sei.
fingíamos
prazer
pela infelicidade um do outro
e tudo dissolveu-se
quando o
esposo dela chegou
fim da cena
sem aplausos ou vaias.
Se pudéssemos nos possuiríamos.
Como leões e cristãos
em arena final
Aí está você...
Sapateando no
leite derramado
Rindo do meu
choro abafado
Dançando com o CD
arranhado
Não vou adiar
esse adeus danado
A casa está uma
bagunça, meu bem
E você fazendo
essa pose zen
Vou tomar essa
atitude, neném
Mala pronta, nem
vem que não tem
Nosso lar, circo
decadente, mal estar
A gente nem
consegue conversar
Você não liga
mais pra mim
Não aguento mais
isso assim
Não quero mais
despedida
Vou embora,
querida.
O
que dizer do tempo?
O novo tempo vai proibir lamento.
A nova ordem superará sentimento?
Melancolia não será mais companheira
hora que não for agora, será estrangeira.
Mas a vida suporta quase tudo.
O outro será digital.
a carne será contrária à prece
a
imagem, onipresente, será presente ausente
dias incandescentes, pobre do frágil espírito.
Como ficará a força do braço?
no mapa do cibernético espaço?
As surpresas já estão presentes...
Nessa tela de certezas aparentes...
Cibele
Frígia, mãe de deuses
Filha do céu e da terra, casada com o tempo, sei
Mãe de Zeus,
Ceres, Juno ,Plutão, Netuno-rei
Ó deusa
da natureza, glórias, reveses
Ó verde selvagem, ó fêmea fértil-nave
Do teu amor pelo pastor, mistérios
orgíacos
Caráter órfico da ressurreição
De 15 a 27 de março, teu culto, louvação
Teus leões, teu carro, tua força, tua chave
Abre as portas da terra, tesouro elegíaco
Sobre tua cabeça pequenas torres
São as cidades que livras das dores...
A hora do amor
Nos limites da casa
Me vejo chegar, espantado
Passar sem cumprimentos, cansado
A luz dourada do abajur clareia
Transparente vermelho jarro de cristal
Saudável melancolia tudo permeia
passado e futuro dançam
Lembranças, aquiescências, avançam.
Bailes, praias, bosques, cachoeiras,
farras
Entrecruzam-se liberdade e amarras.
Os dias passam, noites, frio, calor
O amor brinca no corredor
Toda a gente em cintilantes jardins
silentes
Na casa do eterno a roda da fortuna gira
Voltas com o sanduíche e a bebida
Piano, violino, suaves acordes da vida
Nossos corpos limpos descansam ao som da
lira.
Copenhague
2009
(poema de Moisés Neto)
Na reunião das Nações Unidas sobre o
clima,
É negro o Quadro sobre Mudança
Climática
Duro o corte de emissões de gases poluentes dos países ricos
E também as metas obrigatórias para os
países em desenvolvimento.
O clima era de um pesado dezembro
A
Aliança Pan-Africana por Justiça Climática protestou contra o texto final
Que contraria diversos interesses dos
países mais pobres.
O G-77 ( 130 países em desenvolvimento)
denunciou:
Há algo de podre no reino da Dinamarca!
O Brasil
gritou que os países ricos "não querem agir".
Os ânimos se acirraram: Os países menores
estão sendo alienados do processo.
E "mais vulneráveis"
Longe está o Protocolo de Kyoto, cujo
primeiro período de validade vai até 2012.
Para o Brasil há "desequilíbrio"
no documento.
"Exige-se mais do que se
oferece"
O poeta observa tudo:
Equilibrado, ambicioso e equitativo.
O futuro é uma onda
Por enquanto é apenas Feliz Natal no horizonte
De possíveis anos prósperos.
Meu bem
Como se a vida inteira num fosse
O meu amor e a minha luta
E os pássaros e as árvores próximos à janela.
As horas trazem alegria, doce fruta.
Vou marcando o ritmo das
horas dela
Minha garota tão doce...
Beijando-a na tarde que finda
Penso: quase toda carícia é bem vinda.
Nos amamos suavemente .
Ela me abraça, me faz querer
Tudo que tenho, tive, terei.
Assim o tempo passa.
Assim em gozo, a vida , eu sei.
Abraçando o que me satisfaça.
Neo-Nômade
(para Vitor Araújo & Dielson Pessoa)
Esses fantasmas ciganos insistentes
Me atormentam em meio às nuvens de anjos.
Caminho
Na dança minha dos dias em que
permanecerei. Proporciono
Sempre as soluções rítmicas de amanhecer/
noite
Viverei, atravessarei: ficarei. Tudo é
possível
Confesso-me, escondo-me, encolho-me, redesisto, registro
Fuga-som. O pianista desclassifica o balé
contorce
Mãos de Orlac, sonâmbulo Caligari,
Mabuse
A vida passageira, calça rasgada, t-shirt. Nada fica igual
Nunca é, o é, e é? Neo- Nômade, vacilo,
enceno
Assino, assassino, recrio, luz repartida,
fractais
Manifesto pela liberdade de subverter
lógica e razão
Esses falsos novos deuses velhos se chegam
Deduzem entre o tétrico profético
profilático
E a prática inovadora. Puxo bruxo,
esguicho
Mefausto
Piso, vôo, náusea. 33. Sem contrários não
há progressão
Não me realizo. Esmagado: ideologia
impositiva, vida manipulada
Conflito suspenso, palafita
existencialista: desconstruo
Precário barraco de mim: surto assim.
Expressiono, tenciono-atravesso, sinuoso-vigoroso:
caminho
Idéias fúteis (inférteis?) me querem
prisão
Tripartido, conquisto, sou movimento
fluido, circular
Invado a cena, brilho musical. Hamlet
sensorial
Transgrido o estabelecido. Imaginário.
Nada é absoluto
Exercito explosão. Volto. Vou...
Espelho da lembrança
Sob a lua minguante
Descemos em direção ao mar
As estrelas faiscavam
Cavalgamos entre as dunas até a festa
Lá todos se divertiam à luz do fogo
Dela vinha um cheiro de jasmim,
estonteante.
Havia incenso no ar
Abraçados, eu mergulhei nos abismos
do seu olhar
Um jovem dedilhou a suave balada do homem
só.
Beijamo-nos (sabor de licor, pitanga)
Perguntei se ela casaria comigo
Ela riu amargamente, resumindo o universo
para mim
Misteriosa, disse-me que era tarde
demais...
Afastou-se e pediu que eu não a seguisse!
Ficou para sempre no espelho
movediço da lembrança
A sensação de perdido amor
profundo
Intocável no altar da
fantasia.
Intraduzível
A nossa eternidade
aninhada em meu desejo por ti
raro perfume
frutas cristalizadas nesse querer
vinho tão puro
visão, destino dourado no tom exato
moldura atemporal
suave pulsar perfumado
flor, ímã, talismã
gotas de janeiro na janela.
Sereia, você me atrai, irresistível melodia.
Navegador, conquistador, me deixo seduzir
e me tens nos teus domínios
sob topázio sol, ressurgem esses teus lábios rubis,
olhos água-marinha,
sorriso de pérolas, embriagado reencontro em meu anseio
tua pele , consolador veludo
teus cabelos envolventes
tu, atração, para sempre: intraduzível...
A
tapioqueira e o minotauro
Deu-se no carnaval do Recife
Um caso assim meio bizarro
Foi um namoro de uma tapioqueira
Com um estrangeiro fantasiado de minotauro
Vindo de um navio atracado no porto
foi comprar tapioca
A moça era traquina
E, agitando o abano de palha
As brasas atiçou
diante da bovina criatura
a goma esquentou rápido
Ele tirou a máscara e sorriu como criança.
A recifense sentiu um fascínio profundo
Deu-se ali um instantâneo enlace
E naquela mesma noite
Se encontraram num labirinto de frevo
em linguagem universal...
Pescadores
Raia o sol na beira da praia
Motores, algazarra, canto, risos e sisos.
Vão ao oceano, os pescadores
pernambucanos
Jogarão as redes como se
pudessem
Arrastar nelas o destino incerto
E segurá-lo nas mãos cortadas,
Queimadas pelo trabalho.
Dias e noites de mestres e aprendizes
Nas águas salgadas, cotidiano
e mistério
Cansaço, perseverança,
dolorido querer
No tempo e espaço o barco se
solta
Agitado ou calmo navegar
Mar amar e volta
Dos nossos trabalhadores do
mar...
Sementes
do amanhã
Agora , no espelho da cidade, ainda lhe vejo
se ainda pudesse ter algo seu
seria o tempo reconquistado.
Agora...
As chuvas trazem as baronesas
plantas a flutuar no rio
cortando a paisagem
e as recordações.
No armário: nossa fantasia do último baile...
Na alma, entre atos e fatos, a dúvida e a culpa
de um amor que foi livre para crescer
e secou sob o sol do egoísmo.
Agora:o silêncio de domingo rega novas sementes.
Saio a deslizar por novas estradas.
No porta-luvas um pequeno retrato
da nossa paixão mal resolvida.
Ali ficaremos, fantasiados e sorrindo
até que o tempo, mais uma vez, nos separe.
Pantomima
Concluo um cálice de vinho do porto
meu apetite aumenta para o próximo prato
A tarde avança, o almoço prossegue
Os convidados, os talheres, o pianista.
Na piscina crianças brincam
como loucas.
Dois bêbados vendados
Executam estranha dança.
De repente sinto alguém me
observar.
Sinto algo atraente no ar
Sou máquina masculina...
De repente, olhos negros, pele branca,
alguém me convida para mais intimidade:
Qual flor tão viva no jardim esquecida
Lá estava a tal figura.
Nossos olhares... música delicada.
Lá estava alguém a me tentar
de novo:
Quereria brincar de ninho
comigo
Ou só diversão?
O que fazer?
Saí à francesa.
No outro dia me ligou,
Como descobriu meu telefone?
Mesmo sabendo que eu ainda
era
compromissado, mas não
muito, me quis.
Algo estranho nos uniu.
Era o início de uma ópera
bombástica.
MILAGRE DE CARNAVAL
Resplandescentes e rocambolescos
em meio a uma tempestade de frevos
tu mascando tutti-frutti, eu errante navegante:
ser-me-ias fiel?
Te encontrei num clube de máscaras...bem sabia:
eras de outro antes.
Nossas promessas, tu não confessas?
São trôpegas festas com cenários sobrenaturais
e sinistros brincantes.
Quero me precipitar então nas ondas.
Tu não me segues?
Ressurgiremos transfigurados em ascensão sobre todos.
Que nos importa se tritões e ninfas cantam os prazeres sensuais?
Somos peregrinos ou atores nesta Divina commedia
dell´arte?
Nossa poesia construiu castelo em terreno carnavalesco
mas tentamos redefinir o amor puro.
Neste Eden recifense, tudo ferve...
Da madeira morta nascem flores.
Tudo é folia,agora
estamos perdoados.
Evoé!
Abrigada em
meio à tempestade de frevos
Te encontrei num clube de máscaras
...tu mascando tutti-frutti,
eu errante navegante:
gostas de mim, confesas?
No meio da folia e dos brincantes.
Quero me precipitar então nas ondas.
Tu não me segues?
Somos mesmo foliões do destino
Entre tritões e ninfas em
cenário de prazeres sensuais
Brincantes nesta comédia
Ergamos um castelo em terreno carnavalesco
Vamos redefinir o amor
Neste tabuleiro recifense, tudo ferve...
Até da madeira morta nascem flores!
Tudo é folia,agora
Evoé!
Domingo
De
olho na TV, a mãe cochila no sofá
Pai no quarto, depois da cerveja, dorme
Filho em meio ao circo eletrônico
Vai do game ao fantástico
Do macarrão com molho de tomate ao
cachorro.
As horas voam como a lembrança
Dos
que não se encontram mais entre os vivos.
O final do domingo escorre em torpor.
O menino olha a avó desbotando no
porta-retrato
Ela ainda diz: “Deus lhe faça feliz”.
A vida passa. Está ficando tarde.
Sobre a geladeira um pinguim de louça
Flerta
com uma rosa murcha num copo de plástico.
Sexto sentido
Tão perto dos teus lábios
Quase posso morder tuas palavras
Com meu olfato tão perto do teu aroma
Despertando meu desejo mais e mais
Nos meus olhos está a tua imagem
Guardo-te em todos os sentidos da memória
Está ao alcance da minha mão a tua pele
suave
Atiça a minha fantasia a tua voz
Música embriagante em jardim maravilhoso
Queria ser o teu preferido
Mesmo que fosse num sexto sentido
Outono
Agora o outono recifense...
As folhas caem na memória
Caminhamos por ruas de sonho
Ecoam os nossos passos nesta história
Os crepúsculos vistos das pontes
Rodeiam-nos colorindo o cenário
O verão passado nos trouxe torpor
O futuro nos trará lembranças.
Passeamos de mãos dadas:
Que nos importa o mistério?
O vento salgado do Atlântico nos envolve
E gira a mandala na praça do marco zero
O mundo começa na nossa cidade
O Recife Antigo nos abraça
Ultrapassamos nossos erros
O amor nos deixa à vontade
Lembrança e expectativa a um só tempo...
Fazemo-nos transparentes em nosso
encontro.
Quebra-se a ampulheta
A areia dos séculos se liberta.
Sentimos liberdade, novo ciclo se inicia
Lemos nas nuvens vermelhas outonais:
‘Ama e faze o que quiseres’.
A lua enfeita o céu arabesco
Conjugamos, em nova estação,
O mais sublime de todos os verbos: amar.
E é como se uma nova dimensão se abrisse.
Presente do passado
A cidade impressa no mapa do
mundo
Não traz os sinais da
invenção que a articula
Quem a vê como ponto
distante, mal sabe
Dos jogos que a fazem
inconstante.
Mas hoje é teu aniversário,
Recife!
E eu, amante inconfesso por
ti sofro
Entre tuas paredes e espaços
abertos
Perpetuo meu degredo, pois
Minha liberdade é de ti
prisioneira
Indócil e materna és a minha
partida e chegada
Te amo tanto e não consigo
que sejas minha
Como em peculiar dominó
Queria sim, nos teus braços
todos os abraços
De lama e luxo, cacos, caos,
aconchego
Seguir trios ruas
rimas ritmos pátios, parques, pontes, paços
Menino para sempre no teu
colo, cidade-mãe:
Adormecer, sonhar, acordar
no teu futuro.
II
Recife impressa no mapa
Não traz os sinais da
invenção que a articula
Quem a vê como ponto
distante, mal sabe
Dos jogos que a fazem
inconstante.
Recife!
amante danada
Entre paredes e espaços
abertos
Perpetuo meu degredo, pois
Minha liberdade é de ti
prisioneira
Indócil e materna és a minha
partida e chegada
não, nunca foste minha
jogamos peculiar dominó
Queria, sim, nos teus braços
todos os abraços
De lama & luxo, caos & aconchego
Seguir por tuas veias,
membros
ter mil prazeres, adormecer,
dormir bem, sonhar,
acordar no teu futuro,
de novo
Parabéns, minha cidade!
Hoje é o teu aniversário,
Recife!
E eu, teu filho
Sei bem o que significa
O teu abraço entre lágrimas e risos:
Nova partida e eterno retorno...
Aí estás, impressa no mapa
do mundo
Ponto distante, invenção também
Felicidade e dor, em ti, peculiar
dominó
No teu colo: solidão e
abraço
Lama & luxo, léu &
céu, exílio e ninho
Rios, ruas,
rimas, ritmo, rumo
pátios, parques, pontes, paços, passos
Cidade-mãe!
Queria acordar no teu futuro
Na mais completa claridade
De um amor maduro...
As violetas da Taylor
Em meio às últimas
notícias
Surge um par de olhos
magnânimos
Cor de violeta
Olhos como flores
selvagens
Flores que só nascem
num filme.
Liz Taylor morreu
Há fome no mundo
Há tanta dor e
alegria
Coisas maiores e
menores
Mas há também o grão
de areia
Que namora a estrela
impossível
Que sonhando a
pressente
presa no coração dele
semente a brotar...
em fértil jardim secreto...
Imortal!
Outro país
Para sair da mesmice
Do teu gato de Alice
Do sorriso caduco
Eu, teu chapeleiro mameluco
Te proponho outra maravilha
Outro enigma
Enquanto meu desejo por ti fervilha
Que no teu espelho tu me vejas
No lugar daquilo que mais desejas
Depois que despistares
O coelho branco do relógio
Lá estarei
Para te dar
Rosas brancas e vermelhas
Tudo que um homem pode entregar
A alguém assim especial
Como tu
Rainha de copas
Lagarta virando borboleta
No cogumelo dos dias fantásticos
Que se iniciam a cada minuto
Epifania
A noite
É de branco luar na estrada deserta
Ímã vermelho, teu calor me atrai
O azul escuro do céu serve de contraste
para
Uma verde luz que emana dos teus olhos.
E uma música que dispensa instrumentos
Acalma o mundo, dissolve agonias
Tudo ao redor ganha equilíbrio...
Somos somente nós dois e somos todos os
seres.
