O escritor e
jornalista Raimundo Carrero escreve sobre ANJOS
DE FOGO E GELO no SUPLEMENTO CULTURAL DO DIÁRIO OFICIAL do Governo do
Estado de Pernambuco (Editado pela CEPE em Setembro de 2008):
Cena da montagem pernambucana d peça de Moisés monteiro de melo Neto sobre o relacionamento de Rimbaud e Verlaine, poeatas franceses do século XIX
SOBRE O AMOR MAGOADO
(O escritor e jornalista Raimundo Carrero escreve sobre ANJOS DE FOGO E GELO no SUPLEMENTO CULTURAL DO DIÁRIO OFICIAL do Governo do Estado de Pernambuco (Editado pela CEPE em Setembro de 2008)
(O escritor e jornalista Raimundo Carrero escreve sobre ANJOS DE FOGO E GELO no SUPLEMENTO CULTURAL DO DIÁRIO OFICIAL do Governo do Estado de Pernambuco (Editado pela CEPE em Setembro de 2008)
O que mais importa na
arte: o artista ou a obra? A pergunta nem sempre tem resposta
segura. Em princípio pode-se dizer, simplesmente, a arte. O que seria o ideal, claro. Mas nem sempre é assim. Há
vidas que superam o objeto
artístico e se impõem pela forma,
pela qualidade. Pela
loucura, talvez. E há casos em que arte e artista se
confundem tanto, que uma coisa jamais será
separada da outra. É o caso das vidas de Rimbaud e Verlaine? Ou seria mais apropriado dizer das duas em uma só?
Os
dois se transformaram em símbolos do amor gay,
embora cheios de violência, sofrimento e dor. E não somente para
eles; também para as esposas e, lógico,
para os parentes e amigos. E é justamente para refletir sobre essa turbulência que está
em cartaz, no Teatro Barreto Júnior, a peça “Anjos
de fogo e gelo”, de Moisés Neto.
Um
texto exigente naquilo que a peça de teatro tem de
mais significativo: o condicionante
humano no tratamento do mundo
gay. Algo que provoca sempre
divergências profundas e gestos desmesurados. É claro que não é atributo
apenas de pessoas do mesmo sexo. As
atribuições estão em todos. Mas, no caso especial dos dois, que também geraram
obras de artes extraordinárias, a paixão e a convivência causariam, como causaram,
muitas inquietações.
Basta
lembrar o tiro que Verlaine deu em
Rimbaud, na Bélgica, e que por isso teve de pagar pena de prisão.
É claro que o tratamento agressivo pode ocorrer entre casais os mais diversos,
do mesmo sexo ou não. Violência não tem
particularidade. O efeito da luta, porém, recebe hábil tratamento no texto do
experimentado Moisés Neto, através de referências e alusões. Até porque um tema que começa a entrar na
infalível lista do lugar-comum é a
violência.
A
arte contemporânea terá que superar esse
impasse – seria mesmo um impasse? – de tratar o sexo e a violência em todas as
manifestações artísticas. Sobretudo no caso do amor entre pessoas do mesmo
sexo. É algo que está beirando o óbvio e, por isso mesmo, precisa ser
repensado. O sexo ainda causaria, mesmo, estranhamento artístico? É um elemento artístico de qualidade? Ou ainda provoca escândalo e,por ser
escandaloso, geraria o fator artístico? É o caminho?
Uma das questões da contemporaneidade,
em que a violência e o sexo estão terrivelmente presentes, precisa receber
outro tratamento, que não seja apenas pela beleza ou pelo escândalo.
No
entanto, o que mais se ressalta no texto
de Moisés Monteiro de Melo Neto é o equilíbrio cênico, o que também é um atributo do
diretor. Dentro de um cenário leve, também com ótimo equilíbrio de luz, pode-se
acreditar, sinceramente, naqueles dois seres dilacerados.
[quanto
às personagens Vitalie e Mathilde] Trabalhando este lado mais inquietante do
drama teatral que, no entanto, não tem nada de teatral – na origem são (a mãe de Arthur e a esposa de Paul são) duas
mulheres que se debatem entre a dor e o
amor. E nada mais intranqüilo do que o amor magoado. O amor que se debate
entre o choro e o soluço.
Jornal do Commercio
ARTES CÊNICAS
Ato, do Magiluth, é a zebra do Janeiro
Publicado em 05.02.2009
Ato, do Magiluth, é a zebra do Janeiro
Publicado em 05.02.2009
Peça feita com apenas R$ 3 mil desbancou Rasif e Anjos
de fogo e gelo e levou troféu Melhor Espetáculo em cerimônia da Apacepe
Com o ator Bobby Mergulhão como mestre-de-cerimônias e interpretando uma de suas mais famosas personagens, Dona Verinha, a cerimônia de premiação dos melhores do Janeiro de Grandes Espetáculos, na noite da terça, foi um verdadeiro festival de prêmios. Trinta e nove estatuetas foram entregues aos indicados, sendo a mais disputada entregue ao grupo Magiluth, que levou o troféu de melhor espetáculo (eleito pela comissão julgadora) com Ato, desbancando o favoritismo de Rasif e a arrasa-quarteirão Anjos de fogo e gelo. O resultado surpreendeu os integrantes do grupo, uma das revelações do cenário artístico local dos últimos anos. Ato foi realizada com um orçamento baixíssimo (principalmente em relação a Rasif e Anjos..): R$ 3 mil. A peça levou ainda levou o prêmio Melhor Figurino, conquistado por Júlia Fontes.
Com o ator Bobby Mergulhão como mestre-de-cerimônias e interpretando uma de suas mais famosas personagens, Dona Verinha, a cerimônia de premiação dos melhores do Janeiro de Grandes Espetáculos, na noite da terça, foi um verdadeiro festival de prêmios. Trinta e nove estatuetas foram entregues aos indicados, sendo a mais disputada entregue ao grupo Magiluth, que levou o troféu de melhor espetáculo (eleito pela comissão julgadora) com Ato, desbancando o favoritismo de Rasif e a arrasa-quarteirão Anjos de fogo e gelo. O resultado surpreendeu os integrantes do grupo, uma das revelações do cenário artístico local dos últimos anos. Ato foi realizada com um orçamento baixíssimo (principalmente em relação a Rasif e Anjos..): R$ 3 mil. A peça levou ainda levou o prêmio Melhor Figurino, conquistado por Júlia Fontes.
Jornal do Commercio
Destaques
do Janeiro são premiadosPublicado em 03.02.2009
O
15º Janeiro de Grandes Espetáculos entrega hoje o troféu Apacepe de Teatro e
Dança para os destaques do festival. A cerimônia, que acontece às 19h, no Teatro
de Santa Isabel, é aberta ao público.
As peças
indicadas ao prêmio de melhor espetáculo
adulto são: Anjos de fogo e gelo, Ato e Rasif. A árvore de Julia,
Historinhas de dentro e Outra vez, era uma vez concorrem ao prêmio de melhor
espetáculo de teatro infantil. Enquanto que, na categoria dança, Tempo
fragmentado e Imagens não explodidas disputam a preferência do júri.
Jornal do Commercio. 1 fev 2009»
ENTREVISTA
A ATRIZ DE ANJOS
DE FOGO E GELO
PERSONA/STELLA
MARIS
Entre o palco, o jornalismo
Publicado em 01.02.2009
Entre o palco, o jornalismo
Publicado em 01.02.2009
Dentro de uma rotina corrida e estressante, Stella
Maris, que há cerca de 20 anos estava afastada dos palcos, encontrou na arte o
equilíbrio necessário para enfrentar o dia a dia. Integrando o elenco de Anjos
de fogo e gelo, ela planeja para 2009 uma turnê pelas capitais nordestinas.
Apaixonada pelo teatro e pelos livros, Stella conta à repórter Manuella Antunes
sua trajetória no jornalismo, na vida e no tablado.
JC – Há quanto tempo não fazia teatro?
JC – Há quanto tempo não fazia teatro?
STELLA MARIS
– Voltei para os palcos depois de 20 anos. Nesse meio tempo, fiz duas Paixões
de Cristo, mas nenhum espetáculo de temporada no teatro convencional.
JC – Qual o
motivo de ter parado?
STELLA MARIS
– Na época, houve uma mudança no cenário local, pois fazer teatro é caro e difícil.
Aliado a isso, minha vida como jornalista engolia meu tempo. Todo ano eu dizia
que voltaria a atuar, mas não conseguia.
JC – E qual
o motivo da retomada?
STELLA MARIS
– Faltou equilíbrio na minha vida. O jornalismo é comunicação acima de tudo. E
o teatro é a criação e estava em falta com o exercício criativo, ficou difícil
até respirar. Tinha que voltar, surgiu o convite para Anjos de fogo e gelo e
aceitei na hora.
JC – Como
você descreve sua relação com o teatro?
STELLA MARIS
– Depois de nove espetáculos e duas Paixões de Cristo, posso dizer que, antes
de tudo, sou uma apaixonada pelo teatro.
JC – Qual
desses espetáculos é a menina dos seus olhos?
STELLA MARIS
– Os fuzis da Senhora Carrar. Foi uma
montagem belíssima onde, com 18 anos, interpretei uma mulher de 40. Era época
de ditadura no Brasil e a peça pôde, com metafóras, discutir o regime.
JC –
Professora, jornalista e atriz. Como administra tudo?
STELLA MARIS
– Trouxe a rotina da televisão para minha vida. Priorizo o que é mais
importante e faço cada minuto render o máximo.
JC – Quando
consegue parar, o que gosta de fazer?
STELLA MARIS
– Sou apaixonada por literatura. Perto da cama, tenho um pilha de livros e,
sempre que tenho tempo, pego um deles. Ler é a primeira coisa que faço quando acordo,
antes do dia começar.
JC – E o
teatro em 2009?
STELLA MARIS
– Começaremos uma turnê que, inicialmente, passará pelas principais capitais do
Nordeste.J
Foram três semanas intensas para organizadores,
técnicos, júri, diretores e atores. E público, claro, parte fundamental para
a manutenção e desenvolvimento do Janeiro de Grandes Espetáculos, cuja 15ª
edição encerra nesse fim de semana. Hoje, no Santa Isabel, a ousada história
de amor dos poetas Arthur Rimbaud e Paul Verlaine ganha o palco com “Anjos de
Fogo e Gelo”.
O espetáculo coloca em cena momentos decisivos da
vida dos dois poetas; a crise do casamento de Verlaine, a incompreensão da
mãe de Rimbaud com relacionamento. A apresentação é às 21h. Já no Teatro
Apolo, às 19h, Ivaldo Mendonça em Grupo apresenta “Tempo Fragmento”,
espetáculo de dança contemporânea.
Amanhã, último dia da maratona, é dia de rever
“Rasif - Mar Que Arrebenta”, do Coletivo Angu de Teatro. Baseada no livro
homônimo de Marcelino Freire, a peça traduz em linguagem cênica doze contos
que revelam as fissuras do tecido social brasileiro contemporâneo.
Personagens obscuros se cruzam com figuras cômicas para traduzir emoções e
dissabores.“Rasif” está no Teatro Hermilo Borba Filho, às 19h.
Também no sábado o publico vai poder assistir de
novo “As Andanças do Divino”(às 21h, no Santa Isabel), do Balé Popular do
Recife. O espetáculo celebra os 30 anos da companhia, completados ano
passado, unindo teatro e dança em cima da história de um mamulengueiro que
sai do Sertão rumo ao litoral. E fechando a programação infantil,
“Historinhas de Dentro” (às 16h30, no Barreto Junior), do Grupo de Teatro
Quadro de Cena, narra a trajetória de uma menina que descobre, numa viagem ao
interior do seu corpo, um grande circo. Os ingressos para os espetáculos no
Santa Isabel custam R$ 15 e R$ 7,50. Demais teatros, R$ 10 e R$ 5.
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FOLHA
DE PERNAMBUCO. CADERNO PROGRAMA.
PÁGINA 5 EM 04/11/2008.
Teatro nordestino pede paradaem São Paulo
A programação é variada, e vai até o dia 3
de dezembro.
Teatro nordestino pede parada
A
Talles Colatino
Não soa estranho que São Paulo seja a maior
cidade nordestina do País. E para exercer uma proximidade ainda maior entre a
região e a metrópole, tem início hoje, lá na terra do céu cinza, a Mostra
Paulista do Teatro Nordestino. Até o dia 3 de dezembro, uma série de atividades
gratuitas relacionadas à produção teatral da região ocupa o Centro Cultural
Banco do Brasil (CCBB) e o Centro Cultural São Paulo (CCSP), incluindo peças,
leituras dramáticas e demonstrações de trabalho. A mostra também recebe a 6ª
Semana do Teatro Nordestino, reunindo dramaturgos de São Paulo e do Nordeste em
mesas de debates e lançamentos de livros.
O fato de abrir as portas de dois dos mais
importantes centros culturais do País (o CCBB e o CCSP) à Dramaturgia
Nordestina é um ato de reconhecimento do valor de autores e de criadores
cênicos, abundantes nessa região, que tornam o Brasil um dos lugares do planeta
onde o teatro está mais vivo do que nunca. Se o evento conseguir abrir um pouco
mais o diálogo entre Nordeste e Sudeste, em meio às luzes e às sombras da cena,
terá cumprido importante papel”, afirma Sebastião
Milaré, curador da Mostra.
As quatro montagens selecionadas para se
apresentar no evento homenageiam o pesquisador e dramaturgo alagoano Altimar
Pimentel, falecido esse ano. Pimentel é autor de “A Construção”, uma das peças
emblemáticas do final dos anos 60, encenada em 1969, pelo Grupo A Comuna,
de Amir Haddad, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. De autoria do
dramaturgo, a mostra traz ao palco “Como Nasce um Cabra da Peste”, com a
companhia paraibana Agitada Gang.
Pernambuco vai representado pela companhia
Arte-em-Cena, com seu já clássico “Deus Danado”. “Lesados” (CE) e Sinhá Flor
(PB) completam o time de espetáculos.
SEMANA
Como parte da programação da Mostra, pela primeira vez São Paulo é palco da Semana do Teatro Nordestino, evento que acontece anualmente em Natal (RN) desde 2003, por iniciativa da Associação dos Dramaturgos do Nordeste. A programação da Semana inclui lançamento de livros e palestras com dramaturgos nordestinos e paulistas. “A idéia principal foi dar acesso aos criadores cênicos paulistas, aos estudiosos e ao público interessado de São Paulo a obras dramatúrgicas produzidas no Nordeste. Essa idéia ia ao encontro da proposta básica da Associação de Dramaturgos do Nordeste, que é difundir essa produção dramatúrgica”, conta Sebastião Milaré, mediador das mesas.