Assim, envoltos no absoluto, entramos em
casa
Ícones sem época, a poesia é o nosso
abrigo
Na vertigem do tempo e do espaço
(nossa união reduz o grande Mistério)
Suave, leve, breve, ó musa
distraída
Os acordes do amanhecer
Chegam de onde é quase horizonte
Deitamo-nos
O vento traz o barulho das folhas e dos
pássaros.
Adormeceremos em sono
profundo, rodeados de eternidade
Tranquilos no que somos e queremos.
O resto é devir.
O agora se cristaliza num assomo de
plenitude
Fátima Amaral
(moisesneto)
A luz dos teus olhos/projeta uma existência/como sala de cinema/ mil noites
árabes./Dançam prosa e verso em dias nordestinos./em meio a um/populoso deserto
no centro da cidade/ prendem vista e audição/com histórias e poesia./Conta-nos
mais!/Embriaga-nos com a lucidez da tua estudiosa mente./Faz-nos penetrar em outras
sensações de vida./Traduz-nos o óbvio da existência e da razão ./Em alquimia
literária? / que seja! Ah, doce irmã... / arrebata-nos no carro transcendental
e tão terreno das Letras.
Musa
Esta tua força misteriosa
projeta meu futuro
na arte dessa vida
Nossas histórias comparam-se a mil noites árabes.
Ó musa! Vem!
Beija a minha alma
Fantasia esses meus dias
Vem encantar este poeta...
tristonho nesse deserto lógico
Toma meus sentidos
Inspira-me mais!
Me faz mergulhar em novas sensações de vida.
Traduze-me o óbvio da existência e da razão .
Arrebata-me no teu carro de fogo
Vamos juntos às estrelas
ao paraíso de nós dois...
Que importa a realidade que os homens criam?
O trono e o cadafalso são extremos do
mesmo inferno
No nosso mundo a vida se refaz
equilibrada ou furiosa
nos espelhos e abismos da criação.
Sortilégio
Sem passado ou futuro
Recomeçamos na infixidez
Adentramos o Clube em frenesi
Nada nos falta ou sobra
Lá está: Universal pista de Dança
Movimentamo-nos com força & pureza
Inventamos felicidade, somos amantes
E temos sempre a chance de partir...
Luzes especiais redesenham nossos corpos
Nossos trajes nesse mundinho:
Fotografia estroboscópica, foto pra jornal
Drinks na contracorrente. Um brinde
especial.
- Quem somos nós aqui? Inconsequentes?
- O som
está tão alto!
Flutuamos sobre o piso (em xadrez
incandescente)
Brilha a alegria artificial. Que importa?!
Sortilégio, simulacro. Que ritmo bom...
Brincamos. Rimos. É drama ou comédia?
É tão intenso. É tão bom. É mágico.
Como se nossa noite tivesse luz própria.
Aliança
No interior do casarão da velha fazenda
Objetos antigos, garrafas de licor e
cortinas de renda.
Visito os aposentos que há muito não via.
Revejo parentes, encontro quem não
conhecia.
Pela janela revejo velhas árvores, o
açude, a porteira...
Parecem retratos vivos de gente morta e
querida.
Volto ao quarto da infância quase
esquecida:
A mesma cama, crucifixo e anjo de louça na
parede.
Estou no entrelugar que o tempo esqueceu
Deito na rede.
Tiro do bolso a aliança que você me
devolveu.
Era mesmo estranho adereço
Agora inútil e sem preço
Neste lugar onde o vento sussurra, mais
alto do que você e eu.
Ode ao Teatro de Santa Isabel
Tuas paredes abrigam sonhos
Dentro de ti a vida explode com a intensidade de estrelas
No teu palco as idéias se renovam sempre
Ao som da música
No compasso da dança
A cada ato de tantas representações do riso, da dor, da serenidade
Trazes refletida em cada cristal a imagem da audácia humana
Cravado que estás às margens do Capibaribe
És glória de uma cidade que vem através dos anos construindo-se e refazendo-se
És rosa ao vento nas tardes mornas
És abrigo de tantos projetos que resistem às intempéries
És farol do Recife
Na tua nobreza os pobres se equivalem aos ricos
És de todos
E estás aberto como uma flor magnética
A atrair e ensinar
A divertir e educar
Quisera ter versos magníficos que expressassem toda a minha gratidão
Mas sou poeta menor diante do teu esplendor
Mais que sesquicentenário senhor
Já se vão cento e sessenta anos
E pareces tão jovem, tão atual
Queria te abraçar
Mas envolvo-te apenas com esse olhar de quem pede
A Deus por um mundo melhor
Diante do altar
Teatro de Santa Isabel
Tuas paredes abrigam sonhos
Dentro de ti a vida explode com a intensidade de estrelas
No teu palco as ideias se renovam sempre
Ao som da música
No compasso da dança
representações do riso, dor, exagero,serenidade
Refletes em ti imagens da audácia humana
Cravado que estás às margens do Capibaribe
numa cidade como tantas...construindo-se e refazendo-se
És rosa ao vento nas tardes mornas
És abrigo de tantos projetos que resistem às intempéries
És também farol no Recife
Na tua nobreza os pobres se equivalem aos ricos
És para todos
aberto como uma flor magnética
embriagas com teu esplendor
pareces tão jovem, tão atual
Queria te abraçar
Mas envolvo-te apenas com esse olhar de quem pede...
Pedalando
Toda
vez que estou no Recife Antigo
parece a casa de um amigo
o porto, o Brum, a prefeitura, marco zero
cidade linda, que tanto quero
cruel ou mãe protetora
algoz ou defensora
tanta história na memória
nós te fazemos todo dia
do barroco ao neoclássico
do pós-moderno ao jurássico
eu te amo, da tapioca ao sushi
em cada detalhe que me faz chorar e rir
tua lágrima me comove
teu sorriso me conquista
eu, pobre artista
Esta canção que prove
e a cada pedalada
pontes, rios reais e místicos
está o comum e o artístico
Lá vou eu, antes que o tempo passe
ah! se essa minha bicicleta voasse!
Suave manhã de
outubro
Brisa da manhã me inspira,
olho o mar e os prédios em Boa Viagem,
o verde do mangue do Pina
escuto jazz
penso em tantas viagens que fiz e textos & gente.
O futuro se mistura com o presente,
respiro fundo:
trabalho que não acaba nunca.
Escolho uma camisa branca, calça jeans
...está tudo bem.
Olho o relógio, apressado e tranquilo, simultanemaente...
algo parece estar além da compreensão,
talvez o sentido de tanta poesia no meu peito...
O tempo é relativo, a tecnologia nos insere no amanhã
logo os mais novos envelhecerão,
menos a gente, que é tão atual:
o futuro mais longínquo da semana passada
A Mulher ninguém
A Mulher ninguém não está na mídia
Não é vista na TV nem na internet
Pode-se percebê-la pela janela de um
ônibus
Pendurada, espremida, segurando dois
filhos
Saiu de madrugada lá de longe
Deixa as crianças na escola pública
Tenta marcar consulta para seus males
Faz tempo, não tem remédio
O beijo do companheiro incerto é apressado
Não sabe do seu futuro nem a curto prazo
Desvia das balas, mal sabe ler
E assim mesmo confia no amanhã do país
Tem encontro com seu destino
Mas vive desmarcando
Por falta de tempo...
O templo das horas
Na vida a gente não pode
Deixar
muita coisa pra depois
Porque
depois pode não dar tempo
E
o tempo que passou não volta mais
O
templo das horas não tem porta
Embora
mais um ano esteja para começar
Aprenda
antes que seja tarde
atrás
do truque, a verdade
Nosso
mundo é o céu inteiro
No momento mais triste
ou no picadeiro
Num
piscar de olhos estamos aqui
E
noutro não estamos mais
A
vida é mesmo assim, é fera demais
Para
o novo ontem, o velho amanhã e eterno hoje...
nunca há mesmo um fim
Sempre
haverá mais uma chance
Por isso vamos ao brinde
A isso que se vê de perto-longe
Festa imprevista: somos
todos artistas
Como
num circo
Estamos
sob uma imensa tenda colorida
Somos
nós mesmos: os artistas
Cada
qual na sua vida
Números
e aplausos
Manchetes
e anonimatos
Leitores
e autores
Somos
também a plateia sempre atenta
No
trapézio e na corda bamba
A
gente brilha e o risco enfrenta, no fico ou passo
Rivais,
amigos, indiferente cansaço!
Meditando
profundamente ou em plena diversão
Nos
lançamos no espaço
Ou dançamos mesmo aqui no
chão.
É
como um grande abraço
Uma
festa imprevista
onde o nadatudo
brilhará
Ritmo
maneiro, radical, o tempo inteiro
Com
a força de mil vulcões
ou do cantar de um pássaro:
o
show não para:
No
silêncio dançam vivos e virtuais
em sublimes pistas.
E
no espaço e tempo previstos: tudo se transformará.
Por
isso, entre planos e enganos, somos todos artistas.
Cobaias
e cientistas, leigos e especialistas.
E a todo fraco/forte: (re)nascimento e sorte.
Marginal capibaribe
Recife do reflexo ao fulgor
Escurece na rua da Aurora
Corre o Capibaribe sob estranhos signos
nele meus versos querem se dissolver
no momento transparente
como pássaro que canta sem o saber.
Em tempo de perigo...
Na travessia da ponte
O poema se escreve sozinho
Jogo-o no fluxo do mundo-linguagem
tento acertar o coração da cidade trêmula...
Dezembro Capibaribe
Recife do reflexo ao fulgor
Escurece na rua da Aurora
Corre o Capibaribe sob estranhos signos
a se dissolver
no momento transparente
neste tempo de perigo...
a paz atravessa a ponte
e o poema se escreve sozinho
no fluxo do mundo-linguagem
no coração da cidade trêmula...
acendem-se as luzes de mais um Natal
tudo quer renascer...
Amor
complicado
Nas tramas do Recife
falsos pardos diuturnos
escuridões momentaneamente ensolaradas
de risos misteriosos & esclarecimentos fatais...
segue o seco...
Passo a Paço
Do vidro e aço ao palhaço
da serpentina à triste sina
Do bem e mal
aos sem-carnaval
Ah!
Cidade-jornal
Teus autores desfestejam:
entre confetes & bofetes!
Brindam núpcias impossíveis
abraços melosos
Beijos de delícias escatológicas
...podridões sublimes
Amor complicado, este.
Lutando com um anjo
Em sonho de senhor
que pouco jovem pode
cheio de símbolos
Qual Jacó, lutei com um anjo...
Se nos degraus do além
Ou em ringe/ pista de dança
Vencedor seria de mim mesmo?
Repentinamente
Meu corpo retornou ao meu quarto
Corri atrás dele
Mordendo os dentes
Minha voz parecia mais entrar do que
sair...
Acordei.
O
pequeno teatro invisível
Sublime ou
grotesco
Eis o meu
teatro invisível
de promessas e
sentenças
circo de
performances
tão diversas/
belas/ perversas.
Cá estou...
Atuando
(por mais amor que dinheiro)
na plateia
fora do palco/
picadeiro
se passa esta
peça
sem divisão
entre os atos
misturando
ficção e fatos...
revitalizado ou
cansando
Até quando?
O Provocador Cordial
(para Jomard Muniz de
Britto)
Não existe filosofia, só o filosofar
Podem nos punir, nunca nos disciplinar
Responda, sem intelectualismo:
A História é jogo de azar ou
determinismo?
Quem diz só a verdade, mente?
O que é da razão sem o querer?
Seria o agora, ágora eternamente?
Ou apenas a cultura a
nos entreter?
Mais importante que o passado,
É o presente não-alienado?
Nossa existência é o que
dela podemos fazer?
Ou nossa vida é o que improvisamos:
Para que de prazer
viver/morrer possamos?
Pode um autor errático
ser um neon pré-socrático?
A desconstruir o conceito de
que a verdade
é sempre algo que temos que construir?
Do erótico ao labiríntico
existir
Eis
o nosso pensador mundialmente recifense,
Pense!
Tão igual e diferente
Viva JMB! (anti)herói da nossa gente!
Luz
Nos eternos
campos
soprados pelo vento nordeste
vagamos, dançamos
vivemos docemente
todo tipo de teatro
e o que alguns chamam
violentamente
de vida real
porém há dias de mais e os de menos inspiração...
nossa cruz, nosso altar, nossa glória & prazer:
quando tudo fica pequeno
diante de um tão infinito cosmos
vivamos de nós mesmos, o resto é mentira
exceto o divino,
por isso vamos pensando e conectando-nos
de um modo ou de outro
a ele, a isso, àquilo
sigamos serenos
até o recomeço nesta grande roda iluminada...
Lucila
Naquele veranito, à tarde,
carregava eu, de
presente,
uma pedra vermelha
transparente
luz intensa e
desértica abrasava a cidade
carregava também, na
faiscante memória,
muita coisa, toda
História;
levando em conta o
Fenômeno,
observei o transitório instante
que marcava o momento
anômalo.
A joia era para a
poetisa...
que me aguardava...
(eu que a guardava)
na tarde godiva (ao
redor do being)
tarde exposta,
ferida,
dissolvendo o
ridículo dos anônimos
em tramas cruzadas,
tropicais langores
malemolência...
excitação calculada
caleidoscópicas
perspectivas.
Luz nos meus olhos
espelhados.
Não tenho medo
Exercito, exponho, me
entretenho
Posse, perda, sigo
como num aforismo...
Ao encontro dela...
Regras, riscos,
conclusões antitéticas
Desconstrução,
reconstrução. Fusão.
Entrego-lhe o
vermelho mineral...
Escola
Dominical
Domingo
no
samba ´n´ roll
do Brasil
a
vida é curta
e o
mundo
é
pequeno
uns
tomam antídoto
como se fosse
veneno
Canção para Geninha
Quando
te fazes ausência
E
nos entregas tantas personagens
Estás
apenas dando-nos mais vida
Vida
tão farta no teu coração de atriz
Quando
tua voz acaricia nossos ouvidos
Tuas
mãos tateiam buscando no ar a essência da vida
Estás
a nos ninar também, Geninha querida
Como
esquecer-te?
Como
não lembrar de ti?
Se
te queremos tanto
Se
és flor tão magnífica
Neste
teatral jardim?
Vamos
agora cantar o teu nome
Vamos
mais ainda pensar na tua beleza eterna
E
também neste passar do tempo
Na
máquina do mundo
És
agora uma estrela ainda mais cintilante
E
todas as horas que nos deste
São
como pedras preciosas e incandescentes
Que
o céu do teatro iluminam
Do
palco até a plateia
Hoje
te homenageia
Este
teu admirador
Mas
são só teus
Querida
Geninha
Os
aplausos deste cantor
Parabéns,
grande dama do teatro pernambucano
Que
teu nome ecoe através de muitos anos!
Poeminha Um
O jovem não
precisa de razões;
só de pretextos
no erro ele tem o lucro
e quer aproveitar tudo!
Não só se esforça na certeza da recompensa
e não quer a
ciência
que troque o
seguro por uma teoria
um problema.
Meu filho me
ensina
que devo duvidar
do que ensino
neste mundo que nos é periferia!
Poeminha Dois
Em desperdício
no urbano promontório
Sinto que poematizar
é obrigatório
Nesse frio fictício
de precipício
De condomínio & Sacrifício & desvio
& sombrio
Ensaio
um raio
no
estanho edifício
Rap Recife
Eu não tenho medo
em
expor segredos
cicatrizes
alegrias, dores, fantasias
da
geração da fome
ninguém
se arrogue
a falar em meu
nome
sobre mudança
a favor do homem
benévolo... incrédulo
venho
do prazer e da fúria
sem distinção
entre alta e baixa cultura
A torre de
marfim já me fez muito mal
mas
carnaval aqui parece natural!
Vento
nordeste
sobre a cidade antiga
cheia de paz e briga
o passado me
intriga
O problema
agora não é só herança
brincam por
aqui divinas crianças
...vamos nos assumir!
E ao papel
de oprimidos
resistir?
Que o novo tempo não seja só
"de novo?"
seja também de mudança
Que nesse rap...eu louvo!
Pré-Natal
Na imitação de mim mesmo
Aqui estou
Em pleno dezembro
Sentindo o vento salgado
E o aroma forte do mato
Nem sorte nem morte
O crepúsculo a tudo envolve
E o brilho da árvore de natal
Sobrepõe-se à ardente realidade.
Ave Maria, rogai por nós
Agora e na hora do nosso nascimento
Peço num desejo
Ao ver a primeira estrela
E tudo se entrelaça...
Diamante doido de amor
Para mim tu és
diamante da carne em fulgor
quem sou?
o que fazer?
sou teu Orfeu
na proibição de me voltar
para aquilo que amo.
Em face da imensa noite
da inapreensível sorte
somos dois parceiros
mas não jogamos um contra o outro
jogamos antes um para
o outro...
nosso atual não é estático
você é, você foi/estará, meu
amor
entre o que é
e o que, já sendo, não sabíamos...