Como parte da programação da Mostra, pela primeira vez São Paulo é palco da Semana do Teatro Nordestino, evento que acontece anualmente em Natal (RN) desde 2003, por iniciativa da Associação dos Dramaturgos do Nordeste. A programação da Semana inclui lançamento de livros e palestras com dramaturgos nordestinos e paulistas. “A idéia principal foi dar acesso aos criadores cênicos paulistas, aos estudiosos e ao público interessado de São Paulo a obras dramatúrgicas produzidas no Nordeste. Essa idéia ia ao encontro da proposta básica da Associação de Dramaturgos do Nordeste, que é difundir essa produção dramatúrgica”, conta Sebastião Milaré, mediador das mesas.
Para as palestras, os dramaturgos convidados são: Cleise Furtado Mendes
(BA); Oswald Barroso, José Maria Mapurunga, Rafael Martins, Yuri Yamamoto (CE);
Tácito Borralho (MA); Eliézer Rolim, Elpídio Navarro, Paulo Vieira, Celly
Albuquerque (PB); João Denys(autor de “Deus Danado”), Moisés Neto (autor de “Anjos de
Fogo e Gelo”), Romildo Moreira (PE);
Ací Campelo (PI); Racine Santos, Paulo Dumaresq (RN); Lindolfo Amaral (SE);
Luis Alberto de Abreu, Márcio Aurélio e Newton Moreno (SP). Lá, toda a
programação é gratuita.
» BARRETO JÚNIOR
Anjos de fogo e geloem
DVD
Publicado em 31.10.2008
Anjos de fogo e gelo
Publicado
A apresentação de
Anjos de fogo e gelo de amanhã tem sabor especial. A peça, que traz o polêmico
relacionamento entre os poetas Rimbaud e Verlaine, foi gravada em um DVD que é lançado
amanhã. Com cinqüenta e cinco minutos de duração e legendas em francês e
inglês, o material traz depoimentos do elenco e do diretor da peça, José
Francisco. O plano de direção e os desafios enfrentados pela produção para
montagem do espetáculo são comentados ali. A peça está em cartaz no Teatro
Barreto Júnior, sábados e domingos às 20h.
ANJOS DE FOGO E DE GELO
Saturday, October 11, 2008
O CICLISTA vai ao teatro
O ator Rogério Bravo, mui generosamente, me franqueou entradas para o espetáculo ANJOS DE FOGO E GELO. Confesso que temi – não pelo Rogério, que é um ator sensível e competente, mas pela onda (eterna, meu Deus!) de “travestismo” que ocupa os palcos recifenses; ando tão cansado do exagero, de atores berrando abobrinhas...
Mas encontrei um elenco afinado, uma luz que funciona, marcações perfeitas, um figurino impecável – destaque para Rogério Bravo, que dá conta de um personagem difícil, e a atuação poderosa de Stella Maris Saldanha – que sequer aparece no cartaz - a todo momento roubando a cena – sua mão, delicadamente dobrando o vestido ao descer do palco, é a mão de uma mulher do século XIX. “Deus está no detalhe”, reza o ditado alemão. A atuação dos grandes atores, também.
Vão ver o quanto antes, porque o teatro, meus queridos, é fugaz como a vida e não está para os indecisos.
Sábado, 13 de Setembro de 2008
ANGES
DE FLAMME ET DE GLACE - Pièce de théâtre
"[...] L'arrivée de Rimbaud en enfer".
"Rimbaud : La lune blanche luit dans le bois. De chaque branche part une voix sous la ramée… Ô bien-aimée ! L’étang reflète, profond miroir, la silhouette du saule noir où le vent pleure… Rêvons, c’est l’heure. Un vaste et tendre apaisement semble descendre du firmament que l’astre irise…"
"Rimbaud : La lune blanche luit dans le bois. De chaque branche part une voix sous la ramée… Ô bien-aimée ! L’étang reflète, profond miroir, la silhouette du saule noir où le vent pleure… Rêvons, c’est l’heure. Un vaste et tendre apaisement semble descendre du firmament que l’astre irise…"
Verlaine: Pâle étoile du matin, tourne devers le poète [...]".*
Sempre foi dito que tanto ao dramaturgo quanto ao poeta se deve consentir liberdade de espírito e de texto e Moisés Neto, autor da peça Anjos de Fogo e Gelo, usou e abusou dessa liberdade.
A fala inicial, transcrita acima, é um
trecho do magistral “La Lune Blanche ”,
do poema “La Bonne Chanson ”,
de Paul Verlaine, colocado na boca de Arthur Rimbaud, no que o autor imaginou
ser o momento da chegada do poeta ao inferno e com o qual inicia a descrição de
parte da vida e da obra de Rimbaud, ambas patrimônios da humanidade. No dia 30
de agosto passado fui ao Recife, entre outras coisas para assistir, como
convidado, à estréia da peça referida acima e, confesso, não me arrependi. Revi
amigos que não encontrava há muito tempo, refleti, debaixo de uma árvore do
fruta-pão toda florida, a respeito dos Rimbauds, Verlaines, Mathildes e
Vitalies existentes em cada um de nós e fiquei feliz com o que o diretor de
“Anjos de Fogo e Gelo”, o consagrado José Francisco Filho, conseguiu fazer com o bizarro
texto colocado em suas mãos. Trabalho muito difícil, tenho a certeza.
O texto, como podem deduzir da abertura, é um coletânea não só de poemas de Rimbaud, mas também de alguns de Verlaine, juntamente com uma descrição livre, feita pelo autor, de fatos da vida dos dois, inseridos para facilitar a compreensão dos assistentes. Os poemas também foram livremente adaptados à prosa, tentando tornar o texto mais perceptível.
O texto, como podem deduzir da abertura, é um coletânea não só de poemas de Rimbaud, mas também de alguns de Verlaine, juntamente com uma descrição livre, feita pelo autor, de fatos da vida dos dois, inseridos para facilitar a compreensão dos assistentes. Os poemas também foram livremente adaptados à prosa, tentando tornar o texto mais perceptível.
Se o resultado está sendo
conseguido, deixo a resposta ao público e à crítica.
O diretor, esse sim, deve ter feito das “tripas coração” para prender a platéia - como de fato prende - durante a quase uma hora de duração da peça, já que Rimbaud, o poeta, é denso e Arthur, o homem, complexo demais, para serem - poeta e homem - facilmente compreendidos pelo público do meu querido Recife, nem sempre aberto à poesia, ao teatro ou a comportamentos humanos. De minha parte, ainda que não sendo crítico teatral, captei uma certa insegurança dos protagonistas masculinos, bastante natural em estréias impactantes, talvez fruto do natural receio da reação que o texto e as marcas poderiam gerar nos assistentes. Receio desnecessário, ao menos naquela estréia. Considero um dos destaques da peça - não sei se fruto do texto criado pelo autor, se do trabalho do diretor - a força das duas mulheres presentes no palco: Vitalie, mãe de Arthur Rimbaud e Mathilde, mulher de Paul Verlaine, que conseguem ser protagonistas de uma narrativa na qual seriam coadjuvantes. Mathilde, numa excelente interpretação de Stela Maris Saldanha, conduz linearmente todo o texto, tornando-se no elo de ligação entre as narrativas. Graças à atriz, o texto ficou bem mais fácil para os leigos. Vitalie, também muito bem interpretada, transforma em momentos de comicidade a dispensável maldade que lhe tentaram atribuir. Discordo, data venia, de quem pensou mostrar Vitalie Rimbaud como um mulher amarga, ambiciosa e cruel na relação com o filho.
O diretor, esse sim, deve ter feito das “tripas coração” para prender a platéia - como de fato prende - durante a quase uma hora de duração da peça, já que Rimbaud, o poeta, é denso e Arthur, o homem, complexo demais, para serem - poeta e homem - facilmente compreendidos pelo público do meu querido Recife, nem sempre aberto à poesia, ao teatro ou a comportamentos humanos. De minha parte, ainda que não sendo crítico teatral, captei uma certa insegurança dos protagonistas masculinos, bastante natural em estréias impactantes, talvez fruto do natural receio da reação que o texto e as marcas poderiam gerar nos assistentes. Receio desnecessário, ao menos naquela estréia. Considero um dos destaques da peça - não sei se fruto do texto criado pelo autor, se do trabalho do diretor - a força das duas mulheres presentes no palco: Vitalie, mãe de Arthur Rimbaud e Mathilde, mulher de Paul Verlaine, que conseguem ser protagonistas de uma narrativa na qual seriam coadjuvantes. Mathilde, numa excelente interpretação de Stela Maris Saldanha, conduz linearmente todo o texto, tornando-se no elo de ligação entre as narrativas. Graças à atriz, o texto ficou bem mais fácil para os leigos. Vitalie, também muito bem interpretada, transforma em momentos de comicidade a dispensável maldade que lhe tentaram atribuir. Discordo, data venia, de quem pensou mostrar Vitalie Rimbaud como um mulher amarga, ambiciosa e cruel na relação com o filho.
Vitalie era uma mulher da burguesia rural do
interior da França na época de Napoleão III, no rígido século XIX, e o filho
era um gênio, que poderia ter nascido em qualquer lugar ou em qualquer época.
Impossível, portanto, para uma mulher comum como Vitalie, entender as
idiossincrasias de Arthur sem as criticar, aceitar e conviver com os seus atos
sem se magoar, sem os recriminar. Daí, porém, a ser uma mãe sem amor, só
interessada, anos mais tarde, nos lucros nascentes de Le bateau Ivre e dos demais poemas,
eu não concordo. Ainda bem que Ivonete Melo conseguiu minimizar (mostrando
ingenuidade) a suposta ambição de Vitalie Rimbaud. A música (muitíssimo bem
escolhida) e a iluminação completam o texto e a direção. Parabéns ao autor, ao
diretor, aos quatro atores e a toda a equipe, que estão levando ao Recife um
momento mágico da vida de pessoas mágicas, em um espetáculo que poderá alçar
vôos ainda mais altos.
Aos que estejam no Recife e leiam esta postagem, sugiro que vão ao teatro Barreto Júnior e apreciem o espetáculo, pois vale a pena sim senhor.
Por puro diletantismo, para matar o tempo, resolvi colocar na língua mãe
dos quatro personagens o texto de Moisés Neto, tarefa difícil devido ao "melting pot textual" que
ele é, mas tenho me distraído bastante e o “trabalho” contribuído para que
possa melhor conhecer a obra dos dois poetas. O título em francês - Anges de Flamme et de Glace
- não é meu, mas emprestado de Arthur Rimbaud, mesmo assim, por se tratar da
versão em outro idioma de uma obra teatral, é bom estar registrado (na versão
em francês, é claro), para evitar constrangimentos ulteriores.
____________
Captado
em 5-out-2008
http://lugardosouto1.blogspot.com/2008/09/anges-de-flamme-et-de-glace-rimbaud.html
Poetas e amantes, Paul Verlaine e Arthur Rimbaud estão tendo suas vidas encenadas em Anjos de fogo e gelo. A peça estreou sábado (30), às 20h, no Teatro Barreto Júnior, e conta com a participação da professora do curso de Jornalismo da Católica Stella Maris Saldanha, no papel de Mathilde, esposa de Verlaine. A direção do espetáculo é de José Francisco Filho, ex-integrante do Teatro da Universidade Católica de Pernambuco (Tucap).
Na fase liderada por José Francisco Filho e
Carlos Borba, entre 1973 e 1975, o Tucap se tornou um dos melhores grupos de
teatro amador de Pernambuco, conquistando mais de 30 prêmios. Durante a sua
trajetória no grupo, que durou até 1984, José Francisco Filho dirigiu as
montagens Torturas de um coração (1972), A revolta dos brinquedos (1972),
Prometeu acorrentado (1973), Os escolhidos (1974), A barca d’ajuda (1975) e A
farsa do Mestre Pathelin (1984).
O retorno aos palcos da professora Stella Maris
também era aguardado com expectativa.“Volto para o teatro depois de muitos anos
de ausência. Nesse intervalo, que começou no final dos anos 80, interpretei
Maria por duas vezes na Paixão de Cristo de Nova Jerusalém, mas não atuei por
nenhuma temporada maior”, contou Stella Maris.
O espetáculo Anjos de fogo e gelo retrata o
período no qual Verlaine, poeta já renomado, convida Rimbaud para morar com ele
e sua mulher, Mathilde. A peça mostra momentos decisivos da vida dos dois
poetas, a partir da cumplicidade e da paixão entre eles. A crise no casamento
de Verlaine, a incompreensão da mãe de Rimbaud e reprovação da sociedade
francesa diante do amor entre os poetas são alguns dos temas abordados.
Dono de uma poesia lírica e singular, Paul
Verlaine se casou com Mathilde Mauté de Fleurville numa tentativa de
acomodar-se a uma vida familiar. Mas tudo mudou quando o poeta conheceu
Jean-Nicolas-Arthur Rimbaud, jovem que o fascinava e se tornou seu amante.
Rimbaud começou a escrever poemas quando tinha apenas 12 anos e aos 19 deu por
encerrada sua obra literária. Precoce e cheio de inquietações, o poeta
desenvolveu uma obra incomum, densa e delicada. Admirador de Verlaine, em 1871
Rimbaud escreveu sua primeira carta para aquele que seria seu maior
companheiro.
A união dos poetas causou uma mágoa profunda em
Mathilde, a esposa traída, levando Verlaine a se afastar de Rimbaud.
Hostilizados pelo meio intelectual francês, Verlaine e Rimbaud se aventuraram
pela Europa, numa viagem na qual escreveram poemas que modificaram para sempre
a poesia ocidental. De volta ao continente europeu, Verlaine
trabalhou em "Romances sem Palavras",
enquanto Rimbaud publicou "Uma temporada no inferno". Depois de
várias rupturas e reconciliações, em 1873, Verlaine deu um tiro de pistola em
Rimbaud, em Bruxelas.
A montagem Anjos de fogo e gelo tem texto de Moisés Neto e atuações de George
Meireles, Roger Bravo, Stella Maris Saldanha e Ivonete Melo. O espetáculo fica
em cartaz no Teatro Barreto Júnior até o dia 16 de novembro, aos sábados e
domingos, sempre às 20h.
Em busca do tom
Escrito por Alexandre Figueirôa
O espetáculo Anjos
de fogo e gelo não chega a ser a redenção de uma cena na qual as comédias de
gosto duvidoso dão o tom, mas nos faz ver que nem tudo está perdido
Um espetáculo para marcar múltiplos retornos. Assim é Anjos de fogo e gelo, peça em cartaz até novembro no Teatro Barreto Júnior. Ela assinala a reabertura, devidamente reformada, de uma das poucas salas municipais exclusivas para as artes cênicas no Recife. Traz de volta, também, um encenador – José Francisco –, que andava afastado dos palcos; uma atriz – Stella Maris Saldanha –, cuja carreira ficou adormecida pela necessidade de enfrentar a ribalta do jornalismo; um autor – Moisés Neto –, que afirma ter voltado à adolescência de leitor voraz de poemas de Rimbaud; e, ainda, um tema, cuja mística enfeitiça o Ocidente e já inspirou outras tantas peças, filmes e livros: a turbulenta relação entre os poetas Arthur Rimbaud e Paul Verlaine, no final do século 19, na França.
Um espetáculo para marcar múltiplos retornos. Assim é Anjos de fogo e gelo, peça em cartaz até novembro no Teatro Barreto Júnior. Ela assinala a reabertura, devidamente reformada, de uma das poucas salas municipais exclusivas para as artes cênicas no Recife. Traz de volta, também, um encenador – José Francisco –, que andava afastado dos palcos; uma atriz – Stella Maris Saldanha –, cuja carreira ficou adormecida pela necessidade de enfrentar a ribalta do jornalismo; um autor – Moisés Neto –, que afirma ter voltado à adolescência de leitor voraz de poemas de Rimbaud; e, ainda, um tema, cuja mística enfeitiça o Ocidente e já inspirou outras tantas peças, filmes e livros: a turbulenta relação entre os poetas Arthur Rimbaud e Paul Verlaine, no final do século 19, na França.
Numa cidade onde as comédias de gosto duvidoso dão o tom, não deixa de
ser animador ver mais um grupo de pessoas se debruçar sobre um projeto teatral
que tenta escapar das fórmulas previsíveis do humor fácil e afirmar: o teatro
pernambucano permanece vivo. Por isso acho ser obrigação da crítica não baixar
a voz e, mais uma vez, buscar estabelecer um diálogo sereno e propositivo com
esta cena que resiste. Na troca de impressões, talvez consigamos recuperar um
espaço que, infelizmente, vem sendo ocupado, cada vez mais, pelas manifestações
artísticas massivas onde qualidade e apuro estético pouco importam.
Isto não significa que Anjos de fogo e gelo consiga ser a redenção de tantos conflitos, mas nos faz ver que nem tudo está perdido. Em primeiro lugar, é preciso ressaltar o cuidado da produção, equilibrando os recursos materiais disponíveis a partir de uma coerente articulação entre a proposta de encenação e os elementos cenográficos. No figurino, predominam as cores marrom e bege e, junto com a iluminação, em tom amarelo cobre, temos a impressão de que folheamos as páginas envelhecidas de um livro esquecido na estante. As plataformas por onde circulam os atores, com degraus decorados com sinais de escrita, também conseguem dar unidade ao drama que se desenrola diante do espectador e funcionam de forma precisa como elementos para definição do jogo dramático proposto.
Isto não significa que Anjos de fogo e gelo consiga ser a redenção de tantos conflitos, mas nos faz ver que nem tudo está perdido. Em primeiro lugar, é preciso ressaltar o cuidado da produção, equilibrando os recursos materiais disponíveis a partir de uma coerente articulação entre a proposta de encenação e os elementos cenográficos. No figurino, predominam as cores marrom e bege e, junto com a iluminação, em tom amarelo cobre, temos a impressão de que folheamos as páginas envelhecidas de um livro esquecido na estante. As plataformas por onde circulam os atores, com degraus decorados com sinais de escrita, também conseguem dar unidade ao drama que se desenrola diante do espectador e funcionam de forma precisa como elementos para definição do jogo dramático proposto.
Alex Alencar, na sua
coluna do JC, Caderno C
Publicado em 26.09.2008:
Publicado em 26.09.2008:
Não diria que o relacionamento homo tornou-se
algo absolutamente natural. Pela evolução no mundo, pelas propostas das novas
religiões, bem poderosas, ou de novas maneiras de acreditar e ter fé num Deus.
As várias igrejas que partem de um país e vão atravessando pacificamente outras
fronteiras mudaram as idéias e posicionamentos. A liberdade e os novos direitos
que surgiram permitiram que atrizes famosas, ou pessoas com elevado nível
social e financeiro, até militares tomaram a decisão de posar para fotos de jornais
confessando que são do mesmo sexo mas que se amam. Atitude forte. Claro que
muitos não aceitam, mas que fiquem apenas com seu direito. Não persigam, não
matem nem maltratem aqueles que fizeram a opção. Tenho um DVD que narra o
relacionamento amoroso de dois dos maiores poetas franceses em toda história da
literatura francesa, são Arthur Rimbaud e Paul Verlaine. No filme quem
interpretou Rimbaud foi Leonardo De Caprio, que vem se revelando bom ator, o
Verlaine teve como intérprete um ator francês. Não vou comentar o filme. Mas a
história amorosa e dramática dos dois poetas está sendo representada no teatro
Barreto Júnior aos sábados e domingos com o título de Anjos de fogo e gelo,
dirigido por José Francisco. Tenho ouvido muitos depoimentos sobre a peça. Vera
Brandão achou colossal, e tem bom gosto. O tema é insólito, mas deve ser visto.
O escritor e jornalista Raimundo
Carrero escreve sobre ANJOS DE FOGO E
GELO no SUPLEMENTO CULTURAL DO DIÁRIO OFICIAL do Governo do Estado de
Pernambuco (Editado pela CEPE em Setembro de 2008):
SOBRE O AMOR MAGOADO
O
que mais importa na arte: o artista ou a obra?
A pergunta nem sempre tem resposta segura. Em
princípio pode-se dizer,
simplesmente, a arte. O que seria
o ideal, claro. Mas nem sempre é assim. Há
vidas que superam o objeto
artístico e se impõem pela forma,
pela qualidade. Pela
loucura, talvez. E há casos em que arte e artista se
confundem tanto, que uma coisa jamais
será separada da outra. É o caso das vidas de Rimbaud e Verlaine? Ou seria mais apropriado dizer das duas em uma só?
Os dois se transformaram em símbolos do amor gay,
embora cheios de violência, sofrimento e dor. E não somente para
eles; também para as esposas e, lógico,
para os parentes e amigos. E é justamente para refletir sobre essa turbulência que está
em cartaz, no Teatro Barreto Júnior, a peça “Anjos
de fogo e gelo”, de Moisés
Neto, som e direção de José
Francisco. Um espetáculo difícil,
que exige o máximo do elenco,
sobretudo de George Meireles e Roger Bravo.
Além da natural e óbvia
responsabilidade de encarnarem personagens-símbolos de toda uma geração e de
toda uma época, enfrentam um texto
exigente naquilo que a peça de teatro tem de
mais significativo: o condicionante
humano no tratamento do mundo
gay. Algo que provoca sempre
divergências profundas e gestos desmesurados. É claro que não é atributo
apenas de pessoas do mesmo sexo. As
atribuições estão em todos.
Mas , no caso especial dos dois, que também geraram obras de artes extraordinárias, a paixão e a
convivência causariam, como
causaram, muitas inquietações.
Basta lembrar o tiro
que Verlaine deu em Rimbaud, na Bélgica,
e que por isso TVE de pagar pena de prisão. É claro que o tratamento
agressivo pode ocorrer entre casais os mais diversos, do mesmo sexo ou
não. Violência não tem
particularidade. O efeito da luta, porém, recebe hábil tratamento no texto do
experimentado Moisés Neto, através de referências e alusões. Até porque um tema que começa a entrar na
infalível lista do lugar-comum é a
violência.
A direção da peça
não conseguiu evitar outro lugar-comum da arte contemporânea: as cenas de sexo. A arte contemporânea
terá que superar esse impasse – seria
mesmo um impasse? – de tratar o sexo e a violência em todas as manifestações
artísticas. Sobretudo no caso do amor entre pessoas do mesmo sexo. É algo que
está beirando o óbvio e, por isso mesmo, precisa ser repensado. O sexo ainda
causaria, mesmo, estranhamento artístico?
É um elemento artístico de qualidade?
Ou ainda provoca escândalo e,por ser escandaloso, geraria o fator artístico? É o caminho?
Uma das questões da contemporaneidade,
em que a violência e o sexo estão terrivelmente presentes, precisa
receber outro tratamento, que não seja apenas pela beleza ou pelo escândalo.
No entanto, o que mais se ressalta no texto de Moisés
Neto é o equilíbrio cênico, o que também é um atributo do diretor. Dentro
de um cenário leve, também com ótimo equilíbrio de luz, pode-se acreditar,
sinceramente, naqueles dois seres dilacerados, na pele de George Meireles e
Roger Bravo, sem esquecer as duas atrizes Stella Maris e Ivonete Melo. As duas,
aliás, fazia tempo que não pisavam no
palco. E estão ótimas. Seguras, firmes.
Trabalhando este lado mais inquietante do drama teatral que, no entanto, não
tem nada de teatral – na origem são duas
mulheres que se debatem entre a dor e o
amor. E nada mais intranqüilo do que o amor magoado. O amor que se debate
entre o choro e o soluço.
JORNAL DO COMMERCIO:
Anjos e fogo e gelo grava DVD no Barreto
Publicado no CADERNO C em 19.09.2008
Publicado no CADERNO C em 19.09.2008
Iniciando a quarta
semana de exibição, Anjos de fogo e gelo, peça que mostra o conturbado
relacionamento entre os poetas franceses Rimbaud e Verlaine, será gravada em
DVD amanhã, às 20h, no Teatro Barreto Júnior. Quatro câmeras captarão as
imagens e microfones direcionais serão instalados nas coxias do teatro
garantindo a qualidade do som. O DVD será legendado em inglês e francês. O
material será usado também para divulgar o espetáculo nos principais festivais
cênicos do País. Com texto de Moisés Neto e direção de José Francisco Filho, a
peça traz George Meireles (Verlaine), Roger Bravo (Rimbaud) Stella Maris
Saldanha (Mathilde) e Ivonete Melo (Vitalie). O ingresso custa R$ 20, inteira,
e R$ 10 (estudante).
JORNAL DO COMMERCIO
Coluna social
DIA-A-DIA. Segunda-feira, 01/09/08:
Estréia de sucesso: Arrebentou a estréia da peça Anjos de fogo e
gelo, no Barreto Júnior, sábado. O teatro teve lotação esgotada, com direito a
muitos conhecidos na platéia. Por lá: Turíbio e Zezinho Santos, Carlos Trevi,
Paula Ribeiro... que gravaram depoimentos sobre a peça. Detalhe: para o
espetáculo de ontem, mais de 100 ingressos já haviam sido vendidos até a noite
de sábado.
Publicado no DIÁRIO DE PERNAMBUCO
Em 01.09.08
Rimbaud e Verlaine:
Para o diretor José Francisco Filho, fazer teatro é como andar de bicicleta. Você pode passar anos sem ter contato com o palco, mas quando decide retornar, esta volta transcorre naturalmente. A julgar pela interpretação do elenco de Anjos de fogo e gelo, que fez sua estréia neste final de semana, no Teatro Barreto Júnior, o diretor tem razão. Quatro atores estão em cena - Roger Bravo, George Meireles, Stella Maris Saldanha e Ivonete Melo.Os três últimos não encaravam os espectadores numa peça adulta há anos e defenderam com dignidade seus papéis.
Apesar da atuação correta e da produção impecável, a história do amor conturbado entre os poetas Paul Verlaine (George Meireles) e Arthur Rimbaud (Roger Bravo),
O texto, de autoria de Moisés Neto, também evita o caminho mais fácil ao apenas pincelar os fatos mais conhecidos do relacionamento tempestuoso dos poetas. Os dois tiros que Verlaine deu em Rimbaud, e que o levaram a ficar um ano e meio numa prisão da Bélgica, são apenas citados, ficando tudo nas entrelinhas.
A questão da homossexualidade também poderia ser tratada com menos pudores. Na segunda cena da peça, quando Verlaine e Rimbaud ficam nus e fazem sexo, o palco fica quase na penumbra. Eles atingem o clímax e, instantes depois, já estão discutindo novamente, como se nada de importante tivesse acontecido. Verlaine corre para vestir a roupa de baixo, como se ficasse envergonhado do próprio corpo. Nota dez para os figurinos e adereços de época criados por Aníbal Santiago e para o cenário de Marcondes Lima, com várias escadarias e plataformas de madeira por onde o quarteto se movimenta.
Extremamente pontuais em relação ao teatro local, que costuma atrasar em até meia hora o início de uma peça, Anjos de fogo e gelo começou às 20h05 do último sábado. A platéia do Barreto Júnior estava abarrotada de gente e quem chegou por último precisou se acomodar nos corredores laterais, ficando em pé, enconstado nas paredes. Ao contrário de outras ocasiões, porém, o elenco não agradeceu formalmente à presença do público, nem aproveitou a oportunidade para explicar até quando ficariam
Em seguida, as luzes do palco se apagaram e o público começou a deixar a sala. A platéia, aliás, continua mal-educada: os celulares tocaram repetidas vezes durante a encenação. Quem comparecer à temporada, que continua até meados de novembro, aos sábados e domingos, às 20h, pode adquirir o programa da peça junto com um brinde - um CD com poesias de Rimbaud e Verlaine- por R$ 5.
ESTRÉIA: Poesia e erotismo em lavagem de roupa
suja
Publicado no JORNAL DO COMMERCIO em 01.09.2008
Publicado no JORNAL DO COMMERCIO em 01.09.2008
Marcos Toledo
mtoledo@jc.com.br
O público recifense lotou o recém-reaberto
Teatro Barreto Júnior, no Pina, anteontem, para conferir a estréia de Anjos de
fogo e gelo, espetáculo dirigido por José Francisco a partir de texto de Moisés
Neto. Apesar do zunzunzum gerado pela polêmica em torno do tema, a relação
amorosa entre os poetas franceses Rimbaud e Verlaine, a peça, com menos de uma
hora de duração, contém apenas uma seqüência de erotismo (a programação visual
do material de divulgação pode gerar expectativa) e foca mais na tensão do
triângulo amoroso formado pelo par central e a esposa de Verlaine, Mathilde.
Mesmo quando não há figurino em cena, Anjos de
fogo e gelo é uma grande lavagem de roupa suja entre os personagens supracitados
e a mãe de Rimbaud, Vitalie. Bem-escolhidos, os atores encarnam bem os papéis
aos quais foram destinados: Roger Bravo, na pele do jovem, arrogante e
desmedido Rimbaud, George Meireles, como o inseguro Verlaine, Stela Maris
encarnando a preterida e rancorosa Mathilde, e Ivonete Melo como a mãe
amargurada Vitalie, responsável por algumas das falas mais engraçadas da peça.
Apesar da tensão da estréia, e até pela larga
experiência dos profissionais envolvidos, o espetáculo se saiu bem em sua
primeira apresentação. O texto, porém, tem uma particularidade: mescla momentos
históricos de uma maneira paradidática, mas necessária, com citações poéticas e
diálogos de conflito dos personagens. Há contudo, um certo desequilíbrio entre
os momentos de mágoa – mais fortes –, os românticos e os líricos.