Agarrados
...dançando
agarrados
respiração
dividida
como
hipnotizados
pisando
levemente
na noite
selvagem
longe da
solidão,
sob luzes coloridas
você tenta fugir, mas
já não pode
e me beija
diferente nessa noite
nossos lábios
se encontram,
nossos rostos
se confundem
nos movemos
muito devagar
pelo salão
em arrebatamento puro
e não há nenhum sinal
do fim...
Afetos foliões
Coração no
carnaval
bate em ritmo de afetos foliões
suspira,
transpira,
vira,
revolve
faz
o passo do Recife.
Suspenso, indeciso
frenético
acende-apaga
pulsa acelerado
se
mascara.
Bate
meia-noite
meio-dia:
sangue
multicolorido é bombeado
e
na festa de sorriso (emprestado?)
cibernéticos confetes e serpentinas
envolvem nossos peitos
tão cheios de
futuro e memória...
Carnavalesco
entre frevos
tu me beijas
máscaras na testa
na festa
promessas
folia e prazeres
dores eclipsadas
castelo carnavalesco
ruas de fantasia
pátios onde Amor ferve...
Tudo é folia, agora:
aqui e lá fora
Nosso amor
animal
Eu, peixe nadando no seu amor
E você na
cachorrada com a macacada
Empavonando-se na
porcaria
Avacalhando
nossa relação
Amiga mais da
onça do que de mim
Perna de pinto
saindo na de pato
E eu, formiga sem
roça para comer
engatinhando na desilusão
Pior do que alvo
de piada de papagaio
Fiquei sem Cariri
nenhum nem último pau de arara
Nem lebre nem
tartaruga diante do tempo perdido...
Nelson
Rodrigues faz cem anos
É o teu centenário, Nelson!
O teatro está cheio
esperas
o espetáculo começar
glória, fracasso,
castidade e perversão
amor & tragédia
gozo suburbano
casamento problemático
cheio
de incesto
do álbum de família
rasurado
tuas
personagens
chegam novas
ao século XXI
no palco,
redação de jornal,
asfalto selvagem
da vida-teatro
Vamos aplaudir
tua dança
da morte
com a eternidade
Agridoce
Agora nosso casamento
é um túmulo antigo
diante do qual
eu rio do que eu era antes
(vendo o mundo girar
enquanto eu fraquejava...)
Você me disse que eu seria feliz
e fez de mim um solitário
só deixando o agridoce sabor
do último beijo
na minha boca
Me arrepio só de pensar
Hoje aquilo parece uma
piada cínica
sobre um rapaz
assombrado
OS
ATORES
Sozinhos
em grupos
lá estão
sonhadores
de cruel e ingênua
esperteza
sofrendo e gozando
o alheio
palmas, ouro
vaias, miséria
no palco
na rua
são o outro
a máscara
tão perto/longe
manipuladores do próprio eu
ou fantoches?
ONZE HORAS
No amor
de muito tempo
o máximo carinho
pelo mínimo
em nossa vida
que passa
o tédio
fantasiado
bem resolvido
nos traz de volta ao mundo.
Onze horas
o fim da
manhã
não nos
incomoda...
Vamos abrir
as cortinas?
O esplendor
Assisto
do meu camarote
ao teu espetáculo
Recife...
Bem sei:
sonhos não bastam
para vencer guerras.
No projeto dos
teus fundadores
havia promessas & monstros escondidos.
Agora prometes
reerguer-te
Ó preterida
primadona!
Aguardo ansioso
para aplaudir
teu esplendor.
e o carinho até pelo mínimo
que neste tempo que passa
passe também o tédio e se transforme em aventura
da melhore o carinho até pelo mínimo e o carinho
até pelo mínimo
Linha do tempo
Na lida,
Vida,
Carne e metafísica,
Cena,
Sonhos e
bastidores,
Assim
estou/estamos
Neste improviso
Cheio de
cálculos,
Luz e sombras,
Closes e
panorâmicas,
Não é mesmo?
Face to face...
20.03.12
O poeta
Unem-se as letras
versos escorrem das mãos
Caem no papel fino
ou na tela iluminada por dentro
no meio da noite
súbito êxtase ou calafrio.
surge o poema
cheio de sonhos e notícias
registro da luta
barco no grande rio da vida
dentro dele o poeta
transmuta-se
Driblando
o tempo
Restos do amor
estilhaço do excesso.
Agora os dias passam
mas a lembrança
como flor oculta
pela ramagem variada
parece brasa adormecida
que sopro reavivando
entre as cinzas.
Driblando o tempo
com zelo
volto a te amar...
Teço versos.
Poesia:
abrigo e prisão
deste meu
inexplicável querer.
Atlântico
flamejante
Fim de tarde
Espuma branca
Atlântico flamejante
Sonolento sobejo de
verão
Sem saber exatamente
por quê
Lá estava
O porta-voz da
geração
Sem se encaixar
Silêncio antes do
beijo
Atirou o relógio ao
mar
Envolvido já
Em sonhos e sombras
Por um momento
Tempo suspenso no
olhar
Da criança solitária
Com uma ópera no
peito
Sem alento
Versão 2
Fim de tarde
Espuma branca
Atlântico flamejante
Sonolento sobejo de
verão
Sem saber exatamente
por quê
Lá estava
Silêncio antes do
beijo
Atirei o relógio ao
mar
Envolvido já
Em sonhos e sombras
Por um momento
Tempo suspenso no
olhar
Da criança solitária
Com uma ópera no peito
Sem alento
Lingual
Meu verso
escorre das mãos
Cai na tela
Cheio de sonhos e notícias
Resto de amor e interna lógica
Driblando o tempo
abrigo, prisão, viagem
língua, querer, meteorologia
Beijo
intempestivo
Férias
de operário
Lingual (versão B)
Meu verso: fé e
malícia
escorre das mãos
sem glória
cai na tela (amor
e interna lógica)
Cheio de sonho e
notícia
Sombra e luz do
imaginário
Jornal e lírica ficção
abrigo, viagem, prisão, mágica
incerta meteorologia
Efêmero e eterno
Previsão e memória
Repulsa e beijo intempestivo
tórrido inverno
Férias de operário
Mórbido... festivo
A unha de Dalila
No dedo mindinho
das mulheres
Há uma unha
de Dalila
gostam da juba
para a tosquiarem
ai,mundinho!
és mumunha
quizila na tuba
deste harém
Poeminha sem
esperança
Sigo na contramão
da nossa
história
de desejos
desiguais.
Nem sei aonde vou
(de tão decidido
que estou!)
Seguindo teus
passos?
Teu cheiro?
Ah! Minhas
vontades e presunção!
Pra
que correr riscos?
É...
Pra que
dizer que se
ama
a quem se ama
quando se ama sem esperança?
ANTIFACE
Cai sobre
nós nupcial chuva fina
por ti ordenho a lua e golpeio a aurora
és rosa e lírio do meu viver
pão quente, noite fria
mendigo tua mundividência
transforma-se em pérola
a infecção do mundo-mar em mim
somos sol e sangue
noite e futuro
arrebatadora alquimia
afastando a navalha da existência dos meus olhos
água e sede
és meu porto
ao espelho surge não o meu reflexo
agora
só minha antiface
sou todo teu...
LITERATURA
Meu eu é outro
tu me lês e me refazes
teci a teia que te prende
e parti
sou ninguém, agora.
Mãos em concha
bebes em meu desejo
não és senão o momento.
Mãe e filho
pai e proibição
este poema nos u-n-e
em meio ao nada
construção humana
AMORÓDIO: nossa ligação
sempre, nunca...
vai ser bom.
Não foi?
Clube de inverno
Não digo que a
noite seja só de dança
nem que amor e morte estejam resolvidos
mas, hoje, no Recife ardente
tudo está reinventado
em high tech anfíbio
Poético vuco vuco antilírico
até para ultrarromânticos
há aplicativos de pós-cibernéticos quereres:
tu me vês? Não,
tu te vês me olhando
és tanto e tão pouco!
Insensível! Deixa pra lá...
Afinal, somos juntos nesta cidade
em recortes contraluz
Na arena do clube de inverno
açucarados seres atlânticos
da barbárie à decadência, sem civilização...
Não?
Enquanto a festa vai noite
adentro...
até que o sol aqueça o sal do
mar
e torne tudo mais... real, de
novo
depois da chuva.
CARNE HUMANA
O computador em silêncio
guarda a canção distante
minha ausência conectada
mundo aqui
sonhos na máquina
jogo, cálculo
cansaço, deleite
vou, voo, estou
céu azul, cinza , laranja
âncora, horizonte
amor inclina-se
à lógica
binária cibernética
ela o come vivo
fartando-se
olhos, dedos
tudo virtual...
E sob a pele?
Gente, ainda.
JOGO CIGANO
Tua
estonteante presença
vento
salgado do mar imenso
me
envolve, violenta tempestade
ímã
tirando-me o fôlego....
oh, bem-me-quer!
Procuro
a mim mesmo no teu mapa
onde
ao meu coração
cabe um destino só
pois
no teu jogo cigano
tiras
minha fortuna!
Ameaças
dizendo
que um amor assim
se
eu não aceitar
que
trate
de
me preparar para
entrar
com ele em combate
Dormir
Adormeço entre amor e
esquecimento
Longe dos deuses e
homens.
O prisioneiro
coração-oásis
Estanca a sede,
transcende a mercenária multidão
Na inclemente noite
furiosa de danações e bênçãos.
Com olhos acesos em
volúpia latejando
Sou flecha voando na
tempestade
Sobre os beijos dos
vermes roedores
Calma dos anjos,
ranger dos demônios.
O sol me acorda
Do sonho
entorpecente, afrodisíaco
Onde eu era
espectador e ator
Levanto
Tomo meu banho e café
Visto roupa e razão
Vou trabalhar o dia
todo.
Lembrança suja
Passaste por tantos
E te acolhi como virgem
Mentiste
Perdoei.
Deixaste-me
E de modo tão cruel
Caiu-me a alma no lixo
Preciso de um banho por
dentro
Que limpe tua lembrança
De outro modo
Era hora de meditar e
transgredir
No nosso quarto
Catedral e teatro
Imagens bruxuleiam
digitalizadas
Na rua, manifestações
Gritos, explosões,
esperança.
Nos músculos do ontem
amanhã
(re) fazíamos o hoje
E lá fora éramos nós
aqui
Permanência e êxodo
Política e intimidade
No gozo mais sublime
Carência mais latente
Na ossatura da
acomodação e revolta
Tendo já o que nunca
teríamos
De outro modo
Tempo de não pensar em mim
Uma vez sonhei
meu nome no infinito maior
noutro dia havia lágrimas no
travesseiro
e poeira nos troféus
de amor em amor a gente encontra
a paz e a guerra
mas só a luz interior é forte o
suficiente
para nos guiar
quando o assunto é o etéreo
amigos, parentes e
serpentes
nada podem contra a consciência limpa
agora sou moisés neto
amanhã sou você
porém será sempre por você
e tudo que sou continuará no teu
querer
como pensas que deve ser
a cada minuto do não pensar em
mim
Poema
para Norma Bengell (por Moisés Neto)
Viverás para sempre
Na tela de vários formatos
Desceste ao Hades
Mas teus Orfeus cantarão tua glória
Estás onde poucos podem ir
Uma eternidade feita de dor e gozo, éter e sangue
teatral
Nós , artistas, somos condenados a querer o novo,
sempre
Rir e chorar é o que fazem
Com o que oferecemos
Num Olimpo improvisado
Este tupiniquim tablado de desespero e êxtase
bandido
Prestando contas a um governo podre
Que não leva em conta nada além de um projeto
pontuado
Numa era digital
A enfiar, deslizar e futucar
Dedos gordurosos de um falso interesse
Em downloads que levarão a outro NOWHERE
Restam os filmes, Norma, restam os filmes...
A tua
história...
O resto, como sempre, é silêncio.
poeminha
de moisesneto: sonhando com janis joplin:
Um dia conheci Janis
Quando fui a Port Arthur
Ouvimos muitos blues
Bessie Smith, leadbelly, Big Mama Thorton
E demos uma canja cantando
no coro local
Rimos do que foi a Jefferson
High School
E até da nossa antiga atitude rebelde,
Vestimo-nos como os beatniks
Rimos como na época de San Francisco
De North Beach,
Quando ela trabalhou como cantora folk
Eu não toquei no uso de drogas
Mas tomamos alguma cervejas
E também no Southern
Comfort
Diziam que o uso de drogas chegva a ser mais importante
para ela
do que cantar, e chegou a arruinar sua saúde
Ela me apresentou ao pesoal do Big Brother
& the holding company
Do Full Tilt Boogie Band
E eu fui me despedindo enquanto o sonho não acabava cantando com
ela minha cara "Me and Bobby
McGee"
E ela mandou brasa com "Mercedes-Benz", escrita pelo
poeta beatnik Michael McClure...
Na paredwe estava escrito que as últimas gravação que Janis fez foi
Happy Trails, como um presente de aniversário para John
Lennon
que faria aniversário em 9 de outubro
( em entrevista, Lennon contou que a fita chegou em sua casa após
a morte de Janis!)
Quando olhei para meu celular era dia 3 de outubro de 1970
Apontou para o estúdio Sunset
Sound Recorders (L.A.)
E eu ouvi o instrumental da música de Nick Gravenite, Buried Alive in the Blues
Ela disse que a gravação dos vocais estava agendada para o dia
seguinte
Disse que ia para o hotel
Eu já sabia que no dia das
gravações (4 de outubro) ela não apareceria no estúdio
E que John Cooke
(empresário da banda) iria até lá e a encontraria morta
Que ela iria embora numa dose danada, como uma heroína
O álcool a levaria para
longe deste insensato mundo
Aos 27 anos
E que seria cremada no parque memorial de Westwood Village (CA)
E suas cinzas espalhadas no Oceano Pacífico
Seria homenageada com o
musical Love Janis
Baseado num livro, escrito por sua irmã, Laura.
Acordei
Tomei café e olhei para a minha cidade, hoje
Um vento suave me dizia que o tempo não apaga
Mandela, corpo e alma
Lá se vai Mandela
Se vai para ficar para sempre
Ele que nos libertou tantas vezes
sentimento profundo
Mãos de pai, de irmão
Hoje o mundo guarda tua lembrança
de carinho e luta
a nos inspirar em meio à guerra dos dias
Morreu o corpo
Viverá a força revolucionária do amor tão profundo
Pássaro de esperança & força
Viverá agora no mistério do tempo tríbio
Nas fronteiras móveis das identidades
Até a próxima luta, professor
Obrigado, por ensinar-nos uma lição com tanto
carinho
Tua despedida neste dezembro é apenas mais uma
batalha
Tua participação no doce mistério da vida.
Teu sorriso e tua voz ficarão
Através do universo
corpo e alma
Retrabalhando o tempo e o espaço
Nessa arena cósmica...
Ah! Que tolo que eu sou...
Por que choro agora?
Tudo que é sólido se desmancha no ar
É tudo alquimia
HAIKAIZINHO...
Verão: a vida é fácil?
Peixes no céu, estrelas no mar
Gasosa fantasia, o
amor reinventar
ESSA MORDIDA
Por que essa mordida,
assim tão de repente?
Ferir-me com teus
dentes
Virgem dos olhos de
sangue e fel
Tanto tempo de nós
dois, cruel
Nas dobras do éter
Tua fala e riso de
encanto
Meu coração em
convulsão, fico sem voz
Sob a pele fogo leve
percorre-me feroz
cegueira, zumbido,
tremura, suor
estou quase morto
Morrevivendo,
amorodiando
Em jogo cigano, de
repente?
Ah!
O que faço com a gente?
(poemazinho
mínimo de moisesneto para todas)
Se a coisa estiver por um dia: Virgem Maria!
Se foi
traído, não sai da inércia: foi Lucrécia!
Por uma
não lhe assanhe: amiga, esposa, mãe!
Flor,
dor-amor qualquer: doce mulher!
Se
artista? Protagonista!
Em seu
ventre por meses o humano habita!
Mesmo
sem filho, estranho brilho!
Leite,
mel, deleite até no fel!
Poemazinho dô´je
Domingo, tão lindo, água entre os dedos
Gigante pequenino, velho Abaporu menino
Suave aprendizagem, ou não, seguindo a canção
ostra
Abre
os olhos, natureza morta!Vou penetrar-te toda do sul
até os olhos,ouvidos,lábios de barro e mistério,soprar ardente verbo
Sob árvores de sal e doce, desenredo da nossa lonjura anterior, nessa orgia
CARNE
DE OSTRA
Abro-te, natureza
morta, dentro vives, vou devorar-te toda,
com olhos,ouvidos,lábios de barro e
mistério,verbo/luz,ardente desejo
Sorver-te sob árvores de sal e doce, desenredo
da nossa lonjura anterior
CONTOS
O Cão mais feio do mundo não deixará
descendentes
O cachorro eleito o mais feito do mundo, Elwood, não deixará
descendentes. Ele foi castrado quando era muito pequeno. Ele nasceu do
cruzamento do Chihuahua com com o Cão de Crista Chinês.
Segundo o Fantástico,
Elwood nasceu branco, esmirrado, dentes só na metade da boca. Então a língua
escorregou e ficou para sempre do lado esquerdo. E, como ela balança, machuca o
olho, que, por via das dúvidas, fica fechado.