Em um cenário bem bolado, que segue uma
tendência prática e funcional, o elenco destila os dilemas dos personagens se
movimentando de forma bem coreografada que deixa o trabalho mais dinâmico. A
boa trilha sonora e o belo figurino de época completam os pontos fortes da peça que, tecnicamente, coloca-se acima
da média da produção local.
DIÁRIO DE PERNAMBUCO
Quinta-feira- 28.08.08
O amor conturbado de Rimbaud e
Verlaine
por Tatiana Meira
Estréia // Anjos de
fogo e gelo inicia temporada sábado no Teatro Barreto Júnior e quebra o jejum
dos atores George Meireles, Stella Maris Saldanha e Ivonete Melo, que estavam
distantes dos palcos
Tatiana Meira // Diário: tmeira@diariodepernambuco.com.br
Tatiana Meira // Diário: tmeira@diariodepernambuco.com.br
Quando assistiu à montagem carioca Pólvora e poesia, sobre o
relacionamento tempestuoso entre os poetas Paul Verlaine e Arthur Rimbaud,
George Meireles gostou do resultado, mas sentiu falta de um enfoque maior na
obra dos artistas cujo romance conturbado movimentou os cafés parisienses no
final do século 19. A
vontade de interpretar este drama amoroso que gerou polêmica acabou tornando
irrecusável o convite feito ao ator - há uma década longe da ribalta - pelo
diretor José Francisco Filho e pelo
escritor Moisés Neto, autor do texto
original de Anjos de fogo e gelo. A
estréia do espetáculo será neste sábado, no Teatro Barreto Júnior, no Pina, com
temporada até 16 de novembro, sempre aos sábados e domingos, às 20h. "A
poesia é a forma do texto, que assume um formato diferente, o que me instigou
muito", destaca George.
Foto: Renato Filho/Divulgação |
Com uma trama enxuta,
de 55 minutos, Anjos de fogo e gelo relata a história dos dois poetas, vividos
por George Meireles (que faz
Verlaine em dois momentos, aos 27 e aos 60 anos) e Roger Bravo (Rimbaud), etambém marca a volta à cena das atrizes Stella Maris Saldanha (a aristocrata
Mathilde Mauté de Fleurville, que viu seu casamento de dois anos com Verlaine
ser esfacelado quando ele se interessou por Rimbaud) e Ivonete Melo (na pele de Vitalie, a mãe de Rimbaud). "O quinto
ator é a luz, que faz com que o público se reporte aos atores e aos planos e
escadarias onde se realiza a ação", diz o diretor José Francisco Filho.
Ele explica que os cenários de tom expressionista criados por Marcondes Lima contrastam com os figurinos rebuscados de época pensados por Aníbal Santiago, numa reconstituição rigorosa da indumentária do final do século19. A trilha sonora erudita
proposta por Fernando Lobo, a
maquiagem de Henrique Melo e a
direção de arte de Renato Filho
também ajudam a dar o tom naturalista da montagem, onde os atores foram orientados
a economizar nos gestos e na voz e a focar a interpretação nas expressões
faciais. "Todo o trabalho é fruto de muita pesquisa, do cuidado com os
fatos históricos, para conseguir passar ao público a vida e a obra de Verlaine
e Rimbaud", pontua o diretor.
Stella Maris Saldanha está muito emocionada com este retorno aos palcos. "Tenho uma relação muito visceral com o teatro, mas estava sem atuar desde o final da década de 1980, embora tenha participado duas vezes da Paixão de Cristo de Nova Jerusalém", recorda Stella. Para ela, Mathilde tem um papel estratégico no triângulo amoroso que acaba formando com Verlaine e Rimbaud, experimentando um processo de muito sofrimento. "Ela fica amargurada, magoada, pois é surpreendida por esta relação tempestuosa, até que a dor fica insuportável", explica. A atriz afirma que também está feliz por perceber um "burburinho", uma chama que se acende novamente na cena teatral pernambucana. "Já fomos a terceira capital em produção teatral no país, atrás apenas do Rio e de São Paulo. Temos um movimento muito generoso na música e no cinema, mas no teatro esta palidez ainda está se desfazendo".
Na opinião de Roger Bravo, os oito meses transcorridos entre a leitura do texto e os ensaios vêm sendo bastante intensos. "É um mergulho no desconhecido, uma experiência libertadora, sem fórmulas a seguir", diz Roger, que fica praticamente o tempo todo em cena como Rimbaud, o que exige um alto nível de concentração.
George Meireles acredita que participar de Anjos de fogo e gelo é ainda mais provocador porque o ambiente é simples e não restam "muletas" para apoiar a interpretação do elenco. "É mais difícil, porque somos levados a passar a alma do personagem", revela George, que havia feito a promessa de só voltar ao teatro com uma peça de conteúdo denso, que possa desafiar o público.
Serviço
Anjos de fogo e gelo
Ele explica que os cenários de tom expressionista criados por Marcondes Lima contrastam com os figurinos rebuscados de época pensados por Aníbal Santiago, numa reconstituição rigorosa da indumentária do final do século
Stella Maris Saldanha está muito emocionada com este retorno aos palcos. "Tenho uma relação muito visceral com o teatro, mas estava sem atuar desde o final da década de 1980, embora tenha participado duas vezes da Paixão de Cristo de Nova Jerusalém", recorda Stella. Para ela, Mathilde tem um papel estratégico no triângulo amoroso que acaba formando com Verlaine e Rimbaud, experimentando um processo de muito sofrimento. "Ela fica amargurada, magoada, pois é surpreendida por esta relação tempestuosa, até que a dor fica insuportável", explica. A atriz afirma que também está feliz por perceber um "burburinho", uma chama que se acende novamente na cena teatral pernambucana. "Já fomos a terceira capital em produção teatral no país, atrás apenas do Rio e de São Paulo. Temos um movimento muito generoso na música e no cinema, mas no teatro esta palidez ainda está se desfazendo".
Na opinião de Roger Bravo, os oito meses transcorridos entre a leitura do texto e os ensaios vêm sendo bastante intensos. "É um mergulho no desconhecido, uma experiência libertadora, sem fórmulas a seguir", diz Roger, que fica praticamente o tempo todo em cena como Rimbaud, o que exige um alto nível de concentração.
George Meireles acredita que participar de Anjos de fogo e gelo é ainda mais provocador porque o ambiente é simples e não restam "muletas" para apoiar a interpretação do elenco. "É mais difícil, porque somos levados a passar a alma do personagem", revela George, que havia feito a promessa de só voltar ao teatro com uma peça de conteúdo denso, que possa desafiar o público.
Serviço
Anjos de fogo e gelo
Direção de
José Francisco Filho
Onde: Teatro Barreto Júnior (Rua Jeremias Bastos, Pina)
Quando: Estréia sábado, às 20h. Em cartaz aos sábados e domingos, às 20h, até 16 de novembro
Quanto: R$ 20 e R$ 10 (meia-entrada)
José Francisco Filho
Onde: Teatro Barreto Júnior (Rua Jeremias Bastos, Pina)
Quando: Estréia sábado, às 20h. Em cartaz aos sábados e domingos, às 20h, até 16 de novembro
Quanto: R$ 20 e R$ 10 (meia-entrada)
Diario de
Pernambuco - PE
29/08/2008 - 07:32
29/08/2008 - 07:32
Paixão visceral embalada pela poesia
Amor de Arthur Rimbaud e Paul Verlaine é tema da peça Anjos de fogo e gelo, que estréia no Barreto Júnior
Amor de Arthur Rimbaud e Paul Verlaine é tema da peça Anjos de fogo e gelo, que estréia no Barreto Júnior
Tatiana Meira
Um paralelo entre a vida e a obra poética de Paul Verlaine e Arthur Rimbaud, mostrando as influências mútuas entre os dois poetas, ajuda a compor o enredo de Anjos de fogo e gelo, peça que estréia sábado, às 20h, no Barreto Júnior, no Pina. Além de trazer para o teatro a trajetória pessoal e artística de Anjos de fogo e gelo dois ícones da literatura francesa do século 19, o espetáculo conseguiu reunir no mesmo elenco atores que estavam afastados dos palcos há vários anos, como George Meireles (que vive Verlaine), Stella Maris Saldanha (que estava longe das artes cênicas desde o final da década de 1980) e Ivonete Melo. Também faz parte deste time Roger Bravo, que interpreta Rimbaud.
Dirigido por José Francisco Filho e baseado no texto escrito por Moisés Monteiro de Melo Neto, Anjos de fogo e gelo opta por abordar a paixão avassaladora entre Verlaine e Rimbaud, para discutir uma relação amorosa que poderia acontecer independentemente do sexo. No lugar de uma narrativa convencional, são as poesias que costuram os diálogos, onde os atores foram orientados a seguir um gestual minimalista, para ressaltar a força da interpretação individual. "Sabíamos da responsabilidade do projeto e nos dedicamos a ele com uma entrega visceral", garante George Meireles.
Os cenários foram criados por Marcondes Lima, os figurinos são assinados por Aníbal Santiago - que também estava há anos sem trabalhar na composição de figurinos teatrais -, a trilha sonora é de Fernando Lobo e a maquiagem, de Henrique Melo. A peça ficará em cartaz aos sábados e domingos, às 20h, até o dia 16 de novembro. Ingressos: R$ 20 e R$ 10 (meia-entrada).
FOLHA
DE PERNAMBUCO SÁBADO - 30/08/2008
Encontros e
desencontros clandestinos
“Anjos de Fogo e Gelo” retrata vida dos poetas Verlaine e Rimbaud
“Anjos de Fogo e Gelo” retrata vida dos poetas Verlaine e Rimbaud
por Talles
Colatino
Divulgação
Peça coloca em cena momentos decisivos dos
poetas
Foram dois anos de reformas, e depois da
abertura oficial na última quarta-feira, Recife agora conta com um Teatro
Barreto Júnior apto e seguro a receber peças em seu palco. E para marcar a nova
fase do espaço, acontece hoje a estréia da peça “Anjos de Fogo e Gelo”, que
retrata os encontros e desencontros de dois dos maiores poetas de todos os
tempos, Verlaine e Rimbaud.
A vida e a obra dos dois poetas e amantes
ganham vida cênica com a direção de José Francisco e conta com George Meireles
e Roger Bravo como protagonistas. “Anjos de Fogo e Gelo” retrata um período da
vida dos poetas, no qual Verlaine, entusiasmado com os versos do jovem poeta,
Rimbaud, o convida para morar com ele e sua mulher, Mathilde (vivida por Stella
Maris Saldanha). A partir daí cresce então uma grande cumplicidade entre os
dois artistas e uma intensa paixão.
O espetáculo coloca em cena momentos decisivos
da vida dos dois poetas. Mesclando a história com poemas de ambos, a peça traça
um paralelo entre a vida e a obra poética deles, mostrando como um influenciou
o outro. Fica certo que poesia de Verlaine não é mais a mesma desde seu
encontro com Rimbaud. Assim como esse mergulha no universo poético de Paul
Verlaine, onde sua erudição contribui para que Rimbaud passe a criar uma obra
refinada e profunda.
O texto
da peça é de Moisés Neto e completam o time Renato Filho (direção de arte),
Fernando Lobo (direção musical), Marcondes Lima (cenários), Aníbal Santiago
(figurinos) e Henrique Melo (maquiagem). “Anjos de Fogo e Gelo” fica em
cartaz até o 16 novembro, sempre aos sábados e domingos, às 20h.
Serviço
“Anjos de Fogo e Gelo”
Sábados e domingos, às 20h
Teatro Barreto Júnior
Ingressos: R$ 20 e R$ 10.
“Anjos de Fogo e Gelo”
Sábados e domingos, às 20h
Teatro Barreto Júnior
Ingressos: R$ 20 e R$ 10.
» ESTRÉIA
Dois homens e um livro aberto
Publicado no JORNAL DO COMMERCIO em 29.08.2008
Dois homens e um livro aberto
Publicado no JORNAL DO COMMERCIO em 29.08.2008
Anjos de fogo e gelo leva o romance entre Rimbaud e Verlaine,
poetas franceses para o novo Barreto Júnior
Fabiana Moraes
Fabiana Moraes
A história de um dos romances mais comentados
de todos os tempos começa a ser encenada amanhã em um Barreto Júnior
novinho em folha: Anjos de fogo e gelo, direção de José Francisco e texto de Moisés Neto, conta o atribulado amor
entre Rimbaud e Verlaine, poetas-chave da França do século 19. O par será vivido
pelos atores George Meireles (Verlaine) e Roger Bravo (Rimbaud), que sobem ao
palco ao lado de Stela Maris e Ivonete Melo (elas vivem Mathilde, a mulher de
Verlaine, e Vitalie, mãe de Rimbaud, respectivamente). O espetáculo marca o
retorno de Meireles, Ivonete e Stella ao palco, além da volta de José Francisco
ao universo das montagens adultas – sua última incursão nesse sentido aconteceu
há oito anos.
“É engraçado, muita gente tem me perguntado
como está sendo volta aos palcos, mas você não volta de onde nunca saiu, não
é?”, brinca o diretor, que durante todo este tempo esteve à frente de peças
infantis (como A revolta dos brinquedos, que volta em breve aos palcos) e
envolvido nas aulas do curso de artes cênicas da Universidade Federal de
Pernambuco. “Também estou montando Apareceu a Margarida com a Trupe do
Barulho”, adianta ele. É de José o projeto que se concretizou em peça, uma
mescla moderna de homoerotismo e poesia. “Não sou um fã de carteirinha da
poesia de Verlaine e Rimbaud, e sim fascinado com o rompimento da linguagem
poética”, conta o diretor. “Rimbaud desafia a alta burguesia francesa quando
diz simplesmente ‘eu não sou assim’, ele quebra as estruturas pelo deboche”,
fala.
A forte presença das mulheres foi determinante
para a encenação poética do relacionamento entre Rimbaud e Verlaine (aliás, o
romance entre os dois poetas foi encenado com sucesso em 2000, quando Pólvora e
poesia recebeu o prêmio Shell de melhor texto). “Rimbaud não era ninguém sem a
mãe”, opina José Francisco. O cenário de Marcondes Lima faz do palco um
verdadeiro livro aberto – é totalmente expressionista, pontua o diretor –,
enquanto os figurinos de Aníbal Santiago, verdadeiro pesquisador de
indumentárias, seguem a linha realista. É século 19 do sapato ao lencinho.
O ator George Meireles – que havia atuado pela
última vez há dez anos em O avarento – pesquisa há quase um ano o papel do
exuberante Verlaine, que larga a mulher e o filho recém-nascido para viver o
tórrido relacionamento com Rimbaud. “Aos 19 anos, ele já era considerado um
grande poeta, tanto que recebeu o título de ‘príncipe’ por parte dos franceses.
Victor Hugo ficou impressionado com seu primeiro poema”, conta Meireles,
lembrando que Verlaine supera Rimbaud em termos de popularidade naquele país –
aqui, é justamente o oposto. A separação de Mathilde, os passeios pelo
boulevard Saint-Michel (lugar de “pegação” onde até hoje michês fazem ponto,
escandalizando os moradores bem-nascidos do 5º e do 6º arrondissement) e os
dois tiros desferidos contra Rimbaud são algumas das passagens vividas pelo
jovem poeta e encenadas em Anjos de fogo e gelo. Vivendo o par trágico e
amoroso de Verlaine está o ator Roger Bravo, que já foi dirigido por nomes como
Carlos Bartolomeu e Marco Camarotti. Um grande trunfo da peça, é claro, é a
participação de Stella Maris (Um deus dormiu lá em casa, 1988) e Ivonete Melo
(seu último trabalho foi Abelardo e Heloísa, criado em 2000).
Quem for conferir o espetáculo leva um
presentinho de Rimbaud e Verlaine: além do programa, será distribuído um CD com
poemas e a trilha sonora do espetáculo. Anjos de fogo e gelo ficará em cartaz
aos sábados e domingos, às 20h, no Teatro Barreto Júnior. O ingresso custa R$
20 (inteira) e R$ 10 (estudante).
Festival traz cena pernambucana de teatro para a Bahia
Jornal A TARDE -28/04/2009 Salvador.
Por Roberta Guimarães
A Bahia
recebe entre os dias 1º e 16 de maio a oitava edição do Festival Brasileiro de
Teatro (FTB) – Cena Pernambucana. A programação acontece nas cidades de
Salvador, Feira de Santana e Camaçari e conta com 11 espetáculos em 34
apresentações. O evento tem como objetivo promover o intercâmbio entre os
estados, uma vez que, em 2008, foram os espetáculos baianos que invadiram os
palcos pernambucanos.
A abertura do evento ocorre na próxima sexta-feira, 1º, com o espetáculo “Caetana”, de Moncho Rodrigues e Weydson Barros Leal, que conta com a participação das atrizes Fabiana Pirro e Lívia Falcão, no Teatro Vila Velha às 20h, em Salvador. Já em Feira de Santana, quem abre o festival é a peça “Samba no Canavial” com Pedro Salustiano no circuito de rua, no sábado, 2. O espetáculo inicia as atividades em Camaçari no domingo, 3, às 17h, na Praça de Abrantes.
De acordo com o organizador e idealizador do projeto, Sérgio Bacelar, da Alecrim Produções Artísticas, o objetivo do FTB é promover a produção teatral do Brasil. “Os principais compromissos do FTB são divulgar a produção teatral brasileira para os brasileiros e fomentar a criação de circuitos interestaduais de circulação, além de democratizar o acesso a bens culturais a partir de apresentações em teatros e espaços públicos". Para tal feito, serão disponibilizados 1,7 mil ingressos para alunos de escolas públicas municipais e estaduais. As apresentações acontecem em espaços abertos para 400 pessoas com ingressos a preços populares nos valores de R$5 (meia entrada para idosos, estudantes, funcionários públicos do estado) e R$10 (inteira).
Após a etapa Bahia, o projeto FTB já tem programação para outras edições ainda em 2009, como a Cena Baiana, etapas Ceará e Maranhão, e a Cena Mineira na Bahia. Em 2010 será a vez de Cena Baiana, etapas Sergipe, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Confira a programação do Festival Brasileiro de Teatro - Cena Pernambucana, etapa Bahia:
Sexta-feira, 1º
> 20h - Caetana
Local - Teatro Vila Velha
Classificação: maiores de 12 anos
Sábado, 2
>10h – Samba no Canavial
Local - Praça do Fórum - Feira de Santana
Classificação: livre
>20h – Angu de Sangue
Local - Sala do Coro do Teatro Castro Alves
Classificação: para maiores de 12 anos
Terça-feira, 5
>20h - Conceição
Local - Teatro Vila Velha
Classificação: para maiores de 16 anos
>20h – Corra
Local - Sala do Coro do Teatro Castro Alves
Classificação:livre
Quinta-feira, 7
>15h – Corra
Local - Sala do Coro do Teatro Castro Alves
Classificação: livre
>15h – Historinhas de Dentro
Local - Xisto Bahia
Classificação: livre
Sexta-feira, 8
>15h – Historinhas de Dentro
Local - Xisto Bahia
Classificação: livre
>20h – Anjos de Fogo e Gelo
Local - Teatro Vila Velha
Classificação:para maiores de 18 anos
>20h – Castanha Sua Cor
Local - Sala do Coro do Teatro Castro Alves
Classificação: para maiores de 12 anos
A abertura do evento ocorre na próxima sexta-feira, 1º, com o espetáculo “Caetana”, de Moncho Rodrigues e Weydson Barros Leal, que conta com a participação das atrizes Fabiana Pirro e Lívia Falcão, no Teatro Vila Velha às 20h, em Salvador. Já em Feira de Santana, quem abre o festival é a peça “Samba no Canavial” com Pedro Salustiano no circuito de rua, no sábado, 2. O espetáculo inicia as atividades em Camaçari no domingo, 3, às 17h, na Praça de Abrantes.
De acordo com o organizador e idealizador do projeto, Sérgio Bacelar, da Alecrim Produções Artísticas, o objetivo do FTB é promover a produção teatral do Brasil. “Os principais compromissos do FTB são divulgar a produção teatral brasileira para os brasileiros e fomentar a criação de circuitos interestaduais de circulação, além de democratizar o acesso a bens culturais a partir de apresentações em teatros e espaços públicos". Para tal feito, serão disponibilizados 1,7 mil ingressos para alunos de escolas públicas municipais e estaduais. As apresentações acontecem em espaços abertos para 400 pessoas com ingressos a preços populares nos valores de R$5 (meia entrada para idosos, estudantes, funcionários públicos do estado) e R$10 (inteira).
Após a etapa Bahia, o projeto FTB já tem programação para outras edições ainda em 2009, como a Cena Baiana, etapas Ceará e Maranhão, e a Cena Mineira na Bahia. Em 2010 será a vez de Cena Baiana, etapas Sergipe, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Confira a programação do Festival Brasileiro de Teatro - Cena Pernambucana, etapa Bahia:
Sexta-feira, 1º
> 20h - Caetana
Local - Teatro Vila Velha
Classificação: maiores de 12 anos
Sábado, 2
>10h – Samba no Canavial
Local - Praça do Fórum - Feira de Santana
Classificação: livre
>20h – Angu de Sangue
Local - Sala do Coro do Teatro Castro Alves
Classificação: para maiores de 12 anos
Terça-feira, 5
>20h - Conceição
Local - Teatro Vila Velha
Classificação: para maiores de 16 anos
>20h – Corra
Local - Sala do Coro do Teatro Castro Alves
Classificação:livre
Quinta-feira, 7
>15h – Corra
Local - Sala do Coro do Teatro Castro Alves
Classificação: livre
>15h – Historinhas de Dentro
Local - Xisto Bahia
Classificação: livre
Sexta-feira, 8
>15h – Historinhas de Dentro
Local - Xisto Bahia
Classificação: livre
>20h – Anjos de Fogo e Gelo
Local - Teatro Vila Velha
Classificação:para maiores de 18 anos
>20h – Castanha Sua Cor
Local - Sala do Coro do Teatro Castro Alves
Classificação: para maiores de 12 anos
Sábado, 9
>20h – Anjos de Fogo e Gelo
Local - Teatro Vila Velha
Classificação: para maiores de 18 anos
>20h – Castanha Sua Cor
Local - Sala do Coro do Teatro Castro Alves
Classificação: para maiores de 12 anos
Domingo, 10
>20h – Anjos de Fogo e Gelo
Local - Teatro Vila Velha
Classificação: para maiores de 18 anos
>20h – Anjos de Fogo e Gelo
Local - Teatro Vila Velha
Classificação: para maiores de 18 anos
>20h – Castanha Sua Cor
Local - Sala do Coro do Teatro Castro Alves
Classificação: para maiores de 12 anos
Domingo, 10
>20h – Anjos de Fogo e Gelo
Local - Teatro Vila Velha
Classificação: para maiores de 18 anos
...Anjos
de Fogo e Gelo...
Dedicada a
Carlos Bartolomeu, Jomard Muniz de Britto, José Francisco Filho e João Denys
Recife,
abril de 2008
PRÓLOGO
(Chegada
de Rimbaud ao Inferno:
sua
entrada lembra uma criança à beira da morte improvisando doces canções)
VERLAINE: Ele está morto!
(Toca o quinteto, Opus 115 de
Brahms)
TRECHOS
DE POEMAS DE PAUL VERLAINE: RIMBAUD- A lua branca /brilha no bosque. /De ramo em ramo, /parte uma voz que /vem da ramada. Oh! bem-amado! //Reflete o lago, /como um espelho, /o perfil vago /do ermo salgueiro que ao vento chora. //Sonhemos, é hora... //Como que desce /uma imprecisa / calma infinita do firmamento /que a lua frisa.
VERLAINE- É a hora indecisa...Antes que apagues teu brilho, /nívea estrela matutina/ volve ao poeta, cujo olhar o amor cegou como um véu, /teu olhar, que se diria /banhado na luz da aurora, e leva o meu pensamento, /longe, além, lá, bem distante, /no sonho em que não cessa de se embalar o meu bem, (mas depressa, que o sol dourado já vem!).
RIMBAUD- Cada concha, no interior /dessa gruta onde a gente se amou, /tem o seu especial sabor. Uma, a púrpura tem da chama /roubada ao nosso coração, /quando o desejo nos inflama”.
VERLAINE: (Celo: acorde assustador) Absinto! (Olha o
cálice com o líquido verde) Absinto!
Combustível para minha estadia no inferno! Infinita estadia. Sobre o rio maldito, navega
nosso barco ébrio, nele estão os nossos segredos mais ocultos. Sobre ele quisemos reinventar o
amor! (Verlaine bebe mais)
RIMBAUD: Mocidade aprisionada, a tudo
subjugada. Por delicadeza, eu perdi a
vida...
(Toca trecho de “Casta Diva” de “Norma” de Bellini).
VERLAINE: Leva-nos o barco bêbado... até o
mais estranho portal...o inferno...
RIMBAUD: É chegada minha hora!
(Verlaine repete em francês)
VERLAINE: Sobre o arco da entrada está
escrito: Os que cruzarem este portal, deixem para trás toda esperança.
RIMBAUD: Aos
céus ergui minha estranha sede. Deixei tudo para trás e segui.
VERLAINE: Ele não reconhecia limites
RIMBAUD: Sedento entre ferozes moscas imundas, eis a minha
entrada.
VERLAINE: E eu, na mais alta torre: restam as
lembranças, as flores... o silêncio embaixo das pilastras.. o azul... as
estrelas esparramadas? (Grita enlouquecido). Prisioneiro e possuído pela alma
de Jean Nicholas Arthur Rimbaud! Ele me vê (arregala os olhos) daquele outro
mundo...
RIMBAUD: Ventos noturnos me envolveram... me
falaram...
VERLAINE: Na minha memória, ao entrar, ele parecia uma criança à beira da
morte, improvisando doces canções. Ele, o garoto que veio do interior...
(Música)
MATHILDE: Ele parecia segurar nas mãos uma
granada, depois de lhe ter arrancado o
pino!
VERLAINE- Ele! A mistura de presente, passado e futuro a
paralisar o impossível. Disposto a
roubar o fogo sagrado do altar!
RIMBAUD- Eu não conhecia limites.
MATHILDE: Usou
os seus versos para alimentar o
seu sonho tolo de liberdade. Roubou meu
marido. Destruiu minha família.
VERLAINE: Aqueles olhos azuis..
MATHILDE:
Tão malignos.
VERLAINE: Aquele sorriso...
MATHILDE: Tão satânico!
VERLAINE: Destruindo rima e métrica...
MATHILDE: Ele destruiu boa parte da minha
vida. (segura algo com força e
respira e respira fundo) E agora eu tenho guardados seus últimos escritos. (olha para baixo) Não tenho
força para destruí-los. Não tenho coragem. (ergue a cabeça) É como se das...
trevas... viesse o ...impedimento.
(Música)
VERLAINE: Com as botas rasgadas pelas pedras
do caminho ele chegou até mim...
RIMBAUD: Que me importam os grandes poetas? Apossei-me deles e superei-os.
VERLAINE: Trinta e sete prêmios no colégio.
MATHILDE: Bicho do
mato com sotaque insuportável. Anticristo! Um dia escreveu:
RIMBAUD: À merda, Deus! Merde à dieu!
(Ajoelha-se e chora convulsivamente)
MATHILDE: Blásfemo! Proscrito! Ele roubou-me o pai do meu filho!
Meu filho...
VERLAINE: Meu filho Georges nasceu naqueles dias tumultuados por tanto haxixe,
ópio, absinto...
RIMBAUD: Merde à dieu!
(Música)
VERLAINE: Sim.
Ele era um menino de família que
lia a Bíblia e o Corão.
MATHILDE:
Família, pois sim! O pai?
VITALIE- O pai nos abandonou quando ele
tinha pouco mais de seis anos.
MATHILDE- A mãe tornou-se amarga, seca. Outro
dia veio me procurar, ela e a insuportável da irmã dele. Duas víboras. Raça de
cães. Odeio esse povinho!Nem o marido agüentou aqueles filhos e a mulher.
VITALIE- Largou tudo sem dar satisfação.
RIMBAUD: (Estranho) Meu pai...
MATHILDE:
Ela se refugiou no trabalho do campo. Coisa de gente sem estudo!
(desdenha)
VERLAINE: O primeiro estudo a que se deve
submeter aquele que deseja ser poeta...
RIMBAUD-
... é o estudo de si mesmo. Precisa ser vidente! E essa vidência vem com
o desregramento de todos os sentidos.
MATHILDE: Ele estudava para se tornar um bom
canalha! (ri, jogando a cabeça para trás
e erguendo- a para frente lentamente) Atiçando seus... sentidos...
de modo ...assustador.
VERLAINE: Meu menino... dormindo... debruçado
sobre um livro sob o céu estrelado da França, no silêncio, depois da caminhada
noturna por tantas estradas que percorreu. O
que tanto ele buscava?
MATHILDE: E meu marido juntou dinheiro, com
outros poetas e enviou uma passagem de trem
para esse...(torce o nariz) menininho...
VERLAINE: Do nordeste até Paris.