Ele cresceu e vieram as manchas
pelo corpo. Ficou tão feio que a antiga dona decidiu entregá-lo para a
carrocinha. O marido de Karen soube que ele seria sacrificado e salvou a vida
de Elwood.
O cão, que mora no Estado
americano de Nova Jersey, participou do concurso na Califórnia. Muita gente diz
que Elwood parece um macaco, que tem nariz de porco ou que é um gato sem pêlo.
Bonita
Os limpadores dispersavam a água do vidro.
Ela atravessou a Ponte Giratória no meio da neblina. Fumaça dentro do carro,
lágrimas nos olhos. Um retrato rasgado sobre o assento do passageiro. “holding
back the years”, do Simply Red, no CD player. Uma ilha: o Recife Antigo. Um revólver no porta- luvas,
pílulas, uma garrafinha de prata. Uma retocada básica na maquiagem e no cabelo,
uma ajeitada nos anéis, no colarzinho, no sutiã. Um perfume, Dolce &
Gabanna.Respirar fundo. É hoje.
O flanelinha com imenso guarda – chuva até
a porta da boate. Sorriso do porteiro, abraço do promoter. Faíscas de luz
vinham do primeiro dancing. Direto para o Mexican bar.
- Tequila.
Olhos ansiosos. Bebeu a dose de um gole
só. Classe média recifense. Poucos ricos à meia-noite. Partiu uma unha quando
meteu a mão na bolsa em busca de um cigarro.
- E meu benzinho?
- Na Praça do arsenal. Show do Manu Chao.
- Diz pro Fred que eu já volto.
- A senhora manda.
Cruzou o loundge como um espírito e saiu
entorpecida. Uma rajada de vento frio deu-lhe um arrepio na nuca. Num dos
velhos casarões duas prostitutas velhas gargalharam na varanda Alguns
vagabundos trocavam insultos numa birosca suja. Ao longe o barulho do show.Olhou
à direita para a praça do Marco Zero. A torre de cristal cintilava esverdeada e
uma criança dançava alucinadamente.
Na Rua do Bom Jesus as folhas das árvores
balançavam e as calçadas dos bares estavam vazias. Lá dentro alguns buscavam
calor.
Ela entrou numa espécie de pub. Sentou-se.
Pediu mais tequila e ligou para ele. Muito barulho. Mandou uma mensagem por
escrito: no Panquecas em 15 minutos, que logo passaram. Quando ele chegou ela
tinha tomado mais uma dose.
- Queria ver o resto do show...
- Eu sou o show. E aquele toin oin oin do Manu Chao,
sinceramente!.Olhe: o que você fez, tirando tudo que é seu do apartamento e
jogando a chave por debaixo da porta...depois de tudo...é im-per-do-á-vel! E
comigo! Quem você pensa que é? Hein? Eu acabo com você! Foi aquela cachorra,
não foi? Vamos diga!
- Se você não se acalmar, eu vou embora.
- Pois vá!
-Você não tem jeito. Vamos andando. Pague
esta porcaria. Eu lhe espero na esquina.
Levantou-se. Ela deixou uma nota de 50 e
disse que depois pegava o troco. Seguiu- o . A chuva havia parado e uma lua
cheia ensaiava iluminar as ruas lamacentas. Ela alcançou- o.
- Canalha!Vou denunciar vocês todos. Pensa
que não tenho provas?
- Eles matam você.
- Sem você, é melhor morrer! Eu te amo
demais. E sei que você me ama.
- Ninguém manda em mim.
Ela segurou o rosto dele e deu-lhe um
prolongado beijo na boca. Parecia querer sugar-lhe a alma. Ele desvencilhou-se
e continuou a andar em direção ao cais. Passaram uns rapazes vestidos de preto
e com caras de mortos-vivos. Um deles pediu um cigarro. Ela disse que não.
Pegou um e acendeu.
- Isso ainda vai te dar um câncer. Que
feio!
- E o seu vício é tão bonitinho...
- Escute: semana que vem estou indo para
Londres.
- Não!
- Me deixe ir! O Recife está me sufocando.
Uma
nuvem passou rápida pela lua. Eles chegaram na frente do prédio enorme do
Ministério da Fazenda. Ela encostou-se numa das colunas. Olhou para um navio
que estava atracado. Observou o nome. Parecia russo.
-Vai largar a faculdade? Vai trancar?E o
dinheiro que eu gastei?
Ele não respondeu. O telefone dele tocou.
Ele se afastou pra atender.
- Estou com ela agora...
- Sua vagabunda! Deixe o meu homem em paz!
Não estrague o futuro dele!
- Pare! Depois eu falo com você!
- Ai, meu Deus. Você está me destruindo.
Depois de tudo que eu fiz por você!
Saiu andando cambaleante em direção ao
envidraçado Armazém 12. ele a seguiu. Um trem de carga se aproximava. As
lágrimas atrapalhavam a visão e ela imaginou-se estraçalhada sobre os trilhos.
Desistiu.
- Pois vá! Vá mesmo. Vá logo.
Ele afastou-se indeciso. Mas, foi. Talvez
para sempre.
Ela pensou: era forte. Já agüentara muita
coisa e venceu na vida, sozinha. Maldito desmantelo blue! A lua brilhou
intensamente. Ela esboçou um sorriso. Olhou para os prédios da Praça do Marco
Zero. O chão molhado, as avenidas. Sozinha naquela ilha!
Encaminhou-se para o carro. Morrer não
adiantava. Tinha que continuar lutando e tentar ficar mais forte e mais... bonita.
MANGUEBEATNIK!
“Emoções baratas”
Um contensaio dramocinematográfico
de Moisés Neto
Woodstock, hoje
Vi
o fogo nas brechas
Das
cascas de pedra
Sabedoria
que não se diz
Sonho
maravilhoso paz & amor
Flor
selvagem unissex
A
roçar o céu
Fita
azul, nova estação
Despedida
inconsistente, hey Joe
Laços
nunca enfraquecidos
Hoje,
40 anos depois
Pós-lisérgico
Imperialismo?
Castelo
de nuvens
Palavras
profanam lembranças
Manguebeatnik
Joplin
música ao longe
Pulso
dos invisíveis
Amor
que muda de cor
Tempo
de sono
Cair
mudo das estrelas
Circo,
pão e lágrimas
Liberdade
é não ter o que perder?(M.N.)
- Tédio! Eis porque fazíamos tudo aquilo: por
puro... tédio!
- Eu tinha uma proposta...
- Ah, é? Qual era? Ficar chapado. Bem
chapado. Não era ? Uaaaaaaau!
- Lembra a primeira vez que viemos neste
bar?
- Foi a primeira vez que eu vi a serra das
Russas. Um barato.
- Estava chovendo. Igual a hoje.
- Sim e nós quatro estávamos indo
exatamente para Fazenda Nova, como estamos fazendo agora. Só que era para uma
festa e agora é para um funeral.
- Pobre Daniel. Os leões não o pouparam
desta vez. Mas pelo menos ele morreu chapado.
- Sim. Foram várias cervejas e ele morreu
nos braços de quem amava e trepando!
- Aquele safado. Morreu me devendo mil
dólares. A grana que eu ia usar em Amsterdã.
- Parece a morte do Neal Cassady...
- Lembra quando fundamos nosso primeiro
grupo?
- Eu tinha 17 anos e tinha acabado de ler On
the Road, O Uivo
e Almoço Nu!
- A gente curtia Led Zeppelin pra caralho.
Janis Joplin, Deep Purple, Nazareth,
a porra!
- O jazz, as drogas, as viagens, as
iluminações beat. Éramos como uma nova espécie de anjos...
- Não exagera, cara!
- Nossa alma era múltipla e densa, como um
solo de guitarra de Jimmy Page! Afiada como a voz de Robert Plant! Ou um solo
de Charlie Parker. Lembra do filme Bird?
- Do mesmo diretor do filme The Wall.
Não foi? Do Pink Floyd?
- Acho que não. Que importa?
- E agora nós quatro bem aqui onde quase tudo começou...
- Só falta o quinto mosqueteiro...o
Daniel, my brother...(começa a cantarolar a música “Daniel”)
- Não! Elton
John, não. Please.
- “When
are you gonna come down? When are you going to land? I should have stayed on
the farm. I should have listened to my old man. You know you can hold me
forever I didn´t signe up with you!”
- Oh
yeah,man! The yellow brick road. The long and winding road...
- E
aquele dia de Lucy in the sky with diamonds?
-
Beat...Beatles...os beatles eram beatiniks. Bob Dylan
era beatnik.
- Delinquência, orgias. O consumismo
materialista não saciava a nossa fome. Eu queria ser escritor e já tinha lançado
um livro pelas edições Piratas.
- Lembra do dia em 77 quando chegou o
disco do Sex Pistols?
- Cara, eu pirei com aquele som. O
Burroughs mandou uma carta para eles, elogiando o trabalho dos caras.
- Acho melhor a gente esperar esta chuva
passar.
- Também acho.
- Garçom, traz mais duas! E coloca este
CD, por favor.
- Que CD é este?
- Coltrane.
- A gente tinha ideologia. A gente
pensava. Tinha, mesmo dentro daquela porra de ditadura, mais liberdade do que a
gente tem hoje. Essa juventude de hoje é muito careta.
- E a meditação? As dicas que Augusto dava
pra gente? Ele traduziu Gary Snyder pra gente.
- Kerouac queria ver o rosto de
Deus...morreu em 69! Tinha encaretado? Sei lá. Vivia na casa da mãe. Hemorragia
estomacal...Ginsberg bateu as botas em 97 e Burroughs ainda tirou onda com Sting
e o U2.
- A visão desses caras iluminou nosso
caminho. Não foi?
- Não seja tão sentimental, cara. Isso não
leva ninguém a lugar nenhum.
- Destruir a literatura acadêmica, as
generalizações taxativas, a linguagem dos certinhos...
- Minha vida é bem parecida com a de Gregory
Corso...
- Eu sei um pedaço de um poema dele
decorado
- Você mistura poemas dos outros com os
seus...
- É assim: “Parado na luz fria da rua
deserta/ Olho pra cima pra minha janela, ali nasci/As luzes estão acesas;
outras pessoas andam por lá/ Estou vestindo jeans, cigarro na boca/ Cabelos nos
olhos, mão na garganta./Atravesso a rua e entro no prédio./As latas de lixo
continuam cheirando mal”. Casa Natal Revisitada, Gregory Corso, um beatnik
do caramba!
- A vida me transformou num poeta. É o
poeta e não o poema que deve se transformar numa obra de arte.
- Eu era um HIPSTER... uma geladeira
pifando que funciona com barulho, calor e incrível violência apenas para manter
a sua finalidade que era manter-se fria...É preciso manter-se frio e tentar
salvar o motor.
- Sempre achei que você tinha cara de
geladeira doida
- Vai pro inferno! Vamos brindar ao
Daniel! Garçom: bota a faixa número 7. Por favor. Ele adorava esta música. Ele
tentou ficar frio
- Como a geladeira doida...
- É. Mas o motor dele pifou
- Motor de máquina velha quando pifa, é
fogo.
- Ei, cara.
- Ã...?
- Tem uma remela no teu olho e estás com
uma cara de ressaca da murrinha! Vai no banheiro e vê se dá um grau, falou?
Vamos chegar no enterro do Daniel com a cara limpa.
-
Pacifistas, anarquistas, zen bundistas...
- Bundistas desbundados...
- Pluralismo cultural, sexual, individual.
Um basta aos mitos do progresso. Queríamos um novo tipo de família relaxada e
festiva!
- O mundo exterior não se altera se
continuarmos os mesmos. Depois do que fizemos, revolução no Brasil, pra quê?
- Malditos autômatos.
- E essa porra de Manguebeat? Cadê? E o
teu livro? Vendeu tudo em três meses. E daí? Eu soube que o Fred reclamou de um
lance...
- Manguebeat ou Beat? Fenômeno
comportamental, musical ou literário?
- Só um esquizofrênico divide arte da
vida.
- Pelo menos Chico rompeu com aquela
caretice de Geraldo Azevedo e aquelas morenas tropicanas na tarde de
domingo azul nas praias encoqueiradas de Alceu Valença. Que saco. Vou tomar
dois goles de uma vez por causa disso.
- Falando sério: por que você escreveu
aquele livro sobre Chico Science?
- Porque eu quis. Merda. Eu conheci o
cara. Eu achei legal tudo que ele fez. Aquilo foi beatnik puro. Foi como a cena
da Califórnia nos anos 6 0 ...The Doors, essas coisas. Vocês mesmos
iam aos shows também. A gente se encontrava na Soparia. Agora é que dez anos
depois ficam tirando onda com a minha cara.
- Liga não. Acho até que Chico era uma
espécie de... não riam! Profeta contra a repressão: Afrociberdelia!
- Se os beatniks tiveram que enfrentar o Macarthismo,
nós tínhamos a herança maldita do governo militar a assombrar nossa geração,
nossas vidas e até a nossa arte! Manguebeatnik: a marijuana é uma panacéia pacifista.
- A arte é vida. Chico curtiu a vida. E
fez sucesso quase imediato.
- No meio do axé, do brega,
sertanejo...Voz própria sem concessão demagógica. Estabeleceu-se uma verdadeira
comunicação por necessidade inconsciente e coletiva. Abalando os hábitos
esterilizantes dos amadores solitários e sacudindo a massa. Um hipster:
típico das esquinas, dos bares, das festas, uma criatura dos aglomerados
humanos enlouquecidos
- Só falta dizer que ele era um novo Rimbaud.
Faça-me o favor...
- Eu dei uma lida em tudo isso ultimamente
e me pareceu bastante vazio. Não acredito que o Manguebeat vá virar história.
Ele já parece ter chegado a um ponto de refluxo.
- “Qual a sua estrada, homem? – a estrada
do místico,/a estrada do louco, a estrada do arco-íris, a estrada da droga,
qualquer estrada...Há sempre uma estrada em algum lugar, pra qualquer pessoa,
em qualquer circunstância”, um brinde ao Neal Cassady!
- Um brinde! Aquele é outro: morreu
chapado e só perto dos trilhos do trem.... Será que foi suicídio?
- Foi o que eu me perguntei a respeito do
nosso amigo Daniel também.
- As drogas deram aos beats o que eles
mais precisavam: relaxamento do corpo e ampliar a imaginação. Mergulho fora do
tempo na tranquilidade...
- Como eu dizia do Manguebeat: uma prosódia baseada na fala popular, o
antiacademicismo e aparente antiintelectualismo. Conciliou o maldito e o
olímpico, produzindo influência musical e comportamental. Com ele aprendemos a
amar novamente nossa cidade, nosso estado, nossa loucura e nossa sanidade!
- Se Chico tivesse continuado vivo, será
que a MTV ia continuar dando apoio a ele e a revista americana Spin? E os jornais?
- Vamos mudar de assunto.
- Nós fazemos parte do Romantismo, do
mesmo jeito que Alencar e Castro Alves.
- Como assim?
- Nada na vida se acaba.
- Você está bêbado...desde ontem. Não é,
meu filho?
Eu
sou aquela barata bêbada de Kafka, do comercial de inseticida, de
O Processo, do Admirável Mundo Novo, de Huxley, do Orwell de
1984, de Carlos Castañeda.. A musiquinha era assim: “A
baratinha, iaiá, a baratinha, ioiô. A baratinha bateu asas e voou!”.
- Maconheiro.
- Gerente de banco multinacional...
- Hoje eu quero celebrar os velhos tempos.
Hoje eu sou um anti-herói.
- Nossas errâncias aventurescas. Euforia psicodélica. Coisa de piratas. Monges
medievais. Índios Xucurus.
- Outro dia eu reli o Visions of Cody,
do Kerouac. É puro jazz. Prosódia bop!Escrita espontânea. Ioga das palavras. A
persona do Neal Cassady até hoje me fascina.
Há características que só aparecem na leitura em voz alta.
Pensar
que T. S. Eliot queria uma literatura, uma poesia impessoal. Os
beat barbarizaram.
- Mas não esqueça que o lance do
texto-colagem a gente encontra tanto no Wasteland, quanto em
Kerouac e Ginsberg. E também nas letras do Manguebeat.
- Os mangueboys ficaram famosos mais por sua temática e
linguagem do que pelo seu estilo. Linguagem das ruas, surrealismo, teoria do
caos. Tudo isso eu já falei no meu livro. - A oralidade, a fala do nosso tempo.
Foi isso que me chamou atenção nas letras do Chico. Sabia que o Daniel tinha
uma entrevista exclusiva, e inédita com Science?
- Eu já vi.
- “Portanto, poetas, descansem um pouco
& calem-se: Nada jamais surgiu do nada”, já dizia o velho Kerouac no poema
“Rimbaud” de 1960.
- Sabe outra coisa que os beatniks têm em
comum com o pessoal do Mangue? E até com nós outros?
- Sei: nenhuma mulher fez parte do grupo.
E o livro que Daniel deixou para publicar?
- Os escritos psicosensoriais...
ele disse que rapsodiaria a nossa
realidade. Seja lá o que for, ele escrevia bem.