VITALIE- Meias de lã tricotadas pela mamãe, calças curtas, pois ainda estava em fase de crescimento...
VERLAINE- E lá estava aquele menino-poeta! (abraça o vazio do palco) Entre os meus
braços. (confuso) E agora? O que me resta?
MATHILDE:
Era o prelúdio de um desastre!
VERLAINE: Mathilde era o tipo de esposa
ciumenta.
MATHILDE:Rimbaud era arredio, intratável, monossilábico.
VERLAINE: Ele decepcionou-se comigo. Queria
que eu fosse aquele sujeito dos meus poemas. Queria que eu vivesse como
escrevia. La vrai vie!
MATHILDE: Dizia que buscava a verdadeira vida! A verdadeira vida, pois, pois. Aquele crapulazinho
miserável que dormia com os cães pulguentos das ruas foi para dentro da minha
casa. Como pude dar cabimento? Ah!
Meu Deus.
VERLAINE: Perplexos, foi como os poetas
ficaram diante de tanto talento. Alguns o esnobaram por ser do interior. Ele tornou-se agressivo, querendo viver... só
de... poesia.
MATHILDE:
Não dava um dia de serviço a
ninguém! Nem durante a colheita ajudava
a família! Ficava trancado escrevendo
suas porcarias!
VERLAINE: Um
mito que eu ajudei a criar.
Remendar. Quantas vezes ele a precisou de mim?
MATHILDE:
Pálido, errante, coberto de lama
(pausa) Fezes...desesperado de fome, frio.
VERLAINE: Essa autoflagelação fazia parte do seu ideal poético.
RIMBAUD: Eu já. Conhecia Paris muito bem e
me aproveitava disso.
MATHILDE:
O lugar dele era mesmo os albergues miseráveis, em meio aos vagabundos que vasculham latas de lixo para encontrar comida.
VERLAINE: Ele me provocava.
MATHILDE:
E Verlaine tentou matá-lo com dois tiros de revólver. Feriu-lhe o braço.
(põe as mãos no rosto- crise) O meu marido! Preso na Bélgica! (recupera-se
momentaneamente) Jesus foi mais forte e um ano e meio depois, ele saiu.
Meu marido! Tão canalha
comigo... que escândalo. Comigo! Eu, uma mulher tão jovem, rica, bonita, inteligente...
VERLAINE: Enquanto eu estava na prisão, ele
recolheu-se ao sótão da fazenda e ali escreveu “Une saison en enfer” e a mãe dele, que
não dava dinheiro a ninguém, e não aprovava muito o filho poeta, pagou-lhe a
edição de quinhentos exemplares.
MATHILDE: Mas Deus é tão justo que o desgraçado
do Rimbaud só teve foi a oportunidade de receber os exemplares do autor.
VERLAINE: Para mim a dedicatória foi bem seca: “A P. Verlaine...”
MATHILDE: Gastou o dinheiro que a mãe lhe deu!
(ri) Na farra (ri mais) e não pagou ao
editor. Bem feito! O pacote ficou per-di-do e ele, en-lou-que-ci-do, jogou quase todo
o original no fogo. (zomba) Devia ter se jogado também, naquela
hora! Mas preferiu ser “negociante” na África.
Armas, café, ervas... e suponho
que escravos também. Ele tem o perfil de quem venderia escravos, embora todos
neguem isso. Ele queria ficar rico e ele
não tinha escrúpulos. Isso eu tenho cer-te-za.
VITALIE-
Sempre que ele parte, nunca sei se vai voltar...
VERLAINE-
Com ele a gente nunca sabia.
(toca a overture,
op. 21 de “Sonho
de uma noite de verão” – Mendelsohn)
CENA 2
RIMBAUD: Eu
não gosto muito de estudar, mesmo.
Mas lá na fazenda eu fazia compras, arrumava a casa, cuidava do jardim. Pra que tanta matéria na escola? Não é
uma tortura? Eu sou um poeta.
VERLAINE: Escute...
RIMBAUD: Porra! Ficar esfregando as calças nas
bancas da escola.
VERLAINE: Para vencer na vida, você precisa
estudar...
RIMBAUD: Para quê? Tenho que passar em um
exame para ser engraxate? Só se é rico nessa vida roubando ou explorando a
força de trabalho do próximo.
VERLAINE: Não exagere.
RIMBAUD: Ah!
Não. Que emprego você imagina para um cara como eu? : Tratador de porcos? Boiadeiro? (ri) muito
obrigado! Não quero (ri) Ah! (se benze e se arrepende de se ter benzido).
VERLAINE: (percebendo que Rimbaud
arrependera-se de se ter benzido) Renegando a igreja católica?
RIMBAUD: (pulando para cima de Verlaine que ri relaxado
na cama). A santa doutrina católica. França,
disse o Papa: a primogênita da igreja. Joana D’arc é exemplo
interessante do que a igreja pode fazer com uma pessoa. Não é?
VERLAINE: E seus amigos padres? E Ernesto? Você era... virgem, com ele, também?
RIMBAUD: Como você é vulgar! Conservador! (bate com raiva em Verlaine).
Burguês de merda! Não nega as origens!
VERLAINE: O par perfeito para você.
(tenta beijar Rimbaud)
RIMBAUD: Não me trate como se eu fosse uma das suas mulherezinhas ou apenas mais um dos seus rapazes.
VERLAINE: Isto está virando novela para adolescentes: “Bate um coração, lateja minha tesão, sob
esta batina” (acaricia as partes de Rimbaud e ri, prolongada e ironicamente).
RIMBAUD: O absinto faz de você uma pessoa bem
pior do que você é, quando está sóbrio.
VERLAINE: Você tem olhos de serpente (pega o
lençol simula masturbação sob o “véu”
improvisado- Toca trecho de Mendelsohn) Ó vem a
nós, grande Maria! Tu que és mãe pia do bom Jesus! Do Cristo Santo,
ó virgem prenha, sobre nós venha a tua
luz!(ri e se engasga). O Éter Cósmico sacudiu minha alma enquanto eu despetalava esta rosa
poética! peguei minha cítara...
RIMBAUD: Como um salmista, elevei minha voz inocente... Você
não sabe o que é pureza!
VERLAINE: Faça-me o favor! Puro? (ri) Você?
RIMBAUD: Puro! Ergui minha voz até as
altitudes celestes.
VERLAINE: (vira-se violentamente) E depois recolheu as asinhas. Não foi?
(atraca-se com o outro) Onde você escondeu as suas asinhas de anjo? (rolam pela cama,
Verlaine faz cócegas em Rimbaud) Hein? Seu menino malvado.
RIMBAUD: Guardadas para não se sujarem! Protegendo o meu canto virginal.
VERLAINE: Virgem prenha!
Virgem prenha! Cadê tua
cítara e as energias misteriosas? (rolam pela cama até o chão e continuam em
estranha dança. Dança macabra).
RIMBAUD: Você está possesso...
VERLAINE: Possesso está você, seu pequeno canalha!
RIMBAUD: (cínico) Porca velha!
VERLAINE: Vem!
Vem mamar nos meus peitinhos desta porca, como você mamou nos da sua
mamãe. Vem!
RIMBAUD: Doente!
VERLAINE: Sem
mim, você está perdido, Rimbaud.
Quem vai contar sua história? Analisar sua obra e publicar?
RIMBAUD: Veremos.
VERLAINE: Veremos uma porra! (respira fundo) Bem fez o seu pai que lhe abandonou aos seis
anos.É o seu pai que você vê em mim?
Essa violência é por causa dele, é?
RIMBAUD: Idiota!
Imbecil! Estúpido! Vaca!
VERLAINE: Vaca é Vitalie, a sua mamãezinha,mulher que não soube ser
mulher!
RIMBAUD: E você e a sua esposinha, Mathilde, hein?
Parindo este monstrinho chamado Georges?!
Essa aberração gerada por
vocês dois! (ri, assustadoramente).
VERLAINE: O mal reconhece o mal...
RIMBAUD: Você é um cadáver
adiado que procria!
VERLAINE: Plagiador. Você é uma pessoa muito
má. Eu fiz tudo por você. Estou até
tentando colocar você numa coletânea e...
RIMBAUD: Dane-se sua coletânea!
VERLAINE- Você devora a si mesmo.Como é
doloroso lhe amar( agarram-se) É...desnorteante. Arde. Enfurece. Mal saído da
infância e ..tão...homem velho.
RIMBAUD- A sagrada família cobre o meu
espírito.
VERLAINE- Penetrando. Envolvendo-o.
(acaricia-o)
(brigam na cama novamente)
VERLAINE: Eu lhe entreguei tudo (Rimbaud tira um
terço branco do bolso. Agita-o
enquanto fala. Depois o joga no rosto de Verlaine. Silêncio. Aproximam-se os
rostos. Beijam-se. Deitam-se suavemente. Um fica sobre o outro).
(música)
RIMBAUD: Uma gota sai do meu sexo. (êxtase: abraça
Verlaine) Gota rubra de vergonha! Lágrima de amor, lágrima... tenho o coração
tão cheio... na minha carne... meu coração tão repleto.
VERLAINE: Repleto de quê?
RIMBAUD: (senta-se na borda da cama- pausa,
Rimbaud veste a camisa ) Vamos sair. Eu preciso beber.
VERLAINE: Quer sair para se embebedar?
RIMBAUD- Você quer ir comigo ou não?
VERLAINE: Você não vai mudar o mundo. Suas
iluminações, sua temporada no inferno,
seu evangelho de São João.... tudo pode ser bem inútil.
RIMBAUD: Sou um Cristo sem milagres, apodrecendo na miséria profunda de todos os
homens, corrupção universal, que seria
preciso curar, mas o milagre não se realiza. Deixo todos para trás, o
demônio, os danados... Jesus, todos ...eu
vejo tudo tão claro... os anjos... dando esmolas ao diabo... as flores do
mal... minha inaptidão no trato com as mulheres... a pátria...
VERLAINE: Vamos ficar aqui hoje. Faça de
conta que eu sou a sua mãe e a sua pátria. Pegue a sua coroa de espinhos.
Senhor poeta vidente.
(ele dá a Rimbaud algo para mascar-
ópio- ele aceita, masca- Verlaine tenta agarrá-lo,
Rimbaud que se esquiva)
RIMBAUD: Não tenho mãe. Não tenho pátria. Fujo de toda força moral!
VERLAINE: Vem cá, Arthur, me abraça.
(música, som mínimo)
RIMBAUD: Que gritos preciso soltar? Que animal é
preciso adorar? Sobre que sangue
marchar? A que demônio alugar-me? Erguer
com o punho seco a tampa do caixão?
Entrar nele e sufocar?
VERLAINE: O que você queria?
RIMBAUD: Nada de velhice!
VERLAINE: Este veneno que lhe dá tanta sede,
é a poesia?
RIMBAUD: A cidade, os campos, o lago... o rio ao
luar... O sino tocando à meia noite, me chamando para o inferno.... (Rimbaud ajoelha-se.
Deita-se e adormece sob o praticável da cama. Verlaine sai).
CENA 3
(Rimbaud
está
dormindo debaixo de um banco
próximo ao hotel onde houve uma reunião de poetas franceses que zombaram
dele por ser jovem e da roça).
(Entra
Mathilde com um véu negro- Ela toca no banco com a sombrinha e ele acorda).
MATHILDE:
Surpreso de me ver? (pausa) Sabe
o que me traz aqui?
RIMBAUD: Sei pouquíssimo, madame, e quero saber cada vez menos. Por isso decidi
abandonar a poesia.
MATHILDE: Você
nem começou e já quer parar? Você é tão engraçado.
RIMBAUD:
Não sou mesmo, madame? As pessoas
quando me vêem me tomam por tímido
e quando convivem comigo não suportam meu atrevimento.
MATHILDE: Faltam-lhe forças para continuar na poesia? Ou descobriu
que isto não é um meio de vida?
RIMBAUD: Eu tenho que ir embora...
MATHILDE: Eu vim para lhe ajudar.
RIMBAUD:
Ajudar, como?
MATHILDE: Dinheiro. Você quer?
RIMBAUD: Manchado de sangue?
MATHILDE: Não exagere...
RIMBAUD- Ah! Madame. Por Lúcifer! (respira
fundo- atrevido) Tenha dó!
MATHILDE: Você praticou magia? Não foi? Fez
algum pacto com o... Deus do fogo?
(Rimbaud, furioso, levanta)
RIMBAUD: Queria ver se ele conseguia me
derrubar!
MATHILDE: Eu lhe aviso que você não é mais uma
criança. Vim lhe oferecer ajuda.
RIMBAUD: E em
troca o que quer de mim?
MATHILDE: Nada.
RIMBAUD:
Que eu fique bem longe do seu marido, talvez?
MATHILDE:
Alguns amigos meus poderiam lhe ajudar...
RIMBAUD:
É? Que gentil da parte de vocês. (irônico). Mas já vivi o suficiente para saber que tudo
tem seu preço e que o espírito
burguês nasceu com Cristo, portanto é abençoado.
MATHILDE: A vida oferece-lhe uma nova estrada. Se me trair, garanto que
será expulso da França. Todos estão fartos das suas canalhices.
RIMBAUD: A sociedade francesa que a senhora
representa tão bem, madame?
MATHILDE: Sim A sociedade francesa. Uma
oportunidade fora do país. Tão a seu gosto. Não é?
RIMBAUD: Eu vou pensar no assunto.
(música)
CENA 4
RIMBAUD: Não vou mais escrever poemas.
VERLAINE: Não acredito. Vai escrever o quê? Romances?
RIMBAUD: Vou abandonar a poesia. Eu não
consegui o que queria. Agora chega.
VERLAINE: Oh! (irônico) boa criança
francesa. Pelo bem estar de todos ele vai
parar de escrever. (sério) Não seja tolo. Seus poemas são bons.
RIMBAUD: De que adianta, Verlaine? (chora)
não deu certo. A poesia quis me enterrar vivo.
VERLAINE: A posteridade.
RIMBAUD: (Histérico) Que me importa a
posteridade? O que estes canalhas
fazem comigo é injusto! E quanto a nós dois, sinceramente, eu estou
cansado de repetirmos sempre a mesma conversa.
VERLAINE: Associe-se a uma trupe de
comediantes.
RIMBAUD: sua mulher me procurou.
VERLAINE: O que ela queria?
RIMBAUD: Me ameaçar e me oferecer dinheiro.
Ridícula.
VERLAINE: A família dela conhece muita gente
e...
(Rimbaud veste-se)
RIMBAUD: Vocês nunca vão me entender.
VERLAINE: Aqueles soldados que lhe estupraram lhe entenderam muito bem.
RIMBAUD: Você e suas mentiras degradantes.
VERLAINE: (cínico) Esses fios vermelhos que
estão escorrendo dos seus olhos, são lágrimas?