- Da última vez que eu o vi ele me
mostrou. O texto era um choque térmico entre forma e fundo: límpido, frio,
plano, regular, quase sem estilo.
- E o assunto? Do que trata o tal texto do
Daniel?
- É a história da nossa geração e é uma
homenagem ao Movimento Mangue e aos Beatniks.
- A namorada do Daniel me lembra aquela
mulher do herói do “Almoço Nu” de Burroughs...
- A Joan...
- É. Lembra quando ele brinca com ela? Em
vez de colocar uma maçã na cabeça dela para dar uma flechada, ele coloca um
copo e tenta acertar com um tiro e acerta é a cabeça dela?
- Como assim?
- Ele pirou a cabeça daquela menina.Ele
era doido e pagou com a própria vida os anos de loucura que viveu.
- Like
a Rolling Stone. Como
aqueles personagens Dean e Sal, do On the Road...
- Os Rolling Stones pegaram tudo
dos beatniks e dos negros. Por que não teve nenhum negro beatnik?
- E quando a gente inventou aquela banda?
Uau! Pode não ter dado muito certo, mas foi uma loucura. Ah, cara A poesia
sempre só tem a ganhar quando se junta com música. Os poemas de Homero foram
recitados assim.
- Cá estamos: num dia de chuva, indo para
o enterro de um grande amigo que morreu de overdose em pleno século vinte e um!
E estamos com o pé na estrada, exatamente como fazíamos há mais de vinte anos.
A diferença é que hoje só fazemos nos fins de semana e nas férias...
- Aquilo está no nosso sangue para sempre.
- E aquela briga em San Francisco?
Você quebrou a cara daquele professor.
- Ele veio falar mal do Brasil.
- Você estava era muito doido...
- Foi o meu último ato como delinquente
juvenil.
- Esta é a velha estrada: suja e
misteriosa, ao mesmo tempo tão óbvia...só faltam as anfetaminas e a
marijuana...
Por
falar nisso...
- Não!
- “Ó estrada minha e de todos não tenho
medo de deixá-la. Hás de ser para mim mais que o meu poema”, Walt Whitman...
- Sabia que ele era homossexual?
- Não. Só contaram para você.
- Eu às vezes penso em fazer como Thoreau.
Ficar isolado da civilização. Oito anos e meio vivendo numa cabana. Sem contas,
eletricidade, nada. Do alto da colina vendo as construções. O homem e seus
negócios me irritam: igreja, Estado, comércio, agricultura, política- folgo em
ver o espaço insignificante que ocupam na paisagem.
- Eu queria ir pra o México. O peiote, os
índios, as pirâmides
Pobre México,
tan lejos de Dios, tan cerca de Norte América!
- Manguebeatnik: máquina que mata
fascistas!
- Fascista é a puta que lhe pariu!
- Eu não estava me referindo a você!
- Então por que olhou para mim? Seu idiota!
- Calma: todos querem pão e rosas, não é
verdade?
- Quando eu era mais moço diziam que esta
minha ansiedade iria passar. Agora que vou completar quarenta vejo que isso é
mentira. A estrada me fascina cada vez mais. Sem viajar eu não sou ninguém,
cara. A estrada é o meu SATORI, meu súbito despertar...
- A carroça de maçãs como um anjo numa
vassoura. Rua louca sem nome, estadias estradeiras de Ferlinghetti,
homens sanduíches, banhistas antiquados, imagens surrealistas, labirinto da
solidão. Percorrendo este mundão real
com meu coração irreal. Puta merda. Eu estou bêbado pra caralho, cara. Tô até
com vontade de chorar.
- Minha gente: vamos embora. É melhor.
- Mas a conversa está tão boa...
- Quando chegar ao topo da montanha
continue subindo. Você e seus nós mentais. Para o inferno!
- Esta sua insatisfação visceral, este seu
interesse pelo Zen, esta história de que toda a vida é sofrimento isto mais
parece aquele livro de Kerouac: The Dharma Bums. Dharma significa
“Verdade”, o que é. Karma...
- Você parou no tempo e no espaço. A única
merda que você conhece de literatura são esses escrotos desses beatniks, é?
- Nós éramos os representantes deles no
Brasil no começo dos anos 80. Como é que eu posso esquecer?
- Porque já faz 20 anos.
- O tempo é uma ilusão. Ainda detenho os
direitos autorais de duas das obras beat.
- Venda para a Globo. É o melhor
que você faz.
- Eu ainda vou filmar aquelas histórias.
- Você é um péssimo cineasta. Eu não
gostei daquele seu curta- metragem...
- Você é um pulha...
- Eu vou rezar por você
- Ora...Guarde suas orações para quem
precisa delas, não para mim. Seu fracassado!
- Pensar que eu já estudei japonês e
chinês, e agora não passo de um candidato a monge, bêbado!
- A saída de todos os problemas é beber
leite.
- O Zen é antiintelectualista:
aceita a vida sem teorias explicativas, que a tornam chata, impedindo o seu
fluir descontínuo...
- Meu irmão: você é um gênio.
- Isto não é meu. Eu li em algum lugar
- Mesmo assim: é uma honra ser seu amigo,
sabia?
- Os japoneses fundiram duas grandes
tradições da China e da Índia surgiu o Zen! Somos ajudados pelo que não é a
usar o que é.
- Isso é mais confuso que Confúcio.
- Trocadilho é a pior forma de literatura.
- Zen quer dizer meditação. Contemplação,
sabedoria.
- Todas as religiões contém noventa por
cento de fraude, já dizia Gary Snyder.
- E daí...Que conversa mais doida!
- Deixem-me recitar um haicai de
Moritake..
- Não. Por favor. Nos poupe.
- “Uma flor caída/Voltando para o galho?/
foi uma borboleta”
- Que comovente.
- O músico oriental aprende imitando o
professor, não pela leitura das notas...
- Eram outros os tempos, não?
- A espontaneidade, cara, é o que une o
Zen, à escrita automática dos surrealistas e à prosa espontânea de Kerouac.
- Você está obcecado. Pare. Tome um copo
d´água. Você está parecendo um hippie maluco.
- Ao contrário dos beatniks, os hippies
eram filhos mimados de uma sociedade próspera...
- Ou enjeitados em busca de paraísos
artificiais...
- Sabia que o Allen Ginsberg namorou o Bob
Dylan?
- Você disse...
- Você parece um palhaço com a terceira
visão piscando.
- O ácido lisérgico destruiu sua noção do
que se deve ou não falar. Você está é muito doido.
- Lembra daquele filme que a gente
assistiu no cinema da Aeronáutica nos anos 70? Os assassinos do raio azul.
Sobre uma turma que tomava ácido e anos depois vieram estranhos efeitos...
- Aquele cinema era ótimo. Não tinha
censura.
- Proponho mais um brinde para o Daniel. A
ele, que não sobreviveu!
- O filho da mãe. Como é que ele pôde,
através desse escândalo cósmico, morrer?
- Nós, filhos da contracultura, somos
todos uns maus perdedores.
- Eu sou um vitorioso: eu não choro pelo
passado. Faço como David Bowie fez nos bons tempos: lamento pelo
futuro. Estes jovens de hoje não estão com nada!
- Nossa geração foi importante: promovemos
a revolução na linguagem e nos valores. A liberdade numa época em que ou você
era de esquerda ou de direita, estabelecemos uma nova relação entre a poesia e
a vida. Deixamos a lava e cinza da poesia espalhadas pelo Recife...Selvageria
extraliterária. A gente curtiu pra caralho. Orgia pura, meu.
- Eu trouxe uma cópia do email que o
Daniel mandou para mim pouco antes de morrer. É uma parte do estudo dele que
compara o movimento Manguebeat com os autores beat.
- Quantas páginas?
- Seis.
- Lê um pedaço dessa porra enquanto a
gente acaba a merda desta bebida e paga a conta.
- Lá vai:
“MANGUEBEATNIK: A INTERZONA!
(“Manguebintik
Generation”)
50 Anos da Beat
Generation
10 Anos de Manguebeat
APOSTANDO A ÚLTIMA FICHA NA JUKE
BOX DA SOPARIA
Se não houvesse um Deus, seria
necessário inventá-lo.
Voltaire.
Reunidos em lugares como o Cantinho
das Graças ou na lendária Soparia do Pina, ou do Bar do Caranguejo em Candeias,
alguns amigos trançaram os rumos que abalariam os alicerces das concepções
artísticas no Recife no início dos anos 90.
O termo Manguebeat logo seria
conhecido pelo Brasil inteiro e viraria marca registrada de artistas que dentre
outras coisas admiravam a geração beat principalmente os autores como Kerouac e
William S. Burroughs. O livro “On The Road” tivera sua 1ª ed. em português nos
anos 80 e a editora Brasiliense havia relançado vários autores da Geração Beat,
que voltavam a influenciar os autores brasileiros. “Pergunte ao Pó”, de John
Fante, mostra um herói que tem tudo a ver com os personagens marginais que
pululam nas letras de Chico Science e Fred Zero Quatro, dois poetas, líderes do
Manguebeat.
Science vinha desde os anos 80
“Antenado” com a cultura Underground norte-americana. O Rap e o Funk
faziam a cabeça daquele rapaz que aqui no Recife não esquecia suas raízes
culturais, como o Maracatu, por exemplo, nas percebeu que alguns artistas
ianques da classe menos favorecida, que ficava às margens do mainstream, aprenderam a transformar
em poemas, e no caso dos beatniks, também em romances, as aventuras das ruas,
dos bares, dos guetos.
O momento chegou para a geração mangue
quando em 93 Science assina com a Sony Music e os mangueboys invadem São
Paulo.
Se
o movimento, que havia lançado seu 1º manifesto – release em 91 e já se
articulava bem com a mídia e com os produtores independentes a mundiais, a
partir do lançamento do CD “Da Lama ao Caos”, a geração Manguebeat dava seu
passo mais largo em direção à batida perfeita que eles perseguiam.
Do mesmo modo como nos romances “Pergunte ao Pó” de Fante, o
herói do mangue vive o universo dos bares, dos esquecidos da sociedade, da
busca da emoção mais verdadeira, da vida bandida que Bukowsky mostraria nos
seus textos.
Do mesmo modo que “Beat Generation” foi
inventada por Kerouac em 1948 e foi apresentada ao público no artigo que o
amigo dele John Clellon Holmes escreveu para o The New York Times Magazine em
1952 (“This Beat Generation”), Fred e Science contaram com o apoio do Jornal do
Commercio do Recife para começar o “Movimento Manguebeat”, que evoluiria em
muitas direções durante uma década.
O Manguebeat, nos moldes da beat generation (que tinha este
nome porque, dentre outra coisas, por significar “derrotado, ou, como queriam
alguns, beatitude), usava palavras que normalmente só eram usadas por pessoas
das classes menos favorecidas. Por exemplo, na letra da música “Banditismo por
uma questão de classe” o poeta Science usa a palavra “Fodido”, só para citar
uma pequena exemplo.
A “Batida” (Beat) se espalhou entre aqueles que buscavam a
critica social e desprezavam as afetações burguesas. Então, nos moldes dos
beathiks, a geração mangue usou criminosos, como Lampião, Biu do Olho
Verde, Galeguinho do Coque, e outros, como modelos a serem incorporados ao
eu-lírico. Como os marginais do romance “Almoço Nu” de Burroughs, as
barbaridades são sublimadas em nome da doidice generalizada da sociedade.
Para o mangue chegaram, com os anos 90: Os CD’s. A MTV, a
McDonald e a Internet traziam o estilo americano para o seio de Recife. O Grunge
explodia como movimento em Seattle(EUA). Começava a última década de um século
que presenciou grandes transformações. Os poetas cansados, ergueram mais uns
copos de cerveja e começaram algo que a poeira do esquecimento nunca encobrirá
totalmente.
Ficção ou poesia, o drama social de homens
que buscaram descrever o cotidiano da estrada, da rua, com sua linguagem dura,
sua falta de dinheiro. Em livros ou em CDs, que importa? Era Manguebeatnik!
Pronto.
Trocar idéias, discos, revistas e livros
faziam partido Grupo Mangue (Fred, Chico, Renato L, Mabuse, Helder Aragão e
Jorge du Peixe). Algo que lembrava
os tempos do Village, onde os beats se reuniam para “segurar a onda” uns
dos outros, ler seus novos textos, fazer performances (Como o grupo recifense
que elegeu o Espaço Oásis, em Olinda, o Arteviva e a Soparia
do Pina, Recife, para exibir seus trabalhos),
encontrar novas pessoas e se interessar por elas, fortalecendo assim uma
corrente de pensamento. Fortalecendo uma atitude grupal. É claro que, como
Burroughs, haveria mangueboys de primeira instância que negariam no futuro
qualquer ligação maior com o movimento. Mas isto é outra história.
O Manguebeat desponta no Brasil no final
dos anos de chumbo, do mesmo modo que os Beatniks enfrentaram o McCarthismo
pós-guerra nos EUA e abrir as portas para novas percepções.
A psicodelia, que Ginsberg e Timothy Leary propagaram
já nos anos 60, influenciou Chico de tal forma que ele criou a estética
afrociberdélica, letras psicodélicas, cibernéticas, estética afro, diluída num
som cheio de efeitos.
O desconforto, a ruptura com a velha
realidade e a criação de um novo modo de ver as coisas desnudando-as. Era o
espírito dos rapazes que queriam aventuras e se posicionavam contra aqueles que
queriam roubar dos pobres seu bem mais precioso: a liberdade.
Artistas criando seu próprio universo: os beats mostravam que
não eram só as grades das prisões que mereciam uma revisão. Os valores sociais
precisavam de novo padrão, este fatalmente iria de encontro ao consumismo, não
o respeitando, mas negociando numa dialética bem particular, nova, diferente.
Havia muita gente sem
trabalho, sem segurança e sem felicidade, tanto nos EUA Beatnik quanto
no Recife Manguebeat. Mas tanto a águia americana quanto o gigante deitado
eternamente em berço esplendido (Brasil) na terra dos altos coqueiros
(Pernambuco) fincados no mangue (Recife) tinham no seu colo alguns artistas
desvalidos que pediam uma vida menos bandida, logo! E foram buscar na música
negra, quer fosse o jazz dos beatniks ou no maracatu, funk, rap, soul
dos manguebeats. Queriam a chance de gritar poesia e clamar por liberdade.
Andar num mundo mais livre.
Valia a pena para isso
correr vários riscos.
“Freedom is just
another word for nothing left to lose” disse Kristoferson na letra de “Me
and Bob Mcgee”, interpretada por Janis Joplin no seu álbum –
testamento (Pearl), uma canção pra lá de beat. Janis que levara às últimas
consequências os ideais de sua geração beat/hippie. Viajar, em todos os sentidos,
é o que propuseram os manguebeatniks, também.
E o esforço anárquico manteve a chama acesa excitando e
aquecendo quem deles se aproximar até hoje.
II
DROGAS, CRIMES, SEXO E LITERATURA, O BIZARRO COMO UM ESTILO
DE VIDA
O que Allen Ginsberg enfrentou, desde
outubro de 1955, em San
Francisco, quando pela
primeira vez fez uma leitura pública do “Uivo”, a geração manguebeat, também
enfrentava o problema de toda e qualquer nova geração: provar que tinha algo
novo e eficiente para mostrar. Tornar-se independente.
Na intrigante expressão facial de Chico
Science, no seu jeito de cantar, no que ele dizia sobre a malandragem e o
trabalho, sobre a condição de vida na Manguetown (modo como a geração
manguebeat chamava Recife) e dos mangueboys, vemos estampada a atitude,
o desafio.
Rotular “Mangue”, ou “Beat”, uma geração é
fazer dela parâmetro, farol. Conseguir transformar um conjunto de
comportamentos, num adjetivo. Uma poesia crua, nua, apostando a última ficha numa juke Box de
um bar como foi a lendária
Soparia do Pina, de Roger
de Renor, onde a geração manguebeat
se encontrou, naquele início dos 90.
Viver na boemia e sendo ágil como um
caranguejo. Não ter medo do excêntrico, do tedioso, do ceticismo, do cinismo,
de reconhecer que a paz nas ruas era apenas para disfarçar o cansaço diante da
injustiça social transformada em máquina de explorar pobre e que cara pobre
desses tinha, ou poderia expressar, sua visão diferente do mundo. Uma idéia na
cabeça e um bom canal de expressão à mão.
Se o beco não tinha saída, o lance seria
dar meia volta e cair na estrada novamente. Pois estar na estrada é não
estar perdido, é estar procurando.
O
que o Manguebeat procurava era a atitude certa, coisa que a passividade
recifense havia esquecido de fazer desde os anos 70, quando grupos como Ave Sangria, capitaneados pelo poeta
Marco Pólo, e os escritores publicados pela “Edições Piratas”, como o
poeta Manuel Constantino, criavam novas perspectiva nos meios intelectuais dos bares, das ruas,
da mídia.
O mergulho no álcool, na brincadeira, e até mesmo a visão das
drogas, o trabalho alternativo, ou nenhum, a produção independente ou o
respaldo de uma grande editora, uma gravadora, tudo ia circulando ao redor dos
manguebitniks. A desilusão se transformando na vontade de curtir uma nova experiência,
psicodélica, africana, cibernética, existencialista, uma viagem para dentro da
própria sua condição e curtir várias possibilidades do ser.