RIMBAUD:
Saia do meu caminho. Eu vou embora.
VERLAINE: Foda-se! Arthur de merda. (Verlaine puxa uma pistola
imaginária e... “atira”! Rimbaud sorri,
finge que foi atingido mortalmente, no
coração. Vai caindo e Verlaine o ampara. Brincam). Tudo começou com risos de
crianças, com eles vai terminar. Esta bebida permanecerá em nossas veias.
RIMBAUD:
Começou com repugnância... termine com perfumes. Começou com grosseria? Que acabe em anjos de fogo e
gelo.
VERLAINE: Estou de joelhos aos seus pés.
RIMBAUD: Não me interessa mais nada daqui.
(Verlaine levanta-se)
VERLAINE: Criança monstruosa. Conheço suas
manobras. Este seu vil desespero. Como
se fôssemos os seus brinquedos!
MATHILDE: Flores que você pisa no seu paraíso
artificial de absinto!
VERLAINE: A feiticeira vai se erguer sobre o poente branco?
MATHILDE: Pois que se vá!
VERLAINE: O sino de fogo vai soar vermelho entre as nuvens? Que soe!
Eu volto para minha mulher!
RIMBAUD: Isto! Volte para Mathilde. Ela é do seu nível. Nós
fomos apenas órfãos noivos.
VERLAINE: Nós?
Órfãos noivos?! (ri) você é
muito engraçado! Nosso amor, se é que
podemos chamar isto de amor, é mais como um belo crime na lama da rua. Um circo. Eu que imaginei um mar agitado com nascimento eterno de Vênus, me
deparei com esta coisa sombria...
MATHILDE: A amizade deles era um castelo feito de ossos... de onde brotava uma
música desconhecida. Dentro dele selvagens dançavam sem cessar a festa da
noite.
VERLAINE: O poeta satânico e seus sonhos de
sofrimento. (cospe para Rimbaud) Seu idiota! Estúpido!
RIMBAUD: Idiota é você!
VERLAINE: O caso era esse?
RIMBAUD: O sonho arrefece.
VERLAINE: Quem sou eu para impedir sua
partida? Se nem mesmo sei porque fico.
RIMBAUD: O que ficou para trás foi levado em
carro fúnebre, água turbulenta,
bebida derramada, ataque de cães,
ambições esmagadas, tempo de indigência vergonha de nossa fatal
inabilidade. Somos palermas quando rimos
destes suplícios? Destes crânios, destes
albergues?
VERLAINE: Aonde você vai?
RIMBAUD: Você sabe.
VERLAINE: Você não escapará.
RIMBAUD: Haverá sempre segredos
enlouquecedores, eu bem sei. Saberei ser pássaro silencioso quando tudo se
fizer sombra. Adeus ao aqui, seja onde for.
VERLAINE:
É mesmo adeus?
RIMBAUD: Pode-se dar adeus à imensidão do universo?
VERLAINE: Serei sempre seu amigo. Não importa a distância.
RIMBAUD:
Então... (abraçam-se. Música) adeus.
(Rimbaud sai. Verlaine senta-se, põe as mãos
na cabeça. Afunda. Luz esmaece Mulher aproxima-se).
Cena 5
INTERMEZZO
MATHILDE: Você diz que quer voltar a viver
comigo e com seu filho.
VERLAINE: Eu preciso da minha família e vocês
são tudo que eu tenho.
MATHILDE: Você foi preso por causa dele...
levou o meu nome para lama! Você é mentiroso, mentiu sobre o crime...
VERLAINE: Estávamos na estação. Eu vinha com o meu revólver no bolso, mamãe ao meu lado, Rimbaud atrás.
De repente eu me virei, ele pensou que eu ia atirar nele novamente
chamou um guarda e pediu que eu fosse preso. Foi assim.
MATHILDE: Você
e ele lhe abandonando mais e
mais: alistou-se no Exército Colonial Holandês,
recebeu adiantamento, desertou algumas semanas depois.
VERLAINE- Cale-se, por favor, Mathilde.
MATHILDE: Foi trabalhar num circo!
VERLAINE: Incrível.
MATHILDE: Dinamarca... Roma! (ri) Orgias e
problemas, de novo, com a polícia.
VERLAINE:
Você tem prazer com a desgraça dos outros?
MATHILDE: O que estou querendo dizer é que se
ele lhe amasse, pelo menos um pouco...
VERLAINE: Ele me amou de um modo que você não
pode entender...
MATHILDE: Eu lhe dei a sua família.
(agride-o) Você não precisa disso.
Não é? Você quer o seu êxtase intelectual...sexual...sei lá. Você não vale
nada! É isso. Eu tenho nojo de você. Sabe o que é isso? Nojo? Seu filho de uma
puta! (bate na cara dele).
VERLAINE: Pare, Mathilde.
MATHILDE: Tomara que ele vá parar num
ambiente infecto, pulgas, mosquitos,
calor, água salobra. Contraia tifo.
VERLAINE: Pare de blasfemar! Ele não merece
isto.
MATHILDE: E você. O que você merece, hein?
Seu...seu...indecente!
VERLAINE: Eu mereço, como qualquer um
merece...
MATHILDE: O quê?
VERLAINE: A salvação.
MATHILDE: (olha ao redor) Bem que disseram
que você está entregue ao vício, bebendo
muito, e, pelo que vejo, na mais completa decadência.
VERLAINE: É isso tudo que você sabe sobre ele?
MATHILDE: Logo ele estará num caixão: o corpo
seco e mutilado, velas, um coral, uma estranha melodia... mais nada.
VERLAINE: Quanto ao nosso filho... eu tenho
direito...
MATHILDE: (brusca) Esqueça que eu e seu filho
existimos! Nunca mais me procure. E diga a sua mãe que ela pare de me incomodar
também!
(música)
Cena 6
VINGANÇA
MATHILDE: Então você decidiu ficar! Seu moleque insolente! É um farsante. Este é
o fato nu e cru. Você não entende nada de poesia.
RIMBAUD:. Um dia
sentei a beleza no meu colo. E a achei amarga e injuriei-a.
MATHILDE: Estou vendo que você tirou do
espírito o último traço de esperança
humana. Não aceitar a minha oferta foi a pior coisa que você fez. Mas
agora você vai sofrer as conseqüências.
RIMBAUD: (pula sobre Mathilde, assustador) Eu
poderia estrangular você se eu quisesse, aqui mesmo e esfregar sua cara morta
no chão!
MATHILDE: Faz da desgraça um Deus. Se espoja na lama! Se estende para secar na aura do crime. Faz piada com a loucura!
RIMBAUD- Idiota. (ri)
MATHILDE: Você tem um riso horrível. Hiena!
Você e seu caderno maldito!Pensa que tenho medo de você? (ri, mostra uma pistola)
Está pensando que isso é fruto do álcool ou drogas em excesso? É não. É de verdade.
RIMBAUD: Oh! Armada e perigosa. Boa Mathilde.
Está com raiva do jovem poeta que roubou o seu macho.
MATHILDE:
Vamos combinar uma coisa: Sua poesia é de merda. (irônica aponta a
pistola para Rimbaud) Ver uma mesquita... na torre de uma fábrica?! Um salão no
fundo de um lago. Assombrar-se com
um cartaz de teatro de revista. (ri).
RIMBAUD: Longe dos pássaros, rebanhos. Numa
clareira de joelhos a beber...
MATHILDE: Beber o quê?
RIMBAUD: Tendo em volta os bosques de avelãs na cerração de um meio-dia úmido e
verde...
MATHILDE: Com você é difícil se manter um
diálogo racional.
RIMBAUD: Bebia algum
licor dourado.
MATHILDE: Bebia um licor dourado. Estava de joelho nos bosques de avelãs na cerração de um meio-dia úmido e verde! (ri) O que fiz para merecer isto?
RIMBAUD: E um
temporal varreu o céu. Ao anoitecer.... na areia branca dos bosques...o vento de Deus... eu via o
ouro sem poder beber.
MATHILDE: Pouco
me importa o que o senhor bebeu.
Você é um mal para a nossa
sociedade. Saiba que em nome da moral e dos bons costumes...
RIMBAUD: A moral é a fraqueza do cérebro.
MATHILDE: Devia estar num hospício! Isto sim. Com seus terrores e sonhos soturnos. Dane-se para os confins da terra! Foi isto que vim lhe anunciar, em nome da sociedade francesa. Ninguém aqui gosta de você. Eu sei
das suas falcatruas aqui e noutros países. Eu mesma vou lhe denunciar. Você vai
para a cadeia! Está ouvindo? Fuja! Dane-se! Suma, desgraçado! E não volte mais. Seu pedintezinho nojento. Livre-nos das suas bruxarias.
RIMBAUD: Mágico estudo!
MATHILDE: Dê um arremate
aos seus desejos por aqui! Siga. Vá!
RIMBAUD: A feiticeira que acende sua brasa no
vaso da argila, jamais nos contará o que sabe e que ignoramos.
MATHILDE: Não queremos saber de nada que venha
de você. Só a certeza da sua distância. Vá beber, seus mazagrans bem longe. Destrua
lá o resto da sua jovem miséria. E um dia farão um túmulo branco, de menina,
para você na sua cidadezinha.
RIMBAUD: Também é vidente, madame?
MATHILDE: Não é preciso ser vidente para perceber aonde o senhor vai com tanta pressa.
RIMBAUD: No horizonte da minha cidade: as florestas. Eu olhei para tudo com o céu nos olhos. Abandonei
a minha casa de pedras.
MATHILDE: Em-can-ta-dor.
E fez da vida um sonho contínuo
(ironiza) que poético! Tão ridículo
quanto a sua pessoa.
RIMBAUD: Minha vontade não é de lhe encantar.
Não quero que meus versos lhe rasguem o
coração, também.
MATHILDE: Ridículo! Bossal! Pois bem. O recado está
dado. Suma, Jean Nicholas Arthur
Rimbaud! Volte para o
Inferno que é o seu lugar!
(ela sai, contrariada, por um lado e ele pelo outro)
(música)
CENA 7
(Vitalie
e Verlaine os dois personagens estão em espaço e tempo diferentes apenas
parecem dialogar)
VERLAINE: E ele largou a poesia... nunca
respeitou as musas.
VITALIE: E agora está semi-morto. Desse jeito
terrível! Será castigo? (Benze-se)
Deus me perdoe (fecha os olhos, bate na
boca, pega o telegrama e lê em voz alto e estranha): “Hoje, a senhora ou
Isabelle, venham a Marselha. Trem expresso segunda de manhã vão amputar-me
a perna. Perigo de vida. Negócios sérios a acertar”. Negócio sério. Como é
difícil ser mãe numa hora dessas!
VERLAINE: Não havia esperança. Só o suplício era certo.
VITALIE: Câncer no joelho. Se espalhou pelos
ossos. Voltou para a família depois de
onze anos de exílio na África. o bom
filho à casa torna...
VERLAINE: Penetrou nas entranhas do inferno...
Mutilado e sem forças, no desespero, na tortura. O calor... asfixia...
VITALIE: Da África só sairia desse modo, bem
que eu pressenti. Coração de mãe não se engana. Ele se parece nisso com o pai.
VERLAINE: Os sóis, as savanas, selvas, o desconhecido, a Abissínia... O que era o seu anseio de desbravar o reino
das palavras, diante daquele imenso reino
chamado África? Ele que esteve em tantos
países... tantos infernos.
VITALIE: Quer que eu fique com o dinheiro
que ele consegui nesses dez anos. Sabe-se lá de que modo sujo! (respira) Mas é
dinheiro. Fazer o quê? Mãe é mãe.
VERLAINE: Seu primeiro inferno foi o metafísico, o desregramento, a poesia. O
segundo foi dos sentidos. Tornou-se um
bicho, um ser escuro
VITALIE: Mas poderia ser salvo. Eu sintia
isso. Meu filho ainda tinha muito do menino que foi. Uma vez, ele me abraçou de
maneira tão sincera, meu filhinho, que eu chorei junto com ele. (respira fundo)
De algum modo ele será salvo!
VERLAINE: Restaram-lhe a solidão e o fel. Ele
que queria um natal na terra... Arthur:
estrela que brilha ainda na distância... sozinho... alucinado, odiando, morrendo, buscando o infinito.
(olha para cima e grita) Blasfêmia? Pudor?
Dignidade de alma? Santo Poeta! Por
que não? Cheio de dignidade abismada, cheio de tanta verdade na tristeza
amorosa da noite. Esta noite que afoga o
mundo (masca o ópio) a compor o seu ...livro
negro...
VITALIE: Ele tinha o coração enfermo desde a
infância.
CENA 8
O COLO DA MÃE
(Rimbaud está
deitado. sua perna direita será amputada)
(música aumenta: “Passion”, de Peter Gabriel – “Sandstorm”)
VITALIE– Arthur! Queria ser o quê? Igual ao seu pai? Dinheiro? Sexo? Poesia? I independência?
(tosse) Como se não bastasse o seu irmão! Frederic, eu pressinto, não será mais
que um trabalhador de ônibus. Mas você! Em quem depositei todas as minhas
esperanças? Você...você...foi uma... (espécie de choro- pausa) decepção.
RIMBAUD: não é a melhor hora para falar sobre
isso, mamãe. E me chame só de Jean. A minha situação militar...você sabe...se me
descobrem...
VITALIE: Armas na selva, não é? Meu filho! Uma fábrica era o que você queria. se
não fosse o governo francês...você seria um senhor da guerra naquela região
maldita! Isso é negócio que se faça?
RIMBAUD: Um
mero comerciante, mamãezinha. Um
mero comerciante. Para a Europa
eu não podia voltar tão cedo.
VITALIE: (aproxima-se dele , segura-o como se fosse
trocar a fralda). Traficantes de
armas costumam ter como castigo a
castração. (pega na testa dele) Deixe-me ver se você está com febre.
RIMBAUD: Não. Não cortaram o meu pênis, não
chegou a isso. Mas foi quase! Houve uma greve dos condutores de camelos.
Imagine se eu não falasse árabe...
VITALIE: (espanta-se) Você está ardendo em
febre!
RIMBAUD – Mamãe, isso tudo está parecendo um
sonho..
VITALIE - Você disse que recebia algumas mensagens em sonho...
RIMBAUD: Sim.
VITALIE: Como assim?
Quem lhe fala nestes sonhos?
RIMBAUD: Apolo. O próprio Apolo.
VITALIE: Republicano e ateu, eu suponho.
RIMBAUD: Como todo bom poeta parnasiano. (ele
sente fortes dores e grita)
VITALIE: “Rimbaud é inteligente até não poder
mais; porém acabará mal”, os professores
bem que me avisaram. (mexe nos frascos) Já tomou sua dose boa de morfina hoje?