Como no filme “The Wild One”, com Marlon
Brando, onde um motoqueiro “Beat” e sua turma chegam para tomar cerveja e
agitam numa cidade americana. Ele tem até um troféu, mas a vontade de desafiar
o sistema é bem mais importante. Foi assim com Jim Morrison, com James Dean
(ícone beat), com Cazuza e Renato Russo(rock dos 80) e com Chico Science e Fred
Zero Quatro, da manguebeat generation.
“Only
the most bitter among them would call their reality a nightmare and protest
that they have been indeed lost something, the future”. Disse John Clellon
Holmes no artigo “This is the beat generation”, in the New York Times Magazine 16/nov/52. Artigo que introduziu a expressão “Beat
Generation” para o mundo onde ele afirmava que para eles era mais importante
“como” viver do que “por quê”.
Não era falar sobre o cansaço e sim em
como se tornar mais ativo e ativista: o manguebeat foi o plano que todos esperavam.
Nem se conformar nem destruir: antenar-se
e relaxar, parecia ser o melhor caminho para ambas as “gerações”.
Se a guerrilha que Zeroquatro e Chico exaltavam não podia ser uma revolução armada,
então seriam poesia e som com “gosto de gás” (com toda vontade) como “Bala que
já cheira a sangue” (Trecho de uma letra de Science).
Zeroquatro parecia com o narrador do
romance “On The Road” (“Pé na estrada” na tradução para o Brasil), Sal
Paradise, que parte de New Jersey para San Francisco, antes parando na casa de
um amigo, Dean Moriarty uma espécie de Chico Science, que mora em Denver, e
curte a vida. (Dean é inspirado no Beatnik Neal Cassady). Em Dever ele encontra
Dean e Carlo Marx (inspirado em Allen Ginsberg) que poderia ser qualquer outro
mangueboy como Renato L ou Jorge du Peixe, ou Hélder Aragão (DJ
Dolores). Os três curtem Denver, como os caranguejos com cérebro (os jovens do mangue), curtiram Recife.
Dean
e Sal precisavam de um lugar para ficar e ainda pensam dar um salto para a
Itália. Mas a estrada americana é tudo que a realidade lhes oferece. Chico,
Fred, Renato, Helder, du Peixe e Mabuse aqui no Recife armavam as estratégias
de ataque. O manifesto em 91, o CD e o lançamento do movimento em São Paulo e no Rio de
Janeiro em 93. O Jazz que Sal curte com Duke Ellington em Chicago, era o som de
Nick Cave e tantos outros que Chico
curtia em Recife.
Digo sem
receio que conheço esse meio / entre os balões onde repousam garrafas / com
mesa servindo pra bancadas / se respondem as batidas com os calcanhares / é
sempre aí que não deixo sobrar nada // a lâmina corria / a vista escurecia / e
a multidão nem via / se espremia toda a cidade / caranguejo em praia, não faz
bondade // pisou macio com esperteza gravitacional / pisou macio com leveza pra
não se dar mal // os ecos sentavam ao lado dos barracões / e as donas
reverberando, virando os olhos / com opiniões // nas quebradas com sua
pastorinha no bolso / o caranguejo na praia das virtudes // sem medo, sem
medo...
(Jorge
Du Peixe em “Caranguejo na Praia das Virtudes” do CD “Rádio S. Amb.A (Madame
Satã”). Serviço Ambulante do Afrociberdélia”. (YBRAZIL?MUSIC,2000) a INTERZONA,
Inc. Nação Zumbi.
Carne preta seca em pó da lacraia
aquática gigante brasileira, citada por Burroughs em “Naked Lunch”, a interzona
que este autor sugeriu neste romance. Americanos gostam de viajar, mas só
querem encontrar outros americanos para reclamar da dificuldade que é achar um
hamburger decente para comer. Ah, os rapazes da Interzona!
Humor Afrodisíaco : agente interzonal.
Esporádicas alucinações?
Bem-vindo ao clube! Ele está cheio de máquinas
escrever mutantes e dopadas.
Penitência?
Ansiedade?
Psicodelicanálise?
Há em tudo isso um paradoxo ético
(étnico)? Transestético!
Todos saem do ar na interzona.
Foi algo assim que eu quis criar,
comparando Manguebeat com Beatnik.
Uma filosofia de uso de drogas em relação
ao trabalho artístico. Algo que está além de tal “carne preta” de Burroughs, da
estrada de Kerouac, da lama e dos caranguejos de Science e Zeroquatro.
E que ao mesmo tempo unisse todos num mar
de letras: seguidores e autores, norte-americanos (funk, rap, soul, jazz,
literatura beat) e brasileiros(maracatu, cavaquinho & muito mais), numa
mesma batida!
Vamos questionar os princípios básicos do
que se convencionou chamar realidade.
Nossa América não é um Mundo Novo!
Ela já era velha, suja e má, como disse
Burroughs, “mesmo antes dos colonizadores e dos índios”.
Esta Interzona Manguebeatnik também
é meio suja e cheia de surpresas. Fugir dela hoje em dia é omitir parte da
nossa história, decepar parte do nosso corpo cultural.
Mesmo perdendo os canais de expressão, o
sofrimento do cérebro, que transparece nos olhos tristes, dá ao rosto do que
são obrigados a se calar, um jeito de caranguejo parado no asfalto quente.
Patas na estrada! Podemos não saber aonde estamos indo, mas
chegaremos lá!
Interzona Manguebeatnik: metáfora da ligação política, da nova
ordem.
- A gente devia editar isso como aqueles
livrinhos mimeografados do início dos anos 70...
- Temos que juntar com o resto que ele
deixou. Estas seis páginas a gente podia tentar publicá-las num suplemento
cultural desses como o do diário oficial...
- Eu me lembro de vocês vendendo aqueles
livrinhos mimeografados pelos bares. Era ridículo! Aqueles panfletos
revolucionários. Se não fosse o pai do Júnior ser general, esta hora vocês
estariam mortos. Esquerdistas de Boa Viagem. Leitores medíocres do Pasquim
e de Millôr Fernandes. Adeptos de Chico Buarque sem champanhe Veuve
Clicquot...de Costa Gravas de A até Z. Mais doidos que os discos dos mutantes
e de Gil, juntos. Sacudindo genitais e manuscritos. Foder, é o que vocês
queriam, e faziam, em todo lugar. Seus filhos bastardos do dólar heterossexual.
- Hei! Isso é Ginsberg, cara. O
Uivo: “Caminharam a noite toda com os sapatos cheios de sangue
esperando que uma porta se abrisse. Jogaram seus relógios do telhado fazendo
seu lance de aposta pela Eternidade fora do Tempo & despertadores caíram em
suas cabeças por todos os dias da década seguinte. Cortaram seus pulsos sem
resultado três vezes seguidas. Mandaram brasa pelas rodovias do passado
viajando pela solidão da vigília.Abraçamos os Estados Unidos sob nossas
cobertas. Os Estados Unidos
que tossem a noite toda e não nos deixam dormir. Despertamos eletrocutados do
coma..eles vieram jogar bombas angelicais. Ó legiões esqueléticas, correi fora.
Ó choque da misericórdia- salpicado de estrelas, a guerra eterna chegou. Ó
vitória, esquece tua roupa de baixo, estamos livres.
- Nós atravessamos o inferno. Muitos de nossa
geração ficaram malucos.
- Vejam o Smith: um anjo ansiando pelo
antigo contato celestial.
- Nos meus sonhos, todos os nossos que
foram derrotados ou estão lutando em vão até hoje, caminham gotejantes de uma
viagem marítima até a porta da minha casa, nesta incrível noite.
- Emoções baratas, cara. Emoções baratas.
-
Garçom. A conta!
And this is the
end. Only “the end”, myfriend, only THE END...
Os últimos dias do
Recife
Jove está completamente bêbada. O rio
Capibaribe correndo junto do restaurante, em curva generosa e ligeiramente
perfumada naquele final de tarde no Recife. Que bairro era aquele? Jaqueira?
Casa Forte? Dois Irmãos? A negra se perguntava: “Com que roupa eu vou?”. Nisso Aninha, voltando do toalete,
parou e falou com uns caras no piano-bar e gargalhou com algo que um daqueles
sujeitos disse. Era um tipo meio durão, sinhozinho mandão de corte canavieiro
topetudo. Quando Aninha veio, Jove mostrou um retrato de um jovem despido para
ela. “É esse, o tal fulano com quem
estou... me... relacionando. É o aniversário dele e a festa promete. Eu serei a
dancing queen, entendeu? Ele me chama de minha imperatriz, só porque eu
disse que estrangeiros como ele aqui no Recife vem apenas comprovar a
prepotência do neo-imperialismo ianque, mas também disse que já que ele veio
nos `salvar´ da inundação, tudo bem. Tenho mais escrúpulos não. Tomei ele
daquela fulana porque senti firmeza na promessa de mudança. O cheiro de atitude
que ele traz”. Aninha olhou para ela chocada: “A fulana é afilhada do prefeito”. Jove rebateu: “Dane-se! Se o Recife ficar debaixo d´água
aí eu quero ver o prefeito boiando! Estou é preocupada com minha roupa, o
estilista da Paulinha aprontou comigo. Vá confiar! Mas pelo menos o meu
assessor cuidou muito bem da divulgação do negócio. Gostou da minha foto na
coluna?”. “Não dou importância
a essas coisas, você sabe. Aliás, detesto aquela gentalha, aquelas jóias me
ofuscam, se é que você me entende. Mas diga: você não sabe dos escândalos com
os norte-americanos? Este seu casinho, o tal engenheiro do Tio Sam, pode lhe
custar muito caro depois que acabar a ocupação”. Jove gargalhou: "Nunca que eles vão! Estes depois que
colocam o olho num, tomam! Não estou dizendo? Nunca vi nada como esse homem”.
Aninha devolveu a foto. “Pelo menos
ele é competente? A construção do dique está bem adiantada. Sabia que ele já me
deu uma cantada?”. Jove aquiesceu: “Não se preocupe honey. Eu não sou armorial! Fui criada na beira-mar de
Boa Viagem e se essa porra de cidade vai pro beleléu, é problema dela. Não vou
me ligar se meu homem comeu ou deixou de comer alguém, eu quero é me dar bem.
Estou cansada das falsas promessas deste novo milênio. Já empacotei tudo que eu
tenho. Vou bem ficar esperando a onda chegar aqui? Sei lá se o tal dique
agüenta! Não preciso nem esperar. Vou morar no Texas, bem sequinha. Meu amor
tem um rancho lá. Passamos quatro dias inesquecíveis no Novo Éden, é o nome do
nosso lugarzinho vermelho, branco e azul, cansei de verde-amarelo.”
Aninha riu tranqüilizando-se: “Eita
neguinha abusada!” Jove pediu um capuchinho ao garçom. “Você quer mais alguma coisa, Aninha?”
Esta fez biquinho e disse: “Um sorvete
de menta com chocolate.”.
Cai o pano
Numa pouco freqüentada rua de Casa Amarela
há uma velha casa rodeada por um estranho jardim. Apenas dois empregados de
aparência nada convencional cuidam da manutenção do imóvel. O dono raramente
aparece e os vizinhos já nem ligam parra isso. Foi neste lugar que à cinco
horas da tarde de um dia nublado de junho que Ângela foi parar seguindo um
anúncio de jornal. Acabara de fazer um curso de teatro e no recorte em sua mão
diziam que ali precisavam de uma jovem atriz. Bateu palmas e esperou logo
apareceu alguém que parecia um empregado e conduziu a jovem a uma requintada
sala onde um casal a esperava.O empregado retirou-se, não sem antes observar a
recém-chegado com um certo olhar de soslaio.
- Foram vocês que botaram
anúncio no jornal procurando uma atriz- suspirou esperançosa.
- Exatamente
- Então você é candidata?
- Como é seu nome?
- Ângela... senhor... Eu faria
tudo por uma boa chance de mostrar o meu talento.
- Minha filha você nasceu no
interior?
- Não. Em Recife mesmo. Vim
assim que vi o anúncio no jornal. Peguei um táxi...
- Você não imagina até aonde vai nossa
influência. Por isso muita gente nos procura. Muita. –-Ela parece tão
jovem...jovem demais para o papel.
- É de mim que o público precisa. Eu sei –
disse a novata ofegando mais uma vez.
- Hum- resmungou a assistente de modo
entediado.
- Só depende de você.
- Se você for boazinha com a gente...
- O que é que eu tenho que fazer?
- Digamos que...decorar um
papel numa espécie de teatro.
- Que história é essa?
- Uma senhora está sofrendo
muito porque acha que o filho tem um certo problema sexual e queremos que você
faça, digamos assim o papel de noiva dele.
- É. Hoje em dia isso é um negócio muito comum-
rosnou a assistente.
- - Muito- concordou a menina
que já vira muito isso em filmes e novelas- E onde esta senhora e este filho
dela moram.
- Na Alemanha.
- E eu tenho que viajar?-
perguntou surpresa e fascinada ao mesmo tempo- Eu não sei falar alemão.
- Que curativo é esse no seu
rosto?- assistente se aproximou da jovem e fez expressão de asco.
- Fui assaltada na ponte da
Boa Vista, corri atrás do ladrão briguei com ele, peguei meu celular, chamei um
policial e sabe o que ele disse? Que estava ali enxugando gelo, eu que me
virasse ou se quisesse poderíamos ir a uma delegacia e prestar queixa, mas
precisava de testemunha e isso ia demorar um tempão e não ia adiantar de nada
mesmo.
- Você mora com seus pais?
- Meus pais moram em Catende e
eu vim tentar a vida no Recife.Quase não conheço ninguém aqui. Consegui emprego
numa loja no shopping do Janga, mas eles não pagaram o salário que prometeram e
eu saí. Agora estou trabalhando como garçonete num bar. Mas tem uma professora
de teatro que está me perseguindo. Eu não tenho nada contra as lésbicas.
- Por que você não toma uma
providência?
- Porque a dona do bar me
colocaria no olho da rua. Comecei a trabalhar a semana passada , recebo por
comissão. Foi com este dinheiro que peguei o táxi. Faço vestibular no fim do
ano e estou freqüentando um cursinho.
- Um cursinho? Nossa que
emocionante!- a assistente mal conseguia disfarçar o tédio com aquela conversa
tão vulgar.
- Você bebe?
- Só socialmente.
- Está disposta a passar um
tempo na Alemanha?
- Este rapaz, ele está no
Brasil e embaraça daqui a dez dias. Ele disse a mãe que veio buscar a noiva.
- Está com medo?
- Eu? Com medo de quê?
Ângela seguiu pensando: como
sua ânsia de ser atriz podia combinar com a estranha proposta que recebera?
Duas horas depois estava limpando o bar quando Juliana, a mulher que a
assediara entrou, visivelmente bêbada. Olharam-se.
-Boa noite, querida. Traz uma
cerveja, preciso lavar o estômago.
O caso de celeste
Alô?
Quem é?(pausa fica agradavelmente surpresa) Você?(está com o telefone na mão e
vai ajeitar o cabelo olhando-se no espelho) É você...(pausa como assim direto
ao assunto? Depois de tanto tempo...(chateada-pausa) Eu e César... como assim?
Quem lhe disse isso? (ajeita o contorno do batom com o dedo)
Eu
vim apenas para esclarecer tudo
(pausa)
Calma.Você vai compreender assim que eu explicar tudo. Escuta: o que eu tenho pra contar interessa a você...muito! Afinal tudo aquilo foi tão difícil
para todos nós.
(escuta
o outro lado da linha e bebe um pouco de vinho)
Depois
do que eu vou contar, talvez você mude de idéia.
(pausa)
É claro que eu trouxe uns documentos.
(pausa)
Por
quê? Você ainda pergunta? (finge que ri)
Porque
meus inimigos querem me impedir de
provar que sou inocente e que fui utilizada
naquela falcatrua maldita! (ouve abismada)
Laranja?
Eu? (escuta)
Escuta
aqui, minha filha: Me internaram como louca...(pausa)
Por que
eu permiti? Porque estava sofrendo muito com tudo o que aconteceu e não
sabia o que fazer! Você mesma disse que eu não prestava! Esqueceu? (pausa)
Ah! Isso não: Com tanto remédio que me deram e
convivendo com loucos, pouco a pouco eu fui ficando quase doida.(pausa
dramática)
Será que
eu não enlouqueci mesmo? Era o que eu começava a me perguntar. Isso durou
anos. Foi quando encontrei Juan (pausa, escuta)
Onde
mais podia ser? Numa clínica (pausa)
Em Barcelona... (escuta)
Juan agora é meu...meu...(procura uma palavra)
Não...ele é meu marido.
(escuta)
Não
ria de mim mais uma vez!(furiosa)... se me matarem ele entregará todas as
provas às autoridades competentes.
(falsamente
sonhadora) Juan me trouxe de volta a vida,
fez meu coração se aquecer novamente, me fez sentir que vale a pena viver , que
existem pessoas boas.(pausa)
Passamos um ano juntos e depois nos casamos, por insistência dele.(pausa, escuta)
Ele tem vinte e um anos. (pausa e deboche)
Velha
é você! De corpo e alma. (escuta)
Com
Juan eu consegui retomar minha carreira de estilista. (pausa)
Cúmplice?
Como assim? (apressa-se e tropeça no tapete, cai)
Não
desligue, me escute! Eles tentaram nos separar, Valquíria. Mas...minha
amiga(pausa)
Você
é sim minha amiga! Não diga que não é! O carinho que eu sinto por você ninguém
vai destruir, nunca! Eles bem que tentaram. Ninguém me aceitava porque minha
mãe era prostituta, e você me amparou nos momentos mais difíceis.(pausa,
espanto) até que aconteceu aquilo... eu nunca entendi bem porque você ficou
contra mim... mas eu lhe perdôo.(escuta)
Eu
fui enganada, até por ele! Pelo homem que eu amei, o homem para quem eu
entreguei minha vida, minha alma . Mas agora tenho provas...CDs, fitas,
gravações, papéis...documentos, alguns já foram entregues e na Quarta-feira de
cinzas eu ressurgirei como (pateticamente triunfal)... fênix!
Por
que eu escolhi um dia de carnaval para voltar? Sei lá. Eu queria rever o
carnaval do Recife. Foi isso.
Se
ainda amo César? Não. Não amo! (pausa)
Mas você também o amava, como eu, na época do
escândalo, ele também lhe usou . Não foi? (RI) César é muito envolvente e tem
um jeito especial para tratar as mulheres. Não é?(pausa)
Eu
sei que ele está ameaçado de morte por isso apressei o meu retorno (sinistra)
Você também se deixou envolver por César...
Tem muita coisa que você não sabe...eu fui...um brinquedo nas mãos dele, um brinquedo. Ele me abandonou na hora que eu fui
presa! Passei meses naquela cela imunda!
Eu
não queria mais viver e me sujeitei a tudo como um animal dócil, domesticado.
Eu comecei a ficar confusa. César parecia ter planejado tudo tão bem. Eu era como um peixe nas redes do poder. Você sabe,
vieram as eleições para governador e o patrocínio daquela empresa...era tanto
dinheiro, tantas festas, tanta gente envolvida. Eu era diferente de todos. Nem
fé eu tinha mais. Exatamente! (meio louca) Os músculos lacrimejavam, os olhos
na boca, o coração suava (respira fundo). Meu pensamento ficava pra frente e
pra trás no tempo, noites em brasa , dias gelados.
Eu
era a grande piada da cidade: Foi quando me tiraram de lá e me jogaram numa
clínica psiquiátrica. Eu , Celeste, a louca! (ri muito) A vaca louca! Eu tinha medo que eles me jogassem na cadeia de novo.
César me ameaçou e você sabe muito bem do que o César é capaz quando ele
quer... depois começaram a me jogar de uma clínica para outra pelo mundo afora.
Eles tiraram todo o dinheiro das minhas contas, falsificaram minha assinatura,
toda a falcatrua corria risco... eu era um perigo. (escuta)
Eu?
Nunca!
Você
faz mal juízo de mim... Primeiro: estou apenas querendo limpar meu nome nesta
cidade. Eu sou uma pessoa de luz. (pausa, olha para cima decepcionada)
Está
bem. Mais tarde a gente se fala. (Desliga o telefone. Fica um pouco ansiosa.
Deita-se. Pega o telefone. Larga. Pega e faz nova ligação. Silêncio)
César?
(pausa, respira fundo, escuta e faz várias expressões, resmunga)
Não
me venha com suas promessas! É melhor você medir muito bem o que faz de agora
em diante. É com o coração partido que eu vou entregar...ou melhor , entreguei,
você a polícia.
Seu
canalha! (chora)
Pensou
que tinha se livrado de mim. Não é?
O que você me ensinou, rapaz, é uma lição que eu vou esquecer.
Você
me paga! (pausa esbaforida, transtornada)
Você fez com que todos pensassem assim. Mas agora acabou!
Acabou!
(escuta)
Não tem dinheiro que me compre, César. (é interrompida)
Não
gaste o seu tempo em vão. Não temos mais nada a dizer um ao outro. Reconheça:
Você perdeu... nada disso importa agora. Eu não tenho medo de nada. Mesmo se
seus amigos me matassem isso só complicaria as coisas ainda mais! Aliás, é você
quem está ameaçado de morte por várias pessoas.(escuta proposta indecente)
Eu
sou comprometida. Casada. E amo meu marido. Juan é a melhor coisa da minha
vida. O que eu quero é limpar o meu nome e o da minha família . (pausa, ela
cede)
Me
ama? Eu sei o que é que você ama! (escuta os sussurros eróticos de César ao
telefone)
Você não presta! Pare!(respira fundo )
Pare...
(fica mais nervosa) E todas estas porcarias que você me fez passar? Eu não
posso simplesmente colocar um band-aid
e estancar isso...não posso. (pausa)
Aquele
monte de remédios que tive que engolir... aquelas clínicas na Europa...e se a
polícia do Brasil descobrisse que eu não era louca? Eu ia me lascar. Eu ia
parar na cadeia de novo...num presídio por crimes que não cometi. E ainda por
cima...onde está todo aquele dinheiro que estava depositado em meu nome? Cadê
todo aquele dinheiro, cadê? (escuta)
Eu
não sei. Eu estou tão confusa... (tira um revólver da bolsa)
Tudo
foi tão de repente. (pausa)
Nos
encontrarmos? (pausa) Onde? (aponta o revólver para a platéia)
Então
está certo. (pausa)
Talvez
não seja uma boa idéia. (busca cumplicidade da platéia)
Deixe-me
ver... (pausa)
Está
bem. Diga onde. (pausa)
Eu
estou indo. Até logo.
(desliga
o telefone)
Este
idiota! Não sabe o que o aguarda.
Recife Antigo: parede psicodélica
inspirado nas idéias de Alex
Antunes e José Emílio Rondeau
- Acordou a que horas?
-
Não dormi.
-
Pela cara chapada a Babilônia não está tão longe.
-
Menos
quantidade e mais distorção.
-
Charuto?
-
Carreiras,
bolas, aditivos químicos e orgânicos. È o momento cultural. Preciso soltar os
fantasmas, ter experiências profundas, olhar dentro da alma...
-
Por que
escolheu o Recife?
-
RecBeat,
multiculturalismo, doideira, experimentalismo. E principalmente porque a
revista está bancando tudo. Vou colocar seu nome nos créditos como co-autora do
texto, e tem aquela grana que eu já lhe disse.
-
Legal
-
Olhe essas
águas. Venha até aqui, esta cobertura é ótima. Não é? Quase 50 andares!Olhe os
rios.
-
Os rios que cortam o Recife fazem a diferença
geográfica da cidade que se situa numa planície fluviomarinha constituída por
ilhas, penínsulas e manguezais. O Capibaribe, o Beberibe, o Tejipió, o Jaboatão
e o Pirapama circulam na frente destas colinas em arco que vão de Olinda, ao
norte, até Prazeres, ao Sul. São 218,7 Km2: 67% morros, 23%
planícies e 10% de áreas aquáticas. Só 5% do Recife são de área verde.
-
Adoro
professores. Quer um tapinha?
-
Não. E aí?
Vamos ao Recife Antigo?
-
Vamos.
O chofer vai nos levar. “News paper taxis apear the shore, waiting to take you away, climb in
the back with your head in the clouds,and you´re gone with caleidoscopic
eyes...in the sky with diamonds...”
-
Nossa meu
cabelo está horrível...Ah, esses espelhos de elevadores. Ei! Como você está se
sentindo?
-
Mergulhando
no mangue. Êxtase, solidão,delícia e vazio
-
É difícil
distinguir onde começa a influência da droga na sua demência natural
-
São apenas
combustíveis para a mente...I am the walrus! I am the crabman
in Manguetown! Estou
me sentindo num videoclipe, numa história em quadrinhos, sei lá!
-
Recife
Antigo: aí vamos nós. Siga pela Rui Barbosa e pegue a rua do Príncipe de lá o
Santa Isabel e a rua Madre de Deus até o armazém 14 na beira do Cais...
-
Que dia
lindo...
-
Sabia que o
conjunto arquitetônico do Passo da Alfândega está se transformando num shopping
e um Centro Cultural?
-
Vai ser inaugurado logo?
-
Sim. E isso
inclui o prédio onde funcionava a casa de “diversão noturna” Chantecler.
-
Babado...
-
Vou te levar
até a Praça do Marco Zero. Atravessar de barco para conhecer o parque de
Esculturas de Francisco Brennand. Almoçar no restaurante que fica ali perto
mesmo, no dique: o Casa de Banhos, lugar em que se popularizou tal
atividade no início do século XX aqui na
cidade, onde as ondas arrebentam atrás, sobre os arrecifes. Uma paisagem
inesquecível num local histórico.
-
É. O “Recife
Antigo” merece um passeio a pé: começando pela ponte giratória, passando pela
Rua da Moeda...
-
Os boulevards,
a Praça do Arsenal da Marinha...
-
Preciso
tirar umas fotos do altar da igreja Madre de Deus para a revista.
-
Eu preciso
fotografar também no Recife Antigo o Teatro Apolo.
-
Ali perto tem a primeira Sinagoga das América
e uma antiga estação de trem, a do Pilar, no Brum, a “Cruz do Patrão”, onde os
escravos eram castigados antigamente.
-
Essa matéria
vai ficar bem legal. Eu quero algo que uma regra e sonho, razão e moção, dia e
noite. Tudo isso de maneira inquietante. Algo que expresse as forças obscuras
da alma do Recife Antigo e provoque a embriaguez dos sentidos. Por isso que eu
pedi a ajuda da cilibrina.
-
Cilibrina?
-
É do
negócio, do barato. Entendeu? Mas me diga. É fácil fotografar a tal Cruz do
Patrão?
-
Eu pensei
que precisaríamos de uma autorização ou de um guia turístico.
-
Por quê?
-
Porque o
lugar é meio entocado por trás dos depósitos. Mas eu liguei para o
Escritório de Revitalização do Bairro do Recife e eles disseram que não. Olha:
chegamos. Siga em frente. Vamos Parar no Marco Zero...
-
Olha essa
torre.
-
O pênis de
Brennand. Ela é oca e tem um pêndulo dentro.
-
Vamos logo
até a cruz do patrão?
-
Você é quem
manda. Moço: siga pela beira do cais em direção ao Brum.
-
Sabe? Eu
quero que nesta matéria fique bem clara a distinção, ou fusão, entre
coletivismo e individualismo neste bairro.
-
Brennand,
por exemplo, seria um bom eixo para esta análise, a maneira como ele trata o
sexo...a religião. Vamos deixar o carro aqui e seguir a pé. Or favor é por aqui
que a gente chega à cruz do patrão?
-
Não sei
informar. Peraí. Pedro! Onde é a cruz do patrão.
-
Sei não.
Jorge deve saber
-
Jorge
-
Diz alma
-
Onde é a
cruz do patrão?
-
É aquele negócio
ali no meio do mato.
-
Obrigada. E
aí vamos lá? Prepara a máquina.
-
Tá no ponto.
-
Quantos
ácidos você tomou?
-
Dois
-
Não está
vendo dragões coloridos? Como é o nome do tipo de porcaria?
-
É o
“bicicleta”: dietilamida, ácido lisérgico 25. Sintoma fundamental da
psicodelia: turbilhão mental.Minha cabeça está em festa. Sabia que agora
podemos comprar cogumelos alucinógenos, ayahuasca, peyote pela internet?
-
Que horror!
-
No site www.azarius.com
-
Azarius seu!
-
Mas isso é
besteira porque até pimentão vermelho cru mofado ou noz-moscada inteira dá
barato.
-
Você tem 22
anos e parece uma criança. Um Peter Pan.
-
Sorria,
Wendy. Peter vai tirar uma foto sua na terra do nunca.
-
Vamos.
Próximas paradas: estação do Brum e Torre Malakoff.
-
Siga em
frente.
-
A gente pode
subir na Torre?
-
Sim. Vamos
subir
-
Uau! O
visual é fantástico.
-
Você acha
mesmo que drogas...esse lance de desregramento...transar com um monte de
gente...conduz diretamente à criatividade?Ou a um desequilíbrio pessoal e à chatice
e decadência?
-
Veja o lance
da Jurema: os macumbeiros acreditam que por trás da planta há um elemento
sobrenatural. O babado é o uso sábio. Entendeu?O irracional está cansado de ser
reprimido.
-
Bom: aí está
o Teatro Apolo, do século XIX, lá atrás tem o Hermilo Borba Filho, centro
experimental. Uma foto da fachada? Pra que tantas?
-
O
caminho do excesso leva ao palácio da sabedoria. Let´s go.
-
Nesta rua
fica o Burburinho, um bar diferente.
-
Em quê?
-
Papo cabeça,
paredes na rua...aquelas coisas.
-
Não zombe
-
Olha aí a
Madre de Deus.
-
Vou
fotografar o altar.
-
Esta sua
máquina é ótima. Mas você está tremendo
-
Não é nada
demais. Olha só estas imagens. Parece que estão vivas. Parece que se movem. Que
cores mais absurdas.
-
E aí?
-
Pronto
-
Já? Só cinco
fotos?
-
Eu vou
voltar amanhã. E vou fotografar também a igreja do Pilar.
-
Ali fica A
Folha de Pernambuco. Pertinho da Rua da Moeda: olha onde era o Pina de
Copacabana. Fotografe. No meu ensaio eu falo sobre o Recbeat. Estou com fome.
Vamos ao Marco Zero. Atravessando ver o parque de esculturas no dique e um
restaurante diferente.
-
Por quanto o
senhor nos atravessa moço?
-
O catamarã é
de graça, dona. Oferta do restaurante...
-
Ótimo.
Vamos.
-
Como é o
nome deste... canal?
-
Isso é o rio
Capibaribe mais o Beberibe se ajuntando por aqui.
-
E o castelo
do primo dele? Do Brennand
-
Podemos ir
lá amanhã.
-
A gente pode
saltar aqui e ir andando pelo dique até o restaurante, moço?
-
Fale com o
guarda.
-
Tá bom
-
Menina que
visual! Faz tempo que eu não vinha aqui. Quanta coisa!
-
Tem gente
que não gosta
-
Ah! Má
vontade de recifense.
-
Aí está a
ilha do Recife.
-
Belíssima!
-
Um dado
inquietante você não pode deixar de citar na sua reportagem: uma das
comunidades mais pobres do Recife encontra-se na ilha: é a comunidade do Pilar,
onde moram antigos trabalhadores portuários ou da fábrica de biscoito, ou
famílias que foram marcadas pela zona de prostituição que fez “sucesso” no
Recife Antigo na primeira metade do século XX, essas pessoas hoje vivem na
miséria.
-
Eu vou
escrever assim: você está passeando, pelo Recife Antigo. Fique atento à uma
beleza rara. O Recife é amigável, mas não é tão doce quanto aparenta ao longe.
-
Também não
precisa queimar o filme. Não é?
-
Vamos ao
restaurante.
-
Vamos.
-
Quantas
esculturas.O que é isso?
-
Não percebe?
São os ovos de Brennand.
-
Lindos. Olha:
as ondas sobre os arrecifes. Esta matéria vai ficar ótima.
-
Sim. Agora
vamos comer, beber e eu vou te mostrar um belo pôr-do-sol.
-
Ah, Recife
Antigo és hoje para mim uma parede psicodélica.
Conto daninho
(texto
experimental)
Quase não conseguia conter-se. Foi até o computador. Estava num estado muito
complicado. Ligou a máquina e metralhou o texto: “Vou contar a todos vocês o
que me fez ir para São Paulo! Leiam o texto!MINHA IRMÃ QUEBRA MEU COMPUTADOR,
ME AMEAÇA DE MORTE E ME OFENDE. MINHA MÃE E MEU PAI ME DESTRATAM. Eu estava
morando na Boa Vista, mas fiquei desempregado e meu contrato do apartamento
havia encerrado. Voltei para casa da minha mãe. Mas só que minha mãe sempre foi
uma mãe muito grossa, me insultava, me desvalorizava, gostava de discutir,
bater boca comigo e ter implicâncias. Isso desde a minha infância, mesmo antes
de eu me assumir como gay.
Mas depois que ela se amigou com uma cara que é um gigolô safado, que era muito pobre e viu na minha mãe uma maneira
de se dar bem na vida, ela ficou pior. Ele é 13 anos mais novo que minha mãe e
é um interesseiro. Esse cara está
desempregado e quando encerrar o seguro desemprego dele minha mãe vai
sustentá-lo. Ele já ganhava uma merreca e minha mãe era que arcava com a
maioria na casa! Então quando cheguei lá, minha mãe tava pior que antes! Tudo o
que eu falava ela me destratava, falava com ignorância, querendo discutir,
bater boca por nada. Tentei por 9 dias ser muito forte e ter jogo de cintura! Aí
no dia 11/12, 9 dias depois da minha chegada, minha mãe viu que eu peguei o
telefone para fazer uma ligação e ela implicou dizendo que eu desligasse que
ela ia fazer uma ligação. Eu disse a ela que já tava terminando, mas mesmo
assim, para implicar, ela entrou na linha pela extensão e ficou discutindo
comigo e eu disse que ela tava invadindo minha privacidade e que ela
desligasse, mas ela não desligou. Então continuei a conversa com meu amigo e
estávamos falando de coisas íntimas de sexo entre homossexuais.