(pega alguma coisa, vira-se bruscamente) Cadê o dinheiro?
RIMBAUD: Eu deixei na caverna...
(música)
VITALIE: Que caverna?
RIMBAUD: Meu refúgio...
VITALIE: de novo esta história da caverna? O que
faziam, você e seu amigo Ernesto, naquela caverna? Diga! Eu sempre quis
saber... agora que você está delirando, talvez confesse...
RIMBAUD: Líamos Baudelaire, Edgar Allan Poe, Rabelais.
Criei um código
poético e lancei-o numa simples carta!
Eu, o poeta vidente!
VITALIE: E por que você renega seus poemas? Sua irmã
descobriu que eles estão começando a render
alguma coisa. Eu estou precisando de dinheiro. Verlaine...
RIMBAUD: Não diga a Verlaine que eu estou
aqui! Não quero que ele saiba! Ele seria a última pessoa que eu queria que me
visse assim. E quanto aos meus escritos...
VITALIE- Sua irmã Isabelle disse...
RIMBAUD: Águas
turvas! Não passavam de águas
turvas.
VITALIE: Dizem agora que sua poesia é linguagem de alma para alma resumindo tudo:
perfumes, cores, sons...
RIMBAUD: Não quero saber dos meus poemas...
VITALIE: Imagino que tipo de leitor você
tem. Aqueles que admiram singelas violetas
parnasianas transformadas em doces
escarros das ninfas! Que poesia! (irônica, é claro) Meu filho e seus escarros
das ninfas...sua virgem prenha. Prenha!
(respira fundo) Maria! Que a igreja nos absolva. Onde eu errei na sua educação?
Será que errei?
RIMBAUD: Não, mamãe...foi tudo uma grande
conspiração (ele está delirando sob efeito da morfina, seu delírio é muito
suave) Vislumbrei os sete mares no
cristal líquido do Rio Meuse, nossa
cidade. (fecha os olhos, respira fundo, esboça um sorriso) Rosto rente à água,
observando. (tenta agarrar os raios imaginários) Os prismáticos reflexos
dourados do sol. A correnteza “ondulando meus cabelos”...
MATHILDE: Águas turvas, como você mesmo
disse! Todos sabem, meu filho...sobre o bulevar de Saint-Michel e o que você
fez nas outras cidades também...
VITALIE: Ah! Como eu sofri com o que você fez! Você
acha que foi fácil? E agora agüentar mais isso?
Você! Assim ...e isso é para sempre. Meu
filho que eu eduquei no melhor colégio! Você sabe os sacrifícios que passei.
Abandonada sozinha e com quatro filhos para criar, aquele canalha do seu pai...(respira fundo) minha vida se acabou ali!
RIMBAUD: Eu fui um jovem tolo . É isso que
você quer dizer, não é?
VITALIE: Victor Hugo disse que você era digno de pena. Recusou-se a ser seu advogado!
RIMBAUD: Que honra ser citado pelo senhor Victor Hugo! Dane-se, Victor Hugo!
VITALIE: Meu filho bandoleiro...
RIMBAUD: Uma vez a feiticeira verde do
absinto, numa dose de apenas três centavos,
disse que eu deveria devolver os homens ao seu estado primitivo de filhos do sol.
MATHILDE: Pois bem, senhor filho do sol. Veja o ponto aonde você chegou.
RIMBAUD: Eu
quis viver a vida inimitável!
VITALIE: Isso incluiu
insuflar Verlaine contra a esposa
dele? Eu nunca fui com a cara daquele Verlaine. Sujeito intratável.É do bar
para o hospital e de volta para o bar! Ele
teve vários amantes antes e depois de você! E aquela mulherzinha ordinária dele também
não é coisa que se preze!
RIMBAUD: Bruxa fedorenta! Princesa camundonga! (range os dentes)
Percevejo! É a culpada de tudo. Estragou
tudo...
VITALIE: E você, meu filho? É isto que me
pergunto mil vezes: Aonde pretendia chegar com toda aquela loucura? E depois
essa vida na África...
RIMBAUD: Poesia e a vida. Beijar as duas.
VITALIE: Esse seu jeito de provocar as pessoas! Eu sei.
É meu filho. Eu sinto. Mas a culpa
também é do seu pai que abandonou a
casa. Meu filho envolvido com armas e tráfico!
RIMBAUD: Quando Verlaine pegou naquele
revólver, disse: isto é para você,
para mim, para todo mundo! Quer
ir embora? Pois toma! (imita o
disparo)
VITALIE: Isso é vida
que se queira?
RIMBAUD: Completamente fora de si.
VITALIE: (olha para a pele dele, a pele, os olhos) Sua
pele está horrível. Todo queimado, cheio de manchas. Que cabelo é esse? Você
não tem amor próprio? (solta-o bruscamente, está chocada com o estado do filho)
Maldita Abissínia!
RIMBAUD: Dizem que lá eu encontraria a
arca da aliança que foi depósito dos dez
mandamentos... a terra da rainha
de Sabá...
VITALIE: Você está completamente fora de si. Como
podemos discutir negócios, com você neste estado?
RIMBAUD: Eu estou bem, mamãe. Você vai
guardar estes oito quilos e meio de ouro e também as pedras e o dinheiro.
VITALIE: E esta mulher?
Que você levou de Harrar para Áden? Que você bancou a educação dela. Essa africana em trajes
europeus...
RIMBAUD: Mais elegante do que muitas européias.
VITALIE: É? (riso amargo) Você se casou oficialmente com ela, lá na África? Olha
que ela pode querer parte do seu dinheiro...
RIMBAUD: Não seja boba, mamãe
VITALIE: E o tráfico de armas? A polícia ...você sabe
RIMBAUD: Eu
queria ganhar muito dinheiro e isso incluiu o tráfico...
VITALIE: Por desertos e florestas na África? Entre
rinocerontes, javalis?
RIMBAUD:
Eu pretendia partir para a China
ou Japão, logo depois. (ri, sarcasticamente)
VITALIE: (faz cara de desgosto profundo) Sua
desgraça foi esse seu espírito sarcástico. Sempre quer ver o lado cômico e
ridículo das pessoas. (pega na mão dele) Peça perdão a Deus, meu filho.
(Rimbaud está deitado, delira: Verlaine entra, aproxima-se dele)
RIMBAUD: Allah Kerim (Deus
o queira) Me diga:
a que horas eles vão me levar
para o navio?
(Rimbaud levanta-se e cai. Chora.
Não sente a perna direita)
RIMBAUD- Eu estou adormecido no vale...o riacho ...o sol
...aquele soldado...morto... Jovem soldado, boca aberta, a testa nua, morto...
já não sente o odor das flores, o macio da relva...a mão sobre o peito, dois
furos vermelhos do lado direito... é a guerra...eu preciso chegar a Paris...os tiros...eles...eles
não me vêem...meus pés entre os lírios, eu estou muito
cansado...mamãe...cansado...eu não...agüento mais...
(Vitalie embala-o, ele treme muito)
(Verlaine sai das sombras)
VERLAINE: Onde está o seu namorado?
RIMBAUD: Na guerra. Estamos sofrendo as
primeiras derrotas. Meu querido professor,
deixou o colégio. O grande mestre
foi à casa das tias. E de lá, como eu
pensava que ele fizesse, alistou-se. Eu fugi de trem para Paris: queria ver a
queda da monarquia... Napoleão terceiro.
VITALIE: Com quem você está falando?
RIMBAUD: Com ele...
VERLAINE: Você ultrapassou os limites.
VITALIE: Ele
quem?
RIMBAUD: Meu bilhete era só até
Saint-Quentin. Segui e fui detido na Gare du Nord. Cobraram os treze francos
para complementar a passagem fui parar na cadeia. Nem
dezoito anos eu tinha. Aqueles dias
ali me ensinaram algo que eu nunca esqueci. Por causa de treze francos!
(Vitalie
pega um pano e umedece para esfriar a
testa do filho)
VERLAINE- Olhe bem para mim e responda: o que
é que você queria comigo?Se era ao seu grande professor, a quem você amava?
RIMBAUD: escrevi da prisão uma carta. Ele
veio e me levou à casa das tias, onde passei algumas semanas, em Douai.
VERLAINE: Sua mãe nunca gostou de mim.
RIMBAUD: Mamãe...
VITALIE: Você está delirando, meu filho. Só
estamos nós dois neste quarto. Você está falando com quem?
VERLAINE: Ela não consegue me ver.
RIMBAUD: Eu vou chamar a polícia!
VITALIE: Nem me fale da polícia...
VERLAINE: De novo? Quer que me prendam
novamente? Tem certeza? Sou eu,
Verlaine: eu voltei. (tenta tocar em Rimbaud)
RIMBAUD: (afasta-se apavorado, quase derruba
Vitalie, que o ajuda a deitar-se de novo) O meu relógio de prata... eu
passei quinze dias andando sem
conseguir nada... preciso vender meu
relógio...mãe...
VITALIE: Sim...
RIMBAUD: Você vai guardar meu dinheiro, não
vai? Na fazenda. Promete? Eu sou um
Comunnard! Eles vão me prender.
VERLAINE: Num quartel chamado Babilônia! Vão lhe
violentar. (ri)
RIMBAUD: Eles não gostam da estética, meu
método de vidência. A revolução está
chegando...
VERLAINE: Pobre menino...
RIMBAUD:
Vou esgotar em mim todos os
venenos.: doente, criminoso, maldito... sabedor supremo.
VERLAINE: Venha morar em Paris. Venez , Chère
Grande Âme, on vous attend, on vous désire.
RIMBAUD: As ondas lavam este barco fantasma...vontade de
partir, navegar ao céu... chegar ao desconhecido. Não me sentir mais
amarrado... mais forte que a bebida... a noite verde em neves infinitas.
Perfumes pretos... onda azul, peixes de ouro...barco perdido em brumas
roxas. Céu vermelho...ilhas no céu!
VERLAINE: E agora, aqui, neste hospital; o que
lhe resta? Esta água fria e escura para o seu crepúsculo?
RIMBAUD: Vou até à infinita vida! Vou sugar
seu seio casto e doce e aplacar esta sede ...
VITALIE- Você está com sede?
RIMBAUD- Estou. (Ela vai pegar água)
VERLAINE: E se o leite se transformar em
cuspe vermelho e arder no fogaréu?
(música- Vitalie afasta-se para o escuro)
RIMBAUD: Esses pássaros negros! Buscam em mim o lugar onde o beijo dorme...e onde o fauno morde a flor vermelha com dentes brancos.
VERLAINE: Delírios... como lhe parecem?
RIMBAUD: Suaves queimaduras... coração sangrando.
(Vitalie volta com o copo com água, dá de beber ao filho)
VERLAINE: Lembrei de quando você afogava esse
coração na cerveja e mijava
entre os girassóis. (ri) Para o
céu! como se fosse água benta.
VITALIE: (preocupada, ansiosa) Eu vou chamar
um médico. A infecção deve estar tomando conta do seu cérebro. Eu não agüento mais
pensar nesta maldita operação!
(Vitalie
aproxima-se do filho, acaricia o rosto dele, aperta-o contra o peito, olha para
cima)
VITALIE: Por quê? (suspira) É o que eu me
pergunto. Por quê? Por que tanta dor para uma pessoa? Ah! Arthur... O amor é
uma coisa muito difícil para mim... muito difícil...
(Vitalie vai para o escuro)
VERLAINE: A cidade era toda nossa.
RIMBAUD: Cadela no cio a comer cataplasmas na
noite ardente dos espasmos.
VERLAINE: O mar vermelho no bico dos teus
peitos. Sangue negro.
RIMBAUD: Eu estou tão só...
VERLAINE: Eu estou aqui!
RIMBAUD: Estou com sede.
VERLAINE: Você
tem medo de morrer, agora?
RIMBAUD: A eternidade é o mar que o sol
invade... Meu navio foi a pique. Partiu-se ao meio a minha quilha. Saí boiando
em alto-mar.
(Vitalie volta e ampara Rimbaud, saem para o escuro)
VITALIE: Venha comigo.
(música)
VERLAINE: Fiquei pensando nele que trocou a
vida pela literatura e depois trocou a
literatura pela vida... Amargurado, taciturno,
vazio, desolado Não se achava bem em lugar nenhum... mundo afora,
ardendo uma década na África. Assado em
forno de cal. Inesgotável energia.
Rompeu com amigos e parentes para explorar a vida em toda sua
plenitude. Lutando contra amarras, para se salvar. Obter a liberdade... Pensando, até à morte,
em não ser querido, não servir para nada neste mundo! Não ser digno de regressar à sua pátria, a
França. Não lhe seria permitido
reiniciar a vida normal de um cidadão. Temia
ser preso...
RIMBAUD- Cadeia? Cadeia depois do que acabo de sofrer? Antes a morte!
VERLAINE- Foi enganado e traído.
Barriga vazia, febre pelas inflamações das paredes do estômago causado pelo
atrito das costelas contra o abdômen. A pé, a cavalo, em busca de pão, emprego,
um lugar onde cair morto... (imita Rimbaud novamente)
RIMBAUD- Eu morrerei onde me largar o destino!
VERLAINE- Agora que tudo passou me sinto desolado. Prisioneiro de não sei que
gaiola horrível. Ele fez de mim o seu único amigo e conforto. E agora chove, chora no meu coração. Por que
sem amor nem ódio, meu coração sofre?
Cena 8/ Conclusão
RIMBAUD (EM OFF): As pessoas desta cidade,
na África, não são mais burras nem mais
canalhas do que os negros brancos dos
países ditos civilizados; não são do
mesmo tipo, só isso. Eles são até menos
maldosos e podem em alguns casos, manifestar gratidão e fidelidade. É preciso ser
humano com eles.
(Luz vermelha sobre Verlaine)
VERLAINE: No hospital em Marselha. À beira da morte, ele delirava. Era preciso organizar a caravana, buscar os camelos. Rápido! Estavam esperando. Queria fechar as malas e partir.
Aos trinta e sete anos. Meu menino, meu
formidável explosivo. Viu talvez na amputação da perna uma prova de combate com o anjo. Homem dos pés de vento. Trocou a lira pelo
tilintar das moedas de ouro. Seus escritos, tal pombos vermelhos voando,
levarão a mensagem, iluminarão a noite
da alma como uma... lição de vida. Ele jamais encontrou companhia. Estava sempre só. Assustadoramente só, no
labirinto... No arremate dos desejos... A história lhe reerguerá triunfante da morte. Para que apesar de toda a lama, o mundo veja, seus pés,
Arthur, intactos sobre a cabeça
da inveja!
fim...
ANJOS DE FOGO E GELO
Peça de Moisés Monteiro de Melo Neto (Moisés Neto)
Recife, abril de 2008
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