Minha mãe ouvindo, me insultou dizendo que isso era uma nojeira e ficou implicando. Ela desligou o telefone da tomada! Para
colocar minha irmã e meu pai contra mim, minha mãe ligou para minha irmã e
disse a ela que eu tinha ofendido ela pois ela não gostou de ouvir o que eu
estava falando no telefone sobre sexo homossexual e que ela se sentiu ofendida
e que tinha ido desmaiada para o Hospital por isso.Ela inventou tudo, pois ela
não desmaiou e nem foi para hospital. Bom, ela invade minha privacidade e se
ouviu minha conversa o problema é dela, ela ouviu porque quis. No outro dia,
minha irmã chega manifestada em casa querendo brigar comigo e me bater sem
querer conversar, me ameaça de morte, diz que vai contratar um matador para me
matar, me difama me chamando de frango, veado etc, e ela entrou no meu quarto e
quebrou o meu computador! Fui na delegacia, pois não ia ficar no prejuízo e nem
deixar ser difamado e ameaçado de morte e prestei uma queixa e minha irmã foi
intimada.E meu pai envenenado por minha mãe achou que eu tava fazendo confusão
na casa da minha mãe. Ele não quis me ouvir, pois eu que fui a vítima, afinal
eu só fiz uma ligação, e minha mãe invadiu minha privacidade e inventou várias
coisas para fazer confusão!Meu pai foi muito grosso e disse que ia me expulsar
de casa e eu disse que isso só se a justiça permitisse! Tanto minha irmã como
meu pai deveria ter me ouvido, mas não quiseram conversar e sim foram grossos e
ignorantes comigo! Meu pai falou que me odiava e eu disse que o odiava também,
pois ele nunca foi um pai de verdade, nunca me deu amor, carinho, afeto, nunca
foi um pai presente. E eu disse que eu odiava minha mãe, porque ela nunca foi
uma mãe de verdade e que também odiava minha irmã, pois ela nunca foi uma irmã
de verdade. Então decidi ir embora para São Paulo para viver minha vida,
trabalhar, me formar. Pois vi que na hora que precisei de ajuda, pois estava
desempregado; minha mãe, meu pai e minha irmã me maltrataram. Depois que decidi
ir para São Paulo, então fiz um acordo com meu pai, para ele pagar o prejuízo
do computador, que eu retiraria a queixa. Ele pagou o prejuízo e retirei a
queixa contra os absurdos da minha irmã, para ir embora e estar bem longe
dessas pessoas que para mim estão mortas. Não tenho mais família porque eu não
os considero mais, pois eles nunca foram uma de verdade e para mim eles estão
mortos!Etnia:hispânico/latino;religião:Tenho um lado espiritual independente de
religiões;humor:extrovertido/extravagante, inteligente/sagaz; orientação
sexual:?fumo:não bebo:não; animais de estimação:gosto de animais de estimação; moro:com
meus pais; cidade natal:Recife;cidade:Jaboatão;estado:Pernambuco;
país:Brasil”

Janeiro londrino (Conto de Moisés Neto)
Londres, janeiro de 2014
Cara Ruthinha,
Desculpe
não ter escrito antes, mas tudo foi tão repentino que, confesso, fiquei
horrorizado. A imagem da mulher que amei (enquanto estava com ela eu não
sabia), morta daquele modo bárbaro, a impossibilidade de tê- la novamente em
meus braços, a maneira covarde como os amigos se omitiram, tudo isso somado a
uma falta de fé cada vez maior, quase me levou à loucura. Você deve estar
estranhando um email em vez de um telefonema. Eu havia jurado evitar qualquer
narrativa escrita. Prometi abandonar de vez a porra da literatura. Mas aí está,
bem na sua frente: meu primeiro desabafo depois da maior dor da minha vida
(ainda dói). A traição dela foi uma coisa tão perfeita que até agora me
pergunto como pude ser tão idiota e não prever que ela estava alimentando
aquele menino, dando roupas, tratando dos dentes dele e dando dinheiro porque
precisava de um novo corpo para sugar e se manter "jovem". Acredite,
quando vi o rapazinho no nosso apartamento - quando fui concretizar que a
estava abandonando para sempre - eu até achei bom que aquela bruxa tivesse
arranjado nova vítima e me deixado em "paz". Não imaginava a espécie
de feitiço que me aguardava nem imaginei que aquele boy fosse matá-la.
Pobrezinha. Tinha 51 anos, mas era como se tivesse começando a viver naquele
momento, tal era a vitalidade dos gestos - que até hoje debatem- se na minha
memória desde que fugi do Recife e vim para cá. Sei que perdi dinheiro com a
venda do apartamento. Mas, somando tudo, tenho grana para passar dois anos sem
trabalhar, penso em fazer mestrado, você sabe. As coisas são mais fáceis do que
pensávamos. Tem também aquele lance de passar seis meses no Tibet. Mas aqui
estou para pesquisa de pós-doutorado nesta cidade sombria. Perdoe-me a
espontaneidade irônica de sempre. É, estou estudando o problema da
sexualidade como uma coisa política, ontológica (ser enquanto ser), trato de
desmontar arquétipos e de destruir a dominação do poder enquanto este se
confunde como identidade sexual de gênero, entende? Quero combater tudo que
oprima as singularidades humanas que não se encaixem como adequadas ou
corretas, odeio esta coisa bipolar expressa na heterossexualidade. Ninguém
nasce homem, você torna-se homem, sexualidade não é uma verdade
essencial, temos que desmistificar o sexo e o gênero que tanto interferem nas
relações entre sujeito e sociedade, cujas regras só funcionam através do
discurso e cada vez menos pessoas sabem interpretar discursos! Quero neste caso
questionar o sentido do verbo ser quando se trata de sexo (homo ou hétero e até
categorias fora das significações, tantas experiências silenciadas entre os
corpos e a linguagem!). O amigo, com quem estou dividindo as despesas de uma
casa aqui na Inglaterra , ensina Literatura e tem contatos que você nem
imagina. Temos conversado muito. Ele é budista, é tudo tão surpreendente e tão
possível que eu, de certa forma, estou superando esta minha maldita ansiedade e
encontrando um caminho para recompor meu coração e ensiná-lo a ser feliz
novamente neste cenário londrino. Tenho ido a todos os lugares bem
interessantes. E o Recife, como está? Saudades terríveis desse
lugarzinho manguebeatnik, do bolo de rolo, pamonha, tapioca, rios
pontes & overdrives, dessa lama toda, miséria metafísica concretizada numa
expansão murcha e dolorida do feudo hightech; alma de camelô e
veneno de sinhozinho cretino-sifilítico-oportunista (não tem Suape nem Parque
industrial de Goiana que dê jeito! Tem sotaques novos na cidade, não é? Seremos
cosmopolitas um dia?) e sinhá inculta; que falta me fazem os tubarões do nosso
litoral! Escravos gozando, urinando, defecando, gritando, batendo palma e
escutando som alto (cadê meu espetinho?) no meio da rua num frenesi
carnavalesco que só o pernambucano conhece e que expressa nossa
danação-maracatu-pós-atômico; E Olinda? Vou parar porque pode bater
melancolia pior do que a de Lars Von Trier! Do que os versos de Cláudio Assis,
do que os cangaceiros do Baile Perfumado. Olha: um cheiro na
Daniela Câmara, diz que achei legal a participação dela no filme O som
ao redor. Dá um beijo ou melhor um abraço nessa corda de caranguejos que eu
A-M-O. Gostou do meu balanço esquizoanalítico? Estou tão pior! Um abraço, do
seu doutor favorito, moisesneto.
POSFÁCIO
Minha
escrita é essencialmente dialógica, se choca com
qualquer monologismo , faz críticas aos
costumes vigentes e atinge a intratabilidade na sua busca radical. Não admite
concessão, nem cumplicidade. Quer partejar o real embutido, disperso em tempo e
discurso. Faz-se sátira, paródia, para
tornar patente o ser. Atinge os nódulos. Não é feita para ser adulada; para
ganhar dinheiro. Cava seu espaço na mídia é busca pessoal, terrorista,
libertina, masturbatória, de compreensão e interferência na existência, é
dialógica, fragmentar, polidimensional, hipertextual (na forma e
conteúdo). Organiza o que está disperso
no confronto de idéias, no conflito das multiplicidades, nos devires da virtualidade.
Faz-se flexível, mutável, interpenetra os gêneros: presença com o riso é
paródia e paranóia que não teme o grotesco nem as limitações espacio-temporais,
da história, observa a dimensão jornalística do imediato(livre do convencional
memorialismo) : não se quer verossimil ataca até a si mesma.Não se deixa
atingir pelo bairrismo. Reordena, usa o palimpsesto, a técnica cinematográfica,
pós-surreal-cubista-futurista, é interferência e substituição, reorganização
virótica. Mistura fala, substitui elementos, desdobra o que está dobrado e dobra
o desdobrado. Condensa, exagera,
desloca, permuta, monta, corta, separa, une, junta planos, reestrutura cenas,
cria continuações nos vazios, esvazia os cheios, corta e recompõe em colagens
visíveis e invisíveis e o novo sentido é construído em tempo reordenado nas
pontes do novo texto com outros, texto sobre texto em escreviver. Viola
discursos . É inoportuno desmascaramento,
profanação, desrespeito, contrastes brusquidão, gêneros intercalados,
multiplicidade de estilos, perfuração de limites tornando a estabilidade
relativa onde tudo é levado ao extremo . Parodia os tons opressores levando-os
até seu limite, contradicções,
temporalidades viciadas, câncer. É encontro com a própria consciência, com
outras na luta contra crenças, desejos, naturalizações, explorações,
humilhações pois quer clara consciência. Ironia aí, não é jogo
engraçado e sutil, porém demolição. Não é catarse, espiritualidade, mas
expressão do turvo, equívoco, doloroso , quer a revolta em vez do pastoreio.
Exibe o escravo, a escravidão, as explorações, os preconceitos Execra as
monofonias recusa a aquiescência, a passividade, é incômoda. Não tem partido,
sua razão é contra todos. Não tolera vencidos ou vencedores na sua ácida cólera
, indignação, ataque aos racionais e irracionais, direitas e esquerdas,
modernistas e anti-modernos, comunistas e capitalistas, nazistas e
anti-nazistas, negros e brancos, judeus e árabes, homens e mulheres, amigos e
inimigos, teístas e ateus, pós-modernistas e nacionalistas. Nessa mistura de
sério com cômico atinge representação literária de estados psíquicos
intrigantes num sensualismo que zomba
maliciosamente dos ridículos do mundo.
Tem função corrosiva de busca radical da verdade Não quer se acostumar
com as negociações, arranjos, dribles, acertos, os ideais dos senhores, o que
eles gostam, querem, desejam, sonham. Não quer comungar com o ridículo. Não
teme ofender ninguém e demonstra autonomia, liberdade. Vai além do nacionalista
quando reconhece a máscara dos senhores, dentes dos senhores. E não rir pra eles,
não faz parte dos que ficam parados suspirando nas trevas, coniventes com a
opressão. Quer o instante instaurador como eixo. (Moisés Neto
PS: E aí, Moisés!
Li teu livro hoje de manhã. Dá pra ver a influência do teatro e de escritores
"malditos" no livro todo.
Gostei muito dos contos. Especialmente o segundo. Quem foi Daniel? Existiu
mesmo?
Além disso, esse conto é muito importante pra minha pesquisa. Me fez dar ainda
maior relevo ao papel dos beats no manguebeat.
Obrigado pelo presente!
Abraço,
André Telles
2008/9/17,
André Telles
SUMÁRIO
POEMAS
Teus Olhos .......................................................................... 17
Lobos ................................................................................... 18
Canto Liso ........................................................................... 19
Um Momento que se Perde .................................................. 21
Medula ................................................................................. 22
Tarântula .............................................................................. 23
Plenitude .............................................................................. 24
Licor .................................................................................... 25
Tarde Quente,
Verão & Coca-Cola ...................................... 26
A Mais Doce
Alucinação ...................................................... 28
Nirvana ................................................................................ 30
Platina .................................................................................. 31
Dois Corpos ......................................................................... 32
Imagem Noturna .................................................................. 33
Sem Gente/ A
casa do holandês .......................................... 37
Furta – Cor .......................................................................... 38
Para Dormir no
Escuro ........................................................ 39
Mormaço ............................................................................. 40
Blues..................................................................................... 41
Heaven ................................................................................. 42
Vagão – I ............................................................................. 43
Imagem do
Silêncio .............................................................. 44
O
Resto é Mentira (Tango Final) .......................................... 45
Revolução ............................................................................ 47
Recife ................................................................................... 50
Balada no Janga .................................................................... 67
Passagem .............................................................................. 73
Conhecer a
Verdade ............................................................. 77
Desaparece o Sol na Minha Janela ........................................ 79
Gato Preto em Céu Azul ...................................................... 80
Novela ................................................................................. 81
Roma ................................................................................... 83
O Sopro ............................................................................... 87
Ode ao Livro ........................................................................ 88
Agnus Castus ....................................................................... 91
Balé Bouganville
................................................................... 92
Qual o Sentido de Ser Feliz? ................................................. 93
Arrecife
................................................................................ 94
Sete Faces Para o Amor ....................................................... 95
Detectada (Misteriosa Fonte) ............................................... 97
Poemas de Minas Gerais ...................................................... 98
Mundo Deserto de Pais ...................................................... 101
Reveillon 1 ......................................................................... 103
A
Hora e o Lugar ............................................................... 104
JMB, Foucault & O Jaguar ................................................. 107
Oração Para Invocar Lucila ................................................ 110
Balada com Conceição Camarotti ....................................... 117
Poemanisfestomoisesneto
.................................................. 119
Woodstock, hoje
.....................................................120
Ágata
....................................................................121
A
busca..................................................................122
Matei o sujeito.........................................................123
Néctar.....................................................................124
Balada
recifense..........................................................125
La Negra acena dúbia despedida...................................... 126
Feriado romano:
bis...........................................................127
Aí está você
.......................................................................128
O que dizer do
tempo?.......................................................129
Cibele
................................................................................130
A hora do
amor..................................................................131
Copenhague
2009..............................................................132
Meu
bem............................................................................133
Neo-
nômade......................................................................134
Espelho da
lembrança........................................................135
Intraduzível........................................................................136
A tapioqueira e o
minotauro..............................................137
Pescadores.........................................................................138
Sementes do
amanhã.........................................................139
Pantomima.........................................................................139
Milagre de
carnaval...........................................................140
Evoé!..................................................................................141
Domingo............................................................................142
Sexto
sentido.....................................................................142
Outono...............................................................................142
Presente do
passado...........................................................142
Parabéns, minha cidade.....................................
As
violetas da Taylor..............................................
Outro
país..........................................................................142
Epifania............................................................................142
Fátima...............................................................................142
Musa.................................................................................142
Sortilégio..........................................................................142
Aliança.............................................................................
Suave manhã de
outubro................................................
A mulher
ninguém...........................................................
O templo, das
horas..........................................................
Festa imprevista:
somos todos artistas........................
Marginal
Capibaribe.......................
Amor
complicado....................................
Lutando com um
anjo...............................
O pequeno teatro invisível.........................
O Provocador Cordial...........................
Luz......................................
Escola Dominical.............................
Canção
para Geninha ...................
Poeminhas
Um e Dois......................................
Rap
Recife.................................
Pré-Natal..........................
Diamante doido de
amor..............
Agarrados.........................................
Afetos foliões............................
Carnavalesco....................
Nosso amor
animal...
Nelson Rodrigues
faz cem anos.................
Agridoce.........................
Os atores....
Onze horas.....
O esplendor..................
O poema.............
Driblando o tempo............
Atlântico flamejante........
Lingual.....................
Lingual
(versão B)........
A unha
de Dalila...............................
Poeminha sem
esperança........................
Antiface...................
Literatura.............
Contraluz..........................
Carne humana....................
Jogo
cigano..............
Dormir..........
Clube de
inverno........
Lembrança
suja......
De outro
modo..................
Tempo de não pensar em mim.....................
Poema para Norma Benguell.............
Poeminha de moisesneto: sonhando com janis joplin:...
Mandela, corpo e alma...
Haikaizinho.................
Essa mordida.........
Poemazinho para todas..................
Poemazinho dô´je............
Ostra.......
CARNE DE OSTRA...............
CONTOS
O Cão mais feio do mundo não
deixará descendentes......143
Bonita ................................................................................ 144
MANGUEBEATNIK ....................................................... 145
Os últimos dias do Recife ................................................... 153
Cai o
pano..........................................................................154
O caso de
celeste................................................................156
Recife, parede
psicodélica..................................................158
Conto daninho...................................
Janeiro londrino.....................